Valorizando as diferenças: vivências pedagógicas nos anos iniciais do Ensino Fundamental

Ramon Roberto de Jesus Barroso

Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação (UEPA)

Este relato de experiência descreve as observações, vivências e uma intervenção pedagógica realizada em uma turma de 3º ano do Ensino Fundamental de uma Escola Pública da Rede Municipal de Ensino do município de São Miguel do Guamá/PA.  As atividades desenvolvidas na turma fizeram parte do meu Estágio Supervisionado em Ensino Fundamental, componente curricular do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Universidade do Estado do Pará, no ano de 2019.

O estágio supervisionado é um importante momento em todos os cursos de graduação, pois, nesse momento, os futuros profissionais têm oportunidade de confrontar a teoria com as vivências práticas de sua área de atuação, fazendo uma reflexão e praticando aquilo que se aprendeu ao longo de sua formação. Segundo Chaves et al. (2012, p. 2),

o estágio tem como objetivo possibilitar o desenvolvimento de habilidades e competências e integrar teoria e prática, ele é o meio pelo qual o aluno pode observar e intervir no cotidiano [...] exercitando suas potencialidades.

Tratando-se da docência, o estágio é um dos primeiros momentos de imersão dos graduandos no ambiente escolar, que proporciona análises críticas sobre as práticas pedagógicas observadas em campo e, consequentemente, pensar em intervenções futuras sobre as realidades vividas. Nesse sentido,

o estágio supervisionado cumpre um papel importante na formação inicial docente, pois é o momento de imersão no ambiente escolar, este terá a possibilidade de confrontar a teoria às metodologias abordadas ao longo da graduação com a dinâmica que se expressa no interior das escolas públicas. Também proporciona pensar e repensar uma futura postura de intervenção como profissional no exercício da docência (Lima; Silva, 2015, p. 28).

Dessa maneira, no curso de Pedagogia, os estágios são realizados nos diferentes ambientes de atuação dos/as pedagogos/as, entre instituições formais e não formais de educação, em contato com diferentes práticas pedagógicas, o que favorece a construção de sua identidade profissional, ao vivenciar os desafios e a possibilidades de sua futura profissão.

O Estágio Supervisionado em Ensino Fundamental nos proporcionou vastas experiências, sendo uma etapa obrigatória para integralização do Curso de Pedagogia, apresentando diferentes concepções de práticas pedagógicas dessa etapa do ensino básico, como necessário para a nossa formação inicial.

Tratando-se dessa etapa da Educação Básica, o Ensino Fundamental, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação brasileira, Lei nº 9.394/96, objetiva um ensino que proporcione aos alunos:

I - O desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;

II – A compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;

III – O desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;

IV – O fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social (Brasil, 2014, p. 23).

O Ensino Fundamental se assenta na formação integral do aluno, com vistas a desenvolver não só práticas de leitura, escrita e cálculo, mas também voltado para que o/a aluno/a compreenda o mundo à sua volta e as relações nele estabelecidas, fortalecendo o vínculo familiar e os laços de solidariedade e tolerância para com o outro.

Nesse sentido, ao nos inserirmos nesse campo, objetivou-se conhecer o cotidiano das unidades que ofertam os anos iniciais do Ensino Fundamental e as práticas pedagógicas nelas existentes, bem como planejar propostas de intervenção para as realidades observadas e analisadas ao logo de nossas vivências, imergindo na construção de conhecimentos teórico/práticos em nossa formação inicial.

O lócus de estágio e as observações cotidianas

Mantendo a ética e o sigilo desse relato, optou-se por manter em anônimo o nome da instituição. A escola lócus de estágio foi fundada em 15 de março de 1983, com a finalidade de atender crianças da Educação Infantil do município, sendo situada no Bairro São Manoel, na cidade de São Miguel do Guamá, Estado do Pará.

Em 1985, a escola estendeu suas atividades pedagógicas para as séries iniciais do Ensino Fundamental, passando por um processo de modificação; assim, no ano de 1989, a Escola foi conveniada com a Secretaria Estadual de Educação e, em 2003, foi comprada pela Prefeitura, para que em 2004, sob o Projeto de Lei nº 044/04, passasse a ser denominada Escola Municipal de Ensino Fundamental.

