As condições de pobreza e a evasão escolar no Ensino Médio: estudos de casos do município de Pains/MG

Breno Júnior Porfírio

Pós-graduando em Docência na Educação Básica (IFMG - Câmpus Arcos)

Deyse Almeida dos Reis

Doutora em Engenharia Ambiental, docente no curso de pós-graduação em Docência na Educação Básica (IFMG – Câmpus Arcos)

As condições de pobreza e de extrema pobreza provocam e/ou acentuam vulnerabilidades e riscos sociais, tais como desemprego, violência, desnutrição, dificuldade de acesso aos serviços públicos, entre outros (Brasil, 2005). Frente a isso, a partir de reajuste de valores definidos pela União (Decreto nº 8.232, de 30 de abril de 2014), com o Programa Bolsa Família, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) passa a considerar como critério para classificar a extrema pobreza famílias e indivíduos que possuam renda per capita mensal de R$ 77,01. De maneira análoga, considera como critério para classificar a pobreza famílias e indivíduos que possuam renda per capita mensal igual ou inferior a cento a R$ 154,00 (Brasil, 2014).

De acordo com o Censo Demográfico realizado em 2010 pelo IBGE, cerca de 16,2 milhões de brasileiros se encontram nas condições de pobreza e extrema pobreza. Diante desse fato, o Governo Federal, através do MDS, instituiu estratégias para a erradicação dessa problemática.

Como desdobramento dessas iniciativas, em 2005, o Governo Federal lançou o Plano Brasil sem Miséria, cuja finalidade principal foi superar a extrema pobreza no país. Para tanto, o MDS, órgão coordenador do plano, articulou ações conjuntas com os demais ministérios, a fim de efetivar os três eixos do programa: inclusão produtiva; acesso aos serviços públicos; e garantia de renda para alívio imediato para a situação de pobreza (Brasil, 2005).

Nessa perspectiva, o Programa Bolsa Família e os equipamentos sociais do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), a partir da proteção social, são importantes instrumentos para garantir à população que vive em extrema pobreza a superação dessa condição, pelo acesso aos benefícios sociais e serviços públicos. Para tanto, a definição da proteção social é:

Conjunto de ações, cuidados, atenções, benefícios, e auxílios ofertados pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS) para redução e prevenção do impacto das vicissitudes sociais e naturais ao ciclo de vida, à dignidade humana e à família como núcleo básico de sustentação afetiva, biológica e relacional (Brasil, 2005, p. 90).

Por um lado, há fortalecimento dos serviços e políticas assistenciais que visam à inserção social e à garantia de proteção social ao indivíduo e à família em situação de vulnerabilidade social em decorrência das condições de pobreza e extrema pobreza. Por outro lado, fica evidente a problemática da evasão escolar, que é crescente, principalmente nos anos finais do Ensino Médio, podendo contribuir para o agravamento das condições de pobreza e desigualdade social.

Queiroz (2008) aponta que a evasão escolar se apresenta com maior frequência nos anos finais do processo de escolarização (Ensino Médio) e se evidencia em jovens estudantes em situação de vulnerabilidade social. Diante disto, o presente artigo parte de um estudo realizado pelo autor no ano 2016, a partir de experiência de trabalho como psicólogo da Política de Assistência Social do Município de Pains/MG. O trabalho objetiva identificar as condições dos adolescentes em situação de pobreza atendidos pela Política Municipal de Assistência Social de um município de pequeno porte do centro-oeste mineiro e como essas condições influenciam no problema da evasão escolar no Ensino Médio.

Com o intuito de melhor esclarecer a questão, a presente investigação foi organizada em três seções. A primeira parte consiste em apresentar o conceito de pobreza e extrema pobreza. Apresenta também a Política de Assistência Social como uma das alternativas de enfrentamento dessa problemática e suas principais variáveis em âmbito nacional. A segunda parte discute a evasão escolar no Brasil e seus atravessamentos, por meio de uma pesquisa bibliográfica. A terceira parte sistematiza e analisa os dados relativos às condições da pobreza e extrema pobreza relacionados aos dados de evasão escolar no Ensino Médio no município citado. Nas considerações finais, são apresentadas as formas de enfrentamento da evasão escolar utilizadas pelas políticas públicas locais e nacionais, além de propor possíveis estratégias e alternativas para mudança da realidade apresentada com o estudo.

A pobreza e a extrema pobreza: a Política de Assistência Social como uma das alternativas de enfrentamento dessa problemática

As condições de pobreza e extrema pobreza de parte do povo brasileiro acarretam a vulnerabilidade e risco social. Essas condições, associadas à baixa renda, apresentam vários fatores relacionados à exclusão social e à perda de diretos, como o não acesso aos direitos básicos de saúde, moradia, educação, alimentação, inserção no mercado de trabalho, dentre outros (Brasil, 2011).

Com a Constituição Federal de 1988, os movimentos sociais e a promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) em 1993, inicia-se um novo modelo de política pública para se pensar a Assistência Social no Brasil.

De acordo com as diretrizes da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), de 2012, não há um significado único para o termo vulnerabilidade, tendo em vista que é um conceito complexo. A PNAS não traz explícito o conceito de vulnerabilidade social, mas enfatiza que as situações de vulnerabilidade podem decorrer de várias situações: pobreza, privação, ausência de renda, precário ou nulo o acesso aos serviços públicos e fragilização de vínculos afetivos, entre outros.

