A Numismática na Educação: utilização de moedas como documento histórico na sala de aula

Nicole Loureiro da Silva

Licencianda em História (UNIRIO/Cederj/Cecierj, polo Resende)

A Numismática é um campo pouco desenvolvido na sala de aula, embora todos nós tenhamos contato diário com o dinheiro. Esse fato se deve aos poucos estudos e estudiosos do assunto, que em sua maioria preferem trabalhar com fontes escritas encontradas em arquivos e bibliotecas. No entanto, “as moedas podem fornecer dados históricos importantes, como documentos cujas informações são apresentadas, em sua maior parte, na forma de imagens” (Carlan, 2012, p. 29 apud Albarral, 2017, p. 4).

A Numismática é o estudo científico de moedas, medalhas e cédulas; ela se desenvolveu no Brasil, de acordo com a Sociedade Numismática Brasileira (SNB), a partir do século XIX, com a contribuição de Dom Pedro II, grande entusiasta das artes.

Na pesquisa histórica, as moedas assumem aspecto não somente econômico, mas também social e cultural; como fonte primária, devem ser analisadas pelo historiador como representação do real, simbolismo de algo que vai muito além do valor econômico.

As fontes na pesquisa histórica

A Nova História, a partir da École des Annales, alterou o modo da escrita da História, deixando de lado uma escrita factual, atrelada a datas, relatos e legitimações da memória oficial de um Estado, e passando a dialogar com as Ciências Sociais, problematizando os fatos e criando uma articulação com a história dos homens.

A École dos Annales trouxe à tona a discussão sobre a interrogação que os historiadores possuem, porém acentuou que as interrogações têm de se pautar em nortes corretos, em orientações prévias; não se faz pesquisa a partir do nada, há de se ter ao menos um ponto de partida (Ferreira; Santos, 2013, p. 4).

Desse modo, iniciou-se uma busca por fontes primárias com a utilização da metodologia de pesquisa denominada História-problema, em que o ato de interrogar o documento torna-se importante pois, como demonstra Bloch, o documento não fala por si só. É dever do historiador questionar o que a fonte “mostra”, dentro do recorte espacial-temporal que lhe interessa. O estudo das sociedades que foi desenvolvido pelos Annales tem como objetivo compreender, e não julgar.

O pensamento dos Annales nos ensinou a compreender, problematizar, contextualizar, etc., não apenas estudando os fatos isolados, mas também os entendendo, iniciando primeiramente com a História das Mentalidades, abrindo as possibilidades de análises, de fontes, de escrita, dando certa liberdade ao historiador para não se ater apenas aos documentos oficiais e seguir etapas metódicas para a construção da História (Ferreira; Santos, 2013, p. 7).

Desse modo, a moeda como documento histórico deve ser questionada e analisada dentro do contexto histórico que lhe diz respeito para que se possa alcançar a compreensão desejada, evitando estereótipos e preconceitos que não enriquecem a pesquisa histórica.

A moeda como documento histórico

No Brasil, as fontes orais, textuais e visuais são muito utilizadas nas pesquisas históricas. Porém, as moedas e cédulas têm demonstrado serem potenciais fontes, tanto para a pesquisa como para a sala de aula. A Numismática

ligou-se tradicionalmente ao estudo da História, sobretudo à História Política, ajudando a estabelecer a cronologia de reinados e a datar fatos importantes da política; à Economia, informando sobre o valor das moedas dentro dos diferentes sistemas monetários, sobre desvalorizações e períodos de crise, sobre os comportamentos em relação à moeda, permitindo examinar, no passado, a aplicação das leis econômicas; à Arqueologia, contribuindo para auxiliar a datação de estratos e sítios arqueológicos; e à História da Arte, permitindo, através de seus tipos, uma análise da evolução dos estilos e o reconhecimento de obras desaparecidas ou conhecidas somente por meio de textos literários (Vieira, 1995, p. 94 apud Carlan, 2010, p. 24).

A moeda na prática docente

Por muitos anos, o professor se viu diante de grandes dificuldades relativas à prática docente, como cansaço, desinteresse da turma e certo desânimo frente à atual situação da Educação brasileira, que é incapaz de alcançar as expectativas traçadas pelo planejamento pedagógico. As aulas, em sua maioria, são positivistas, sem conseguir criar um diálogo professor-aluno satisfatório que favoreça o processo de ensino-aprendizagem. Frente a esse dilema, é necessário repensar a prática pedagógica, alinhando essas novidades sem fugir do que o currículo propõe.