Hoje, a instituição continua a desenvolver suas práticas educativas, visando ao alcance do aprendizado significativo de seus alunos, sempre inserindo a família nesse processo, no sentido de preservar a credibilidade conquistada perante a comunidade escolar, bem como a sociedade guamaense.

Atualmente, a escola possui seis salas de aula, uma sala da leitura, uma sala de informática, uma sala de AEE, uma sala de professores, uma para a secretária, uma para a diretoria, uma copa, seis banheiros, almoxarifado, área de circulação coberta e área de circulação livre. Em relação à quantidade de alunos, a escola tem 275 estudantes nos turnos da manhã e tarde, atendidos por 31 funcionários, entre professores, apoio e direção escolar.

Durante cinco semanas, observaram-se diversos aspectos, referentes aos espaços físicos da escola, o planejamento, a rotina dos alunos e as práticas pedagógicas desenvolvidas pela professora em uma turma do 3º ano do Ensino Fundamental que contém 20 alunos estudando no período vespertino.

Quanto aos espaços físicos, a escola possui uma infraestrutura pequena que comporta 6 salas de aula, e um pequeno espaço para recreação; observa-se que ela precisa de uma reforma para melhor atender seu público; a sala de aula observada tem uma boa estrutura, sendo climatizada, com bastante espaço e mobiliários adequados aos alunos, além de um cantinho da leitura que precisa ser mais bem aproveitado.

Em relação à rotina da turma, os alunos têm um momento de oração em conjunto com toda a escola; depois, ao adentrarem a sala, fazem uma dinâmica com a professora, onde podem escolher um abraço, um toque de mão ou uma dança - esse é um momento importante para aproximação da professora com os alunos.

Semanalmente, as turmas têm aulas de Educação Física, leitura e interpretação de texto, sendo uma professora para cada área, diferentes da professora titular.

Quanto ao planejamento dos conteúdos, ele acontece mediante a reunião entre os professores e a coordenação pedagógica, seguindo a matriz curricular proposta pela Secretária Municipal de Educação/Semed; os conteúdos são selecionados para cada bimestre, conforme a realidade da escola. Dessa forma, nessa etapa, observou-se que se enfatiza a Língua Portuguesa e a Matemática, pois os alunos estão em período de alfabetização. Porém, eles têm as outras disciplinas em seu currículo: Ciências, História, Geografia, Artes e Ensino Religioso.

As práticas pedagógicas desenvolvidas pela professora são, na maioria das vezes, voltadas para que os alunos saibam ler, interpretar e resolver as operações matemáticas; suas aulas são expositivas e dialogadas, utilizando o quadro e as conversas formais e informais, porém ela também utiliza as atividades lúdicas, como as dinâmicas, pinturas e desenhos, além da contação de histórias e leituras compartilhadas.

A turma possui alunos público-alvo da Educação Especial, que fazem acompanhamento no Atendimento Educacional Especializado/AEE, além de ser uma turma com grandes diferenciações quanto à raça, condição social, religião e gênero, justificativa para que se criasse a proposta de intervenção seguinte.

A proposta de intervenção pedagógica

O público-alvo da intervenção foram os/as 20 alunos/as da turma de 3º ano da escola lócus de estágio, ressaltando que todos que estavam presentes participaram com empenho da atividade proposta, a metodologia consistiu de uma roda de conserva, elaboração de escrita e desenhos, além da confecção de um mural, como está detalhado a seguir.

Diante das vivências e observações, pensando na diversidade de alunos atendidos nessa turma e nos objetivos da LDB 9394/96, para essa etapa de ensino, organizou-se um plano de intervenção voltado para a discussão sobre o respeito às diferenças; com isso,  o objetivo foi promover uma atividade que contribuísse para a valorização da identidade de cada aluno/a e, consequentemente, para o respeito às diferenças existentes nas demais pessoas, onde  se pudesse falar da construção da nossa identidade, das características físicas, étnicas e pessoais de cada ser humano, sobre autoestima, respeito e  tolerância.

