Múltiplas inteligências a partir de jogos no ensino de Geografia

Adriano Pequeno Santos

Geógrafo, especialista em Análise Regional e Ensino de Geografia (UFCG), professor na rede pública da Paraíba (SEE/PB)

Monalisa Cristina Silva Medeiros

Geógrafa, mestra e doutora em Recursos Naturais (UFCG), professora na rede pública da Paraíba (SEE/PB)

O ensino de Geografia, ao longo do tempo, vem ocorrendo de forma mnemônica, sem vinculação com a realidade dos estudantes. Nos últimos anos, outras concepções pedagógicas têm permeado o ensino de Geografia: a inatista, a empirista e a interacionista. Nesta pesquisa, ressaltaremos a concepção interacionista, vinculando-a às múltiplas inteligências. Além disso, foram organizadas oficinas de jogos baseadas na metodologia participante e foram propostas algumas atividades para o ensino de Geografia. Este trabalho pretende fazer uma análise dos jogos como forma de estimular as múltiplas inteligências e favorecer a construção do conhecimento geográfico.

No primeiro momento do trabalho, foi caracterizado o espaço da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Marechal Almeida Barreto, local onde foram realizadas a investigação e as oficinas e foi apresentado o caminho metodológico. O segundo momento consiste na fundamentação teórica com ênfase nas múltiplas inteligências no ensino de Geografia. Em seguida, vêm os resultados e discussões com a descrição das oficinas de jogos realizadas; e então as considerações finais.

Caracterização da área de pesquisa

A Escola Estadual Marechal Almeida Barreto está localizada no município de Juazeirinho/PB (Figura 1). Atualmente a escola possui 63 professores/servidores e cerca de 1.300 alunos matriculados.

Figura 1: Localização da Escola E. E. E. F. e M. Marechal Almeida Barreto
Fonte: Santos (2018).

A escola funciona nos três turnos, oferecendo Ensino Fundamental e Médio. A instituição encontra-se com problemas na estrutura física, pois há 55 anos a estrutura física é a mesma. Contudo, busca-se alinhar aos programas dos governos federal e estadual, com destaque para o Programa Mais Educação.

Os problemas na estrutura física do espaço escolar dificultam a melhoria na qualidade da educação oferecida, constituindo-se em problema político comum em relação ao contexto em que a escola pública brasileira está inserida. Porém, outras questões, como a formação docente, também penalizam a qualidade. E é nessa perspectiva que este artigo se desdobrará, a partir da temática da metodologia do ensino em Geografia.

Pesquisa participante

A construção teórica e metodológica da pesquisa baseia-se nos caminhos da investigação qualitativa, tendo em vista que é uma abordagem que traz metodologias e técnicas que permitem ao pesquisador observar o objeto de vários ângulos, favorecendo uma interpretação aprofundada a respeito das relações que ocorrem no espaço escolar, em que

compreender e interpretar fenômenos, a partir de seus significantes e contexto, é tarefa sempre presente na produção de conhecimento, o que contribui para que percebamos vantagens no emprego de métodos que auxiliem a ter uma visão mais abrangente dos problemas. Ademais, supõem contato direto com o objeto de análise e fornecem um enfoque diferenciado para compreensão da realidade (Neves, 1996, p. 5).

A utilização da abordagem qualitativa será de fundamental importância, pois a aproximação do olhar do pesquisador frente ao objeto estudado favorecerá o aprofundamento e a possibilidade de coletar dados e informações da pessoa ou grupo investigado. Dentre as metodologias desse tipo de abordagem utilizamos a observação participante, que, para alguns autores, também é uma pesquisa onde há ação.

Segundo Lüdke (1986), a observação é utilizada como principal método de investigação e pode ser associada a outras técnicas de coleta. Sendo assim, ela possibilita um contato pessoal e estreito do pesquisador com o fenômeno estudado.

Todavia, Demo (1995 apud Gori, 2006) reitera que a pesquisa-ação como metodologia alternativa está sedimentada em uma avaliação qualitativa das manifestações sociais, comprometida com intervenções que complementam o diagnóstico. Com base nessa concepção, a pesquisa-ação, além de participativa, objetiva a acumulação, a sistematização dos dados coletados no espaço estudado e a produção do conhecimento, visando melhorias em um contexto educacional pela intervenção.

Por isso, optamos por esse caminho metodológico, utilizando jogos para a disciplina de Geografia e participando ativamente de todo o processo.

