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Lições aprendidas em experiências de tutoria a distância: fatores potencializadores e limitantes

Taís Rabetti Giannella, Miriam Struchiner e Regina Maria Vieira Ricciardi

Laboratório de Tecnologias Cognitivas (Nutes/UFRJ) Apoio: CNPq, Capes, Paped/Seed/MEC

Introdução

Muito embora diferentes classificações sobre o papel do tutor/orientador a distância venham sendo amplamente discutidas na literatura, ainda há poucos dados ancorados em pesquisas sobre a prática de tutoria em contextos a distância, mediados pelas novas tecnologias da informação e da comunicação. Tendo em vista que essas informações são de fundamental importância para o planejamento de ambientes e processos educativos a distância, este trabalho tem como finalidade oferecer subsídios para essa discussão, com base na análise dos resultados obtidos - as lições aprendidas - sobre os fatores potencializadores e limitantes do trabalho de tutoria/orientação a distância, em três estudos sobre programas de educação a distância (EAD), via Web.

A pesquisa e o desenvolvimento de ambientes de aprendizagem a distância têm contribuído com o movimento de reflexão e questionamento sobre o campo educacional. Esse movimento aponta para a necessidade de integrar novos conhecimentos e materiais que contribuam para a melhoria da qualidade do ensino, viabilizando não apenas mudanças curriculares, mas também um ensino ativo, que enfatize a autonomia e a pesquisa, bem como a cooperação entre as pessoas envolvidas no processo de aprendizagem (Demo, 1994; Jonassen, 1998; Laurillard, 1993; Struchiner et al., 1998). Vale ressaltar que, embora os desafios lançados por esse movimento não sejam, em instância alguma, peculiares à EAD, o desenvolvimento desses ambientes de aprendizagem tem criado oportunidades de repensar velhos modelos, a partir de novas modalidades.

É com a visão de que a EAD não difere da educação presencial em sua essência, mas em aspectos pontuais, que devemos discutir o modelo de EAD que desejamos e suas implicações. Isso significa que grande parte dos conhecimentos envolvidos no processo educativo e nas atividades de ensino-aprendizagem é fundamental para a EAD, que, para suprir a distância física, lança mão de instrumentos, materiais e meios adequados para que todos os participantes tenham acesso às fontes de informação, participem ativamente do processo educativo, trocando experiências e relacionando-as ao mundo em que vivem, recebendo apoio e orientação para esse fim (Struchiner & Giannella, 2001). Nesse sentido, um dos elementos cruciais de reflexão e renovação do processo educativo é a relação professor-aluno. Em especial, a reformulação do papel do professor na relação pedagógica é uma das características fundamentais da EAD, que se apoia na "tutoria/orientação" realizada com o suporte de diferentes meios e ferramentas pedagógicas. Essa reformulação ganha relevo quando a proposta educacional está pautada em uma abordagem inovadora, que está centrada no papel ativo do sujeito na atividade educativa. Principalmente, ganha ênfase quando o ato educativo é entendido como um momento de construção de conhecimento, de intercâmbio de experiências e de criação de novas formas de participação.

Nesse contexto, o presente artigo se desenvolve, tendo como objetivo fundamental discutir, a partir da análise de três experiências de EAD, os principais fatores potencializadores e limitantes da atividade de tutoria/orientação a distância.

O papel do tutor/orientador a distância: competências e estratégias

Alguns autores questionam o conceito de tutoria, ressaltando que o "profissional potencializador da aprendizagem", além de complementar e facilitar a mediação pedagógica, deve estabelecer uma "comunicação empática" com o estudante (Coelho, 2002; Gold, 2001; Gutierrez, 1996). Pensar nesse mediador ultrapassa o conceito de tutoria, já que, analisando o significado da palavra, tutor é aquele que tutela, que ampara, confere proteção, dependência e sujeição (Struchiner et al.; 1998). Essas características não fazem parte do perfil de um profissional de um ambiente de aprendizagem que busca a potencialização do ato educativo numa ação participativa, criativa, relacional e, principalmente, reflexiva. Assim, esse profissional será mais bem denominado facilitador, orientador pedagógico ou, como optamos neste texto, tutor/orientador. Integrar o conceito de orientação valoriza a ideia de educar pela pesquisa. Portanto, remetendo ao contexto universitário, ressalta-se que o professor deve assumir o papel de orientador e, assim como em sua relação com seus orientandos de pesquisa, deve se caracterizar como alguém que, tendo produção própria, motiva o aluno a produzir também (Demo, 1994).

