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Projeto: uma nova cultura de aprendizagem
Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida
A prática pedagógica por meio do desenvolvimento de projetos é uma forma de conceber educação que envolve o aluno, o professor, os recursos disponíveis, inclusive as novas tecnologias, e todas as interações que se estabelecem nesse ambiente, denominado ambiente de aprendizagem. Este ambiente é criado para promover a interação entre todos os seus elementos, propiciar o desenvolvimento da autonomia do aluno e a construção de conhecimentos de distintas áreas do saber, por meio da busca de informações significativas para a compreensão, representação e resolução de uma situação-problema. Fundamenta-se nas ideias piagetianas sobre desenvolvimento e aprendizagem, interrelacionadas com outros pensadores dentre os quais destacamos Dewey, Freire e Vygotsky.
Trata-se de uma nova cultura do aprendizado que não se fará por reformas ou novos métodos e conteúdos definidos por especialistas que pretendam impor melhorias ao sistema educacional vigente. É uma mudança radical, que deve tornar a escola capaz de:
- atender às demandas da sociedade;
- considerar as expectativas, potencialidades e necessidades dos alunos;
- criar espaço para que professores e alunos tenham autonomia para desenvolver o processo de aprendizagem de forma cooperativa, com trocas recíprocas, solidariedade e liberdade responsável;
- desenvolver as capacidades de trabalhar em equipe, tomar decisões, comunicar-se com desenvoltura, formular e resolver problemas relacionados com situações contextuais;
- desenvolver a habilidade de aprender a aprender, de forma que cada um possa reconstruir o conhecimento, integrando conteúdos e habilidades segundo o seu universo de conceitos, estratégias, crenças e valores;
- incorporar as novas tecnologias não apenas para expandir o acesso à informação atualizada, mas principalmente para promover uma nova cultura do aprendizado por meio da criação de ambientes que privilegiem a construção do conhecimento e a comunicação.
A aprendizagem por projetos ocorre por meio da interação e articulação entre conhecimentos de distintas áreas, conexões estas que se estabelecem a partir dos conhecimentos cotidianos dos alunos, cujas expectativas, desejos e interesses são 2 mobilizados na construção de conhecimentos científicos. Os conhecimentos cotidianos emergem como um todo unitário da própria situação em estudo, portanto sem fragmentação disciplinar, e são direcionados por uma motivação intrínseca. Cabe ao professor provocar a tomada de consciência sobre os conceitos implícitos nos projetos e sua respectiva formalização, mas é preciso empregar o bom-senso para fazer as intervenções no momento apropriado.
Trabalhar com projetos significa lidar com ambiguidades, soluções provisórias, variáveis e conteúdos não identificáveis a priori e emergentes no processo. Tudo isso se distingue de conjecturas pela intencionalidade explicitada em um plano que inicialmente é um esboço ou design caracterizado pela plasticidade, flexibilidade e abertura ao imprevisível, sendo continuamente revisto, refletido e reelaborado durante a execução.
O plano é a espinha dorsal das ações e vai se completando durante a execução na qual evidencia-se uma atividade que rompe com as barreiras disciplinares, torna permeável as suas fronteiras e caminha em direção a uma postura interdisciplinar para compreender e transformar a realidade em prol da melhoria da qualidade de vida pessoal, grupal e global.
O desenvolvimento de um projeto envolve um processo de construção, participação, cooperação e articulação, que propicia a superação de dicotomias estabelecidas pelo paradigma dominante da ciência e as interrelaciona em uma totalidade provisória perpassada pelas noções de valor humano, solidariedade, respeito mútuo, tolerância e formação da cidadania, que caracteriza o paradigma educacional emergente (Moraes, 1997).
O professor que trabalha com projetos de aprendizagem respeita os diferentes estilos e ritmos de trabalho dos alunos desde a etapa de planejamento, escolha do tema e respectiva problemática a ser investigada. Não é o professor quem planeja para os alunos executarem, ambos são parceiros e sujeitos de aprendizagem, cada um atuando segundo o seu papel e nível de desenvolvimento.
As questões de investigação são formuladas pelos sujeitos do conhecimento levando em conta suas dúvidas, curiosidades e indagações e, a partir de seus conhecimentos prévios, valores, crenças, interesses e experiências, interagem com os objetos de conhecimento, definem os caminhos a seguir em suas explorações, descobertas e apropriação de novos conhecimentos.
Cabe ao professor incitar o aluno a tomar consciência de suas dúvidas temporárias e certezas provisórias (Fagundes et al., 1999), ao mesmo tempo em que o ajuda a articular informações com conhecimentos anteriormente adquiridos e a gerenciar o seu desenvolvimento.
O professor é o consultor, articulador, mediador, orientador, especialista e facilitador do processo em desenvolvimento pelo aluno. A criação de um ambiente de confiança, respeito às diferenças e reciprocidade, encoraja o aluno a reconhecer os seus conflitos e a descobrir a potencialidade de aprender a partir dos próprios erros. Da mesma forma, o professor não terá inibições em reconhecer seus próprios conflitos, erros e limitações e em buscar sua depuração, numa atitude de parceria e humildade diante do conhecimento que caracteriza a postura interdisciplinar.
A interdisciplinaridade (Fazenda, 1994) caracteriza-se pela articulação entre teorias, conceitos e ideias, em constante diálogo entre si; não é categoria de conhecimento, mas de ação (...) que nos conduz a um exercício de conhecimento: o perguntar e o duvidar (ib, 28). Esta postura fovorece a articulação horizontal entre as disciplinas numa relação de reciprocidade, e, ao mesmo tempo, induz a um aprofundamento vertical na identidade de cada disciplina, propiciando a superação da fragmentação disciplinar.
A partir de uma mudança pessoal e profissional é que se começa a refletir sobre a mudança da escola para uma escola que incentive a imaginação criativa, favoreça a iniciativa, a espontaneidade, o questionamento e a inventividade, promova e vivencie a cooperação, o diálogo, a partilha e a solidariedade.
Mas, para transformar o sistema educacional é preciso que essa reciprocidade extrapole os limites da sala de aula e envolva todos que constituem a comunidade escolar: dirigentes, funcionários administrativos, pais, alunos, professores e a comunidade na qual a escola encontra-se inserida.
Referências Bibliográficas
Fagundes, L. C. et alli. Aprendizes do futuro: as inovações começaram. Cadernos Informática para a Mudança em Educação. MEC/ SEED/ ProInfo, 1999.
Fazenda, I. C. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. Campinas, SP: Papirus, 1994.
Moraes, M. C. O Paradigma Educacional Emergente. Campinas, Papirus, 1997.
PUC/SP, Julho, 1999
Publicado em 31 de dezembro de 2005
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