Oficinas de jogos

A utilização de oficinas é uma estratégia muito interessante em atividades pedagógicas, pois relaciona a teoria com a prática. Dessa forma, a oficina é uma forma de construir conhecimento a partir da sequência ação, observação e reflexão. Para Paviani e Fontana (2009), o uso de oficinas é o momento em que se vivenciam situações concretas e significativas.

O professor ou coordenador da oficina não ensina o que sabe, mas vai oportunizar o que os educandos necessitam saber, sendo, portanto, uma abordagem centrada no aprendiz e na aprendizagem e não apenas no professor. Desse modo, a construção de saberes e as ações relacionadas decorrem, principalmente, do conhecimento prévio, das habilidades, dos interesses, das necessidades, dos valores e julgamentos dos participantes (Paviani; Fontana, 2009, p.79).

Assim, a oficina de jogos, como atividade didática, dinamiza o ambiente escolar e constitui-se em um momento de produção do conhecimento tanto para o professor e para o pesquisador como também para o educando, porque ele está no centro da relação ensino-aprendizagem.

Construção do conhecimento geográfico e múltiplas inteligências

O ensino da Geografia no Brasil foi influenciado pela escola francesa, que valorizava a descrição baseada no caráter empirista, distante da realidade do educando. Desse modo, encontrava-se impregnado de características típicas dos moldes tradicionais, valorizando a “decoreba”, principalmente de conceitos. Isso favorecia a reprodução daquilo que já estava pronto, dificultando o aluno a entender os processos que levariam à formação dos conceitos geográficos.

Contudo, a Geografia como disciplina escolar deve ter por finalidade trabalhar suas categorias principais, como: espaço, paisagem, território, região e lugar. Para isso, é necessário que o professor desenvolva situações que visem ao estímulo do educando, favorecendo o seu desenvolvimento crítico. O educador deve estar atento a novas metodologias e à pessoa do aluno como possuidor de experiências e que se constitui sujeito ativo no processo de ensino-aprendizagem. Segundo Cavalcanti (2012), o aluno é sujeito histórico e socialmente constituído ativo no processo de construção de seus conhecimentos, e a Geografia destaca-se como elemento de extrema importância para que o discente compreenda o mundo em que vive.

Nesse contexto, existem várias teorias pedagógicas que, com sua operacionalização na sala de aula, podem contribuir ou dificultar a construção do conhecimento geográfico. Dentre essas teorias, podem ser destacadas:

A inatista, que concebe o conhecimento como um dado da própria natureza humana ou de uma dádiva divina; a empirista, que entende o conhecimento como decorrência das impressões (gravações) na mente dos dados provenientes da experiência; e a interacionista, que reconhece o conhecimento como resultante das interações do sujeito (com todas as suas características hereditárias) com o meio (com todos os seus condicionantes sociais e culturais) (ROSA, 2007, p. 41).

Assim, a teoria que mais se aproxima das concepções apontadas anteriormente por Cavalcanti (2012) seria a interacionista, subsidiando o que ficou conhecido por construtivismo. Segundo Rosa (2007, p. 40), “o construtivismo é filho do movimento iluminista, fiel defensor da capacidade humana de guiar-se pela razão e, através dela, criar e recriar o mundo”. Reiterando essa autora, o construtivismo é fiel ao princípio interacionista, pois procura demonstrar, ao contrário das demais tendências, o papel central do sujeito na produção do saber, diferentemente das proposições tradicionais.
A educação baseada em um pensamento construtivista, no qual se destaca a Geografia do aluno como referência, conduz ao processo de ensino-aprendizagem com estruturação dos conteúdos básicos de Geografia.

Lira (2013) reflete que o ensino tradicional permanece predominante na prática da disciplina escolar, com a transmissão e a repassagem de dados formulados por meio da descrição e memorização das informações. Esse ensino não valoriza a realidade mais próxima do estudante. E reforça as condições de trabalho de professores(as), pois dificulta a operacionalização de uma prática construtivista.

Antunes (2012) também considera que muitas escolas ainda trabalham com o conceito de inteligência com base no referencial de Alfred Binet, em que as pessoas inteligentes são aquelas que possuem capacidade de se expressar com clareza/domínio da Matemática etc. Somado a isso, as formas de avaliação utilizadas são baseadas em testes, ou seja, a famosa “prova”, e esta seria uma descendente muito próxima dos famosos testes de QI, que não valorizam as outras capacidades dos seres humanos, a não ser a facilidade de expressão e domínio matemático citados anteriormente.