Para os tutores/orientadores apoiarem o processo de aprendizagem dos alunos, Jonassen (1998) propõe os seguintes níveis de orientação: tutoramento (scaffolding), treinamento (coaching) e modelagem (modeling). O tutoramento dá um suporte sistemático ao estudante, até que ele seja capaz de agir sozinho, como, por exemplo, iniciar uma tarefa, demonstrar os procedimentos e, posteriormente, dar seguimento à atividade de maneira autônoma. O treinamento objetiva motivar os alunos, analisar suas atividades, promover feedback e dar conselhos, provocar reflexões e articular os conhecimentos adquiridos. A modelagem caracteriza-se por oferecer ao aluno um exemplo do comportamento ou da atividade pretendida, por meio de relato de casos parecidos, mostrando como as soluções foram tomadas ou demonstrando como um especialista perseguiria a solução de um determinado problema. O aluno analisa os procedimentos e as soluções, comparando-os com o problema que precisa resolver, e tenta encontrar suas próprias respostas. Dessa maneira, percebe-se a existência de três níveis de atividade e de suporte para o aluno, que vão desde um acompanhamento mais estruturado e direto até o mais aberto, que possibilita a livre iniciativa do aluno (Struchiner et al., 1998).

Aretio (2001) aponta que a quantidade de características e competências recomendadas para a atividade de orientação a distância é muito extensa e, nesse sentido, procura enfatizar quatro principais qualidades, sem as quais todas as demais podem fracassar: cordialidade - fazer com que os alunos se sintam "bem-vindos", respeitados e confortáveis; aceitação - aceitar/compreender a realidade do aluno que, em seus contatos com o tutor/orientador, deve se sentir participante ativo do processo; honradez - ser verdadeiro e autêntico; não deixar que o aluno crie expectativas falsas sobre o que se pode oferecer; manifestar honestidade, não assumindo uma postura de "professor dono da verdade"; empatia - colocar-se no lugar do outro; envolver-se com os sentimentos dos alunos, aproximando as relações.

Aliada a essas qualidades, Aretio ressalta ainda mais uma: a capacidade de desenvolver uma escuta/leitura inteligente, isto é, o tutor deve procurar escutar/ler o que se diz/escreve intencionalmente, ou inconscientemente. Com isso, espera-se animar o estudante a expressar seus sentimentos e preocupações sem constrangimento. Para o desenvolvimento dessa qualidade, Aretio indica as seguintes recomendações: (1) procurar remeter a ideia dominante que o aluno acabou de dizer/escrever, resumindo ou parafraseando suas palavras, evitando emitir opinião ou crítica, de maneira a estimular sua reflexão e fazendo-o prosseguir; (2) evitar perguntas que podem ser respondidas com "sim" ou "não", ou aquelas iniciadas por "por que"; essas perguntas tendem a quebrar o fluxo natural do pensamento dos alunos, são restritivas e, por possuírem uma natureza de interrogatório, podem colocar os alunos em uma postura defensiva; (3) compreender o silêncio; muitas vezes, um espaço de tempo sem diálogo é necessário para a reflexão e a tomada de decisão pelo aluno; o tutor/orientador deve procurar estar atento se o silêncio indica desânimo ou possível desistência, ou tempo necessário para a reflexão/ação individual.

O desenvolvimento de todas essas qualidades revela a importância do aspecto humano das relações, que deve ser elevado ao máximo, possibilitando o estabelecimento de um processo educativo onde haja uma relação emocional de confiança, amizade e cumplicidade (Santos, 2002). Segundo Krelling (2001), esse tipo de relação é essencial para o crescimento do aluno, contribuindo para minimizar problemas como a alta evasão nos cursos de EAD.

