O lúdico no processo de aprendizagem na Educação Infantil

Juli Rodrigues Duarte

Pedagoga (UENF/Consórcio Cederj)

Edimilson Antônio Mota

Professor doutor (UFF – Campos dos Goytacazes)

Na Educação Infantil, a utilização de jogos e brincadeiras em aulas, possibilita compreender o desenvolvimento da criança pela forma e pela linguagem lúdica específicas da infância. É primordial conhecer o significado de brincar e conceituar os termos principais utilizados sobre o brincar para interpretar o universo lúdico e reconhecer os elementos básicos da ludicidade, pelos quais a criança se comunica com o seu mundo pessoal e com o outro.

O ato de brincar é uma forma de comunicação em que a criança tem a oportunidade de reproduzir o seu cotidiano através da linguagem lúdica. Brincar possibilita a aprendizagem e facilita a construção da autonomia, da reflexão e da criatividade; e pode também estabelecer uma relação ao se utilizar jogos pedagógicos que promovam o desenvolvimento físico, cultural, social, afetivo, e cognitivo da criança. É preciso que tanto a família quanto a equipe escolar reconheçam que a ludicidade se impõe necessária no cotidiano na infância.

Para subsidiar teoricamente este trabalho, citamos Vygotsky (1998), que defendeu a ideia que o educador poderá fazer o uso de jogos, brincadeiras, histórias e outros mecanismos para que através do lúdico a criança possa se sentir desafiada a pensar e a resolver situações-problemas, e, se assim for, as regras aplicadas nas brincadeiras podem imitar as regras utilizadas no mundo social dos adultos. Nesse mesmo sentido, citamos também Oliveira (1997), que diz que a aprendizagem nada mais é do que um processo pelo qual o indivíduo adquire informações, atitudes, habilidades, valores etc., e, complementando o seu pensamento, vão ao encontro da sua abordagem (Kishimoto, 2003; Almeida, 2000; Santos, 1999).

Na Educação Infantil a criança tem contato diretamente com o meio escolar, e esse meio é orientado por um currículo específico para essa faixa etária. Para os anos iniciais o programa curricular aborda os fundamentos do desenvolvimento humano na infância. A natureza da escola é político-pedagógica e como tal objetiva promover uma aprendizagem que contribua para a socialização da criança que, aprende brincando e ao brincar não está apenas se divertindo e sim desenvolvendo uma série de habilidades que vão auxiliar em diversos aprendizados o ato de brincar envolve utilização dos sentidos. Por trás de si deve haver orientação pedagógica que objetive expressar as significações produzidas pela criança e seus pares. Através da brincadeira a criança consegue extravasar suas tristezas, alegrias, angústias, entusiasmos, passividades e agressividades.

Nesse contexto pedagógico, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) aponta que a escola é um ambiente propício para o desenvolvimento social e cognitivo da criança (Brasil, 1998). A concepção de infância é historicamente recente (Ariès, 1981). Portanto, faz-se necessário compreender a importância do brincar, que é um dos principais elementos marcadores desta fase.

A pesquisa nasceu da inquietude da graduanda em Pedagogia pela UENF/Cederj em EaD, do Polo São Fidélis, que, com base na sua formação teórica, buscou entender a contribuição do lúdico no desenvolvimento da criança na Educação Infantil.

A pesquisa objetivou acompanhar a rotina de uma instituição de Educação Infantil, uma creche-escola, para compreender em que medida o lúdico está inserido no seu currículo; e buscou também refletir sobre a importância da ludicidade através do uso e aplicação de jogos e brincadeiras no desenvolvimento cognitivo da criança. Foi realizada uma entrevista semiestruturada com educadoras da Creche-Escola Dona Zizi, a saber, uma diretora, uma pedagoga, uma professora da turma do maternal e uma mãe de aluno da creche-escola.

A concepção de criança no contexto da infância

No Brasil, as primeiras instituições voltadas para a Educação Infantil tinham a finalidade de gerar proteção e promover segurança para a criança. Porém, ainda não tinham o olhar voltado para um lugar pelo qual o governo reconhecesse a infância como uma etapa do desenvolvimento humano primordial e assegurasse políticas educacionais para essa faixa etária. Atualmente, a Educação Infantil integra o sistema público e privado da Educação Básica.

Ao fazer parte da primeira etapa da Educação Básica, em concordância com a concepção atual de infância, a criança é percebida como sujeito de direito, de cidadania, respeito e atenção. Neste sentido, Kuhlmann Jr. (1998, p. 31) denota que

é preciso conhecer as representações de infância e considerar as crianças concretas, localizá-las nas relações sociais, reconhecê-las como produtoras da história. Torna-se difícil afirmar que uma determinada criança teve ou não infância. Seria melhor perguntar como é, ou como foi, sua infância.