Assim, surge a necessidade de estudar novas formas que visem estímulos positivos na educação de forma a tornar o cotidiano escolar dinâmico e proveitoso. Com esse pensamento, novos meios de educar foram criados ou adaptados, visando ao desenvolvimento de competências e habilidades do educando. Segundo Travassos,

as crianças em diferentes idades possuem necessidades diferentes, respondem a diferentes formas de informação cultural e assimilam conteúdos com diferentes estruturas motivacionais e cognitivas; logo, os tipos de regimes educacionais planejados pelos educadores precisam levar em conta esses fatores de desenvolvimento. Os tipos de modelos educacionais que são oferecidos às crianças podem demonstrar a direção que elas poderão tomar, podendo ser encorajadas ou não para a perícia, criatividade etc. Em nossa sociedade pode haver modelos contrastantes sobre os usos do talento e as maneiras pelas quais ele pode ser desenvolvido (Travassos, 2001).

Por essa concepção, de que a mente humana abriga diferentes tipos de inteligências, apontadas por Howard Gardner, surge a necessidade de criar novos métodos de ensino visando o desenvolvimento de cada tipo de inteligência e atividades criativas e estimuladoras para as demais inteligências. Nessa perspectiva, firma-se o papel do professor como mediador que vai adaptar os conteúdos da disciplina à realidade do aluno, de modo que este consiga entender o que está sendo trabalhado, respondendo de forma positiva.

Atualmente, os jovens mostram-se abertos a novas experiências, tecnologias e conhecimentos. Assim, as escolas devem planejar sua didática com base nessa nova realidade. Para Haydat (2006), o educador, na sua relação com o educando, estimula e ativa o interesse do aluno para aprender. A utilização de jogos é uma boa oportunidade de trabalhar as múltiplas inteligências, constituindo uma dentre as várias alternativas de inovação da aprendizagem, favorecendo o desenvolvimento da criatividade do aluno, tornando a sala de aula dinâmica, proporcionando um aprendizado construtivo e saudável. 

Travassos (2001) faz referência a sete inteligências: a inteligência musical, a cinestésico-corporal, a lógico-matemática, a linguística, a espacial, a interpessoal e a intrapessoal. Antunes (2001) destaca mais uma: a inteligência ecológica, porque nessa o indivíduo busca entender uma linguagem que está presente na natureza e em todo o espaço que rege os ecossistemas.

Dentre as inteligências que se relacionam aos conteúdos sistematizados da ciência geográfica podem ser citadas, a cinestésico-corporal, a ecológica, a espacial, a linguística, as inteligências interpessoal e intrapessoal, a lógico-matemática e a sonora.
É importante mencionar que essas inteligências não se encontram isoladas umas das outras; elas estão presentes nas pessoas como um conjunto no qual algum ou alguns dos seus elementos são mais desenvolvidos que os outros. Segundo Bez (2011, p. 61), “as várias habilidades e competências cognitivas não se encontram desenvolvidas no mesmo nível”. Isso significa que a aquisição da linguagem, o controle corporal-cinestésico ou o raciocínio espacial podem apresentar níveis de desenvolvimento diferenciados (Bez, 2011, p. 61). Daí destaca-se a importância de criar situações que proporcionem o estímulo dessas inteligências baseando-se na interdisciplinaridade, com a finalidade de desenvolver no educando várias inteligências simultaneamente.

Para estimular as múltiplas inteligências e promover a aprendizagem de conteúdos de Geografia, é necessário que se trabalhe de forma sedutora e interessante. A todo momento, o meio à nossa volta fornece informações que são encaminhadas ao cérebro por nossos sentidos, mas, se nossa memória armazenasse todas as informações pertinentes ao nosso dia a dia, o cérebro acabaria entrando em colapso. Assim, ele possui mecanismos de defesa que funcionam como uma espécie de bloqueio de informações não interessantes que são facilmente esquecidas.

Nesse sentido, o uso de jogos pode ser uma ferramenta que auxilia a informação e sua assimilação, tendo em vista que, embora seja uma prática de lazer muito antiga e que proporciona relaxamento, diversão e prazer, quando direcionado e adaptado à finalidade educativa o jogo torna-se importante instrumento didático, tendo em vista que mobiliza todos os alunos a participar e aprender. Na Educação, o jogo não representa uma competição ou uma disputa com vencedor, mas sim uma estratégia de estímulo com o objetivo de tornar as aulas de Geografia mais interessantes e dinâmicas. Segundo Antunes (2012), o jogo visa o estímulo para aprender, socializar, promover a compreensão, análise, síntese, percepção de um novo conhecimento, transformado e assumido pela experiência do aluno. Assim, o jogo pode ser um meio de estimular a aprendizagem dos conteúdos sistematizados da ciência geográfica.

