As narrativas literárias na Educação Infantil: com literatura e imaginação podemos mudar o Brasil

Rosely Maria Morais de Lima Frazao

Graduanda de Pedagogia (Cesmac/AL), membro do Movimento Cultural Darcy Ribeiro/AL

Mackleyde de Brito Félix

Pedagoga, pós-graduada em Gestão Escolar e Coordenação Pedagógica (Cesmac/AL)

Rosiane Maria Barros Santos

Assistente social, pedagoga, pós-graduada em Psicopedagogia e Docência do Ensino Superior, mestra em Educação (UFAL)

Adentrando o universo literário: neste o que é prioritário?

Quando se aponta o contexto da contação de histórias no ambiente escolar da primeira infância, alguns termos são rapidamente atribuídos a essa prática pedagógica, como o imaginário, a criatividade e a afetividade. Entretanto, esse rico momento de interação é terreno fértil, de acordo com os aportes teóricos deste estudo, ao desenvolvimento social, cognitivo e linguístico das crianças, pois nele incorporam-se a ludicidade, a autonomia e a cultura, em um fazer que proporciona um encontro prazeroso e frutífero com o eu, com o outro e o mundo que os cerca.

Assim, nas narrativas literárias experienciadas na escola, como em todos os outros fazeres didáticos pedagógicos, está contida uma intencionalidade formativa que, por sua vez, estabelece um desafio encantador, influindo para além da possibilidade de ampliação do repertório linguístico ou da decodificação das primeiras letras. Dito isso, no intuito de alcançar a compreensão desse fazer inicialmente simplista, autores como Abramovich (1991), Zilberman (1994), Coelho (1999), Ariès (1981) e Arroyo (1994) e a leitura de documentos legais forneceram a esta pesquisa uma perspectiva estruturante sobre o fazer pedagógico desenvolvido por meio dos contos.

Nessa feitura, o trabalho docente deve prioritariamente acolher e imprimir características interativas, criativas, coletivas e integradas ao contexto sociocultural dos pequenos, respeitando suas necessidades, seus ritmos, saberes e anseios. Por essa razão, este trabalho, a fim de propor uma discussão exitosa sobre a temática abordada, distribui olhares sobre esse fazimento nas legendas que se seguem, intituladas:

  • A arte de contar histórias e a criança pequena: um fazer que atravessa o tempo em uma missão plena;
  • O papel propositivo da escola na imersão no universo literário;
  • As narrativas literárias e o fazer docente: para as crianças, um presente;
  • O despertar da criatividade no imaginário da literária arte.

Essas legendas são expressas, em suma, nas considerações finais, que esta pesquisa intitula “Considerações primordiais para fazeres literais”.

A arte de contar histórias e a criança pequena: um fazer que atravessa o tempo em uma missão plena

Se o assunto é sobre o narrar histórias, é justo que se apresente um resumo da trajetória do contar. Nesse sentido, diversos pesquisadores relatam que o ato/hábito de enunciar histórias passou a existir muito antes dos registros escritos, ou seja, dos livros. Segundo os teóricos, a contação de histórias, ressalvadas as devidas especificidades, se manifestaram nas sociedades tidas como primitivas. Porém não há registro de uma data específica cronologicamente que aponte seu aparecimento. Os apontamentos denotam que, nas sociedades primitivas (tribais), a atividade de contar histórias não possuía finalidade literária; seu objetivo era manter viva a historicidade e o conhecimento de seu povo, as crenças, os mitos, as descobertas e os costumes a serem preservados pela comunidade. Os mais velhos em idade eram os escolhidos para a tarefa, em um fazer intergeracional de proteção e preservação cultural. Schermack (2010, p. 2) ilustra esse fazer quando descreve:

Considerando que a arte de contar histórias se constitui em um ritual muito antigo, os líderes organizavam rituais noturnos em torno de uma fogueira, onde crianças, jovens e adultos ouviam histórias contadas por sábios e comunicativos feiticeiros, os quais detinham a sabedoria a ser transmitida para essas gerações. As histórias narradas oralmente buscavam o entendimento dos mistérios que envolviam a natureza, como o surgimento do céu e da terra, o aparecimento e o desaparecimento da lua, a origem do dia e da noite, a criação dos homens, como o Gênesis, por exemplo.

Dessa forma e mais especificamente nesse recorte temporal, o narrar fora concebido como canal de transmissão de saberes para as futuras gerações. Assim, a oralidade carrega consigo a dinâmica letrada, vai costurando a linha do tempo das histórias contadas, como relata Pires, ao afirmar que “da palavra viva e animada surgiu o mito, que é o primeiro estágio da arte de narrar, vinculado ao sobrenatural e à superstição; deste, por conseguinte, nasceu o conto” (Pires, 2011, p. 13).