Se assim perguntar, saber-se-á da sua trajetória de vida e das relações sociais em que a criança foi mais ou menos reconhecida como um sujeito social. Isso impõe a necessidade de considerá-la como um agente com potencial para fazer a sua produção histórica na sociedade no período que se inicia desde o seu nascimento.

Institucionalmente, o RCNEI é um documento norteador desta faixa etária. O mesmo orienta sobre a importância do lúdico como instrumento pedagógico indissociável no desenvolvimento da criança (Brasil, 1998). Aplicar o RCNEI na formação da criança significa prever o seu desenvolvimento e representa também conhecer as fases do desenvolvimento infantil. Brincar é importante, e deve ser compreendido como comportamento natural da fase de desenvolvimento da criança, uma vez que ela se encontra constantemente vivenciando novos conhecimentos e descobertas (Brasil, 1998).

A brincadeira pode ser uma aliada importante para a aprendizagem, visto que a criança ao brincar de faz de conta, por exemplo, representa diferentes papéis de gênero e culturas diversas. No mundo imaginativo a criança pode tudo. O brinquedo e a brincadeira são um direito da criança, e como tal deve ser assegurado em qualquer ambiente ou ocasião, devendo estar em todos os lugares e não apenas em alguns espaços e momentos pontuais nos quais a criança está presente.

Ainda segundo o RCNEI, um dos princípios que deve nortear a qualidade das experiências oferecidas às crianças, considerando suas especificidades afetivas, emocionais, sociais e cognitivas, "é o direito das crianças de brincar, como forma particular de expressão, pensamento, interação e comunicação social". Em outras palavras, o universo lúdico deve ser colocado em uma posição de valor quando se trata da infância e do desenvolvimento da criança (Brasil, 1998, p. 13).

O lúdico e seus principais teóricos

São vários os estudiosos que buscam compreender o lúdico como meio para o desenvolvimento e a aprendizagem na infância. São áreas variadas na Educação, na Psicologia, na Biologia, na Neurociência. Dentre os estudiosos, uma das primeiras referências é Vygotsky (1998), que centrou seus trabalhos e estudos sobre questões de desenvolvimento humano e aprendizagem.

Oliveira (1997) corrobora estudos de Vygotsky (1998) afirmando que na situação imaginária constituída na brincadeira, a criança define a atividade por meio do significado do brinquedo, o que é de suma importância para o desenvolvimento cognitivo dela. A autora ainda aponta o momento da brincadeira como sendo um processo de humanização no qual a criança aprende a conciliar a brincadeira de forma efetiva, criando vínculos mais duradouros. Assim, ela desenvolve sua capacidade de raciocinar, de argumentar, de questionar e de chegar a um consenso ou não pelas atividades lúdicas (Oliveira, 2000).

Para Kishimoto (2003), o brincar deve ser a atividade principal do cotidiano da criança, isso porque é um momento de dar a ela o poder de tomar decisões, expressar sentimentos e valores, conhecer a si, aos outros e o mundo ao seu redor; de repetir ações prazerosas, de partilhar, expressar sua individualidade e identidade através de diferentes linguagens; de usar o corpo, os sentidos, os movimentos e de solucionar ou criar problemas.

Ao brincar, a criança experimenta o poder de explorar o mundo dos objetos, das pessoas, da natureza e da cultura, para compreendê-lo e expressá-lo por meio de variadas linguagens. É no plano da imaginação que o brincar se destaca pela mobilização dos múltiplos significados.

De acordo com Winnicott (1982) e Piaget (1978), conceitos como brinquedo, jogos e brincadeiras são formados ao longo da vida. É peculiar a cada criança definir as brincadeiras como meio de divertimento e de aprendizado.

Segundo Chateau (1987, p. 14), "uma criança que não sabe brincar é uma miniatura de velho, será um adulto que não saberá pensar". Assim, para manter-se em harmonia consigo mesma, com seus semelhantes e com o mundo que a rodeia, ela necessitará de estímulos para assim, construir seus conhecimentos.

Diante disso, as ações com jogos, devem ser criadas e recriadas, para que oriente à imaginação e estimule o desejo de jogar. Quando a criança brinca sem ter toda a informação sobre si mesma, ela automaticamente fornece várias informações a seu respeito ao educador para o seu acompanhamento. Portanto, o brincar é fundamental para estimular seu desenvolvimento integral, tanto no ambiente familiar, quanto no ambiente escolar, além de contribuir para a interação de si com o meio social.