Todavia, Castellar (2011) acrescenta que o mediador precisa analisar constantemente suas intenções para que não fuja do foco, que é a aprendizagem. Essa aprendizagem deve ir além dos muros da escola, auxiliando os educandos em sua vida cotidiana na solução de problemas e gerando atitudes positivas, além de construir conhecimentos geográficos.

Jogos no ensino de Geografia

O jogo não é apenas uma prática divertida de lazer; é também uma possibilidade lúdica de auxiliar o professor de Geografia e de disciplinas afins, num contexto educacional de construção do conhecimento, podendo favorecer melhorias nas relações entre professor e aluno ou entre aluno e aluno.

Conforme Baranita (2012, p. 35), “a relação entre o jogo e a educação vem de muito longe e sempre marcou presença nas diferentes épocas e foi objeto de estudo ao longo dos tempos, o que nos permite hoje compreender melhor os aspetos históricos dos jogos”. Desse modo, os jogos como instrumento educativo já eram utilizados por algumas civilizações na Antiguidade, a exemplo da Grécia Antiga, onde Platão dizia que os jogos educativos deveriam fazer parte dos jogos de deporto, daí o filósofo dar grande valor moral e educativo. Entre egípcios, romanos e maias, os jogos eram usados para transmissão de conhecimentos e valores das gerações mais antigas para as mais novas (Baranita, 2012, p. 35).

De acordo com Antunes (2001), os jogos também podem ser de extrema importância para o ensino de Geografia e História. Por isso, os jogos operatórios propõem dinâmicas em grupos ou minigrupos e possuem valores estratégicos de ação integradora, socializadora e cooperativa. Eles visam despertar a atenção objetivando criar um ambiente favorável à produção/construção do conhecimento geográfico com base em estímulos às múltiplas inteligências.

O jogo Rapidão Geográfico tem como base o uso de questões preparadas e adaptadas pelo professor com temáticas já trabalhadas em sala de aula. Desse modo, busca favorecer a construção de conhecimentos de Geografia. Dentre os procedimentos para a utilização deste jogo podem ser destacados:

  • Dividir a turma em duas ou quatro equipes.
  • Escalar um aluno de cada equipe para tomar conta dos potes com respostas (eles devem tomar conta de potes que não sejam de sua respectiva equipe).
  • Cada equipe terá acesso às questões, pois elas estarão expostas dentro da sala de aula, em um painel no quadro branco, em cartolina ou apresentado em PowerPoint através de datashow.
  • Os alunos das equipes devem ser enfileirados para a largada.
  • A largada é o momento em que cada componente (um por vez) de cada equipe irá se deslocar rapidamente aos potes com respostas, buscando encontrar a resposta a uma determinada questão objetiva.
  • Para saber o local no qual se encontram os potes com respostas, os alunos devem ter acesso a uma imagem de satélite da escola com a localização deles, destacados por um ícone (triângulo, quadrado ou círculo) colorido.
  • A largada será dada pelo professor.
  • Vencem as equipes que terminarem de montar todo o painel com as respostas a cada questão e que responderam a elas corretamente.
  • É importante que os alunos façam alongamento antes e ao término do jogo.

O jogo trabalha a inteligência espacial, devido ao fato de que os alunos utilizarão sua experiência vivida e a paisagem interiorizada para buscar os trajetos que melhor favoreçam seu desempenho, visando com isso se deslocar por caminhos mais curtos. Na continuidade, outros trajetos desenvolvidos pelos alunos serão utilizados para a construção de mapas. Ademais, a imagem de satélite servirá para posteriores trabalhos cartográficos na escola.

O jogo Memória Geográfica tem como finalidade favorecer a construção do conhecimento com base no entendimento das inter-relações que ocorrem entre os elementos presentes no meio que atuam em conjunto, formando uma variedade de paisagens. As etapas são as seguintes:

  • Divide-se a turma em quatro equipes (com nomes para cada uma).
  • É feito um sorteio, e equipe sorteada terá direito a escolher um número apresentado no quadro de conexões geográficas; cada número esconde uma temática.
  • A temática equivale a questões que as equipes buscarão responder (em torno de três a cinco questões para cada tema).
  • Cada equipe deverá responder às questões em folhas de ofício (A4) para conferência (com relação à quantidade de acertos de cada tema).
  • Ganha a equipe que tiver mais acertos.

