Divulgação científica no Ensino Médio: experimentação utilizando argilas modificadas

Júlio César de Oliveira Ribeiro

Licenciado em Química (UEG - Câmpus Central)

Renato Rosseto

Doutor em Ciências. Professor universitário (UEG - Câmpus Central)

Atualmente vivemos em um cenário de crise ambiental crescente, sendo trazidas com frequência notícias sobre queimadas, desastres com barragens e principalmente poluição de águas. Sabe-se que esses problemas causam grandes impactos negativos à vida dos ecossistemas e que são reflexo de erros causados por várias gerações. Dessa forma, cabe a todos discutir e buscar formas de remediação ou preservação para reduzir os impactos causados por condutas errôneas.

Uma das principais preocupações ambientais está na qualidade dos recursos hídricos, que tem diminuído nas últimas décadas devido à poluição e ao consumo desenfreados. Diversas atividades antropogênicas domésticas, industriais e/ou comerciais podem gerar poluentes específicos, acarretando diferentes impactos na água e nas formas de vida que entram em contato com ela (Haseena et al., 2017).

A contaminação da água pode acontecer de diversas formas: mudanças em teores de nutrientes e temperatura, presença de metais pesados, variações de pH, toxinas não metálicas, produtos farmacêuticos e componentes orgânicos como corantes, entre outros. A adição dessas substâncias altera as características químicas, físicas e biológicas da água (Haseena et al., 2017).

Dessa forma é necessário o desenvolvimento de métodos para mitigar a contaminação dos recursos hídricos; porém para que isso seja possível o conhecimento científico é de extrema importância.

O acesso ao conhecimento científico pela sociedade é hoje um fato considerável e desejável em países democráticos. A divulgação desse conhecimento para o público leigo teve origem na Europa do século XV, com a própria ciência moderna. O início foi marcado por muita repressão e preconceito, mas aos poucos ganhou-se reconhecimento e espaço (Mueller; Caribé, 2010).

Corantes e indústrias têxteis

Nos dias de hoje, contaminações orgânicas de diversas fontes tornaram-se preocupação global por causa de seus impactos na saúde pública. Em particular, corantes orgânicos poluentes e as indústrias têxteis receberam grande atenção devido ao aumento do risco ambiental quando são descartados em água, que não só podem causar problemas estéticos como também exibem alta toxicidade e potenciais efeitos mutagênicos e carcinogênicos (Ai et al., 2011).

Corantes e pigmentos podem permanecer no meio ambiente por longos períodos de tempo, pois são fabricados para serem resistentes à biodegradação; dessa forma, é necessário tratamento adequado. Por exemplo, o corante Reactive Blue 19, quando hidrolisado, leva cerca de 46 anos para ser degradado a pH 7 e 25ºC (Hao; Kim; Chiang, 2000).

Além dos corantes, outros contaminantes podem estar associados à indústria têxtil, como fenóis etoxilados (presentes em detergentes e umectantes), e agentes sequestrantes, como os ácidos etilenodiaminotetracético (EDTA) e dietilenotriaminopentacético (DTPA); essas substâncias podem estar associadas a distúrbios na reprodução de espécies aquáticas. Fica evidente o impacto das indústrias têxteis em questões ambientais (Hao; Kim; Chiang, 2000).

Nos últimos tempos, a conscientização e a rigidez das regras ambientais vêm aumentando; com isso, o desenvolvimento de tecnologias para tratamento de águas e efluentes tem sido de grande interesse (Palaniappan et al., 2010). As principais técnicas disponíveis na literatura para descoloração das águas de rejeito envolvem principalmente processos de adsorção, precipitação, degradação química, eletroquímica e fotoquímica, biodegradação entre outros (Mahjoubi et al., 2017).

Entre esses métodos, o processo de adsorção é uma das técnicas mais eficazes empregadas com sucesso para remoção de corantes por possuir baixos custos, mais eficiente e menos susceptível de gerar resíduos secundários. Sistemas convencionais de adsorção usam carvão ativado, apesar de seus altos custos de produção e dificuldade de regeneração. Vários adsorventes de baixo custo foram investigados na remoção de corantes, tais como resíduos agrícolas, resíduos de construção, quitosana, sílicas, alguns biosorventes naturais. No entanto, esses materiais geralmente têm baixa capacidade de adsorção e, portanto, são necessárias grandes dosagens do adsorvente para obter baixa concentração dos corantes em efluentes tratados (Mahjoubi et al., 2017).