Muito embora essas classificações sobre o papel do tutor/orientador a distância venham sendo amplamente discutidas na literatura (Aretio, 2001; Berge, 1995; Gutierrez, 1996; Jonassen, 1998; Krelling, 2001; Santos, 2002), ainda há poucos dados ancorados em pesquisas sobre a prática de tutoria em contextos a distância, mediados pelas novas tecnologias da informação e da comunicação. Tendo em vista que essas informações são de fundamental importância para o planejamento de ambientes e processos educativos a distância, este trabalho tem como finalidade oferecer subsídios para essa discussão, com base na análise dos resultados obtidos em três estudos sobre programas de EAD, via Web.

Análise das três experiências de EAD

A presente análise foi realizada a partir do levantamento e da caracterização dos principais fatores identificados como potencializadores e limitantes do trabalho de tutoria/orientação, nos cursos investigados. Os estudos analisados contaram com três principais fontes de dados: observação do desenvolvimento dos cursos, realização de questionários e entrevistas (com alunos, tutores/orientadores e coordenadores).

No quadro abaixo, são apresentadas as características gerais dessas três experiências.

Características básicas das experiências descritas

Características Curso A Curso B Curso C
Período de realização Fev/1999 a ---* 18/8/2000 a 18/10/2000 21/2/2002 a 25/3/2002
Forma de distribuição Na Internet Na Internet Na Internet
Público-alvo Profissionais de empresas que gerenciam seus próprios programas de saúde Profissionais ligados à área de gestão de recursos humanos (experiência realizada no Rio Grande do Norte, Brasil) Docentes universitários de universidades públicas brasileiras (âmbito nacional)
Conteúdo do curso Gestão e assistência em saúde Competências gerenciais para a implementação de novas práticas que possam elevar os padrões de qualidade e assistência nos serviços no âmbito das reformas do setor saúde Potencialidades pedagógicas do uso da Internet no processo de ensino-aprendizagem
Número de tutores/orientadores 13 (o coordenador não tinha função de tutor) 2 (o coordenador não tinha função de tutor) 3 (o coordenador também era tutor)
Número de alunos Inicial: 300
Final: ---*
Inicial: 20
Final: 14
Inicial: 37
Final: 13

*Como a experiência A não teve sucesso, não tendo continuidade, alguns dados não podem ser contemplados neste quadro.

Em relação ao curso A, verificou-se que não houve um processo de seleção de tutores/orientadores. Os professores, que integravam o departamento que oferecia o curso, foram convidados a participar da experiência, recebendo remuneração para cada aluno que completasse as atividades do curso. Uma das razões, segundo o coordenador do curso, para utilizar os professores do próprio departamento, era a possibilidade de associar os recursos da instituição ao programa de EAD. Os tutores foram orientados para o desempenho de suas atividades em workshop com duração de dois dias, coordenado pela assessora pedagógica. No início do curso, havia a proposta de uma reunião presencial mensal com os tutores, o que ocorreu apenas durante os três primeiros meses, já que os tutores não conseguiam mais conciliar seus horários. Foi verificado que a comunicação entre tutores e alunos foi bastante falha, não apenas por problemas tecnológicos (o fórum, única ferramenta disponível, apresentou diversos problemas), como por uma falta de entendimento e compreensão sobre o papel da orientação no curso (Alcântara, 2001).

Em relação ao modelo de tutoria/orientação do curso B, o curso contou com duas tutoras, profissionais com domínio do conteúdo tanto do ponto de vista teórico como prático. Vale ressaltar que as tutoras tinham também prática docente no ensino presencial, mas nunca haviam participado de cursos a distância. Foram orientadas pela coordenadora (que participara da elaboração do curso), em relação ao modelo do programa, às atividades pedagógicas e ao desenvolvimento de suas funções de orientador/facilitador, numa abordagem construtivista de aprendizagem. A comunicação entre alunos, tutores/orientadores e coordenação foi facilitada pela existência de diferentes ferramentas de comunicação: quadro de avisos, e-mail e fórum de discussão (Carvalho, 2000).