Esse jogo pretende estimular a inteligência ecológica ou naturalista com base na correlação de características e elementos presentes nas paisagens dos ambientes conhecidos pelos alunos, favorecendo a construção do conceito de paisagem.

O jogo Batalha Naval busca favorecer a aprendizagem acerca das coordenadas geográficas, pela utilização de linhas e colunas (que se cruzam). Os procedimentos são:

  • Dividir a turma em dois grandes grupos (trabalharão em equipe).
  • Com um sorteio, será definida a equipe que iniciará os disparos.
  • Cada equipe disparará três tiros, indicando a coordenadas do alvo com o número da linha e a letra da coluna.
  • Após cada um dos tiros, o mediador avisará se acertou e, nesse caso, qual a arma foi atingida (caso atinja uma bomba, a equipe passa a vez). Se ela for afundada, esse fato também deverá ser informado.
  • O jogador encontrará perguntas relacionadas ao conhecimento geográfico.
  • Uma arma é afundada quando todas as casas que formam a arma forem atingidas.
  • Após os três tiros e as respostas do opoente, a vez passa para o outro jogador.
  • O jogo termina quando um dos grupos afundar todas as armas do seu oponente.

O jogo possibilita o entendimento pelos alunos de que qualquer lugar da superfície terrestre pode ser localizado. A temática favorece o trabalho futuro com outras. Além de ser uma das etapas para o letramento geográfico de mapas, favorece os estudos em temáticas como fusos horários e auxilia as observações do globo terrestre e de mapas.
O jogo de xadrez constitui importante instrumento dinamizador, tendo em vista que estimula o conhecimento lógico-matemático e geográfico. Os procedimentos são os seguintes:

  • Dividir a turma em equipes de dois ou três alunos.
  • Para produzir o tabuleiro de xadrez serão necessárias réguas, tesouras sem ponta, lápis, borracha, cartolina, estilete, folhas e colas de isopor.
  • O mediador deve explicar aos alunos como produzir o tabuleiro utilizando o sistema de medidas (centímetros). O tabuleiro deve ter 24cm de lado, dividido em parcelas menores com laterais de 3cm.
  • O tabuleiro deverá ser desenhado na cartolina, recortado e colado na base de isopor.
  • Após a confecção dos tabuleiros pelos alunos, eles serão motivados à aprendizagem do jogo (regras).
  • Após o jogo, o professor fará a relação com a realidade.

O jogo favorece a construção do conhecimento, relacionando-o a coordenadas geográficas, que constituem elemento importante para os estudos do letramento cartográfico e principalmente para as relações de poder que ocorrem simbolicamente representadas ou incorporadas ao xadrez, no qual as peças brancas disputam o espaço com as peças pretas, remetendo ao estudo de território. As peças encontram-se divididas em classes sociais. Desse modo, após o jogo, o mediador poderá relacionar os jogos aos conteúdos da Geografia, às relações sociais em que os alunos estão inseridos, com base em comparações com a sociedade de classes.

Relações e análise das oficinas

A oficina com o jogo Rapidão Geográfico foi trabalhada no 7° ano C, onde estavam 31 alunos presentes. Inicialmente, alguns alunos demonstraram resistência a participar da atividade. Outros olhavam com ar de curiosidade. Mas, na aplicação, todos acabaram por contribuir ativamente para o desempenho de sua equipe.

A imagem de satélite foi usada com astúcia pelos educandos, que rapidamente conseguiram identificar os locais onde estavam localizados os potes com respostas (Figuras 2 e 3). Desse modo, pela análise de suas falas, procuraram os trajetos mais fáceis e mais próximos.

Figura 2: Alunos com imagem de satélite
Fonte:
Santos (2018).

Figura 3: Alunos junto ao painel do Rapidão Geográfico
Fonte: Santos (2018).

A agilidade e o trabalho em equipe foram fundamentais para o sucesso dos grupos. O diálogo intensificou-se no decorrer da atividade, o que caracterizou a inteligência interpessoal em ação, pois os alunos se ofereciam para ajudar o colega na resolução do que estava sendo requisitado. A paisagem simbólica e interiorizada foi usada aqui como ponto de referência para elementos de localização, o que estimula a noção de espaço pelos alunos.

