Potencialidades educacionais do ciberespaço: uma reflexão sobre a utilização das redes sociais virtuais em práticas de ensino

Rana Rose Rico Martins Borges de Sousa

Professora de Física na Educação Básica, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Tecnológica (Cefet/MG), especialista em Tecnologias Digitais Aplicadas ao Ensino (IFRJ, câmpus Arraial do Cabo), licenciada em Física (UFMG)

Não tendo definições geográficas, mas como espaço invisível, propício ao conhecimento e trocas de saberes, Lévy (2003) descreve as potencialidades do ciberespaço como fenômeno que transforma o modo como a sociedade é construída. Quando surgiu, o ciberespaço era utilizado, principalmente, em universidades e grandes empresas. Nos últimos anos, com a popularização dos aparelhos smartphones e as conexões sem fio, Wireless Fidelity (Wi-Fi), 3G e 4G, o que se vê é a ampliação do acesso a esse recurso para além desses espaços físicos, o que para Maia (2013) leva informação e aprendizagem também a grupos periféricos e a ambientes informais, de forma cada vez mais contínua.

Atento às transformações rápidas provocadas pela rede de conexões de computadores, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), investigou, no último trimestre de 2017, indicadores sobre o uso das Tecnologias Digitais da Comunicação e da Informação (TDIC), pelos brasileiros com idade igual ou superior a 10 anos. A coleta de dados mostrou que, naquele ano, 74,9% dos lares brasileiros possuíam condições para acesso à internet por meio de televisores, tablets, computadores e, principalmente, celulares.

Ainda de acordo com a pesquisa, os internautas apontaram como principal finalidade do uso da internet a troca de mensagens por meio dos aplicativos das redes sociais. Além disso, mais de 80% dos jovens entre 14 e 24 anos aparecem na pesquisa como internautas. Coerente com os dados fornecidos pelo IBGE, o relatório Digital in 2019, feito pela We Are Social em parceria com a Hootsuite, apontou que 81% da população brasileira com 13 anos ou mais é usuária das redes sociais, o que corresponde a 149,1 milhões de usuários ativos, sendo que o Youtube, Facebook, WhatsApp e Instagram aparecem como as redes preferidas pelos internautas no Brasil.

A alta adesão às ferramentas digitais de socialização virtual há anos desperta interesse em diversos setores da sociedade. Entretanto, a fenomenal aglutinação dos jovens nesses meios nos leva às reflexões sobre a apropriação das Redes Sociais Virtuais (RSV), enquanto lugar no ciberespaço, além da comunidade escolar, para fins pedagógicos. A partir destes entendimentos, Machado e Tijiboy afirmam que:

A formação de redes de interação vem atingindo as mais diversas esferas e campos de conhecimento, desde o plano econômico, científico, cultural etc. No campo econômico, a exploração do nicho social networking passa a ser alvo de interesse de empresas que estão vendo no ramo das redes sociais virtuais um amplo espaço para negociação de produtos e serviços e, enxergando também, o potencial de relacionamentos estabelecidos nas comunidades como forte capital social da atualidade. Além disso, a comunicação em rede tem sido explorada como instrumento de ativação de movimentos sociais e culturais como a luta dos direitos humanos, feministas, ambientalistas, etc. Na educação, a participação em comunidades virtuais de debate e argumentação encontra um campo fértil a ser explorado (Machado; Tijiboy, 2005, p. 2).

Tal fenômeno pode ser observado com a forte adesão ao Orkut pelos jovens brasileiros, a partir de 2006, quando a comunidade escolar passou a assumir uma postura de resistência à utilização da rede social, acreditando ser uma fonte de distração. Porém, com o passar dos anos, outras redes, como o Facebook e WhatsApp, surgem e levam a faixa etária adulta também a se apropriar das plataformas de interação virtual. Com as RSV cada vez mais presentes no cotidiano das pessoas, assim como no dia a dia dos alunos e professores, e se apresentando como um verdadeiro hábito, fazer uma reflexão sobre o uso dessas plataformas, por partes dos profissionais da educação, é algo cada vez mais imprescindível.

Dentro deste contexto, Silva e Serafim (2016, p. 69) acreditam que “as redes sociais da internet possam vir a favorecer a interação e socialização dos processos desenvolvidos na escola. E podem contribuir significativamente com o trabalho do professor quando utilizadas de forma pedagógica”. Assim, as possibilidades do ciberespaço para o processo de ensino e aprendizagem podem ser incontáveis, desde vídeos aulas, simulações on-line, transmissões ao vivo, compartilhamento de arquivos, jogos, podcasts e imagens, realização de trabalhos e pesquisas colaborativas em rede ou até mesmo outra função, que não irá demorar meses para ser inventada e integrada ao cotidiano.