Com base nessa perspectiva, o desenvolvimento da Química de materiais e nanotecnologia permitiu aos pesquisadores desenvolver vários materiais com propriedades funcionais. Muitos dos nanocompósitos sintetizados possuem propriedades atraentes e únicas que os tornam candidatos em potencial para aplicação em cuidados para a saúde, armazenamento e conversão de energia e remediação ambiental (Chen et al., 2016; Gu; Atherton; Xu, 2015).

Hidróxidos duplos lamelares

As argilas modificadas possuem uma variedade de propriedades e aplicações, o que as torna materiais interessantes para a remoção de corantes orgânicos em meio aquoso. Os hidróxidos duplos lamelares (HDL), também conhecidos como argilas aniônicas, estão entre os materiais lamelares mais estudados. Os HDL são formados por lamelas carregadas positivamente contendo ânions e água na região interlamelar (Yu et al., 2017).

A formula geral do HDL é representada por [M2+1-XM3+X(OH)2]x+[Ap-x/p]x+.mH2O, sendo M2+ e M3+ cátions metálicos divalentes e trivalentes, respectivamente; An-, o ânion interlamelar; e X = M3+/(M2+ + M3+), a carga da superfície, determinada pela relação dos dois cátions metálicos. A representação da estrutura dos HDL é apresentada na Figura 1 (Lemes, 2018).

Os HDL mostram-se como ótimos candidatos quando empregados na remoção de corantes do tipo azo, moléculas conhecidas pela presença de dupla ligação entre nitrogênios. De acordo com Ai, Zhang e Meng (2011), a remoção do alaranjado de metila utilizando HDL se mostrou bastante eficiente. A adsorção do corante ao HDL é altamente dependente do pH. Segundo esse estudo, o HDL pode ser usado como como um potencial adsorvente para remoção de corantes aniônicos em águas contaminadas.

Figura 1: Representação esquemática da estrutura dos hidróxidos duplos lamelares (HDL).

Fonte: Lemes (2018).

Fala-se muito sobre questões ambientais e possíveis tecnologias para a remediação e/ou preservação do meio ambiente. Porém esse tipo de informação normalmente não é assimilado de maneira trivial pela população em geral, o que limita a compreensão da extensão real da problemática envolvendo contaminantes. Acreditamos que a popularização da ciência por meio da experimentação em sala de aula no Ensino Médio possa ser uma maneira profícua de transmitir e divulgar conhecimentos científicos relevantes, em que o aluno cidadão tenha capacidade de analisar criticamente as relações entre a sociedade, a ciência e a tecnologia, podendo assim redimensionar a influência da sociedade em temas relevantes (Moreira; Massarani, 2002).

Divulgação científica

A ideia de que se deve ter maior integração entre a ciência e a sociedade é um sentimento que vem se tornando cada vez mais forte entre pesquisadores e os responsáveis pela implementação de políticas públicas. Apesar do consenso entre vários discursos de pesquisadores, políticos, iniciativas de órgão de fomento – como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e de fundações de amparo à pesquisa dos estados (FAPs), ocorrem muitas divergências nesses diálogos sobre como deve ocorrer, o público-alvo enfocado e quem deveria se encarregar dessa tarefa (Kellner, 2013).

É possível afirmar que grande parte dos produtos tecnológicos é feita de modo que os seus usuários não precisam conhecer os métodos científicos em que se baseiam para poderem utilizar. Além disso, milhões de pessoas vivem suas vidas normalmente mesmo com a falta de conhecimento sobre ciência; isso não acarreta aparentemente limitações em suas vidas. Fica então a indagação, da real necessidade de se promover alfabetização científica (Magalhães; Silva; Gonçalves, 2012).

Existe uma necessidade cultural de ampliar o universo de conhecimentos científicos, tendo em vista que convivemos de maneira mais próxima com a ciência e seus produtos tecnológicos. Há um grande interesse em aumentar o nível de entendimento público da ciência, não só como interesse de prazer intelectual, mas também para o aumento do seu desenvolvimento. Nessa perspectiva, o letramento científico não tem como objetivo formar futuros cientistas, embora essa visão possa contribuir para que aconteça. O objetivo é tomar os conceitos científicos apresentados com cuidado, discutindo, compreendendo seus significados e aplicando para o entendimento do mundo (Lorenzetti; Delizoicov, 2001).