No ano de 2004, a Política Nacional de Assistência Social (PNAS) foi instaurada efetivamente como política de garantia de direitos do cidadão e dever do Estado. Posteriormente, em 2005, com a IV Conferência Nacional de Assistência Social, surgiu o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), e este passou então a ser um modelo único de gestão e execução da política nacional de assistência social no país, garantindo a Proteção Social Básica e Especial de forma indispensável.

A Política Nacional de Assistência Social, SUAS: Proteção Social Básica e Especial

De acordo com Cruz (2009), o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), define dois níveis de proteção social: a Proteção Social Básica, que tem como principal objetivo prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e do fortalecimento de vínculos familiares e comunitários em caso de violação de direitos sociais; e a Proteção Social Especial, que tem como objetivo intervir nos casos de rompimento total de vínculos familiares e em situação de média e alta complexidade, ficando os serviços restritos aos centros especializados.

O Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) é o equipamento que rege a Proteção Social Básica, no qual oferta-se o serviço do Programa de Atenção Integral à Família (PAIF) e o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV).

O Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) é responsável por oferecera Proteção Social Especial, que propõe a intervenção em situações em que o direito já foi violado e os vínculos familiares, rompidos. Esse serviço especializado visa reconstruir as situações de violação de direito, oferecendo ainda o Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI) e o Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medidas Socioeducativas de Liberdade Assistida e de Prestação de Serviço à Comunidade, além do Serviço Especializado em Situação de Rua. Estes constituem os serviços de Proteção Social Especial de média complexidade. O serviço de alta complexidade é o Serviço de Acolhimento Institucional.

Assim, após apresentada a organização do serviço de Proteção Social Básica e Especial, com base na tipificação dos serviços socioassistenciais, sendo este o documento que organiza e categoriza os serviços da proteção social ofertados através do SUAS, pode-se verificar que a rede de serviços da Política de Assistência Social é provida por dois equipamentos da proteção social: o CRAS e o CREAS, constituindo elementos base para a garantia dos direitos socioassistenciais e o convívio familiar e comunitário, a fim de promover a autonomia da família e/ou indivíduos e resgatá-los do risco social e de exclusão.

É à Proteção Social Básica que estão vinculados os benefícios e serviços voltados para a erradicação e a prevenção da vulnerabilidade social e da pobreza. Diante disso, o presente trabalho irá se ater a apresentar de forma mais detalhada essa especificidade da proteção.

A problemática da evasão escolar no Brasil e seus atravessamentos

O conceito de educação pode ser definido como o ato ou efeito de se desenvolver e construir processos de aprendizagem. A partir de interação com o contexto social, a educação pode acontecer em diversificados contextos, como família, escola, igreja e/ou comunidade, e acontece de forma livre e espontânea com todos os seres humanos em suas relações com o outro ou com grupos sociais (Brandão, 1995).  

Entende-se então, que a educação acontece sempre quando há relações entre pessoas e intenções de ensinar e aprender. De tal forma, educar se torna um processo de levar o indivíduo de volta a ele mesmo, incentivando a construção de novos saberes e o desenvolvimento humano em todos os seus aspectos, ou seja, educar tem o poder de potencializar o ser humano através do conhecimento (Brandão, 1995).

Meksenas (2002) ressalta que Durkheim percebeu que a convivência na sociedade é impossível sem a educação, pois ela é um elemento adaptador e normalizador básico na integração indivíduo-sociedade. Isso fica muito claro quando Durkheim afirma que:

Em cada um de nós existem dois seres. Um constituído de todos os estados mentais que não se relacionam senão conosco mesmos e com os acontecimentos de nossa vida pessoal; é o que poderia chamar de Ser Individual. O outro é um sistema de ideias... Que exprimem os grupos diferentes de que fazemos parte... Seu conjunto forma o ser social. Constituir esse ser social em cada um de nós – tal é o fim da educação (Durkheim, 1978 apud Meksenas, 2002, p. 40).

Brandão (1995) aponta que a educação como prática social no decorrer do tempo vai além das fronteiras do saber comum de todas as pessoas, e consequentemente faz emergir tipos e graus de saberes que correspondem desigualmente a diferentes categorias de sujeitos; também declara que

a educação é uma prática social cujo fim é o desenvolvimento do que na pessoa humana pode ser aprendido entre os tipos de saber existentes em uma cultura, para a formação de tipos de sujeitos, de acordo com as necessidades e exigências de sua sociedade, em um momento da história de seu próprio desenvolvimento (Brandão, 1995, p. 73).

Nessa prerrogativa, a educação é um processo pelo qual uma pessoa ou grupo de pessoas adquirem conhecimentos gerais, científicos, técnicos ou especializados com o objetivo de desenvolver sua capacidade ou suas aptidões. É importante salientar que a educação visa o pleno desenvolvimento da pessoa e a qualifica para o trabalho; a Constituição de 1988, Art. 205, diz que

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (Brasil, 1988 p. 15).

O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu Art. 53, preconiza a educação na mesma lógica da Constituição Federal:

A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; direito de ser respeitado por seus educadores; direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores; direito de organização e participação em entidades estudantis; acesso á escola pública e gratuita próxima de sua residência (Brasil, 2008, p. 19, grifo nosso).