A metodologia consistiu em uma roda de conversa com os alunos e alunas, mostrando imagens de diferentes pessoas; em seguida, questionou-se quais as diferenças vistas de uma pessoa para outra? Os alunos e alunas versaram sobre a cor da pele, o cabelo, as condições físicas, a etnia, a idade, além de destacar sobre quais imagens se pareciam com a sua e sobre as situações de preconceito que sofreram ou sofrem na escola devido às suas características.

Figura 1: Roda de conversa

Em seguida, conversamos brevemente sobre a etnia de cada pessoa e sobre a importância de respeitar as diferenças entre os seres humanos; depois, os alunos escreveram seu perfil, descrevendo suas principais características físicas e pessoais, tais como sua cor, gênero, idade, altura, atividades preferidas, etc., e, em seguida, desenhando uma imagem de si.

Figura 2: Os alunos escrevendo seu perfil e fazendo representações de si

No último momento, em conjunto, os alunos fizeram um mural com seus desenhos, para que pudessem compreender a diversidade existente na sociedade e a importância da valorização de si e do outro, como essencial para a construção de uma sociedade mais justa e igual para todos e todas.

Figura 3: Mural com os desenhos feitos pelos/as alunos/as

Por meio da atividade, o resultado obtido foi satisfatório na medida em que houve a participação dos alunos e alunas da turma, enfatizando que este momento se caracterizou como um momento inicial de reflexão e escuta, onde esses sujeitos puderam externar um pouco sobre seus pensamentos, suas representações e estabelecer um diálogo de valorização da diversidade.

Algumas considerações

Ao imergirmos nas observações no campo do estágio, vivenciando e refletindo sobre o cotidiano da sala de aula, confrontamos as teorias estudadas ao longo de nossa formação com a prática cotidiana, compreendendo que essa relação teoria e prática são indissociáveis, e a ausência dela prejudica a construção de nosso conhecimento.

Reflete-se que é necessária, cada vez mais, a valorização da Escola Pública para que proporcione uma Educação de qualidade para todas as pessoas, assim, como a valorização da docência, para a efetivação de um ensino que, de fato, sirva como aprendizagem significativa para seus alunos e alunas.

Conclui-se que, enquanto docentes, é essencial a valorização das diferentes identidades dos alunos e alunas para que a escola se torne um ambiente de todos e todas, com vista ao apreço, tolerância a pluralidade de pensamento contidos na LDB nº 9.394/96. Intervenções pedagógicas que trazem à baila a propostas da diversidade são importantes para que o aluno valorize a si e respeite o outro.

Referências

BRASIL. LDB: Lei de diretrizes e bases da educação nacional [recurso eletrônico]. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. 10ª ed. Brasília: Câmara dos Deputados/Edições Câmara, 2014.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular: versão final. Brasília: Ministério da Educação, 2017. Disponível  em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wpcontent/uploads/2018/06/BNCC_EI_EF_11 0518_versaofinal_site.pdf.

CHAVES I. C. G. et al. A importância do estágio na formação de professores. In: SEMANA DE PEDAGOGIA DA UEM. Anais... V. 1, nº 1. Maringá: UEM, 2012. Disponível em: http://www.ppe.uem.br/semanadepedagogia/2012/pdf/T2/T2-003.pdf.

LIMA, M. do S. L.; NASCIMENTO, A. M. do. As raízes do estágio curricular supervisionado: fundamentos que sustentam suas práticas. In: ALBUQUERQUE, Jacirene Vasconcelos de et al. (Orgs.). O estágio na formação do pedagogo: reflexões e vivências. Belém: EdUEPA, 2015.

Publicado em 08 de dezembro de 2020

Como citar este artigo (ABNT)

BARROSO, Ramon Roberto de Jesus. Valorizando as diferenças: vivências pedagógicas nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Revista Educação Pública, v. 20, nº 47, 8 de dezembro de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/47/valorizando-as-diferencas-vivencias-pedagogicas-nos-anos-iniciais-do-ensino-fundamental

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