Constata-se que, sozinha, a escola não consegue garantir um letramento científico aos seus alunos. Apesar de possuir seu papel, as escolas não têm condições de proporcionar aos seus alunos as informações científicas necessárias para que eles possam compreender o mundo e os fenômenos ocorridos no dia a dia. Dessa forma, os cursos e disciplinas não podem oferecer conhecimento suficiente aos cidadãos para que eles possam compreender o mundo e suas mudanças, a fim de que assim possam participar das tomadas de decisão e questões políticas relacionadas à ciência e às tecnologias (Cazelli, 1992).

Segundo Chassot (1993), existe uma leitura diferente do mundo que é possibilitada às pessoas a partir do conhecimento químico. Com o conhecimento científico em mãos, cada pessoa pode ter um lugar e atuar de forma significativa modificando a natureza e a si mesma. Dessa forma, os indivíduos podem interagir de forma mais ativa e consciente na sociedade. Graças às alterações que o ser humano promove na natureza devido ao conhecimento tecnológico, essa natureza se apresenta ao homem de formas muito diferentes, possuindo uma gama de possibilidades (Maldaner; Piedade, 1995).

Diante do exposto, este trabalho teve como objetivo levar para uma sala de aula do 2° ano do Ensino Médio de uma escola pública uma linha pesquisa utilizada no meio acadêmico de forma simples e contextualizada, levantando discussões sobre questões ambientais e temáticas científicas, com um experimento que utiliza hidróxidos duplos lamelares (HDL) para remoção de corantes em água.

Metodologia

A pesquisa utilizada neste trabalho é de caráter qualitativo, envolvendo uma série de aulas ministradas, aplicação de questionários e realização de experimento. O trabalho foi desenvolvimento em uma turma de 25 alunos de forma presencial em uma escola pública situada na cidade de Anápolis/GO no ano de 2019. Foram realizadas sete aulas de 50 minutos; as atividades foram organizadas de acordo com o Quadro 1.

Quadro 1: Organização das atividades para a execução da proposta

Cronograma

Atividade desenvolvida

Objetivo

Aulas 1 e 2

Apresentação do projeto aos alunos

Interagir e apresentar a proposta aos alunos

Aplicação do questionário inicial

Identificar os conhecimentos dos alunos sobre a temática

Aulas 3 e 4

Comentários sobre as questões do questionário

Promover uma discussão sobre o tema e explicar alguns conceitos

Levantamento de produtos e compostos que possam ser contaminantes de efluentes

Observar se os alunos conhecem compostos contaminantes de águas

Aula 5

Realização do experimento da remoção do corante

Instigar a curiosidade dos alunos e demonstrar na prática a remoção de contaminantes

Aula 6

Aula expositiva dialogada

Explicar como funciona o adsorvente e os conceitos envolvidos na remoção do corante

Aula 7

Encerramento do projeto e aplicação do questionário final

Continuar as discussões sobre pesquisas científicas e identificar o nível de assimilação dos alunos em relação aos temas discutidos durante a aplicação do projeto

Em pesquisas qualitativas, o questionário é o instrumento mais utilizado para obter dados; sendo assim, após apresentada a proposta de trabalho aos alunos, foi aplicado um questionário inicial contendo nove perguntas, como demonstrado no Quadro 2. Esse questionário teve como objetivo identificar as percepções dos alunos em relação ao tema abordado.

Quadro 2: Questionário inicial (QI) aplicado

Identificação da questão

Questão

QI1

Para você o que é ciência?

QI2

Na sua opinião, o que um cientista faz e qual sua importância na sociedade?

QI3

Você tem interesse em ser cientista? Por quê?

QI4

Você conhece algum tipo de pesquisa científica? Se sim, qual?

QI5

Você gosta de Química? O que você relaciona à palavra “Química”?

QI6

O que você entende por cinética?

QI7

O que é uma interação química? Cite um exemplo.

QI8

Cite pelo menos três resíduos industriais que são descartados em água (rios, oceanos etc.).

QI9

Você pretende fazer algum curso superior? Se sim, qual?