Na continuidade, pedimos aos alunos que desenhassem o trajeto casa-escola (mapa mental) para posterior análise das percepções cartográficas dos estudantes. É importante ressaltar que essa atividade proporciona aos alunos fazer uso de sua experiência, pois o trabalho com o lugar tem relação íntima com a paisagem e favorece maior significação a quem a vê em processo de mudança. A “paisagem exterior possui íntima relação com a vida interior do indivíduo, causadora de determinadas emoções” (Pozo; Vidal, 2010, p. 115).
Conforme ressalta Castellar (2011, p. 25), “os mapas mentais ou desenhos são representações em que não há preocupação com a perspectiva ou qualquer convenção cartográfica”. Assim, no desenho não há regras convencionais que obedeçam às normas cartográficas, mas é uma forma de iniciação ao letramento cartográfico, pois nele podem ser analisadas as dificuldades dos alunos e podem ser auxiliados na observação do que foi desenhado e como o fez.
Para favorecer a atenção dos estudantes acerca de localização/orientação espacial, proporção/escala, simbologia, título e legenda, a criatividade deles deve ser estimulada. “O aluno pode usar a criatividade ou estabelecer critérios junto com a classe, pois as representações ocorrem da memória, revelando os valores que o indivíduo tem dos lugares, dando-lhes significados ou sentido ao espaço vivido” (Castellar, 2011, p. 25).

No desenho apresentado na Figura 4, a aluna buscou representar simbolicamente os elementos com cores variadas. Percebe-se um ônibus escolar do qual o aluno é usuário, o que significa que ele mora distante da escola. Destacam-se elementos fixos incorporados às construções e aos fluxos na forma do transporte. Contudo, a noção de proporção ainda não está muito perceptível, pois a escola encontra-se em um tamanho igual ou inferior a outros elementos representados e as residências encontram-se na horizontalidade.

Figura 4: Trajeto casa-escola de aluno do 7° ano
Fonte: Santos (2018).

A oficina com o jogo Memória Geográfica foi desenvolvida junto à turma do 6° ano C (Figuras 5A e 5B), onde estavam 31 alunos presentes. Inicialmente foi aberto um diálogo com os alunos sobre o conceito de paisagem, os elementos que a identificam, os tipos de paisagens, com relação à sua formação, à sua importância como ponto de referência para a localização espacial e fonte histórica (forma de conhecer a história local).

A

B

Figura 5: Alunos do 6° ano C
Fonte: Santos (2018).

Ao mostrar o slide com quadrículas destacadas com numeração, os alunos reagiram com certa curiosidade. As imagens utilizadas foram do bioma Caatinga e da área urbana do município. Foram feitos questionamentos relacionados à vivência deles no lugar e ao contexto no qual estão inseridos. As perguntas foram as seguintes: Que paisagem é essa? Que elementos podem ser encontrados nessa paisagem? Existem problemas ambientais? Como faço para chegar a esse local?

O jogo foi trabalhado de forma a associar um dos conceitos-chave da Geografia, a paisagem, tendo como base fotografias dos espaços naturais, rurais e urbanos vivenciados pelos alunos no dia a dia. Isso favoreceu não apenas a identificação das paisagens, mas também a sua localização, pois os alunos buscaram ressaltar como chegar à área. Conseguiram identificar territórios comerciais, como oficinas, além de corpos d’água, ruas, espécies vegetais da caatinga e a importância deles para o pequeno agricultor (a exemplo do “cardeiro”, como é chamado popularmente o mandacaru, que serve de alimento para as criações de animais em épocas de seca). Os problemas ambientais destacados pelos alunos foram associados à presença do lixo, de áreas de mau cheiro e à poluição visual.

O Batalha naval foi trabalhado com o conceito de território na turma do 7° ano B, com 19 alunos (Figuras 6 e 7). Souza (2011, p. 78) pontua que território “é o espaço definido e delimitado por e a partir das relações de poder”. A perda de poder ou o conflito se dão pelo território quando a unidade dele é comprometida. E a Geografia, segundo Lacoste (1988), serve primeiramente para fazer a guerra. Essa concepção está no fato de que, conhecendo o território inimigo, a vitória é certa, pois favorecerá o desenvolvimento de estratégias (Sun Tzu apud Souza, 2011, p. 77).

A escola foi utilizada também como referência para favorecer a reflexão de que ela é uma forma de territorialização administrativa (divisão em turmas). É importante ressaltar que os próprios alunos territorializam a todo momento: um exemplo são os espaços da sala de aula quando se formam pequenos grupos; isso está incorporado às palavras dos educandos quando dizem “esse é o meu lugar”.

Assim, o território foi observado a partir das características de posse, de influência (a respeito de quanto você pode influenciar na vida do outro). E o jogo Batalha Naval é o ápice dos conflitos entre territórios incorporados à guerra.

Figura 6: Jogando o Batalha Naval
Fonte: Santos (2018).