Um dos problemas atuais da educação é a evasão escolar. Como aponta Meksenas (2002), a evasão nos últimos anos vem sendo estudada e pesquisada de forma mais intrínseca; sendo assim, nos últimos cinquenta anos, as estatísticas educacionais oficiais nos países da América Latina mostram um quadro em que a evasão escolar parece ser o principal entrave ao aumento da escolaridade e da competência cognitiva de sua população jovem.

Meksenas (2002) esclarece que dados oficiais contêm erros importantes, que têm conduzido os pesquisadores e as autoridades educacionais a análises e políticas que simplesmente não levam em conta o principal problema de fluxo de alunos nos sistemas educacionais, que é a repetência escolar. Assim, esclarece:

Foi a partir de 1985 que aqui no Brasil se começou a propor uma metodologia alternativa para determinar indicadores educacionais utilizando dados censitários ou de grandes surveys, como as PNADs do IBGE (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), que são realizadas anualmente (Meksenas, 2002, p. 13).

Na contemporaneidade, o Brasil enfrenta uma grave situação em relação à educação, principalmente nas classes mais pobres, em que, mesmo com várias leis e projetos, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e Base da Educação (LDB), o problema da evasão escolar atinge grande número de crianças e adolescentes.

A evasão escolar acontece quando o aluno deixa a escola por qualquer motivo e não mais retorna. Dados sobre o assunto são difíceis de conseguir, pois existe uma dificuldade muito grande para acompanhar o destino de cada aluno. Patto (1999) menciona a complexidade do fracasso escolar, discorrendo sobre as dificuldades de conseguir dados específicos, bem como as dimensões políticas, históricas, socioeconômicas, ideológicas, pedagógicas e institucionais como fatores que fundamentam processos e dinâmicas em que se efetivam as práticas do cotidiano escolar.

Contudo, as análises antropológicas até hoje realizadas mostram claramente na cultura do sistema de ensino a existência do fracasso escolar, ora atribuída aos próprios alunos, ora a seus pais, ora ao sistema sociopolítico, raramente aos professores, sua formação ou à organização escolar. Extrai-se assim, do censo educacional 2004, que

é sintomático perceber que o esforço das famílias brasileiras em manter seus filhos na escola não se traduz numa escolarização mais competente. Tudo leva a crer que nunca houve uma real função educadora de forma autossuficiente da escola. Hoje, a escola é um restaurante, um ambulatório médico, uma creche ou um depósito de crianças. Raramente encontramos uma escola que pretenda que seu processo de ensino-aprendizagem formal se esgote intramuros independente da situação da criança (Brasil, 2004, p. 6).

Diante disso, pode-se inferir que as escolas na maioria das vezes não assumem o seu papel de contribuinte no processo de formação do aluno; ela acaba assumindo papéis que são de outros atores sociais. Patto (1999) afirma que não existe partilha complementar entre escola, família, políticas públicas e sociedade no processo de formação e educação do aluno.

Fatores da evasão escolar e a relação família-escola

Para Caggiano (2009), a evasão escolar é o reflexo de uma sociedade injusta e excludente, que propicia uma cidadania tutelada. A institucionalização do não saber e da dependência inviabiliza o alcance efetivo dos direitos do cidadão e ao mesmo tempo condiciona os comportamentos individuais e a gestão compartilhada. “A educação, como direito assegurado pela Constituição Federal de 1988 e por leis educativas complementares, tem sido outorgada formalmente, mas não tem se efetivado plenamente, como um direito para a formação da cidadania” (Caggiano, 2009, p. 10).

Segundo Caggiano (2009), a educação antes da Constituição cidadã de 1988 era considerada ilha de excelência, mas as vagas não eram para todos; nessa lógica, existe ainda hoje uma defasagem na garantia de uma educação de qualidade para todas as pessoas e em todos os níveis e modalidades de ensino. Frente a isso, Caggiano (2009) apresenta os dados de 2007 do MEC e do INEP referentes à produção da desigualdade educacional, esclarecendo que

apenas 40,1% da população de 14 anos frequenta o Ensino Médio; os índices de evasão e repetência continuam altos – 19,5% para o Brasil –, o que demonstra uma enorme inadequação entre a demanda e a qualidade da oferta e, mais uma vez, confirma as desigualdades regionais: Norte, com 27,3% e Nordeste, com 27,5; de 100 alunos que ingressam no Ensino Fundamental, apenas 59 terminam a 8ª série e somente 40 chegam ao final do Ensino Médio (Caggiano, 2009, p. 9).

Por sua vez, Queiroz (2008) destaca que a evasão escolar está interligada a múltiplos fatores, tanto internos quanto externos à escola, cabendo ao gestor escolar refletir sobre eles e questioná-los por meio de diagnóstico situacional, debates e reflexões compartilhadas com os atores sociais envolvidos.

Sêda (2002) pontua que os alunos oriundos das classes populares têm dificuldades para o acesso à escola e a sua permanência lá. Lista então uma série de fatores que podem interferir nesse sentido: muitos têm que trabalhar para ajudar no orçamento do lar, provocando incompatibilidade no horário para os estudos; o desgaste prematuro no trabalho, não sobrando tempo e ânimo para estudar; a distância da escola para suas casas ou mesmo a falta de moradia fixa, com constantes mudanças de endereço; uma escola não atrativa ou autoritária; professores despreparados; ausência de motivação; alunos considerados indisciplinados, outros com problema de saúde ou devido à ocorrência de gravidez precoce; uso de violência doméstica e negligência dos pais ou responsáveis; uso de substâncias ilícitas; desestrutura familiar, baixo poder aquisitivo para obtenção de materiais escolares exigidos pelas escolas; violência e outras causas oriundas do sistema capitalista e educacional do país.