E, ao relacionar os fins com o modo humano de comunicar-se, junto ao anseio de expandir, modificar e locupletar sua própria experiência de vida, entende-se que a contação de história, também segundo Pires (2011, p. 13), é

um dos meios mais antigos de interação humana, usada desde os primórdios da humanidade para, por meio da linguagem, transmitir conhecimentos, estimular a imaginação e a fantasia – necessidades basilares do homem – e é empregada também para transmitir valores morais, além de disciplinar e desenvolver o interesse pela leitura. Por meio das histórias, as pessoas galgam a oportunidade de se tornar leitores assíduos e competentes linguisticamente, além de poder caminhar por uma estrada infinita de descobertas e compreensão do mundo.

Na Idade Média, seguindo a linha cronológica, o narrador de histórias era um sujeito reverenciado e respeitado em todos os espaços que frequentava; já a imagem de criança – aqui investigada como público-alvo na imersão do universo narrativo-literário – era concebida como um adulto em miniatura. Ariès (1981), em seus estudos, aponta, nesse contexto temporal, um não reconhecimento da infância; essa etapa biossocial não era, até então, percebida em suas especificidades. Somente ao final desse período, a ingenuidade e a inocência, características da primeira infância, são reconhecidas, sob forte influência do cristianismo – porém o acesso às escolas, por exemplo, era restrito à nobreza. Entretanto, ao saltar para a Modernidade, com a Revolução Francesa, a razão ganha espaço e força, inclusive na institucionalização das escolas.

Nesse trajeto temporal, o trabalho pedagógico desenvolvido com as crianças também aponta fundamentais mudanças, pois inicialmente os registros relatam um trabalho com perfil singularmente assistencialista. O pedagogo era uma espécie de guia moral que conduzia as crianças em fazeres elementares.

Outro recorte importante neste estudo trata do surgimento das histórias literárias com perfil infantil grafadas em livros. Nascedouras nos contos populares e nos livros direcionados para o público adulto, no Brasil, por exemplo, originou-se entre os séculos XIX e XX. Segundo Zilberman e Lajolo (1986), os contos derivados do Oriente e da Europa voltados e/ou possibilitados ao público infantil foram explanados e traduzidos por escritores brasileiros como Olavo Bilac, José de Alencar e Figueiredo Pimentel, entre outros. No entanto, sua popularização se deu com Monteiro Lobato, que, transcendendo os livros, alcançou a televisão brasileira.

Diante disso, esta pesquisa avalia as contribuições da relação da primeira infância com as vivências das narrativas literárias experienciadas na Educação Infantil, pois, para além da manutenção da tradição e do entretenimento, as contações de histórias, sobretudo as desenvolvidas em terreno escolar, propõem hoje, de acordo com os documentos legais consultados nesta construção, como a Base Nacional Comum Curricular (2017) e as Orientações Curriculares para a Educação Infantil da Rede Municipal de Maceió (2015), um fazer estimulante, prazeroso e desafiador no intuito propositivo de desenvolvimento pleno dos pequenos; porém nesse ínterim, a literatura não se efetiva com função formativa conteudista, talhada em recortes a serem interpretados à luz da gramática normativa, mas sim como fonte criativa no caminho do conhecimento.

O papel propositivo da escola na imersão no universo literário

Ao adentrar solo educativo, a criança se depara com inúmeros desafios e descobertas. Comumente, elas são recebidas em rodas de conversa que utilizam trabalhos literários, musicalizações e/ou brincadeiras para acolhida e consequente socialização. Coelho (apud Pires, 2011, p. 17, grifo nosso) relata que

acredita que a escola é hoje o espaço privilegiado, em que deverão ser lançadas as bases para a formação do indivíduo, e nesse espaço deverão ser privilegiados os estudos literários, pois, de maneira mais abrangente do que quaisquer outros, eles estimulam o exercício da mente, a percepção do real em suas múltiplas significações, a consciência do eu em relação ao outro, a leitura de mundo em seus vários níveis e, principalmente, dinamizam o estudo e o conhecimento da língua, da expressão verbal significativa e consciente – indispensável para a plena realidade do ser.

Assim sendo, vivenciar as possibilidades emanadas do ato de contar/ouvir histórias envolvendo as crianças no universo da leitura, despertando nelas a curiosidade e o prazer contidos nas experiências literárias, são passos salutares para a apresentação de mundo efetivada na primeira etapa da Educação Básica. Entretanto, são diversos os meios, recursos e caminhos para introduzir/implementar a contação de histórias como vereda propositiva aos saberes, pois, para além dos objetivos de aprendizagem presentes nos campos de experiências, a escola necessita encontrar um ritmo acessível ao desenvolvimento/socialização dessas vivências.