Figura 7: Alunos do 7° ano B
Fonte: Santos (2018).

O xadrez foi trabalhado com a turma do 6° ano A, com 25 alunos. Na etapa inicial, os alunos se empolgaram e se dispuseram a construir o tabuleiro do xadrez, preocupando-se com as medidas do quadrado maior de 24cm de lado e das parcelas menores de 3cm. Demonstraram maestria ao construir com a régua a base do jogo (Figuras 8 e 9), formatando, assim, um espaço que será disputado entre as equipes que os constroem.

Figura 8: Alunos confeccionando o tabuleiro
Fonte: Santos (2018).  

Figura 9: Alunos jogando xadrez 
Fonte: Santos (2018).

         

No jogo de xadrez, o território ganha forma de representação da realidade. Os alunos se empenharam avidamente na construção do tabuleiro com o desejo de jogar. Os estudantes conseguiram perceber que as peças possuem influências diferenciadas e, ao mesmo tempo, que o rei não é tão forte assim e que o seu poder advém daqueles que o investem. Isso favoreceu a aprendizagem sobre as relações de classes baseada numa visão marxista (explorador e explorado). As peças de cada território possuem características comuns – umas são pretas e as outras, brancas. Isso foi ressaltado como exemplo entre povos de culturas diferentes, de territórios diferentes. Assim, aquilo que é comum a todos tende a uni-los e aquilo que é diferente os separa.

A fronteira do território é o limite e constitui-se como área de constantes conflitos. Desse modo, para vencer o oponente os alunos trabalharam em equipe, favorecendo a cooperação e o raciocínio lógico-estratégico.

Considerações finais

No decorrer deste trabalho, constatou-se que a construção do conhecimento geográfico e o estímulo às múltiplas inteligências podem ocorrer de forma muito mais proveitosa com a utilização de jogos. Ademais, eles também são um importante instrumento avaliativo, pois a partir das dificuldades dos alunos podemos orientá-los e favorecer a construção do conhecimento com mais respeito às suas individualidades.

A participação dos alunos foi efetiva, pois aqueles que demonstraram resistência às atividades acabaram incluindo-se nelas, reafirmando, assim, que os jogos educativos seduzem o sujeito a participar. Ao mesmo tempo, criaram bases para que houvesse diálogos aluno-aluno e aluno-professor, devido ao fato de os estudantes, durante as oficinas, constantemente contribuírem com experiências de seu cotidiano.

Desse modo, os jogos constituem-se como instrumentos que favoreceram a construção do conhecimento dos alunos. Por exemplo: no jogo de xadrez, alguns alunos conseguiram identificar o grau de influência que uma peça tem em relação à outra com base na quantidade de casas que ela pode se deslocar.

No caso do Rapidão Geográfico, a utilização dos trajetos dentro e fora da escola associados aos mapas mentais favoreceu a identificação de que a maioria dos estudantes continua fazendo seus desenhos a partir da visão horizontal, e apenas um estudante desenha elementos em posição vertical, tendo a visão de cima. Temos a hipótese de que a imagem de satélite possibilitou essa construção do conhecimento cartográfico.

Os conceitos de paisagem – tudo aquilo que a vista alcança – e de território – definido e delimitado pelas relações de poder, trabalhados nas oficinas com os jogos Memória Geográfica e Batalha Naval, associados à realidade dos alunos, proporcionaram maior contribuição por parte dos discentes, pois favoreceu maior significação devido à maior proximidade daquilo que eles conhecem.

Por isso, colocamos à disposição da escola nossa pesquisa com o intuito de contribuir com propostas que favoreçam a melhoria da qualidade do ensino de Geografia.

Referências

ANTUNES, C. Inteligências múltiplas e seus jogos: Introdução, vol. 1. 3ª ed. Petrópolis: Vozes, 2012.

______. A sala de aula de Geografia e História: inteligências múltiplas, aprendizagem significativa e competências no dia a dia. Campinas: Papirus, 2001.  (Coleção Papirus Educação).
_______. Geografia e Didática. Superv. Simone Selbach. Petrópolis: Vozes, 2010. (Coleção Como Bem Ensinar).

______. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligência cinestésico-corporal, vol. 2. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 2009.

______. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligência lógico-matemática, vol. 6. 3ª ed. Petrópolis: Vozes, 2011.