Vasconcellos (1995) explica que o processo de conclusão dos estudos dos alunos possibilita a eles apropriação do saber e, consequentemente, constroem como cidadãos. Logo, entender e interferir positivamente no processo de evasão escolar é um desafio que exige postura de desconstrução das verdades construídas nas complexidades do tema.

O conhecimento prévio sobre a evasão escolar é observado por Freire (1982) como um desafio, pontuando que

o próprio fato de tê-lo reconhecido como tal me obrigou a assumir em face dele uma atitude crítica e não ingênua. Essa atitude crítica, em si própria, implica a penetração na “intimidade” mesma do tema, no sentido de desvelá-lo mais e mais. Assim, (...) ao ser a resposta que procuro dar ao desafio, se torna outro desafio a seus possíveis leitores. É que minha atitude crítica em face do tema me engaja num ato de conhecimento (Freire, 1982, p. 86).

Logo, é importante perceber que o conhecimento prévio sobre evasão escolar e o esforço dos educadores na sua maioria não têm sido suficientes para conseguir a frequência e a aprovação dos alunos, assegurando sua permanência nas escolas (Freire, 1982).

Mesmo a educação sendo um direito dos cidadãos, há esforços em vão para a permanência deles nas escolas. O ECA aparece como regulador social e jurídico do Art. 227 da atual Constituição. Essa norma estatutária reafirma o direito constitucional à educação e institui meios para reclamá-lo, principalmente por meio da rede de proteção aos direitos das crianças e adolescentes, formada pelos mais diversos atores inseridos neste novo paradigma de atenção ao público infantojuvenil (Vóvio, 2004).

Segundo Vóvio (2004), a Constituição Federal de 1988 consagrou direitos no campo educacional em sintonia com os Direitos Humanos e com a mobilização social em torno da redemocratização do país, como tão bem expressa. Para esse autor, a Constituição de 1988 propõe uma educação que busque superar as desigualdades e promover aprendizagens fundamentais para o pleno desenvolvimento humano e inserção social.

Dentro dessa perspectiva, a escola é uma das principais instituições responsáveis pelo desenvolvimento e pela promoção de aprendizagem que permitam o acesso à cultura e ao desenvolvimento de práticas socialmente valorizadas e necessárias para a inserção plena de todos. Porém, segundo o autor, a dificuldade enfrentada por alunos para entender esse tipo de proposta educacional acaba gerando evasão escolar (Vóvio, 2004).

Entende-se então que pensar em educação é também pensar no papel que a escola desempenha na atual sociedade. E o Brasil do século XXI enfrenta velhos e novos desafios em diversas áreas e setores, acarretando sérias consequências não só no ensino e no aprendizado, mas também na economia, na política, no social e com bastante destaque para a educação. Sobre essa prerrogativa, Vóvio (2004) esclarece que,

nos últimos anos, a educação tem sido apontada como uma das principais vias para a construção de uma sociedade mais justa, solidária e democrática. Em primeiro lugar porque a educação é elemento fundamental para o desenvolvimento pessoal e para a realização da vocação do ser humano. Segundo, porque é o caminho para formar pessoas sensíveis para questões que afetam a todos e a grupos minoritários, para a prática da liberdade e para o exercício da cidadania. Terceiro, porque é uma das vias para ampliação do processo produtivo e o desenvolvimento tecnológico do país. Quarto, porque é o caminho para a mobilização social, sem a qual as mudanças não se viabilizam, a modernização não distribui seus frutos e não superam as desigualdades e a exclusão (Vóvio, 2004, p. 32-33).

Educar primando pela solidariedade, para o pleno exercício da democracia e uma cidadania efetiva tem sido um dos desafios encontrados atualmente na busca da garantia desse direito por meio de políticas intersetoriais, destinação de recursos e a criação de recursos educativos entre outros. Piana (2009) deixa claro que

legislações brasileiras reformuladas têm defendido uma educação de acesso a todo cidadão, de qualidade de uma eminente inserção no mercado profissional e no mundo do trabalho. Mas nem sempre se tornam realidade esses discursos, não passando de meras ilusões e uma pseudoeducação. Pois milhares de crianças, adolescentes e jovens, mesmo matriculados em uma escola, permanecem excluídos de uma educação participativa, democrática, conscientizadora, dialógica, autônoma e afetiva (Piana, 2009, p. 57).

A escola complementa o trabalho da família na formação do indivíduo, porém não é exatamente o que temos presenciado. Piana (2009) afirma que atualmente a escola vem tomando para si atribuições que são de responsabilidade da família, e essas duas instituições precisam estar conscientes do papel destinado a elas. Como bem destaca Szymanski (2001), a ação educativa da escola e da família apresenta nuances distintas quanto aos objetivos, conteúdos, métodos e questões interligadas à afetividade, bem como às interações e contextos diversificados.