As redes sociais, dentro desse espaço, possuem os recursos necessários para reunir muitas dessas possibilidades e, como ambiente interativo, permite atividades condizentes com a realidade dos alunos nativos da sociedade da informação. Dessa forma, pensam-se as redes sociais virtuais como uma rede de saberes, nas quais as interações abrem espaço para que as habilidades do indivíduo sejam utilizadas em favor do coletivo. A educação, diante desse lugar que favorece a inteligência coletiva, ganha mais um instrumento pedagógico.

A partir deste contexto, surge a questão norteadora deste artigo: pensando nas plataformas de interação mais utilizadas pelos brasileiros, como as ferramentas digitais das RSVs podem favorecer práticas de ensino na educação formal?  Para responder à presente questão, o objetivo desta pesquisa foi explorar três redes sociais virtuais, buscando algumas de suas ferramentas e refletindo suas potencialidades educacionais. Sendo assim, este estudo percorreu as seguintes etapas: descrever quais características essas ferramentas digitais deveriam possuir; definir quais as redes sociais a serem exploradas; listar as ferramentas digitais encontradas dentro dessas redes; sugerir aos professores algumas práticas a serem trabalhadas com seus alunos.

Assim, esta pesquisa foi desenvolvida por meio da metodologia de revisão bibliográfica, que de acordo com Gil (2008, p. 50): “é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos”. No caso do presente estudo, foram consultadas ainda algumas páginas de redes sociais da internet, por se entender que, na sociedade da cultura digital, essas páginas também constituem fontes de pesquisa bibliográfica.

É sabido que, como ocorre com toda pesquisa, uma pesquisa bibliográfica também possui seus limites de escopo e aprofundamento. Além disso, também se tem ciência de que cada realidade é um contexto em particular e que as reflexões ora propostas precisam ser pensadas e trabalhadas de modo específico em cada realidade. Todavia, destaca-se a relevância de uma pesquisa bibliográfica, como essa aqui realizada, por colaborar com professores que desejem conhecer as potencialidades de algumas ferramentas de RSVs para a prática de ensino.

Diante disso, preocupando-se com a compreensão do uso pedagógico das redes sociais, esta pesquisa teve como procedimento uma pesquisa teórica bibliográfica de livros e artigos, por meio de banco de dados digitais (Google acadêmico e SciELO), a qual foi realizada em diferentes dias do ano de 2019; além disso, visitaram-se as plataformas das redes sociais selecionadas na busca de ferramentas digitais. 

A transformação do trabalho docente com a apropriação do ciberespaço

Em sua obra Cibercultura, Pierre Lévy (1999, p. 11) propõe refletir a cultura digital diante de dois fatos aqui apresentados, a saber: 

Em primeiro lugar, que o crescimento do ciberespaço resulta de um movimento internacional de jovens ávidos para experimentar, coletivamente, formas de comunicação diferentes daquelas que as mídias clássicas nos propõem. Em segundo lugar, que estamos vivendo a abertura de um novo espaço de comunicação, e cabe apenas a nós explorar as potencialidades mais positivas deste espaço nos planos econômico, político, cultural e humano.

No que diz respeito à área da educação, este trabalho acredita que as potencialidades do ciberespaço podem contribuir para práticas de ensino que aproximem o trabalho docente das tecnologias digitais tão apreciadas pelos jovens alunos. Mas, o que é o ciberespaço e como ele poderia colaborar com práticas do trabalho docente?

O termo ciberespaço nasceu para nomear um ambiente artificial idealizado por Willian Gibson, em seu livro de ficção científica Neuromancer, lançado em 1984. Propiciado por um conjunto de rede de computadores, o ciberespaço era, para o autor, o local onde todos os tipos de informações circulavam e relacionamentos diversos eram estabelecidos, tudo isso sem que houvesse a presença física dos humanos.

Posteriormente, já em um contexto de uma sociedade em transformação devido aos recursos digitais, em uma infraestrutura real com cabos, fios e computadores, Lévy (1999, p. 17), resgata o termo e define com suas palavras o que seria esse ambiente:

O ciberespaço (que também chamarei de ‘rede’) é o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial de computadores. O termo especifica não apenas a infraestrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ele abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo.