______. Inteligências múltiplas e seus jogos: inteligência sonora, vol. 8. Petrópolis: Vozes, 2006.

BARANITA, I. A importância do Jogo no desenvolvimento da Criança. 2012. Disponível em: http://recil.grupolusofona.pt/bitstream/handle/10437/3254/Dissertacao.pdf?sequence=1. Acesso em: 12 jun. 2017.

BEZ, L. Sobre a inteligência espacial e o ensino de Geografia:notas para discussão. Revista de Geografia, v. 28, nº 3, 2011. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistageografia/index.php/revista/article/viewArticle/437. Acesso em: 03 maio 2018.

CARVALHO, M. I. da S. de S. Fim de século: a escola e a geografia. 3ª ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2007.

CASTELLAR, Sônia. Jogos, brincadeiras e resolução de problemas. In: CASTELLAR, Sônia; VILHENA, Jerusa. Ensino de geografia. São Paulo: Cengage Learning, 2011. p. 43-63. (Coleção ideias em ação).

______. A linguagem e a representação cartográfica. In: CASTELLAR, Sônia; VILHENA, Jerusa. Ensino de geografia. São Paulo: Cengage Learning, 2011. p. 23-42. (Coleção Ideias em Ação).

CAVALCANTI, Lana de Souza. O ensino de Geografia na escola. Campinas: Papirus, 2012.

GORI, R. M. de A. Observação Participante e Pesquisa-Ação: aplicações na pesquisa e no contexto educacional. Revista Eletrônica de Educação do Curso de Pedagogia do Campus Avançado de Jataí da Universidade Federal de Goiás, v. 1, nº 2, jan./jul. 2006.

HAYDAT, R. C. C. Curso de Didática Geral. 8ª ed. São Paulo: Ática, 2006.

LACOSTE, Y. A Geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. Campinas: Papirus, 1988. p. 21-30.

LIRA, S. M. de. O ensino de Geografia, a construção do conhecimento geográfico e a operacionalização da prática docente. Campina Grande: 2013. (mimeo).

LÜDKE, Menga. Métodos de coleta de dados: observação, entrevista e análise documental. In: LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. (Orgs.) Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. p. 25-44.

NEVES, J. L. Pesquisa qualitativa – características, usos e possibilidades. Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 1, n° 3, 2° sem. 1996.

PAVIANI, N. M. S.; FONTANA, N. M. Oficinas pedagógicas: relato de uma experiência. Conjectura, Caxias do Sul, v. 14, nº 2, p. 77-88, maio/ago. 2009. Disponível em: http:www.ucs.br/etc/revista/index.php/conjectura/article/viewFile. Acesso em: 03  maio 2018.

POZZO, R. R.; VIDAL, L. M. O conceito geográfico de paisagem e as representações sobre a Ilha de Santa Catarina feitas por viajantes do século XVIII e XIX. Revista Discente Expressões Geográficas, Florianópolis, n° 6, ano VI, p. 111-131, jun. 2010. Disponível em: www.geograficas.cfh.ufsc.br. Acesso em: 02 jul. 2017.

ROSA, S. S. da. Construtivismo e Mudança. 10ª ed. São Paulo, Cortez, 2007. (Coleção Questões da Nossa Época, v. 29).

SANTOS, F. M. J. Ensino de Geografia nas séries do fundamental na Escola Marechal Almeida Barreto, em Juazeirinho - PB [manuscrito]: desafios, perspectivas e a aplicabilidade da Geografia. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Geografia), Centro de Educação, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2012.

SOUZA, J. L. de. O território: sobre espaço e poder, autonomia e desenvolvimento. In: CASTRO, Iná Elias de; GOMES, Paulo Cesar da Costa; CORRÊA, Roberto Lobato (Orgs.). Geografia: conceitos e temas. 14ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011. p. 77-116.

SMOLE, K. C. S. Múltiplas inteligências na prática escolar. Brasília: MEC/SEED, 1999. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me002751.pdf. Acesso em: 03 maio 2018.

TRAVASSOS, C. P. Inteligências múltiplas. Revista de Biologia e Ciências da Terra, v. 1, nº 2, 2001. Disponível em: http://eduep.uepb.edu.br/rbct/sumarios/pdf/inteligencias_multiplas.pdf. Acesso em: 03 nov. 2017.

Publicado em 12 de maio de 2020

Como citar este artigo (ABNT)

SANTOS, Adriano Pequeno; MEDEIROS, Monalisa Cristina Silva. Múltiplas inteligências a partir de jogos no ensino de Geografia. Revista Educação Pública, v. 20, nº 17, 12 de maio de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/17/multiplas-inteligencias-a-partir-de-jogos-no-ensino-de-geografia

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.