A escola é responsável pela complementaridade da ação iniciada pela família, por isso se torna tão importante a participação familiar na vida escolar do indivíduo, pois ele já chega à escola com sua personalidade quase ou já formada no seio de sua família. Szymanski (2001) ressalta o papel da família no sentido de valorizar o trabalho da escola, participando do processo educacional da criança ou adolescente, cobrando o aprendizado com responsabilidade, disciplina e compromisso, pois quando a criança ou adolescente percebem que a família está interessada em seu desenvolvimento escolar sente-se importante, contribuindo para um melhor aprendizado.

Szymanski (2001) também aponta que a parceria entre escola e família resulta em uma educação com maior qualidade e na formação de um sujeito consciente dos seus deveres e direitos, crítico, autônomo e preparado para viver em sociedade, pois são essas duas instituições previamente construídas as responsáveis pela inserção do sujeito no contexto social. A relação educacional não se resume no dueto aluno-professor; a participação da família é fundamental para que a criança e o adolescente se desenvolvam como estudante e pessoa. Por isso, ela deve ser motivo de preocupação e atenção. Porém, como ressalta Piana (2009), na realidade o que se nota é que muitas famílias não se encontram em condições de exercer seu papel, o que se exige atenção especial por parte dos profissionais e do Estado.

A evasão escolar no Ensino Médio

Partindo da afirmativa de que o Ensino Médio é demarcado justamente pelo processo final de formação do jovem e/ou adolescente, período no qual ele se prepara para uma possível iniciação em um processo de formação técnica ou superior e para inclusão no mercado de trabalho, os casos de evasão se tornam mais frequentes (Batista; Souza; Oliveira, 2009).

Pesquisa divulgada em 2010, pelo Instituto Educacional e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) aponta que a evasão escolar apresenta índices superiores no Ensino Médio, se comparado com toda a Educação Básica: aproximadamente um a cada dez adolescentes com faixa etária entre 15 a 17 anos matriculados abandona a escola (Brasil, 2010). Destaca-se que os dados apresentados se referem ao recorte temporal da pesquisa.

Batista, Souza e Oliveira (2009) apontam que a evasão escolar no Brasil no Ensino Médio é mais frequente com adolescentes em condições de desigualdade social e/ou com baixas condições de renda, o que pode ser justificado pelo desejo ou até mesmo necessidade deles de inclusão no mercado de trabalho. Outro fator que contribui para evasão no Ensino Médio é a falta de estimulo no contexto escolar, que em sua grande maioria apresenta uma forma didática de apresentar o conteúdo teórico conservadora e tradicionalista, distante da realidade vivencial do aluno (Batista; Souza; Oliveira, 2009).

Queiroz (2008) enfatiza que a evasão escolar está diretamente relacionada a condições sociais e econômicas a que o aluno está submetido. Existe um ciclo de reprodução de vulnerabilidade no próprio histórico das famílias, principalmente das que se encontram em baixas condições econômicas ou em casos de gravidez na adolescência, uso de drogas ou conflito com lei, dentre outros aspectos que estão presentes no contexto de algumas famílias e contribuem para a não conclusão do Ensino Médio.

Diante dos fatos, a próxima seção irá apresentar por meio de análise as condições de pobreza de um município de pequeno porte do centro-oeste mineiro e as condições que influenciam na evasão no Ensino Médio.

Um breve relato da realidade histórica e socioeconômica do município de Pains

A história do município tem início em 1854, quando um capitão, proprietário de uma fazenda de médio porte, iniciou a construção de uma capela localizada à margem direita do rio que banhava a região onde a cidade está situada.

A capela não era comum, possuía oito ângulos, bem edificada e decorada com muito bom gosto. Nela foram construídos quatro belos altares com pinturas muito bonitas, em perfeitas simetrias arquiteturais. Além da capela, foi construída uma segunda igreja que se dedicava às procissões e quaresma (Faria; Goulart; Lopes, 2009, p. 7).

De acordo com Faria, Goulart e Lopes (2009), terminada a construção da igreja, o capitão e um amigo doaram à padroeira da região uma área com cerca de 12 hectares, no intuito de contribuir para o início do núcleo de colonização nas imediações da região. Acredita-se que os primeiros habitantes da região foram os índios, uma vez que, até hoje, nas cavernas de algumas pedreiras encontram-se machados de pedra, panelas e potes, entre outros utensílios relativos ao ofício da população indígena. Porém, até o presente momento, não foi possível identificar qual tribo ocupou o terreno (Faria; Goulart; Lopes, 2009).

Os primeiros desbravadores pertenciam a três grupos de famílias até hoje tradicionais na região. Contudo, o capitão e seu amigo foram os primeiros a fixar morada ali. Motivados pela fertilidade de suas terras e, possivelmente, pela possibilidade da caça e pesca fartas, passaram a se dedicar à agricultura. As primeiras casas da cidade, de estilo mansão colonial, foram construídas em madeira e barro (Faria; Goulart; Lopes, 2009).

Em relação à realidade atual e à situação socioeconômica do município, pode-se afirmar que, de acordo com a Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (SAGI), o produto interno bruto (PIB) do município cresceu 38,9%, entre 2006 e 2010, passando de R$ 106 milhões para R$ 197 milhões. A estrutura econômica encontra no setor industrial a participação mais expressiva, correspondendo a 47% do PIB municipal, seguida pelo setor de serviços, cuja participação no PIB, em 2010, foi de 30% (Brasil, 2010).