Acompanhando esse pensamento, Lévy (2003) diz que este espaço não é geográfico, não é uma instituição ou um estado, é um espaço de conhecimento e saberes, que transforma a forma como a sociedade é construída. O ciberespaço, que embora esteja envolvido por tecnologias digitais em sua infraestrutura, é constituído também por saberes e pelos indivíduos que os possuem (LÉVY, 1999). Mantendo indivíduos ligados apesar do distanciamento territorial, ele funciona como suporte para o desenvolvimento e fortalecimento de uma inteligência coletiva.

Lévy (1999, p. 171) ainda reflete que “a direção mais promissora, que por sinal traduz a perspectiva da inteligência coletiva no domínio educativo, é a da aprendizagem cooperativa”, em um processo pedagógico em que professores e alunos compartilham os recursos e habilidades que possuem e ambos aprendem ao mesmo tempo. Lévy (2003) diz que a inteligência coletiva é aquela que se distribui entre todos os indivíduos e não está restrita para poucos privilegiados.

Além disso, para esse autor, as tecnologias digitais se encontram cada vez mais ao alcance dos indivíduos, e provocam mudanças na relação com o saber redefinindo alguns espaços. Para ele,

as novas possibilidades de criação coletivas distribuídas, aprendizagem cooperativa e colaboração em rede oferecidas pelo ciberespaço colocam novamente em questão o funcionamento das instituições e os modos habituais de divisão de trabalho, tanto nas empresas como nas escolas. (Lévy, 1999, p. 172).

Dessa maneira, para Lévy (1999), o papel do professor também se transforma. Não se trata mais de difundir conhecimento ou de ser a fonte exclusiva de acesso ao conhecimento, mas de ser um incentivador do processo de aprendizagem e do pensamento. O autor lista algumas das funções do professor nesse novo papel, como, por exemplo, “o professor torna-se um animador da inteligência coletiva dos grupos que estão a seu encargo” (Lévy, 1999, p. 171). Diz ainda que sua atividade estará centrada no “incitamento à troca de saberes, a mediação relacional e simbólica, a pilotagem personalizada dos percursos de aprendizagem etc.” (Lévy, 1999, p. 171).

Portanto, o docente, diante da possibilidade de se apropriar das inúmeras potencialidades educacionais no ciberespaço, tem a tarefa de atualizar as suas práticas com o desejo de aproximar suas atividades a um ensino aparelhado pela cultura digital e suas ferramentas.

Conectando as práticas de ensino às redes sociais virtuais

Nas últimas décadas, com o acesso cada vez maior à rede de computadores, as rápidas transformações proporcionadas pela internet levam as redes sociais e os jovens a uma posição de destaque:

No contexto da cultura digital (ou cibercultura), que materialmente vem se desenvolvendo desde a ampliação do acesso aos computadores pessoais (PCs) nos anos 1980, as redes sociais on-line ocupam atualmente o centro das atenções, especialmente a partir da década de 2000, quando registraram forte crescimento de adesão e utilização, especialmente por jovens em idade escolar (Rosado; Tomé, 2015, p. 14).

Tal perspectiva remete ao pensamento de Silva e Serafim (2016), ao identificarem a adesão dos jovens às redes sociais do ciberespaço. Eles acreditam que o trabalho pedagógico do professor possa vir a ser favorecido por essa interação e socialização virtual. Pensamento também compartilhado por Santos e Campos, ao se referirem às redes sociais da internet (RSI), como possibilidades de serem

utilizadas como ferramentas pedagógicas, pois ajudam não somente a melhorar e ampliar as possibilidades de aprendizagem dos alunos como também oferecem ao educador outras maneiras de se relacionar e interagir com os mesmos. Além disso, estreitam a relação professo/aluno e ampliam o espaço da sala de aula, permitindo que os alunos tornem-se também responsáveis por sua própria aprendizagem (Santos; Campos, 2013, p. 18).

Cabe lembrar, todavia, que alguns aspectos contribuem para o processo lento de apropriação das tecnologias digitais pela comunidade escolar, como recurso pedagógico, por exemplo, “a dificuldade que muitos professores têm em acompanhar essa nova pedagogia tecnológica, enquanto os alunos as usam e dominam” (Silva; Serafim, 2016, p. 74). As autoras destacam, também, a falta de aparatos nas escolas para uso das tecnologias digitais e, quando há aparatos, muitas vezes não há um treinamento para os profissionais. Refletem ainda sobre a resistência dos docentes em abandonar a reprodução dos métodos tradicionais repensando as suas práticas de ensino para uma sociedade que, de fato, mudou. Contudo, as autoras lembram que “o processo de modificação não depende apenas de professores e alunos, mas também de termos administradores, direção e coordenadores mais abertos” (Silva; Serafim, 2010, p. 76).

