Resenha do artigo "Educação, cultura e diversidade"
Aldimária Francisca P. de Oliveira
Doutoranda em Ciências da Educação
Francisco de Assis de Souza Júnior
Doutorando em Ciências da Educação
Maria da Conceição Tavares da Silva
Doutoranda em Ciências da Educação
Máximo Luiz Veríssimo de Melo
Licenciado em História, especialista em História do Brasil República, mestre e doutorando em Ciências da Educação
Paulo Roberto Frutuoso de Oliveira
Doutorando em ciências da educação
No artigo resenhado, a autora trata da educação que é praticada nas sociedades indígenas e do modelo de educação ocidental que é introduzido nas sociedades indígenas. A autora divide o artigo em apenas duas partes; na primeira, ela trata especificamente do modelo de educação das sociedades indígenas, procurando trazer detalhes de como funciona a educação praticada nessas sociedades; na segunda, ela trata da imposição de modelos ocidentais de educação em sociedades indígenas. Aqui a autora procura explicar o porquê dessa imposição, qual é a sua intenção e por que as sociedades indígenas aceitam essa imposição e até cobram a implantação de escolas do modelo ocidental de educação.
Na primeira parte, é mostrado que nas sociedades indígenas a educação acontece como forma de tornar o jovem indígena um membro autêntico de sua tribo. Por esse ponto de vista, percebe-se que a educação indígena não difere tanto da educação ocidental, das ditas sociedades civilizadas, nas quais se encaixa a nossa sociedade (“nossa sociedade” aqui se refere à brasileira), visto que a educação ocidental também visa a formação do jovem para ser um bom cidadão, também integrado e ativo em meio à sua sociedade.
A diferença entre a educação indígena e a ocidental vai estar presente basicamente no fato de que entre as sociedades indígenas o jovem membro tem que aprender somente a ser alguém integrado e que faça parte da comunidade, aprendendo todas as tarefas ou ofícios inerentes à comunidade. Ou seja, cabe ao membro da comunidade apenas aprender esses ofícios. Nas sociedades ocidentais, o jovem membro da comunidade tem que ter domínio de vasto conhecimento de mundo, de muitos conceitos e habilidades, de coisas e situações que envolvem o mundo e sua dinâmica, coisas que, para as sociedades indígenas, não apresentam tanto valor e importância. Para as sociedades indígenas, o mais importante é o jovem membro aprender os ofícios práticos que sirvam para o cotidiano da tribo, como aprender a caçar, pescar, usar arco e flecha etc.
Sendo assim, a educação indígena se dá na prática diária, nos afazeres da comunidade, onde a criança ou o jovem membro da tribo ou comunidade se encontra junto com o adulto, procurando realizar tudo que esse adulto está realizando ou fazendo. A autora cita que, outra autora, Alcida Ramos (1986, p. 58), afirma que “não há lugar onde uma criança indígena não possa ser admitida nem há recintos ou assuntos impróprios para menores”. Isso mostra e reforça o fato de que a educação das tribos indígenas ocorre sempre no sentido de ensinar, ou fazer o jovem ou a criança da tribo aprender as tarefas ou ofícios referentes ao cotidiano do grupo e assim permitir que cada um tenha sua função dentro da comunidade.
Nas sociedades ocidentais, não é bem assim que ocorre o processo de educação, começando pelo fato de que nelas a criança não é bem aceita em todos os lugares, muito menos pode ouvir ou participar de qualquer tipo de assunto. Com relação ao trabalho, à criança ou ao jovem não é permitido trabalhar, pois se acredita que isso atrapalha não somente os estudos, mas também o processo de crescimento físico da criança e a fase natural da criança, que nesse período ou fase da vida tem que viver com brincadeiras etc., ou seja, fazer coisas que sejam típicas de uma criança ou jovem. Esse modo de pensar, aqui no Brasil, está assegurado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que inclusive prevê punições para quem desrespeitar tais regras, como colocar uma criança para trabalhar.
Segundo Leitão (2002), ainda citando Alcida Ramos, pontua que nas sociedades indígenas os jovens ou crianças usam miniaturas dos objetos de que os adultos fazem uso. Ou seja, se um adulto sai para caçar e leva um arco e flecha, uma criança sai com sua miniatura de arco e flecha. Da mesma maneira, as crianças têm liberdade para fazer ou realizar qualquer coisa que um adulto faz, até mesmo acender uma fogueira, como diz a autora, sem “incorrer em acidentes”. Ou seja, nas tribos indígenas a criança aprende praticando, realizando. Em outras palavras: a criança é tratada como uma espécie de adulto em miniatura, como bem fala a autora, citando Alcida Ramos (1986, p. 59).
Essa visão mostrada pela autora, citando Alcida Ramos (1986), sobre como a criança tem a liberdade de desempenhar muitas tarefas, até mesmo tarefas consideradas perigosas, entre as sociedades ocidentais não é algo aceito ou praticado. Como já falado, no Brasil isso é até passível de punição ou sanção, de acordo com o ECA (2010).