Nesse fazer, a rotina é um elemento do planejamento que colabora de forma assertiva com o estabelecimento das feituras. Se a escola acorda como premissa a presença das narrativas literárias entrelaçadas às feituras diárias, propõe, segundo teóricos consultados para este estudo, uma constituição exitosa no desenvolvimento do sujeito crítico e criativo, contribuindo para a potencialização da imaginação, da atenção, da memória e da linguagem das crianças pequenas. Daí a importância de essa imersão literária ser efetivada já na Educação Infantil, que tem sua finalidade descrita na Lei de Diretrizes e Bases (nº 9.394/96):

Art. 29 – Define a Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica e atribui a ela como finalidade o desenvolvimento integral da criança até cinco anos de idade em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.

Assim, a Educação Infantil, ao atender crianças de 0 a 5 anos, em creche e pré-escolas, também encontra no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998) orientações no tocante à estimulação e à valorização das diferentes situações de leitura para o domínio gradativo da linguagem. Nesse ponto, a escola, como espaço fértil de interação, socialização e descobertas, ao compreender que a contação de histórias é de fato meio rico para o desenvolvimento das crianças, possibilita o estímulo da potencialidade delas.

As narrativas literárias e o fazer docente: para as crianças, um presente

Levando em consideração os diversos contextos socioeconômicos que permeiam as escolas e nos quais as crianças estão inseridas, as leituras literárias desenvolvidas pelos pedagogos desempenham, sociocognitivamente, papel integrador.

Espacialmente, essas contações, de preferência, devem ser realizadas em locais convidativos, iluminados, amplos e estruturados conscientemente para interação das crianças com livros de diversos gêneros poéticos e autores (entre clássicos e populares) selecionados para além das temáticas curriculares e indicações editoriais e apoiadas por recursos como fantoches, máscaras, fantasias, adereços, respeitando o grupo etário envolvido.

Essa feitura demanda um estudo prévio por parte do profissional professor, pois ao primeiro olhar a contação de histórias se apresenta como um fazer nato, mas ao desempenhá-lo junto aos pequenos, permeando as intencionalidades previstas nos documentos norteadores, é perceptível a necessidade de preparação mais encorpada, como evidencia Rigliski (2012, p. 12-13, grifo nosso):

os professores de Educação Infantil precisam estar preparados para que assumam uma atitude reflexiva em relação ao seu ensino e às condições sociais que o influenciam, e o grande desafio é garantir o movimento à riqueza do processo, mantendo o diálogo permanente. Propor situações-problema, desafios, reflexões, fazer conexões entre o conhecimento adquirido ao pretendido e ao vivido. Cabe, portanto, ao professor de Educação Infantil pensar, refletindo sobre o seu fazer docente. Sonhar... Pigmentar a sua prática com as riquezas da fantasia e o encantamento mágico do ato de criar em sala de aula e a contação de histórias é um caminho para estimular todo esse potencial dos pequenos.

Nesse sentido, as narrativas literárias emanadas nos livros e propostas nas salas de aula, além de estimular a intimidade das crianças com o universo leitor, cultivam nos pequenos a apropriação das estruturas linguísticas, auxiliando-os na fluência, na elaboração de frases, na iniciação da escrita, no enriquecimento vocabular, na autonomia ao questionar, na reflexão sobre as hipóteses; enfim, nas feituras comunicacionais.

Mas esse cenário, apresenta também a necessidade de atentar para o fato de que “um livro é um objeto; tem forma, cor, textura, volume, cheiro” (Martins, 2003, p. 42). Portanto, mesmo as crianças envolvidas não sabendo ler alfabeticamente, elas no mínimo veem, observam, folheiam, tocam, amassam, apreciam, descobrem, identificam, hipotetizam, rasgam, sentem na interação com os livros. Assim, essas vivências em ambiente escolar, geralmente manifestadas sob a mediação do professor, demandam dele uma compreensão sobre essa relação como um momento de exploração e descobertas, de apropriação e identidade para que, de fato, se efetive o encantamento talhador dos saberes.