Percebemos, assim, que os desafios encontrados na implementação do uso das RSI no ensino envolvem, para além do professor, reflexões e mudanças sobre a própria política e sistema educacional. Mas inúmeros podem ser os benefícios dessas reflexões e mudanças. Uma vez conectada a sociedade da informação, a educação poderá encontrar e mostrar caminhos, colaborando com “um projeto de convivência integrada a outros espaços sociais” (Brennand, 2001, p. 9), assumindo um papel indispensável e incentivador “na construção redes populares de produção e disseminação de saberes múltiplos, interativos, multifacetados” (Brennand, 2001, p. 9).

Aos docentes, que já se encontram atentos às potencialidades das TDIC, Silva (2009, p. 92), em seu trabalho, insere uma interessante reflexão, lembrando que

os professores e as professoras estão cada vez mais compelidos à utilização de novas tecnologias de informação e de comunicação, mas permanecem pouco atentos à necessidade de modificar a sala de aula centrada na pedagogia da transmissão. Nem sempre as soluções encontradas significam salto qualitativo em educação. Afinal, o essencial não é apenas a tecnologia, mas novas estratégias pedagógicas capazes de comunicar e educar em nosso tempo.

De fato, lidar com jovens que nasceram em um contexto de uma sociedade já imersa nas tecnologias digitais traz aos professores contemporâneos desafios e reflexões em torno de suas práticas de ensino. No mesmo texto, o autor disserta ainda que “na cibercultura, os atores da comunicação tendem à interatividade, e não mais à separação da emissão e recepção própria da mídia de massa” e dessa forma o ambiente escolar está transformado para “uma multiplicidade de recorrências entendidas como conectividade, diálogo, participação e colaboração” (Silva, 2009, p. 96). Sendo assim,

o docente propõe o conhecimento à maneira do hipertexto. Assim redimensiona a sua autoria. Não mais a prevalência do falar-ditar, da distribuição de informação, mas a perspectiva da proposição complexa do conhecimento à participação colaborativa dos participantes, dos atores da comunicação e da aprendizagem. Ele pode construir sua docência interativa inspirada no parangolé de Oiticica. Para isso, precisará modificar seus métodos de ensinar baseados na transmissão e memorização (Silva, 2009, p. 96).

Todas essas compreensões apontam para o fato de que o professor que estiver aberto às transformações da sociedade da cultura digital poderá utilizar de suas habilidades e das habilidades dos alunos, para coordená-los em um processo de construção coletiva de conhecimentos e de aprendizagens. Em benefício da interatividade, na sala de aula e além desse espaço físico, utilizando como ferramenta de apoio, tecnologias digitais da informação e comunicação. E, para tudo isso, as RSV parecem ser um campo fértil a ser explorado.

A escolha das redes sociais

A agência We Are Social disponibiliza anualmente o relatório Digital in sobre o mundo digital. Nele, há dados globais e regionais que ajudam a entender as tendências da internet, as mídias sociais, os dispositivos móveis e o comércio eletrônico. Foi a partir dos números da Digital in 2019 Brazil, que este trabalho escolheu as três redes sociais mais ativas para investigar suas ferramentas, a fim de refletir sobre as práticas de ensino na educação formal e como essas podem melhor integrar alunos nativos da cultura digital.

A Figura 1 traz a porcentagem de internautas brasileiros que declaram utilizar cada uma das redes sociais e estes dados estatísticos ajudaram a selecionar as plataformas Youtube, Facebook e WhatsApp como objetos de análise deste estudo.

Figura 1: Plataformas de mídia sociais mais ativas no Brasil

Fonte: Datareportal (2019).

Para a busca das ferramentas digitais com potencialidades educacionais, partiu-se da reflexão de que as redes selecionadas deveriam contribuir para que o professor assuma um papel de mediador e incitador das atividades desenvolvidas com suas turmas e que o aluno pudesse ser retirado da condição passiva, ganhando voz, para que o movimento de ensinar e aprender fossem provenientes de uma postura proativa de todos os sujeitos envolvidos.

Dessa forma, em convergências com os pensamentos de Lévy (1999; 2003; 2013), essas ferramentas devem beneficiar um processo que facilite a comunicação, que desburocratize a distribuição de informações e que a construção do conhecimento seja colaborativa.