Na terceira aula, foi realizado o experimento da remoção do corante alaranjado de metila (AM) em solução aquosa utilizando o hidróxido duplo lamelar (HDL). Usando 100 mL de uma solução de AM 10 mg L-1 e 10 mg do HDL derivado de Zn/Al calcinado, conforme descrito na literatura (Khan et al., 2009; Lemes, 2108). A solução foi deixada em uma chapa sob agitação até que adquirisse aparência incolor e transparente. O sistema montado pode ser observado na Figura 2. Concomitantemente ao experimento, foram promovidas discussões com os alunos sobre métodos de remoção de contaminantes, utilizando exemplos contextualizados, como filtros utilizados em casa compostos por velas e carvão ativado.

Figura 2: Realização do experimento de remoção do alaranjado de metila com o HDL Zn/Al

Na última aula, continuou-se com algumas discussões e ao final foi aplicado o segundo questionário (Quadro 3), contendo cinco questões, a fim de identificar se houve assimilação do tema por parte dos alunos.

Quadro 3: Questionário final (QF) aplicado.

Identificação da questão

Questão

QF1

Após as aulas juntamente com o experimento, houve alguma mudança na sua percepção em relação à Química?

QF2

Você consegue ver importância da Química para a sociedade? Justifique

QF3

É importante que sejam desenvolvidas pesquisas para descontaminação de água? Por quê?

QF4

Na sua opinião, é mais fácil assimilar o conteúdo quando há experimentos durante a aula? Por quê?

QF5

Sabendo da importância da ciência para a sociedade, você teria interesse em realizar algum tipo de pesquisa? Se sim, o que gostaria de pesquisar?

Ambos os questionários contaram com questões simples, todas elas abertas. As respostas obtidas foram transcritas integralmente sem correções; os erros de ortografia e gramática foram mantidos para não perder a originalidade da pesquisa.

Análise do Questionário Inicial (QI)

As questões envolveram perguntas sobre ciência em um contexto social, conhecimentos básicos em Química e uma questão no contexto ambiental. Dessa forma, não foi observada abstenção para as questões: 100% dos alunos responderam as nove questões propostas no QI, porém grande parte das respostas não foi satisfatória, devido em parte ao nível de conhecimento demonstrado pelos alunos.

Para QI6 e QI7, esperavam-se respostas coerentes com os questionamentos, uma vez que os conteúdos abordados fazem parte dos currículos dos 1º e 2º anos do Ensino Médio, já cursados pelos alunos na etapa da aplicação do questionário. Entretanto não houve um bom índice de respostas satisfatórias. Na QI6, o aluno A1 escreveu: “Não entendo nada, esqueci”. Dessa mesma forma, grande parte dos alunos apresentou respostas como “não sei”, “nada”, “esqueci”, e outros poucos relacionaram o conceito de cinética ao conceito visto em Física, que nos remete a movimento, como A4: “Energia de movimento”. Nesse mesmo contexto, foram observadas poucas respostas relacionando cinética à Química propriamente dita, podendo destacar A15, que respondeu: “É a parte da Química que estuda as velocidades das reações”.

Respostas como “não sei” para QI7 foram de praticamente 100%; nenhum aluno apresentou algum tipo de resposta válida, como o aluno A1, que respondeu: “São quando opostos se atraem tipo gelo e fogo. Não sei”. Sendo assim, foi possível observar que todos esses alunos possuem grandes dificuldades em conceitos básicos relacionados a ciências.

Quando foi perguntado aos alunos se gostam de Química, 50% responderam que sim, mas que possuem dificuldade em aprender. Os outros 50% que responderam não gostar alegam que o motivo é a não compreensão do conteúdo, podendo ser destacadas as respostas dos alunos A1: “Gostar gostar não porque meu raciocínio dura uns dois minutos, mas me interessa bastante tudo que envolve Química’’, e A13: “Quando eu a compreendo sim”.

Outro ponto interessante a se observar é a percepção sobre Química por eles. Grande parte dos alunos a relaciona a ácidos e bases, tabela periódica, nêutrons, moléculas etc., pois essa é a visão da Química que vem sendo disseminada para os alunos nesse contexto do Ensino Médio, sugerindo que os professores focam apenas em cumprir o conteúdo programático, sem contextualizar nem relacionar as ementas a temas atuais envolvendo Química e ciências em geral, o que é reforçado por Lima et al. (2000) quando diz que o modelo atual de ensino de Química não traz discussões de aspectos conceituais, preocupando-se apenas com memorização de equações matemáticas e definições, fazendo com que o aluno não consiga relacionar a Química ao que ocorre em seu cotidiano.