A atividade lúdica deve fomentar sua capacidade de relacionar uma informação nova com seu próprio esquema de conhecimento.

A respeito do jogo como estratégia de ensino, o mesmo possibilita estimular na criança, potencialidades cognitivas e linguísticas, além de afetivas, motoras e sociais; o que pode constituir, assim, possibilidade ampla para promover a sua formação integral.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento normativo com orientação para as redes de ensino de instituições públicas e privadas, com referência de conteúdo para a EI (Educação Infantil), para o EF (Ensino Fundamental), e para EM (Ensino Médio) (Brasil, 2018). Sobre a EI, o documento apresenta um conjunto com seis direitos para a aprendizagem e para o desenvolvimento da criança, são eles: conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer. As atividades pedagógicas a serem desenvolvidas com a criança devem estar sob a orientação desse conjunto de direitos entre os quais o brincar seja um meio comum para ela se expressar, conhecer a si mesma e também o outro; e, por fim, resolver conflitos e explorar ambientes. A BNCC aponta também ser importante para EI a formação de professor, como mostra o próximo tópico.

A importância da qualificação do professor da educação infantil frente ao lúdico

Muito se fala por parte dos educadores a respeito da formação continuada como prioridade para se fazer uma educação de qualidade e essa necessidade; é fato. Vivemos a era da informação que circula em todos os espaços e se a mudança chega tão rápido pela informação, acredita-se haver também a necessidade de o educador acompanhar estas mudanças sofridas pelas transformações que atingem diretamente o contexto escolar. Mudança requer repensar procedimentos de ensino e rever metodologias e práticas, pois

o sentido real, verdadeiro, funcional da educação lúdica estará garantido se o educador estiver preparado para realizá-lo. Nada será feito se ele não tiver um profundo conhecimento sobre os fundamentos essenciais da educação lúdica, condições suficientes para socializar o conhecimento e predisposição para levar isso adiante (Almeida, 2000, p. 63).

Trabalhar com o lúdico é uma tarefa difícil, pois o educador terá que ter fundamentação teórica estruturada e consciência de que está lidando com criança que nasceu na sociedade da informação; portanto, o seu repertório de atividades precisa ser atualizado constantemente. Isso significa que a formação continuada do professor é permanente. Destacamos aqui, que, na sociedade da informação um desafio posto diariamente para o professor é o fazer. Fazer uma aprendizagem significativa pela qual a diversidade não seja silenciada e invisibilizada.

A diversidade é um aspecto amplo que inclui conjuntos de particularidades e especificidades de cada ser humano, conjuntos estes que devem ser respeitados. Diante disso, o professor deve refletir a respeito de sua prática pedagógica e rever quais práticas o mesmo deve desenvolver com crianças tão diferentes. Para isto, a importância do planejamento é imprescindível.

Partindo do que diz a BNCC para a EI, o conhecimento vem com as experiências que cada criança vive dentro do contexto escolar. O professor deve ter o apoio e o respaldo da legislação em educação para fazer o planejamento de sua prática para o ensino na EI (Brasil, 2018).

Por fim, o mesmo deve estar constantemente aberto para analisar e acompanhar as reações e expressões de cada criança, que serão sempre pessoais e únicas. Em outras palavras: é de suma importância que a prática educativa do professor esteja comprometida com os interesses e as necessidades de cada criança para que a vivência se transforme em experiências significativas e tenha de fato um propósito educativo.

Procedimentos de investigação sobre a compreensão do lúdico na Creche-Escola Dona Zizi e sua importância

Embora não tenha tido um critério amostral estatístico probabilístico, pode ser explicado aqui que a intenção foi coletar experiências e vivências a fim de ilustrar os aspectos teóricos discutidos até então bem como, associada à observação participante, fornecer materiais que facilitassem a interpretação deste. Os nomes das entrevistadas foram alterados para preservação da identidade.

Para mostrar como é feita a inserção do lúdico com crianças na EI, a presente pesquisa seguiu a seguinte ordem de procedimentos:

  • Escolha da unidade de ensino Creche-Escola Dona Zizi, situada no município de São Fidélis, no bairro Nova Divineia;
  • Tempo de observação e levantamento de dados: iniciou-se no mês de setembro e terminou no mês de outubro de 2019;
  • Perfil da Creche-Escola Dona Zizi: fundada em 1989, a instituição atende crianças de zero a cinco anos de idade.
  • O corpo docente da instituição é composto de dezoito professores. A instituição conta também com uma diretora, uma coordenadora pedagógica, um funcionário do administrativo e quatro auxiliares de serviços gerais;
  • Todos os alunos são residentes da zona urbana do município de São Fidélis; a grande maioria mora no bairro no qual está situada a Creche-Escola Dona Zizi.