Para a realização dessas buscas, no caso Youtube, seguiu-se os passos para criação de um canal, verificando então as ferramentas disponibilizadas pela plataforma. No Facebook, criou-se um grupo para também apurar a disponibilidades de ferramentas desse espaço virtual. Já para o WhatsApp, o levantamento de ferramentas disponíveis se deu pela visita ao site oficial do aplicativo.

Na próxima seção do artigo, serão apresentadas algumas dessas ferramentas, sugestões de uso e trabalho com essas redes nas práticas de ensino de educação formal.

A busca das ferramentas digitais e sugestões de práticas de ensino

YouTube

Desenvolvido por Chad Hurley, Steve Chen e Jawed Karim, o Youtube se consagrou como a maior plataforma de compartilhamento de vídeos, hospedando, ao longo dos anos, vários canais dos mais diversos temas, uma infinidade de filmes e documentários. Lançado em junho de 2005, para Burguess e Green (2009, p. 17)

o YouTube era um entre os vários serviços concorrentes que tentavam eliminar as barreiras técnicas para maior compartilhamento de vídeos na internet. Esse site disponibilizava uma interface bastante simples e integrada, dentro da qual o usuário podia fazer o upload, publicar e assistir vídeos em streaming sem necessidade de altos níveis de conhecimento técnico e dentro das restrições tecnológicas dos programas de navegação padrão e da relativamente modesta largura de banda. O YouTube não estabeleceu limites para o número de vídeos que cada usuário poderia colocar on-line via upload, ofereceu funções básicas de comunidade, tais como a possibilidade de se conectar a outros usuários como amigos.

Assim, com uma plataforma de descomplicado uso, fácil acesso e com enorme potencial colaborativo, os usuários realmente se apropriaram da mensagem trazida por seus fundadores. Além de materiais disponibilizados por grandes empresas, canais de TV e celebridades, o YouTube abriu a porta também para vídeos caseiros, facilmente compartilháveis em outras redes, sites e blogs. O resultado de anos de colaboração transita por humor, moda, culinária, música, tecnologia, dentre outras.

No campo das disciplinas do currículo escolar, há milhares de produções independentes, elaboradas por profissionais das mais diversas áreas. Dentro deste contexto, cabe considerar como o professor pode utilizar o conteúdo já disponível na plataforma e as ferramentas desta RSV com seus alunos?

No texto de Pechi (2011), disponibilizado pela revista Nova Escola, são propostas “8 razões para usar o YouTube em sala de aula” e apresentadas neste trabalho de forma breve:

  1. Oferecer conteúdo que sirva como recurso didático para as discussões em aula;
  2. Armazenar todos os vídeos que você precisa em um só lugar;
  3. Montar um acervo virtual de seus trabalhos em vídeo;
  4. Permitir que estudantes explorem assuntos de interesse com maior profundidade;
  5. Ajudar estudantes com dificuldades;
  6. Elaborar uma apresentação de slides narrada para ser usada em sala;
  7. Incentivar os alunos a produzir e compartilhar conteúdo; e
  8. Permitir que os alunos deixem suas dúvidas registradas. 

Com base nesses apontamentos e de visita ao site do YouTube, este trabalho oferece alguns pensamentos e algumas sugestões para práticas de ensino.

A proposta inicial é que o professor crie o seu próprio canal na plataforma, podendo naquele espaço perpetuar, de forma organizada, uma seleção de vídeos contendo materiais de própria autoria e de outros usuários, seu trabalho com as turmas e as produções dos seus alunos.

Ao utilizar o YouTube, o professor poderá levar o recurso audiovisual a sala de aula, para introduzir novos conteúdos, ilustrar fenômenos, mostrar experimentos e simulações. Propondo atividades em que grupos de alunos explorem a plataforma a procura de novos vídeos que posteriormente serão sugeridos ao restante dos colegas, auxiliando a compreensão e aprofundamento do tema.

O professor poderá criar uma playlist, que permitirá reunir dentro do seu canal listas de vídeos selecionados, garantindo conteúdos de qualidade, que poderão ser organizados na sequência desejada, por série e/ou matérias, que em momentos oportunos serão sugeridos à turma. Nos comentários, os alunos poderão debater, tirar dúvidas e sugerir novos materiais. Nos vídeos do canal, poderão ser propostos e criados links que relacionem os vídeos e conteúdos, direcionando uma leitura-aprendizagem para quem acessar o canal.