Abramovich (1991) adverte sobre outra vertente desse fazimento literário: a escuta de variados contextos narrativos, pois quando se percebe essa feitura como premissa formativa deve-se levar em consideração a seleção de autores e textos oralizados a serem experienciados que, de acordo com estudiosos da temática literária, eles se tornam mais acessíveis ao público infantil quando são apresentados por jogos verbais, rimas e ludicidade. Dessa forma, possibilitando uma relação entre o cotidiano vivenciado e o imaginário, como destaca o excerto do Ministério da Educação (2009, p. 29, grifo nosso):

ler, portanto, significa compreender os propósitos explícitos e implícitos da leitura e fazer uso de conhecimentos relevantes para interpretar a informação. Por sua vez, escrever não é a imagem de uma transcrição do próprio pensamento. Escrever exige que o sujeito reflita sobre o conteúdo, reorganize as ideias, busque a melhor forma de expressar suas intenções, representando os possíveis destinatários e controlando todas as variáveis que estão ao seu alcance em um intento de que o texto que se escreve esteja o mais próximo possível do texto que se lê.

Dito isto, ao analisar a linha temporal da literatura infantil nas últimas décadas, é perceptível a crescente otimização acerca do convite à criança para uma imersão literária mais exitosa. Por meio da mudança dos leiautes, do material e da linguagem impressa, entre outros aspectos, autores, ilustradores e editoras vêm apresentando nos livros peles e vozes mais infantes.

O papel do professor, portanto, é de mediador dessa experiência literária. Nesse sentido, é salutar que o fazer docente favoreça o contato das crianças com os livros e as leituras, estabelecendo práticas sociointeracionais no ambiente escolar que aproximem imaginário e real, propondo a meninos e meninas, por meio da hipóteses, reflexões sobre si e o mundo que os cerca.

É interessante, nesse fazimento, que o professor proponha interações que impulsionem o pensar sobre as diversas situações nas quais cotidianamente todos se envolvem por meio do diálogo entre professor e aluno, aluno e aluno, aluno e objeto, aluno e espaço, vivenciando processos de criação e expressão na escuta, na apreciação, na inferência, na identificação e no reconto. Afirmativa esta amparada pelas prerrogativas dispostas na denominada Zona de Desenvolvimento Proximal apresentada por Vygotsky (1999, p. 112-113, grifo nosso) como

a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. (...) A Zona de Desenvolvimento Proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado embrionário. Essas funções poderiam ser chamados de “brotos” ou “flores” do desenvolvimento, ao invés de “frutos” do desenvolvimento.

Assim, o fazer do pedagogo não se limita a narrar ou intermediar essas vivências, mas sim provocar o desenvolvimento proximal – entre o desenvolvimento real, individual, já internalizado, e o desenvolvimento potencial, o que está em processo de maturação, interpessoal. Ou seja, o docente deve exercitar sua sensibilidade ao identificar o que o infante já traz como saber e relacionar com o que poderá ser percebido nas feituras literárias.

Contudo, o profissional professor também deve alcançar o entendimento de que cada criança é singular e, ao transitar pelos estágios e períodos do desenvolvimento sociobiológico, apresentam especificidades ímpares, carregadas de traços culturais dos contextos nos quais se desfiam.

O despertar da criatividade no imaginário da literária arte

As vivências literárias possibilitam que as crianças experienciem enriquecedoras interações, relacionando, a partir da trama apresentada, questões subjetivas como tristeza, alegria, tranquilidade, anseio e criatividade, esta última de modo particularmente exitoso. Zilberman esclarece que “a literatura sintetiza, por meio dos recursos da ficção, uma realidade que tem amplos pontos de contato com o que o leitor vive cotidianamente” (Zilberman, 1994, p. 22).

Assim, os pequenos efetivam um passeio por lugares e ambientes mágicos que geralmente são povoados por reis poderosos, belas rainhas, valentes príncipes, fadas bondosas, bruxas más, animais falantes, gnomos feiticeiros, duendes ajudantes, meninos curiosos e meninas sabidas, entre tantos outros personagens que convidam e transportam os infantes para inúmeras aventuras que fomentam, entre outros aspectos, a criatividade salutar ao imaginário. Zilberman (1994, p. 22), que aporta este estudo, relata que:

por mais exacerbada que seja a fantasia do escritor ou mais distanciadas e diferentes as circunstâncias de espaço e tempo dentro das quais uma obra é concebida, o sintoma de sua sobrevivência é o fato de que ela continua a se comunicar com o destinatário atual, porque ainda fala de seu mundo, com suas dificuldades e soluções, ajudando-o, pois, a conhecê-lo melhor.

Nesse sentido, Coelho (2000, p. 141) explica que “é pelo imaginário que o eu pode conquistar o verdadeiro conhecimento de si mesmo e do mundo em que lhe cumpre viver”. Todavia, a narração de histórias configura um instrumento propositivo no estímulo ao hábito da leitura, remetendo as crianças ao endereço da imaginação e da criatividade. Para Abramovich, “ouvir histórias pode estimular o desenhar, o musicar, o sair, o ficar, o pensar, o teatrar, o imaginar, o brincar, o ver o livro, o escrever, o querer ouvir de novo (a mesma história ou outra). Afinal, tudo pode nascer dum texto!” (2001, p. 23).