Desse modo, a preparação das aulas e a escolha das fontes devem estar alinhadas ao currículo, à realidade escolar e ao que o professor quer atingir no âmbito educacional; no caso do professor de História, como ele quer desenvolver o pensamento crítico sobre as fontes com os alunos. Como afirma Edlene Silva (2010, p. 173), “as fontes expressam valores políticos, sociais, culturais e religiosos que devem ser lidos de forma crítica e não como verdades naturais e inquestionáveis”.

Analisando cédulas

Pensando na prática docente, analisamos algumas cédulas selecionadas que podem ter relação com o conteúdo de História previsto pelo Currículo Mínimo do Estado do Rio de Janeiro. As três cédulas apresentadas foram emitidas e lançadas entre 1970 e 1990.

Figura 1: D. Pedro I - Cr$ 5,00 (1970)
Fonte: Acervo pessoal.

Figura 2: D. Pedro I (verso) - Cr$ 5,00 (1970)
Fonte: Acervo pessoal.

Figura 3: Marechal Rondon - Cr$ 1.000,00 (1990)
Fonte: Acervo pessoal.

Figura 4: Marechal Rondon (verso) - Cr$ 1.000,00 (1990)
Fonte: Acervo pessoal.

É importante destacar que todas têm a presença de símbolos nacionais, como D. Pedro I, a Praça 15 de Novembro no Rio de Janeiro, o busto de Cândido Rondon e os indígenas da Amazônia, a figura dos quatro principais expoentes do ideal republicano no Brasil em comemoração ao primeiro centenário da República e a representação de um quadro em óleo de Pedro Bruno, Pátria.

Figura 5: Efígie da República - Cr$ 200,00 (1990)
Fonte: Acervo pessoal.

Figura 6: Efígie da República (verso) - Cr$ 200,00 (1990)
Fonte: Acervo pessoal.

A presença dessas representações nacionais nas cédulas correntes naquele período que o Brasil vivia, correspondente à ditadura e à redemocratização do Brasil, traz diálogos interessantes com a História e a sociedade, pois “essa interação para a construção do real, a partir das conclusões do próprio aluno, faz do aluno um participante da história. Pensar nos signos é refletir sobre como estamos imersos em uma sociedade simbólica, onde os fatos possuem uma necessidade de ressignificação” (Albarral, 2012, p. 12).

Conclusão

Repensar a prática pedagógica diante de tantas dificuldades sociais, estruturais e culturais tem se tornado cada vez mais urgente. O uso de diferentes fontes pode ser interessante no que diz respeito ao alargamento do contato do aluno com a pesquisa histórica. Cabe ao professor mediar essa interação e fazer com que o aluno se sinta parte da sociedade em que está inserido.

O incentivo à pesquisa deve levar o aluno a conseguir identificar as relações de poder por trás de símbolos como moedas e cédulas. Apesar de a Numismática não ser um estudo amplamente difundido no meio acadêmico, ela consegue analisar e dar suporte aos estudos da sociedade e da cultura, indo além daquele meramente econômico.

Referências

ALBARRAL. E. V. A Numismática e a utilização da moeda em sala de aula. In: CARLAN, C. U. (Org.). As moedas e o conhecimento histórico. Santos: Artefato Cultural, 2017.

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Cédulas produzidas. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/cedulasemoedas/cedulasemitidas. Acesso em: 14 out. 2019.

CARLAN, Claudio Umpierre. Arqueologia e Numismática: a História antiga e a cultura material. Agenda Social, v. 4 , nº 1, p. 22-36, jan./abr. 2010.

FERREIRA, Geisa Carla Gonçalves; SANTOS, Vanessa Sátiro dos. Historiografia nos Annales: desafio em lidar com as fontes para a produção da pesquisa histórica. V FÓRUM INTERNACIONAL DE PEDAGOGIA. Anais Fiped, v. 1, 2013. Disponível em: http://www.editorarealize.com.br/revistas/fiped/resumo.php?idtrabalho=194. Acesso em: 14 out. 2019.

SILVA, Edlene Oliveira. Relações entre imagens e textos no ensino de História. Sæculum – Revista de História, João Pessoa, v. 22, p.173-188, jan./ jun. 2010.

SOCIEDADE NUMISMÁTICA BRASILEIRA. O que é numismática. Disponível em: http://www.snb.org.br/portal/oqueenumismatica.htm. Acesso em: 11 out. 2019.

Agradeço às orientações da professora mestra Isabella Pinheiro para realizar este trabalho.

Publicado em 09 de junho de 2020

Como citar este artigo (ABNT)

SILVA, Nicole Loureiro da. A Numismática na Educação: utilização de moedas como documento histórico na sala de aula. Revista Educação Pública, v. 20, nº 21, 9 de junho de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/21/a-numismatica-na-educacao-utilizacao-de-moedas-como-documento-historico-na-sala-de-aula

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