Como autorização do uso de imagem pelos responsáveis, pode-se criar um acervo com produções dos próprios alunos. Em uma prática que o professor propõe o tema e orienta atividade, os alunos tornam-se os protagonistas do processo. De acordo com a disciplina e matéria, o aluno pode representar um cientista realizando e explicando um experimento ou um jornalista noticiando um fato histórico. As ideias surgirão. Mas serão eles os responsáveis por produzir o roteiro, bons argumentos, por gravar e editar o vídeo. O acervo estará disponível, instruindo usuários e inspirando novos trabalhos.

Facebook

Criada em 2004, por Mark Zuckerberg, Dustin Moskovitz e Chris Hughes, a rede social virtual que é um fenômeno em número de usuários foi inicialmente pensada para fortalecer a interação entre discentes da Universidade de Harvard. Após sua rápida expansão para outras universidades, em fevereiro de 2006, abre suas atividades ao público com idade igual ou superior a 13 anos.

Devido à sua origem, a quantidade de usuários e as numerosas ferramentas desenvolvidas ao longo dos anos, o Facebook tornou-se um lugar do ciberespaço com diversas possibilidades, o que remete reflexões a outras maneiras de trabalho em práticas que promovam o ensino:

O Facebook é uma ferramenta de lazer que se tornou ao redor do mundo uma ferramenta política, empresarial e social e por que não educativa. O educador não pode deixar de acompanhar a evolução tecnológica, pois a mesma gera mudanças no perfil dos educandos que exigem cada vez mais um ensino dinâmico e provocador (Fumian; Rodrigues, 2013, p. 6).

Esta RSV disponibiliza uma ampla lista de ferramentas capazes de potencializar o ensino dinâmico. A recomendação é que o professor crie um grupo dentro da plataforma e que receba como membros somente os alunos da turma que desejam interagir.

O professor deve ser o administrador do grupo e, se quiser, pode escolher um ou mais alunos para ajudar na moderação desse espaço de trabalho. Os moderadores poderão autorizar solicitações de entrada no grupo, convidar membros, aprovar postagens e programá-las em datas estratégicas.

A Figura 2 ilustra a variedade de ferramentas digitais disponíveis para enriquecer as publicações, e este trabalho sugere algumas ações para que os professores as utilizem e estimulem o uso também por seus alunos.

Figura 2: Ferramentas digitais das publicações no Facebook

Fonte: Facebook(2019).

Na ferramenta foto/vídeo, é possível carregar arquivos como documentos, planilhas, PDFs e vídeos, possibilitando a disponibilidade fácil e rápida de materiais contendo instruções, conteúdos e atividades. Imagens que auxiliarão na contextualização das informações. Os memes tão populares nesta rede poderão ser compartilhados, ora favorecendo um momento de descontração, ora trazendo conceitos do conteúdo e os reforçando. Quando equivocados, o professor ou um aluno pode fomentar um debate que leve ao texto correto. 

Ao marcar amigos, a pessoa é notificada. Essa ferramenta é rica no auxílio das dúvidas, pois, por meio dela, o aluno pede ajuda diretamente ao professor ou a um colega. O processo pode ocorrer ao inverso, com os membros marcando em postagem alunos que demonstraram dificuldades durante a aula, levando a eles um novo material e a ampliação da discussão da temática.  

O Check-in é uma ferramenta em que os membros poderão fortalecer a interação, compartilhando experiências em eventos, mostrando visitas a parques, museus ou cidades. As enquetes podem ser criadas com diversas opções de respostas, podendo o respondente optar por mais de uma opção, de acordo com as configurações predeterminadas pelo autor da pergunta. Para enriquecer a atividade, em cada uma das opções, é possível anexar uma foto, arquivo ou gif. O autor da enquete pode programar a data da publicação, assim como o encerramento. Utilizando essa ferramenta, o professor poderá reforçar conceitos através de questões.

O resultado contribuirá para verificação da aprendizagem e com o diagnóstico poderá auxiliar nas estratégias de revisão e reforço de conceitos. Grupos de alunos, em atividades extraclasse, em alguns momentos que substituiriam o tradicional “para casa”, recebendo a tarefa de criar questões, inserindo-as na plataforma em forma de enquete, o que só seria possível através da revisão do conteúdo. Além de permitir momentos de descontração entre a turma. 

Ao marcar um evento, os membros poderão manter datas importantes na agenda do grupo. Por exemplo, sugerindo um filme na TV ou até mesmo uma estreia no cinema, marcando uma visita a museus ou exposições, frisando a data de uma prova ou apresentação de trabalho ou relembrando data e hora de encontros virtuais para estudos coletivos.