Como o curso C fazia parte de uma experiência piloto, não se planejou oferecê-lo para um grande número de participantes. Assim, visando estabelecer uma dinâmica aberta e informal, não se previu a existência de um modelo de tutoria/orientação formal, mas sim de um coordenador para orientar as atividades, preferencialmente por meio de espaços coletivos, como o fórum e a monitoria. Posteriormente, como o curso contou com um grande número de inscrições, optou-se por dividir, aleatoriamente, os alunos entre três orientadoras, para que os participantes pudessem direcionar os problemas ou as dificuldades pessoais que preferissem não publicar nas áreas de comunicação coletiva, não sobrecarregando, assim, a coordenação. Nesse sentido, o papel das orientadoras foi o de atender e orientar dúvidas e/ou questões mais pessoais provenientes dos alunos. A coordenadora, que era uma das orientadoras, foi quem assumiu o papel de gerenciamento, mobilização e orientação do processo educativo, no sentido coletivo. A interação entre os participantes contou com as mesmas ferramentas comunicacionais oferecidas no curso B (Giannella, 2002).

Lições aprendidas

A partir das três experiências relatadas, apresenta-se uma síntese dos fatores que potencializaram ou limitaram as atividades de tutoria/orientação a distância.

Os fatores que potencializaram as atividades podem ser classificados em três categorias: fatores pedagógicos, tecnológicos e gerenciais.

  1. Fatores pedagógicos
    • Estratégia pedagógica baseada na resolução de situações-problema

      Este modelo pedagógico, utilizado no curso (B), permitiu envolver as experiências dos alunos, estimulando o desenvolvimento de uma aprendizagem ativa e autônoma. Ao mesmo tempo em que exigia maior dedicação e elaboração por parte do tutor/orientador, tornou a atividade de tutoria/orientação mais aberta e flexível. Esta estratégia não é a melhor, nem a única que propicia os elementos citados anteriormente, mas configura um exemplo oportuno para o desenvolvimento de ambientes construtivistas de aprendizagem.

    • Diversidade de ferramentas comunicacionais

      A possibilidade de utilizar ferramentas comunicacionais com funções específicas (quadro de avisos, e-mail e fórum de discussão, por exemplo) facilita o trabalho do tutor/orientador, pois permite atender diferentes estilos de conversação (interação mais pessoal ou coletiva, por exemplo). As ferramentas comunicacionais possibilitam diminuir a sensação de isolamento nos cursos de EAD, potencializando a construção coletiva de conhecimento.

    • Familiarização dos tutores com todos os elementos e estrutura do curso

      O habitual, em cursos a distância, é que haja equipes especializadas para as diferentes etapas de desenvolvimento e implementação. Normalmente, este processo envolve especialistas de conteúdo, desenhistas instrucionais, programadores visuais e de informática, além de tutores/orientadores. Os tutores/orientadores quase nunca participam do processo de concepção e planejamento do curso. Portanto, é necessário que se familiarizem tanto com o conteúdo, como com a abordagem pedagógica e o ambiente de aprendizagem. Esta familiaridade garante maior segurança e domínio em relação ao processo educativo, o que potencializa a atividade de tutoria/orientação.

  2. Fatores tecnológicos
    • Existência de ferramentas de acompanhamento das atividades do curso

      Uma vez que todas as atividades acontecem a distância, as ferramentas de acompanhamento facilitam as atividades dos tutores, criando estratégias de organização do trabalho e gerenciamento das atividades dos alunos. Assim, a partir destas ferramentas, os tutores/orientadores podem visualizar o número de acessos, os caminhos percorridos, os materiais consultados e enviados etc. No curso (A), os tutores podiam acompanhar as atividades a partir do histórico de navegação dos alunos. Embora facilitasse o trabalho, esta ferramenta ainda deverá ser aperfeiçoada, já que sua "leitura" e sua interpretação não são tão amigáveis. No curso (B), os tutores/orientadores contaram com a ferramenta de Alunos por orientador (cadastro dos alunos relacionados ao orientador), Controle de acesso (disponibiliza os dados sobre a rotina de utilização do curso pelos alunos sob sua orientação) e Análise dos trabalhos (dáacesso à visualização e correção dos trabalhos dos alunos). No curso (C), os tutores não contaram com qualquer ferramenta de gerência.

  3. Fatores gerenciais
    • Liderança da coordenação do curso

      É fundamental que a coordenação do curso se coloque no papel dos tutores para conhecer e vivenciar o processo educativo e melhor gerenciar a dinâmica do curso. A coordenação deve assumir o papel de integração da equipe, potencializando as atividades dos tutores.