Com relação ao respeito ou às regras sociais, a autora afirma que Alcida Ramos diz que os mais velhos da tribo ou da comunidade sempre mostram ter muita paciência e tolerância para com os mais jovens. Isso é comprovado pelo professor Hamilton Werneck em palestra realizada no dia 8 de novembro de 2019 em São Bento/PB, quando falou que, numa visita a certo estado brasileiro, pôde observar o cacique de uma tribo indígena, ao ser perguntado por uma criança da tribo sobre algo, se abaixar para responder à criança, a fim de ficar da altura da criança.
Werneck, curioso, perguntou ao cacique por que ele se abaixou para responder à pergunta que a criança fez; o cacique respondeu que era para poder ensinar aquela criança a ter respeito pelas pessoas, pois, se ele não agisse daquela maneira, a criança não ia aprender a ter respeito pelos outros e não ia poder ser um bom cacique no futuro. Isso mostra que a criança aprende a respeitar os demais membros da tribo porque desde cedo ela também é respeitada.
Isso quer dizer que, nas tribos indígenas, realmente as crianças aprendem na prática, nos exemplos que veem no cotidiano da tribo, nas pequenas ações dos mais velhos para com elas, e assim também tendem a colocar isso em prática. Assim, é possível falar que, nas tribos indígenas, praticamente todos os membros têm algo a ensinar aos mais jovens, que cada membro é um professor para os mais jovens, que cada membro tem e sabe ensinar algo que é inerente à sua tribo.
Isso prova que os mais velhos, nas tribos indígenas, permitem que os mais novos aprendam com os exemplos que dão. E esse aprendizado se dá em toda e qualquer área, instância, situação ou realidade da vida daquela tribo, também permitindo que a criança pratique, mesmo em sua escala ou com objetos menores. Isso é reforçado em Lacan (1998), ao falar que a criança aprende com os mais velhos, aprende vendo o que os mais velhos fazem. Ou seja, os mais velhos são espelhos para os mais jovens.
No entanto, para as sociedades ocidentais, permitir que uma criança faça ou copie não chega a ser algo tão positivo. Aqui não se está negando a Teoria do Espelho de Lacan (1998), querendo dizer que ela não é válida. Pelo contrário, se está afirmando sua validade, dizendo que ela realmente é verdadeira e que é isso que acontece nas tribos indígenas: as crianças aprendem com os exemplos dados pelos mais velhos. Aqui se está falando que, nas sociedades ocidentais, nem sempre os mais velhos têm bons exemplos a dar aos mais jovens. Assim, podemos dizer que nas sociedades ocidentais nem sempre os mais velhos podem ser bons professores. A educação indígena ocorre por meio do exemplo, é repassada de geração a geração de modo oral e costuma ser ensinado apenas aquilo que é relevante para a existência da tribo.
Na segunda parte, a autora trata da imposição de modelos ocidentais de educação em sociedades indígenas e afirma que a formação do indivíduo envolve uma série de fatores, começando pelo espaço, local específico para ela acontecer: os prédios escolares, com pessoas especializadas para isso: os professores, chamados de “profissionais da educação”.
A autora afirma que as sociedades ocidentais – no caso, a realidade brasileira – impõem o seu modelo de educação às sociedades indígenas no desejo de dominação, de controle dessas sociedades e, consequentemente, de suas riquezas. No entanto, a autora diz que nem sempre essa imposição do modelo ocidental de educação tem sido colocado em prática da forma que é pretendida, pois sempre nas escolas que são introduzidas nas tribos indígenas são implantados dois idiomas: o nosso e o indígena.
A autora pontua também que as sociedades indígenas aceitam e até cobram essa imposição do modelo ocidental de educação como forma de ter meios ou mais possibilidades de agir e lutar para conseguir manter sua tradição, pois, sabendo a cultura e principalmente o idioma do civilizado, essas nações indígenas podem negociar e até se render. Para a autora, ter conhecimento da cultura ocidental é para as sociedades indígenas uma arma de resistência à dominação do civilizado.
O artigo, mesmo tendo sido escrito dezessete anos atrás, permanece bem atual – talvez até mais atual do que quando foi escrito, pois o que ainda se vê é o desrespeito às sociedades indígenas; suas terras continuam sendo tomadas, índios continuam sendo mortos ou expulsos de suas terras etc. Por essa razão, por ser ainda atual, é que se resolveu fazer essa resenha e sugerir a leitura do texto como forma de entender e compreender um pouco essa relação entre o homem dito civilizado, que procura dominar o índio, e este, que tentar resistir a essa dominação.
Referência
LEITÃO, Rosani Moreira. Educação, cultura e diversidade. In: VIANA, Nilda; VIEIRA, Renato Gomes (Orgs.). Educação, Cultura e Sociedade: abordagens críticas da escola. São Paulo: Germinal, 2002.
Publicado em 23 de junho de 2020
Como citar este artigo (ABNT)
OLIVEIRA, Aldimária Francisca P. de; SOUZA JÚNIOR, Francisco de Assis de; SILVA, Maria da Conceição Tavares da; MELO, Máximo Luiz Veríssimo de; OLIVEIRA, Paulo Roberto Frutuoso de. Resenha do artigo "Educação, cultura e diversidade". Revista Educação Pública, v. 20, nº 23, 23 de junho de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/23/resenha-do-artigo-educacao-cultura-e-diversidade
Novidades por e-mail
Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing
Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário
Deixe seu comentárioEste artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.