A economia local gira em torno da produção de calcário e de confecções de costura; portanto, a grande maioria da comunidade tem como fonte de ocupação a via formal de trabalho nesses meios de produção. Outra pequena parcela é composta por trabalhadores informais e produtores rurais. A renda média per capita da maioria das famílias do município é de até três salários mínimos (Brasil, 2016).

Conforme apresentado pelo último censo demográfico realizado pelo IBGE, a população da cidade aumentou. No período entre censos (2000 a 2010), o número de habitantes passou de 7.784 para 8.014. A taxa de 0,29% de crescimento populacional ao ano ficou abaixo da taxa de crescimento do estado, que foi de 0,93% ao ano. A cidade ficou abaixo da tendência de crescimento registrada, ao se comparar os índices alcançados com os dos municípios vizinhos de pequeno porte.

A pobreza e a extrema pobreza no município

A pobreza se apresenta de diversas formas: falta de segurança alimentar e nutricional; falta ou insuficiência de renda; desemprego; moradia precária; e trabalho infantil, entre tantas outras formas (Brasil, 2011). De modo geral, o município tem uma realidade socioeconômica que retrata as várias expressões da questão social existentes em nosso país, como: falta de emprego; alcoolismo; aumento do número de outras dependências químicas; pessoas idosas vítimas de maus-tratos; e violência contra a mulher, entre outras situações que requerem atenção por parte do governo (Brasil, 2016).

Não há incidência de grandes concentrações territoriais de pobreza ou os chamados “bolsões de pobreza”. Entretanto, existem casos de famílias em situação econômica de extrema pobreza e outras em situação de risco social grave, inclusive com perda de vínculos familiares (Brasil, 2016).

Segundo dados do último censo demográfico (2010), do total da população 1,5% vivia na linha de extrema pobreza, ou seja, 118 pessoas possuíam renda domiciliar per capita abaixo de R$ 77,00 mensais. Destas, 39 (33,1%) viviam no meio rural e 79 (66,9%) residiam na área urbana; são 74 mulheres (62,7%) e 44 homens (37,3%) nessa situação.

A educação e a evasão escolar no Ensino Médio no município de Pains

A rede de educação do município é composta por cinco escolas, sendo três municipais e duas estaduais. Uma das escolas estaduais encontra-se na zona rural e outra na urbana, sendo esta a única escola do município que oferta Ensino Médio. Essa escola foi fundada no dia 14 de abril de 1960; além do Ensino Médio, oferta Ensino Fundamental do sexto ao nono ano e o programa tempo integral (apenas no Fundamental). No período noturno, oferece a modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA).

No ano de 2016 (ano de realização da pesquisa), encontravam-se matriculados na escola 784 alunos; desses, 192 são beneficiários do Programa Bolsa Família, ou seja, pertencem a grupos familiares com renda per capita igual ou inferior a R$ 154,00 mensais.

Segundo informação da direção, a escola é composta por alunos em sua grande maioria de classe média e classe média baixa. Por ser um município de pequeno porte, a maioria dos alunos mora próximo à escola e o trajeto é feito pé ou, em alguns casos, em veículos como bicicleta, automóvel ou moto (quando os pais e ou responsáveis levam). Uma pequena parcela dos alunos reside em um bairro um pouco mais distante da escola e outra pequena parcela reside em comunidades rurais; nesses casos o trajeto até a escola é realizado em transporte escolar público fornecido pela prefeitura municipal.

Encontravam-se regularmente matriculados no Ensino Médio 250 alunos. Trinta estão em situação de evasão escolar, porém apenas três desses alunos, todos do sexo feminino, se enquadram no perfil de pobreza definido pelo MDS.

Diante dos fatos apresentados, foi realizada uma pesquisa a partir de entrevista semiestruturada com as três alunas e com a supervisão do Ensino Médio da escola, com o objetivo de identificar as condições das adolescentes em situação de pobreza e como elas se relacionam com a evasão escolar no Ensino Médio.

Apresentação dos instrumentais da pesquisa

Após autorização da direção da escola, a pesquisa começou a ser desenvolvida. Foi realizada junto à direção a coleta dos dados referentes aos alunos em situação de evasão e pobreza matriculados regularmente no Ensino Médio. Foram selecionados os participantes e coletados nome, endereço e idade de três alunos, denominados doravante S1, S2, S3. Após autorização deles e de seus responsáveis, as entrevistas semiestruturadas foram realizadas. Todas as entrevistadas eram do sexo feminino, com idade entre quinze e dezoito anos, beneficiárias do Programa Bolsa Família, todas com histórico de evasão escolar.

As entrevistas tiveram duração média de cinquenta minutos, com roteiro preestabelecido contendo questões fechadas de múltipla escolha com indagações acerca do perfil social das adolescentes, apresentando perguntas relacionadas a ocupação, renda, composição e classificação familiar. Outra parte da entrevista conteve questões abertas dando vazão a uma amplitude maior de resposta, com questionamentos diretamente relacionados à evasão escolar e ao cotidiano das adolescentes, como motivos da evasão, avaliação da qualidade do ensino ofertado na escola, principais dificuldades encontradas atualmente no contexto social e familiar, estratégias de enfrentamento dessas dificuldades, desejo de retornar aos estudos e sonhos e perspectivas. As entrevistas foram realizadas de forma oral, tendo o questionário apenas como alternativa de direcionamento. 