Sabe-se que a Educação Infantil é a fase de descobertas, e a escola, por excelência, é um facilitador de integração social da criança. Na escola o educador tem a função de levar a criança a fazer descobertas e desejar a buscar novos conhecimentos. É importante introduzir práticas de ensino, como jogos, diferentes brinquedos e brincadeiras que se utilizam do corpo-movimento, como música e cantigas de roda.

Entrevistadas, a diretora e a coordenadora pedagógica disseram ter formação de nível superior em Pedagogia. Formação na área da educação é fundamental para elevar a qualidade do ensino. Questionadas a diretora e a coordenadora, o que é ser criança, para a diretora, "criança é um pequeno cidadão de direitos assegurados pela lei, sendo responsabilidade da família, do Estado e da sociedade" (Daniela); e, para a coordenadora, ser criança "é ser criativo e imaginador".

Nota-se que as respostas de ambas se complementam uma à outra sobre o que é ser criança. A diretora fez uma definição de "ser criança" à luz do direito de ter direito como um sujeito em desenvolvimento pleno e este direito está assegurado em lei. De fato, isto é importante ainda hoje destacar no Brasil. Embora a infância tenha conquistado direitos à cidadania, como a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Brasil, 1990); contudo, a criança ainda sofre perdas de direitos e corre o risco de estar vulnerável a todo tipo de abusos. Para a diretora a criança deve ser compreendida como um ser em fase de desenvolvimento, que deve ser "protegida, cuidada, educada" (Daniela). No mesmo sentido, a coordenadora pedagógica destacou a capacidade e a potência criativa e imaginativa inerente à criança. Essa, que é um sujeito social em desenvolvimento e em construção, portanto, a família e a escola são as primeiras instituições às quais ela tem acesso direto nessa faixa etária da infância, e, por ter essa convivência é fundamental conhecer e reconhecer o potencial cognitivo da criança. Reconhecer significa cuidar, acompanhar, incentivar, proteger, amar, ou seja, assistir a criança em seu pleno desenvolvimento.A diretora apresentou uma visão do ponto de vista da gestão; a coordenadora pedagógica apresentou sua visão a partir do olhar pedagógico, do desenvolvimento humano na infância. Ambas as visões geram um sentido sob a mesma direção.

A coordenadora acredita que sua função na creche-escola é a de mediar as relações que contribuam para o desenvolvimento pleno da criança. Ela reconhece ser desafiador o seu trabalho visto que a creche-escola atende criança de zero a cinco anos de idade, o que limita o desejo de fazer um atendimento maior, como ela diz:

Meu espaço de atuação é exclusivamente voltado para o atendimento de crianças de zero a cinco anos de idade. Aqui, nós exercemos nossas funções de modo a contribuir para a formação destes pequenos seres que temos a responsabilidade de cuidar e educar. É aqui que se forma a base educacional da criança, é onde as primeiras vivências no contexto da educação acontecem na vida da criança (Vanuza).

Ciente da sua função e do seu papel, que é mediar o bom relacionamento entre o professor e a criança, toma para si mesma esta atividade diária, que muito lhe exige. Ela aponta que são muitas turmas de diferentes idades sob o seu acompanhamento pedagógico; e, nesse contexto, perguntado para ela como a coordenação pedagógica contribui com a equipe docente, e se existe relação de parceria, ela respondeu que há; embora não esteja diariamente na instituição, contudo, mesmo na sua ausência a diretora e os professores fazem um trabalho excepcional com as crianças. Sempre que possível, a coordenadora cria mecanismos de incentivo para os professores, como por exemplo, informar sobre diferentes tipos de formação continuada como: especialização, participação em palestras, oficinas e aquisição de materiais didáticos.

Já a professora entrevistada disse ter formação no magistério nível médio e superior incompleto. Perguntada sobre a importância do lúdico na Educação Infantil e de que forma ele pode auxiliar no processo de aprendizagem da criança, ela disse que, pelo brincar "é possível trabalhar conteúdos e desenvolver habilidades importantes, como atenção, memória e tantos outros"; "O lúdico é uma ferramenta facilitadora do processo de aprendizagem da criança" (Joelma).