Nesse contexto, não se esperava que os alunos tivessem conhecimentos específicos sobre pesquisas científicas, o que foi perguntado na QI4. Cerca de 50% dos alunos responderam não conhecer nenhum tipo de pesquisa, 20% disseram conhecer pesquisas para desenvolver a cura do câncer, resposta que pode estar relacionada à grande incidência da doença, que é sempre citada nos meios de comunicação.

Entre os outros 30%, houve respostas variadas, mas sem muita especificidade, como A1, que respondeu: “Sim. A umas semanas estava vendo um estudo de peixe para saber a idade deles”. Também com a resposta de A15: “Pesquisas sobre teorias, indústrias, ou até mesmo como as coisas funcionam”.

Nota-se então que, mesmo com os variados meios de acesso à informação, o conhecimento científico não chega de forma satisfatória a esses alunos, demonstrando que o conhecimento gerado pela ciência não vem sendo transmitido de maneira que as pessoas possam compreender. Segundo Lorenzetti e Delizoicov (2001), as informações chegam de diferentes fontes, mas são necessários especialistas para popularizar e desmistificar o conhecimento científico de forma que os cidadãos possam compreender e utilizá-lo em seu cotidiano.

No quesito ambiental, perguntado na QI8, observa-se que os alunos não conseguiram responder de forma objetiva sobre os tipos de resíduos que são descartados em águas; apenas um aluno conseguiu citar três exemplos, A11: “Remedios, petroleo, produtos de limpeza”. A grande maioria cita petróleo como resíduo descartado, podendo ser relacionado também a notícias na mídia sobre vazamentos de petróleo. Isso indica que os conhecimentos sobre poluentes e contaminantes dos alunos ainda é bastante superficial.

Nenhum dos alunos cita corantes, compostos que se encaixam na categoria de contaminantes emergentes e têm atraído muita atenção entre todos os compostos químicos utilizados, devido ao seu alto potencial de poluição (Arslan-Alaton; Gursoy; Schmidt, 2008).

Análise do Questionário Final (QF)

Baseando-se em alguns dados obtidos pelo Questionário Inicial e pela perspectiva passada pela turma, as aulas seguintes foram realizadas tentando mostrar aos alunos a relação entre Química, ciência, problemas ambientais e os conteúdos vistos. Dentro dessa perspectiva, foi possível perceber que os alunos se mostram mais interessados em discussões diferentes do que em uma aula comum, em que apenas o professor tem a fala e o aluno somente copia o conteúdo. Os alunos querem participar, querem falar e ser ouvidos, não querem ficar apenas escutando o professor, o que já foi relatado por Santos (2003, p. 12).

Quando foi realizado o experimento, notou-se que a curiosidade dos alunos foi despertada, surgindo vários tipos de dúvidas e questionamentos relacionados à aula, o que a deixa mais dinâmica, havendo também maior interação da turma com o professor.

Partindo para a análise do questionário final, na QF1 foi perguntado se a percepção dos alunos havia mudado após as aulas e a realização do experimento. A grande maioria, 90% dos alunos, comentou que sim; segundo A1, “Sim, passei a considerá-la mais importante, tanto para mim quanto para a sociedade”. O aluno A3 respondeu: “Sim. Comecei a me interessar em pesquisas e afins, porem antes, eu estudava sem motivo”. Esse tipo de resposta reafirma a ideia de que a Química vem sendo passada sem nenhum objetivo claro, em que o aluno está em sala de aula apenas por obrigação, para cumprir o currículo da disciplina.

Dentre os alunos que responderam não ter mudado a percepção, o motivo foi por não conseguir compreender de forma alguma a Química, como A8: “Não, literalmente eu não entendo Química”. Nesse contexto é normal, pois os alunos possuem diferentes formas de compreender o conteúdo, alguns possuem mais dificuldade que outros. Segundo Miranda e Costa (2007), a ênfase dada à transmissão de conteúdos desvinculados do cotidiano e à memorização de fatos, símbolos, nomes e fórmulas tem influenciado negativamente na aprendizagem dos alunos, visto que deixa de lado a construção do conhecimento científico. Essa prática faz com que os alunos não consigam estabelecer correlações entre o que é estudado, o meio em que estão inseridos e as suas próprias vidas (Miranda; Costa, 2007).