Dessa forma, o contar, além de proporcionar uma atividade lúdica, instiga e auxilia o desenvolvimento emocional, social, linguístico e cognitivo da criança, ou seja, estimula as múltiplas dimensões que constituem o ser humano, desvelando a curiosidade, a excitação, a instigação e a estimulação da imaginação, desenvolvendo a autonomia e o pensamento crítico e criativo, projetando a resolução de conflitos do seu cotidiano, enfatizando sua autonomia.

O mundo das histórias é lugar cheios de fantasias e fabulosos mistérios que carecem da criatividade para que a magia se efetive nas interações propostas. Desse modo, ler na Educação Infantil é despertar interesses na construção de seus respectivos universos a partir de suas referências cotidianas entrelaçadas criativamente ao mundo literário.

Considerações primordiais para fazeres literais

Há muito o que considerar quanto aos fazeres literários em ambiente escolar, pois a contação, preliminarmente vista como tarefa antiga e simplista, assume hoje caráter múltiplo, atuante em dimensões constituintes dos sujeitos. Entretanto, para despertar em meninos e meninas o interesse pela busca de novos saberes por meio dos livros, o pedagogo deve estar atento às necessidades e interesses deles, tendo como fiéis escudeiros a imaginação e a criatividade.

Nesse sentido, a valorização do hábito de narrar histórias na primeira etapa da Educação Básica possibilita às crianças um desenvolvimento pleno, como indicado nos documentos legais norteadores. Vale ressaltar que, nessa feitura, a interação com os pequenos não se restringe à proposição de comunicar-se por meio de sua língua narrada pelo professor e grafada nos livros; esse fazer oferta o entendimento e a compreensão do meio sociocultural em que eles estão inseridos.

Além disso, o cenário da contação amplia/otimiza o espaço da observação e da escuta, tão fundamental ao desenvolvimento do trabalho pedagógico na Educação Infantil. O ato de ouvi-las e o olhar atento aos seus questionamentos e interações revelam seus interesses e necessidades, primordiais à construção socioeducacional desenvolvida pela e na escola, pois, ao experienciar as histórias, os infantes podem questionar, expressar, interagir, emocionar-se, viajar por lugares fantásticos, sonhar, prospectar, enfim viver novas experiências a partir do imaginar tão característico dessa faixa etária.

Para além da fala, o momento literário convida o corpo e os gestos, o diálogo e a mediação, o olhar e a contemplação, os sentidos e os sentimentos, o eu e o outro, o lúdico e a razão, o concreto e o abstrato para um rodopio em um carrossel brincante em um tempo qualquer que, mais do que entretenimento, confere um vislumbre a um viver mais vibrante, colorido e possível, se assumido como responsabilidade de todos, desde cedo, desde sempre, desde pequeno. Logo, o que dizer a um povo que de pequenino já compreende o poder do ler? E, mais ainda, como ludibriar a quem aprendeu cedo a imaginar?

Referências

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ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. 2ª ed. Rio de Janeiro: LTC, 1981.

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COELHO, Betty. Contar histórias: uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 1997.

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura? São Paulo: Brasiliense, 2003.

PIRES, O. S. Contribuições do ato de contar histórias na Educação Infantil para a formação do futuro leitor. Maringá: UEN, 2011.

RIGLISKI, A. S. Contribuições da contação de histórias no desenvolvimento das linguagens na infância. Ijuí: Unijuí, 2012.

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SCHERMACK, K. Q. A contação de histórias como arte performática na era digital: convivência em mundos de encantamento. Passo Fundo: Ed. UPF, 2010.

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______. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

ZILBERMAN, Regina. A literatura infantil na escola. 9ª ed. São Paulo: Global, 1994.

______. A literatura infantil na escola. 10ª ed. São Paulo: Global, 1998.

Publicado em 10 de novembro de 2020

Como citar este artigo (ABNT)

FRAZAO, Rosely Maria Morais de Lima; FÉLIX, Mackleyde de Brito; SANTOS, Rosiane Maria Barros. As narrativas literárias na Educação Infantil: com literatura e imaginação podemos mudar o Brasil. Revista Educação Pública, v. 20, nº 43, 10 de novembro de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/43/as-narrativas-literarias-na-educacao-infantil-com-literatura-e-imaginacao-podemos-mudar-o-brasil

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