O Watch Party é uma maneira de professores e alunos assistirem juntos a vídeos, já gravados e disponíveis na plataforma ou a transmissões ao vivo. Uma vez que o Watch Party é iniciado, os participantes do grupo podem interagir através de curtidas e comentários, onde poderão adicionar fotos, gifs, emojis, além de contribuir com novos vídeos. O espaço deverá ser aberto a ponderações, dúvidas e dicas. Os participantes do Watch Party poderão “convidar” outros membros do grupo que receberão da plataforma uma notificação. Se aceitarem o convite, terão suas fotos exibidas no canto da tela. Os vídeos escolhidos pelo professor ou sugeridos pelos alunos e aprovados pelos moderadores poderão contribuir para os momentos de estudos coletivos e colaborativos.

A plataforma permite pedir recomendações de locais e serviços aos participantes através da página do grupo. É possível solicitar dicas de livrarias, sebos, biblioteca, museus, cinema, teatro, shows, dentre outros. O recurso permite inserir no mapa interativo as repostas dadas pelos outros membros.

Os gifs são um compilado de imagens compactadas que se repetem configurando uma animação. Um verdadeiro sucesso nas RSV, os gifs estão quase sempre atrelados ao humor. Mas o recurso também possui amplo repertório, disponível na internet, nos campos das ciências e tecnologias. A própria agência espacial estadunidense, National Aeronautics and Space Administration (NASA) possui um canal oficial de gifs que mostram fenômenos astronômicos, a rotina na Estação Espacial Internacional e a construção de telescópios, assim como informa seu site oficial. Para todo o campo da educação, há plataformas que disponibilizam diversos conteúdos ou ensinam passo a passo a criar o seu próprio GIF. Essa ferramenta é excelente para chamar a atenção do aluno e o inserir nas atividades.    

O membro que desejar organizar um encontro conta com a ferramenta que permite inserir a descrição, a data, hora e local. Pode ser utilizado, ainda, para grupos de estudos, passeios e excursões. O Facebook notifica os membros da aproximação do encontro.

Diante do grande número de ferramentas desta RSV, este trabalho corrobora o pensamento de Patrício e Gonçalves (2010, p. 598) quando dizem:

Em suma, o Facebook pode ser utilizado como um recurso/instrumento pedagógico importante para promover uma maior participação, interacção e colaboração no processo educativo, para além de impulsionar a construção partilhada, crítica e reflexiva de informação e conhecimento distribuídos em prol da inteligência colectiva.

WhatsApp

O aplicativo desenvolvido em 2009 pelo ucraniano Juan Koum foi concebido para ser uma simples e ágil ferramenta de troca de mensagens de texto de forma gratuita, uma alternativa ao então popular sistema de Short Message Service (SMS).

Ao longo dos anos, a plataforma recebeu atualizações e novos recursos. O site oficial do WhatsApp apresenta todos eles: a troca de mensagens de texto e de voz; as chamadas de voz e vídeos; o compartilhamento de fotos e vídeos (que pode ocorrer instantaneamente); envio de documentos (PDF, planilhas e apresentações); criação de grupos (configurando uma RSV de até 256 pessoas); WhatsApp web (sincronização das conversas com seu computador). Além de permitir que se anexem links, gifs, figurinhas e emojis.

O professor que optar por trabalhar com o WhatsApp pode criar ou pedir que algum aluno crie um grupo que, restrito a membros da mesma sala ou mesma série daquele ano, poderá centrar suas práticas e estratégias na mesma temática e temporalidade.

O WhatsApp, assim como o Youtube, permite a criação e compartilhamento de vídeos, como o Facebook, é possível anexar documentos, vídeos e links. É claro que, ao contrário do Youtube, o material fica restrito ao pequeno grupo e que a plataforma não possui tantas ferramentas como o Facebook, porém o WhatsApp se destaca pela eficiência do sistema de notificações de mensagens, dando agilidade nos processos em andamento.

É através dele que, com rapidez, pequenas dúvidas serão sanadas, o conteúdo da prova confirmado, vídeos serão sugeridos, as páginas do livro marcadas, aquele recado reforçado. Possibilitando um dinamismo às atividades fora de aula, além de incluir nas atividades o “distraído do dia” ou o aluno que precisou se ausentar.  

Instagram

Embora o Instagram ocupe o 4º lugar na preferência dos internautas brasileiros, e por isso não foi objeto de estudos deste trabalho, a pesquisa Digital in 2019 constatou que esta RSV foi a que apresentou a maior taxa de crescimento. Ou seja, foi ela que recebeu o maior número de novos membros no último ano. Essa informação deve manter atentos pesquisadores e professores que lidam com alunos mais jovens, pois são eles, os nativos digitais, os primeiros a ocuparem esses novos lugares. 