Em momento posterior, foi realizada no ambiente escolar entrevista oral semiestruturada com a supervisora do Ensino Médio; teve duração de uma hora. A entrevista teve roteiro norteador com perguntas objetivas relacionadas a escolaridade, idade e tempo de trabalho da profissional na escola e outra parte contendo questões abertas relacionadas diretamente com o problema da evasão escolar.

A supervisora entrevistada tem 42 anos, é casada e reside no município. É graduada em Pedagogia há dez anos, sendo também especialista em Direção e Supervisão; possui cargo efetivo na escola há nove anos, porém há apenas três assumiu a supervisão do Ensino Médio. Essa etapa das pesquisas foi realizada entre setembro e outubro de 2016.

Análise de dados do perfil dos adolescentes em situação de pobreza evadidos da escola no Ensino Médio

Todas as alunas entrevistadas residem em zona urbana. No caso de S1, a entrevista foi realizada no seu ambiente de trabalho, em decorrência de ela não ser encontrada em casa e trabalhar oito horas por dia como empregada doméstica. As entrevistas com S2 e S3 foram realizadas em seus próprios domicílios. Todas as entrevistadas foram cooperativas na entrevista.

Pode-se evidenciar que as adolescentes apresentam características semelhantes em alguns aspectos: as três são do sexo feminino e possuem renda familiar igual ou inferior a um salário mínimo e a composição familiar é superior a três membros. S1 e S2 advêm de família nuclear e S3 advém de família monoparental chefiada por mulher. S1 trabalha informalmente, as outras duas não trabalham.

Durante a análise do resultado das entrevistas, a gravidez na adolescência de S2, a necessidade de inclusão no mercado de trabalho para complementação de renda familiar no caso de S1 e a dificuldade de relacionamento com o contexto escolar, principalmente o corpo docente, relatadas pela supervisora e por todas as alunas caracterizam-se como os principais motivos geradores da evasão escolar das entrevistadas.

Em relação aos fatores que dificultam a permanência na escola, todas as alunas entrevistadas e a supervisora enfatizam que os métodos de ensino e avaliação possuem um parâmetro tradicional e conservador que não se aproxima da realidade e do cotidiano do alunado, ou seja, o conteúdo é repassado de forma metódica e teórica, não existindo interação entre a disciplina e o aluno, o que pode gerar desmotivação. O apontamento acima pode ser evidenciado nos seguintes trechos de falas das entrevistadas: “Tudo é muito repetitivo”; “Os professores só falam e cobram”; “Tem coisas que não sei por que aprender”; “Os alunos não têm vez”.

Outro aspecto apresentado pelas alunas e pela supervisão que perpassa a problemática da evasão escolar nos casos de famílias em situação de pobreza é a negligência familiar e a consequente falta de interação entre família e escola.  “O distanciamento da família dos alunos com relação ao contexto escolar é recorrente, os país e responsáveis não se responsabilizam com os problemas e com o processo de formação do aluno na escola”, traz a supervisora. De acordo com relatos da supervisão, é comum na escola haver problemas com indisciplina, agressão verbal e desrespeito por parte dos alunos em relação aos professores e outros colegas. A prática do bullying também se faz frequente. Os pais e responsáveis pelos alunos são convocados à escola para reuniões e orientações acerca do comportamento dos filhos, porém não comparecem. Os casos de agressão e de indisciplina “costumam envolver os mesmos alunos”.

Uma das alunas relata ter enfrentado problemas com alcoolismo no contexto familiar e, como consequência dessa problemática, os pais sempre foram ausentes no contexto escolar: “meu pai e minha sempre brigaram muito, por causa de bebida, nunca iam às reuniões da escola... Sempre senti que eles não estavam nem aí pra mim nem pro meu irmão”, segundo S2.

Outra aluna relata que ela e a família sofreram preconceito de alguns professores e de pessoas da comunidade, por serem negros e possuírem baixas condições econômicas:

Minha mãe nunca foi de ir à escola muito mesmo não, a professora C e o povo lá da escola sempre olhou a gente com o nariz torto, por a gente ser pobre e preto, o tratamento era diferente até dentro da sala, quem era riquinho sempre podia aparecer mais, eles faziam as coisas e as professora não falava nada (S3).

Em relação a alternativas e estratégias de enfretamento das problemáticas, tanto da situação de pobreza quanto da evasão escolar, as alunas e a supervisão apontam que a solução viável seria justamente a retomada dos estudos, porém atualmente a escola se caracteriza como um ambiente desmotivador e de coerção. “Melhor saída seriam os estudos, mas quando chego à escola dá um desânimo... Aí prefiro pegar no batente pesado o resto da vida” (S1).

A supervisora afirma que o corpo docente preocupa-se com a qualidade do ensino ofertado, mas a falta de reconhecimento profissional, principalmente em relação às condições trabalhistas e salariais contribui direta e negativamente na qualidade do ensino. Segundo ela, isso ajuda para a escola se tornar cada vez mais distante do aluno; os professores ficam estressados, gritam com os alunos e apenas repassam o conteúdo teórico de forma fria e distante.

A supervisora também ressalta que outro problema que perpassa o contexto escolar, afetando diretamente a incidência da evasão, é justamente a falta de articulação da escola com a comunidade e com as demais políticas públicas do município (saúde, esporte lazer cultura e Política de Assistência Social/ CRAS). A supervisora alega ter esperanças sobre possíveis mudanças na realidade local da educação, mas acredita que tais mudanças não dependem apenas do município e sim de novas formas de gestão em âmbito estadual e federal da política de educação, que se encontra em estado de calamidade e precariedade.