Mesmo havendo alunos que responderam não mudar de opinião sobre gostar de Química, quando perguntados na QF2 se conseguiam ver a importância da Química para a sociedade, todos responderam que sim. Alguns apresentaram respostas simples, como o aluno A1, que no QI afirmou não gostar de Química: “Sim, por ajudar as pessoas a resolver problemas que talvez sem a Química não teria solução”. Nessa perspectiva, um dos objetivos do trabalho foi alcançado –demonstrar a importância da Química como ciência.

Com a QF3, percebeu-se que os alunos também não conseguiram elaborar uma resposta bem estruturada, porém todos possuem a noção de que a água é um recurso indispensável para a vida e que se deve incentivar investimentos para seu tratamento. A2: “Sim. A água é importante, sem ela morreriamos, e as pesquisas em eliminar os resíduos é completamente importante”. A10: “Sim, porque a água do planeta está acabando então é necessário sim fazer o tratamento da água”.

Quando é perguntado aos alunos sobre experimentação, 100% afirmam ser mais fácil compreender o conteúdo quando algum experimento está envolvido. A6: “Sim, porque a gente faz na pratica o que está estudando, e se torna uma aula interessante”. A10: “Sim, acho interessante, diferente, pois se torna algo que chama a atenção para o aprendizado e de uma forma divertida”. A15: “Muito mais fácil, a compreensão, o entendimento, penso que como eu vários dos meus colegas tem dificuldade em relação a Química, na pratica aprendemos mais”. Giordan (1999) afirma que a experimentação tem a capacidade de despertar o interesse dos alunos, aumentando a capacidade de aprendizagem; a construção do conhecimento é alcançada majoritariamente quando está associada a atividades investigativas.

Seguindo a análise do questionário, podemos avaliar a QF5 relacionando-a à QI3. Na pergunta do Questionário Inicial, 75% dos alunos responderam que não tinham interesse em ser cientistas, muito menos realizar algum tipo de pesquisa. Após as aulas juntas com o experimento, essa visão mudou: 80% responderam ter se interessado em realizar algum tipo de pesquisa. A12: “Sim, para ajudar o mundo”. A14: “Gostaria de estudar a parte medicinal para que pessoas com câncer não sofram tanto para que esse câncer venha ter a cura”.

Considerações

Inicialmente, pode-se perceber a baixa motivação dos alunos frente a temas relacionados a ciências e tecnologias, tornando-se mais evidente o desinteresse por questões pertinentes a conteúdos de Química. Porém, durante a execução do trabalho, constatamos que:

i) os alunos demonstram interesse em aprender quando são expostos a novas experiências; e

ii) a maioria dos estudantes julga as aulas tradicionais como tediosas e sem propósito, o que cria obstáculos para não participar nem sentir vontade de aprender.

Um ponto importante a ser destacado se dá em relação à condução de atividades experimentais em escolas públicas. A sobrecarga de trabalho dos professores, bem como a montagem e a supervisão de experimentos de forma segura e responsável, são situações que podem dificultar a realização de aulas práticas, visto que muitas escolas não contam com técnicos ou infraestrutura de laboratório adequada. Entretanto, experimentos direcionados, mesmo em menor complexidade experimental como proposto neste trabalho, tendem a ser bastante promissores, pois colocam o aluno frente a diversas realidades, saindo do contexto de sala de aula tradicional.

Vistas todas as situações (limitações e superações) encontradas e abordadas, os resultados apresentados aqui se mostraram bastante alentadores, uma vez que se constatou uma mudança positiva acentuada na postura dos alunos no decorrer das aulas. Dessa forma, propostas dessa natureza devem ser valorizadas e levadas com maior frequência para as salas de aula, buscando maior interação entre os alunos e temas relacionados a ciências e suas tecnologias.

Referências

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Agradecimentos

À Universidade Estadual de Goiás pelo Programa de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic/UEG), Pivic/UEG, Pró-Programas PrP/UEG.

Publicado em 06 de abril de 2021

Como citar este artigo (ABNT)

RIBEIRO, Júlio César de Oliveira; ROSSETO, Renato. Divulgação científica no Ensino Médio: experimentação utilizando argilas modificadas. Revista Educação Pública, v. 21, nº 12, 6 de abril de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/12/divulgacao-cientifica-no-ensino-medio-experimentacao-utilizando-argilas-modificadas

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