    • Apoio de monitores tecnológicos

      Tendo em vista as inúmeras dificuldades com o uso da tecnologia, ainda apresentadas pela maioria dos participantes (coordenadores, tutores e alunos), o apoio de monitores especializados é um elemento muito importante para auxiliar as atividades de tutoria. Os monitores não apenas apoiam as dúvidas dos alunos, como as dos próprios tutores. Os tutores, assim, ficam liberados da sobrecarga das dúvidas dos alunos em relação ao uso da tecnologia e podem se concentrar na orientação pedagógica.

Na classificação dos fatores que limitaram as atividades de tutoria/orientação, além das três categorias apresentadas anteriormente, identificou-se a categoria "fatores culturais".

  1. Fatores pedagógicos
    • Falta de experiência com a prática de orientação a distância

      As atividades de EAD ainda são uma novidade para a maioria dos professores, lançando inúmeros desafios para as suas práticas docentes. Dificilmente será possível transferir os mesmos hábitos/estratégias da sala de aula para as atividades de EAD, o que traz, de início, uma certa insegurança para os professores. Com a prática, novas competências são desenvolvidas para o melhor aproveitamento das atividades de tutoria/orientação.

    • Falta de uma compreensão sólida e comum sobre a abordagem pedagógica proposta

      Embora, atualmente, grande parte dos cursos de EAD seja apresentada como proposta inovadora e construtivista, nem sempre isso é compatível com os modelos oferecidos. Além disso, nem sempre existe uma compreensão sólida sobre este modelo, que seja compartilhada por todos os profissionais envolvidos. No processo de planejamento e desenvolvimento de um curso, é fundamental - além da análise profunda e crítica sobre qual a visão educativa que o curso pretende oferecer - propiciar estratégias de discussão e integração desta visão com toda a equipe. Isso possibilita o desenvolvimento profissional e pessoal de cada um e favorece a concretização de um projeto coletivo.

    • Problemas nas ferramentas comunicacionais - limitação da interatividade entre os participantes

      Como as ferramentas comunicacionais são o principal meio de contato e diálogo entre os participantes, as atividades de tutoria ficam prejudicadas quando há problemas técnicos, e isso limita a interatividade e distancia a comunidade.

    • Capacitação de tutores limitada aos aspectos técnicos do curso

      Grande parte dos cursos de capacitação para tutores se limita aos aspectos técnicos relacionados ao uso das ferramentas do curso. Os aspectos pedagógicos e os elementos e estratégias peculiares da EAD são, muitas vezes, deixados em segundo plano ou nem abordados, o que acaba prejudicando o desempenho dos tutores. Isso se deve a dois principais motivos: 1) à familiaridade ainda pequena em relação aos aspectos pedagógicos envolvidos na EAD e 2) ao fato de se considerar que, sendo professores, esses profissionais já são competentes na prática pedagógica.

  2. Fatores tecnológicos
    • Limitações técnicas do uso da tecnologia

      As limitações tecnológicas de nossa rede de computadores ainda são bastante intensas, o que dificulta muito as atividades a distância pela Internet; entre as limitações, pode-se citar a lentidão da rede e o seu custo de uso. A dificuldade de acesso à Internet é um dos elementos que mais provoca a desistência e o insucesso desta modalidade de EAD.

  3. Fatores gerenciais
    • Pequeno tempo de dedicação dos tutores

      A falsa ideia de que a EAD exige menos tempo de dedicação dos professores ainda persiste. Na verdade, as atividades de EAD, quando realizadas com seriedade e com a visão de priorizar os processo de autonomia, interação e cooperação, acabam requerendo dos professores um tempo de dedicação maior do que o imaginado. Isso pode acabar trazendo conflitos e desorganização para o processo educativo, dificultando as atividades de tutoria/orientação. É necessário ter sempre em mente que as atividades de EAD requerem, além das demandas normais de qualquer atividade educativa, uma reorganização das relações de ensino-aprendizagem, o que é um grande desafio e exige maior tempo de dedicação e compromisso.