Com o findar das entrevistas, fica evidente o quanto a realidade do município pesquisado se assemelha à teoria estudada, pois, como aponta Sêda (2002), a escola se encontra cada vez mais distante da realidade do aluno e se caracteriza como um ambiente rígido e autoritário, não assumindo seu papel de formadora e contribuinte no processo de ensino-aprendizagem.

De acordo com Queiroz (2008), as condições de desigualdade social se tornam cada vez mais agravantes para a evasão escolar, pois a escola não está preparada e aberta para entender os vários contextos sociais nos quais a educação está inserida e não partilha as demandas e os problemas apresentados pelo alunado. Na maioria dos casos, o contexto escolar responsabiliza a família ou a rede pelo problema do aluno, porém não há atuação de forma conjunta e reflexão por parte da escola sobre os problemas enfrentados pelos estudantes que evadem.

As entrevistas demonstram que a evasão escolar, para ser enfrentada, necessita de articulação direta com a Política de Assistência Social e com as demais políticas públicas vigentes. Porém também se faz necessária uma mudança estrutural na educação que a aproxime e reconheça a realidade e as particularidades de cada aluno.

Considerações finais

Diante da pesquisa realizada, foi possível constatar que a evasão escolar no Ensino Médio dos adolescentes em situação de pobreza se evidencia justamente pela falta de proximidade do contexto escolar com a realidade do aluno e pela falta de articulação da política de educação com outras políticas públicas.

Foi possível concluir que no Brasil existe uma ótima estruturação acerca da legislação e regulamentação, tanto da PNAS quanto da Política Nacional de Educação, que se caracterizam como políticas públicas inclusivas de acesso universal, de equidade e igualdade e promotoras de acesso a direitos fundamentais. Porém a pesquisa comprovou, pelas entrevistas, que a Política de Assistência Social não resolve problemas estruturais das escolas brasileiras.

Observa-se pela pesquisa que a política de educação, além de não ofertar um espaço de acolhida e construção conjunta da aprendizagem, se encontra totalmente distante da realidade dos alunos, não é articulada com a família, com a comunidade e com outras políticas públicas, principalmente a PNAS. Isso parece contribuir diretamente para o aumento e agravo da evasão escolar.

Portanto, objetivando a mudança dessa realidade, propõe-se o incentivo à construção de projetos e de intervenções que possibilitem o diálogo e a articulação da política de educação com as outras políticas públicas e a comunidade. Além disso, se fazem necessárias avaliações contínuas sobre os métodos e as práticas de ensino executados no país em esferas municipais, estaduais e federais, para que o que é preconizado nas normas diretrizes e legislações se efetive.

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Apêndice A - Roteiro da entrevista semiestruturada aplicada aos alunos

Aluno: ____________________     Sexo (  ) Masculino   (  ) Feminino

  • Renda familiar?

(  ) inferior a um salário  (  )  até dois salários mínimos  ( )  até três salários

  • O adolescente trabalha? Se sim, (  ) via formal  (  ) via informal. Ocupação?_________________
  • Composição familiar? (  ) até dois membros (  ) até  três membros (  ) superior a três

Classificação familiar? (  ) Nuclear (  ) Monoparental   (  ) Homoparental   (   ) Outro

  • Quais são os motivos que o fizeram deixar ou não frequentar a escola nos anos finais do Ensino Médio?
  •  Como avalia a escola na qual está matriculado(a)? Ela oferta ensino de qualidade? Se sim ou não, por quê?
  • Quais são as principais dificuldades que você enfrenta atualmente no contexto social e familiar?
  • Você consegue visualizar estratégias para enfrentar as dificuldades em que vive?
  • Você pretende retornar aos estudos? Quando? Diante de quais condições?
  • Quais são seus sonhos e perspectivas?

Apêndice B - Roteiro da entrevista semiestruturada aplicada à supervisora do Ensino Médio

Nome do funcionário: ____________________ Ocupação: ________________

Há quanto tempo atua na educação? __________________ Idade: ___________

  • Quantos alunos encontram-se matriculados regularmente no Ensino Médio?
  • Quantos desses adolescentes e jovens matriculados encontram-se em situação de pobreza (renda per capita familiar de até um quarto de salário mínimo)?
  • Qual é o índice geral de evasão escolar no Ensino Médio da escola? Quantos desses adolescentes evadidos da escola se encontram em situação de pobreza?
  • Quais são principais motivos com que os adolescentes evadidos e responsáveis justificam a problemática da baixa frequência e evasão escolar?
  • Qual sua hipótese para os possíveis causadores da evasão escolar e da baixa frequência?
  • Como você avalia o Ensino Médio da escola na qual trabalha?
  • Quais são as estratégias da escola para o enfrentamento dessa problemática (evasão escolar )?

Publicado em 27 de outubro de 2020

Como citar este artigo (ABNT)

PORFÍRIO, Breno Júnior; REIS, Deyse Almeida dos. As condições de pobreza e a evasão escolar no Ensino Médio: Estudos de casos do município de Pains/MG. Revista Educação Pública, v. 20, nº 41, 27 de outubro de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/41/as-condicoes-de-pobreza-e-a-evasao-escolar-no-ensino-medio-estudos-de-casos-do-municipio-de-painsmg

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