Considerações finais

O presente trabalho realizou uma busca por ferramentas digitais das três redes sociais mais ativas no Brasil no ano de 2019, a fim de refletir suas potencialidades em práticas de ensino. Para a busca e seleção dessas ferramentas, partiu-se do entendimento que elas deveriam favorecer práticas de ensino mais interativas com intencionalidade de aproximar o trabalho docente a alunos nativos da cultura digital. Dessa forma, refletiu o papel do professor como um condutor de um processo que favorece maior engajamento do aluno. O que se encontrou foi um farto arsenal de recursos que contribuem para a ampliação da comunicação e distribuição de informação, que dão ao aluno a possibilidade de colaborar e participar de maneira mais ativa na construção coletiva de significados.

Além disso, essas ferramentas podem auxiliar em algumas questões, que muitas vezes são difíceis de serem detectadas em uma sala de aula, seja pelo grande número de alunos ou pelo pouco tempo de contato semanal com as turmas. Todavia, na posição privilegiada de moderador nos espaços das RSV, o professor será capaz de observar melhor suas turmas e individualmente alguns de seus alunos. E, se julgar necessário, terá a oportunidade de realizar intervenções, de repensar algumas de suas práticas e de traçar outras estratégias.

Aqui se sugere a análise de três aspectos, mas se entende que o saber da vivência profissional de cada professor o levará a observar os espaços da RSV também de outras maneiras. Estes aspectos seriam: Comunicação do indivíduo, Interação do grupo e Material de estudos.

Tratando-se do indivíduo, a comunicação mostrará a capacidade de escrita e de elaboração de argumentos que expõem o envolvimento com o trabalho proposto e o nível de compreensão do tema. Na interação do grupo, habilidades específicas poderão ser expostas e utilizadas em prol de todos os sujeitos envolvidos, as dúvidas sendo colocadas, poderão atrair para o bate-papo aqueles que se identificam e aqueles que podem contribuir para saná-las. Já a disponibilidade de materiais de estudos, que vem sendo significativamente ampliada com a cultura digital, o professor, estando atento ao compartilhamento desses materiais, tem a oportunidade de conhecer novas fontes ou de realizar ressalvas e indicar fontes de melhor qualidade.  

Ao reunir neste estudo discussões e reflexões sobre três RSV, tem-se a intenção de contribuir para a decisão da escolha da plataforma e inspirar professores a ampliar as formas de emprego de suas práticas diante desse lugar que é um campo fértil para o trabalho docente. Acreditamos que o potencial das ferramentas aqui apresentadas ultrapasse em muito as ideias sugeridas,. e que a escolha da RSV e as formas de trabalho terão variáveis de acordo com a experiência do profissional, a faixa etária da classe, o seguimento de ensino, a disciplina ministrada e as sugestões dos alunos.

Como este trabalho limitou-se a uma investigação teórica, no futuro, gostaríamos que este estudo contribuísse para novas pesquisas aplicadas ao uso dessas ferramentas. Além de sugerir a pesquisadores interessados nesse campo, um trabalho sobre as potencialidades do uso pedagógico do Instagram, em ações que o professor possa interagir diretamente com suas turmas.  

Entendemos também que ainda há resistência de alguns profissionais à utilização pedagógica das RSV e uma preocupação em torno do acesso dos alunos a suas páginas pessoais. O professor, se preferir, pode utilizar as configurações de privacidade, limitando o acesso dos alunos a assuntos pessoais. Uma alternativa é criar páginas estritamente profissionais. No entanto, a decisão de utilizar as RSV em práticas de ensino deve ser uma decisão individual de cada profissional. Só dessa maneira um trabalho produtivo será realizado.

Por fim, cabe destacar que compreendemos que, utilizando as RSV como mais uma maneira de se relacionar com seus alunos, o professor poderá ampliar o espaço e tempo de sua sala de aula, depositando no smartphone de cada um deles uma aprendizagem móvel, flexível e interativa.

Referências

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Publicado em 24 de novembro de 2020

Como citar este artigo (ABNT)

SOUSA, Rana Rose Rico Martins Borges de. Potencialidades educacionais do ciberespaço: uma reflexão sobre a utilização das redes sociais virtuais em práticas de ensino. Revista Educação Pública, v. 20, nº 45, 24 de novembro de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/45/potencialidades-educacionais-do-ciberespaco-uma-reflexao-sobre-a-utilizacao-das-redes-sociais-virtuais-em-praticas-de-ensino

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