  4. Fatores culturais
    • Desafios do modelo pedagógico que privilegia uma postura mais ativa e autônoma dos alunos

      A cultura da transmissão do conhecimento ainda está enraizada em nossa sociedade, dificultando o desenvolvimento de propostas educativas mais abertas que estimulem uma postura ativa e autônoma dos alunos. Geralmente, os alunos mantêm uma postura passiva, esperam que o professor dite todo o andamento do processo educativo e desejam receber sempre respostas prontas para as suas dúvidas. Um dos papéis dos orientadores/tutores é procurar transformar essa visão, redirecionando suas práticas para uma ação de apoio ao aprendizado.

    • Limitações culturais do uso da tecnologia

      O primeiro passo para o orientador passar confiança e segurança para os seus alunos a distância é demonstrar conforto com a tecnologia, procurando conhecer a fundo todo o ambiente, seus recursos e ferramentas. Isso também facilitará o atendimento às dúvidas técnicas dos alunos.

    • Dificuldade de lidar com situações em que os alunos apresentam maior conhecimento sobre determinado conteúdo

      Pela facilidade de enviar perguntas e comentários diversos (a qualquer hora, quando desejar) e pela abertura e flexibilidade propostas em muitos ambientes de aprendizagem, pode acontecer de os orientadores receberem questões que não saibam responder. Isso pode ser embaraçoso para os professores, que devem aprender a lidar com essas situações. É sempre bom poder relembrar que a atividade educativa é uma atividade de construção social, que se dá por meio da troca e cooperação de diferentes conhecimentos e expertises.

    • Dificuldade de exposição, em virtude da linguagem escrita

      A falta de familiaridade com o formato de interação viabilizado pela Internet, onde ideias e posicionamentos são registrados de forma permanente, por meio da expressão escrita, pode ser um fator de inibição que explica a participação de caráter mais observador de alguns participantes. Essa postura mais observadora pode acabar limitando as atividades dos tutores, que devem procurar alternativas para orientar esses alunos.

Conclusões

Tendo em vista a ideia de que o aluno a distância deve encontrar em si mesmo as motivações e as necessidades para aprender, sendo capaz de fazer opções sobre seu próprio processo de educação, apresenta-se um grande desafio para a EAD, que é o de estabelecer pedagogia menos diretiva, onde os alunos possam definir seus ritmos, preferências curriculares e de metodologias de aprendizagem. O planejamento do processo educativo deve levar em conta as habilidades e competências dos participantes, assim como suas condições socioculturais (situação familiar, profissional, social, ambiental).

Como discutem Struchiner et al. (1998), a mediação pedagógica construtivista pode ser traduzida em competências do tutor/orientador, que deverá compreender a construção do conhecimento como um processo dinâmico e relacional; além disso, deverá ter uma visão clara da metodologia a ser realizada e dos processos adequados de avaliação e desenvolver uma postura de atuação compatível com essa visão. Dessa maneira, o tutor/orientador possui um papel fundamental, direcionando seus esforços na personalização da EAD, mediante um apoio sistemático e organizado, que ajude os alunos na utilização dos materiais educativos oferecidos, que propicie o estímulo e a orientação individual e coletiva, facilitando e motivando as situações de aprendizagem.

No entanto, essa inegável importância relegada ao tutor/orientador deve vir acompanhada da compreensão de que sua atuação, como foi apresentado neste trabalho, é influenciada por uma série de elementos. Assim, como pode ser observado em nossas Lições aprendidas, os fatores envolvidos no trabalho de tutoria/orientação a distância contemplam desde aqueles relativos à concepção pedagógica do curso (fatores pedagógicos), passando pelos relacionados aos recursos e ferramentas disponíveis para auxiliar o seu trabalho (fatores tecnológicos e gerenciais), indo até a postura e expectativa dos alunos, além da visão sobre o processo de ensino-aprendizagem, contemplada por todos os participantes envolvidos (fatores culturais).

Finalmente, vale ressaltar que a literatura define tantas listas de qualidades e recomendações para o trabalho de tutoria/orientação a distância que, para alcançá-las, precisaríamos de perfeitos "super-homens" (Aretio, 2001); na verdade, mais do que procurar seguir recomendações, é necessário ter a oportunidade de refletir sobre elas, com a prática e com os possíveis erros.

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Publicado em 31 de dezembro de 2005

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