A professora disse também desenvolver atividades lúdicas com seus alunos, e que através dessas brincadeiras, busca ensinar números, fazer contação de histórias, utilizar o alfabeto móvel, promover oficina de fantoches e outros. A professora disse que as atividades lúdicas na sua prática estão previstas no seu planejamento que é uma exigência da direção da creche-escola. Segundo ela, as atividades contidas no seu planejamento obedecem às exigências da Secretaria de Educação do município de São Fidélis.

A professora falou também dos desafios para atuar como educadora. Disse que

no decorrer da profissão infelizmente surgem dificuldades que acabam prejudicando um pouco o nosso trabalho, como por exemplo, a falta da participação dos pais na vida escolar dos filhos, a falta de recursos didáticos para a realização de atividades diárias e a desvalorização do professor que ainda é gritante em nosso país.

A professora fez três destaques, primeiro apontou a falta de participação dos pais na vida escolar. A não participação dos pais no meio escolar é uma queixa recorrente de professores. Diante do desafio da professora, quais seriam os mecanismos que a escola pode criar para provocar o interesse dos pais para participar da vida escolar dos filhos? Creditamos à escola a competência para pensar a relação família e escola sobre o desenvolvimento da criança e buscar parcerias em outras instituições que tratam da questão.

Outro ponto que ela mencionou foi a falta de recursos didáticos para a realização de atividades. Essa é uma questão estrutural que varia de acordo com a realidade de cada município no que diz respeito à gestão e tocante a investimento e a planejamento para a educação. Não foi alvo desta pesquisa levantar dados do município de São Fidélis, sobre o quantitativo em valor monetário do quanto se investe na educação, e também a forma com que o recurso é gerido e o quanto chega para a rede pública de ensino e como cada unidade escolar faz a gestão do recurso. São questões relevantes que ficam para outra pesquisa.

Por fim destacou a desvalorização do profissional da educação e o baixo salário. Esses elementos centrais refletem diretamente na qualidade de vida do profissional da educação, que consequentemente tem reflexo na sua atividade diária na escola. O baixo salário do professor não é determinante à qualidade do ensino, mas é uma variável estruturante da mesma. O piso salarial deve dar condições para o professor ter o direito de acesso, consumo e a aquisição de material didático e recursos diferenciados; como também ter condições de ir a teatro, cinema, viagens de lazer, palestras. Enfim, apesar de a professora dizer que faz um trabalho educativo que visa o desenvolvimento pleno das crianças, a falta de recursos didáticos, investimento do governo e a desvalorização do magistério, são problemas estruturais e caros para a educação pública do município de São Fidélis.

Retomando o primeiro destaque, a participação de pais na vida escolar, foi entrevistada uma mãe de aluno, que se disse ativa no acompanhamento do filho, como mostra o tópico a seguir.

Mãe na escola e na família

É preciso ressaltar que a família possui um importante papel no processo educacional da criança. É no contexto familiar que ocorrem as primeiras experiências, o primeiro contato social e a participação dos responsáveis pela criança rumo à sua trajetória escolar. Enfatizamos a tão necessária participação da família no processo educacional, bem como a interação da mesma e da comunidade junto à equipe escolar. Essa parceria deveria se iniciar na Educação Infantil e terminar com o fechamento do ciclo da Educação Básica na trajetória da vida escolar da criança.

Em concordância com a Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), o conceito de educação deve ir além do sistema formal, pois acredita-se que é na base familiar que a criança constrói seus valores, valores estes que a acompanharão durante toda a sua vida, incluindo o seu processo de socialização (Brasil, 1998). Por essa razão, há a necessidade de aproximação das famílias junto à unidade de ensino, o que pode possibilitar um reconhecimento maior por parte da criança acerca do ambiente social no qual ela está inserida.

Cabe ressaltar o limite desta pesquisa. A entrevista não foi ampliada para toda a comunidade escolar na qual envolveria todas as famílias e pais, ou cuidadores. A pesquisa se limitou a entrevistar uma mãe; portanto, é preciso destacar que a visão sobre a importância da escola na vida da criança, na Creche-Escola Dona Zizi, foi apenas de uma mãe, conforme mostra o próximo parágrafo.

Quando questionada sobre como participa da vida escolar de seu filho, ela disse que sempre comparece às reuniões de pais e, quando não pode estar presente, manda uma pessoa que a auxilia, que cuida dele, enquanto ela está trabalhando, para participar e dizer sobre o que foi falado na reunião da escola; diariamente, olha também a sua agenda e as atividades que são realizadas por ele durante o dia.

Prosseguimos à segunda pergunta: As atividades desenvolvidas pela professora com o seu filho ajudam no desenvolvimento dele? De que forma?

Gosto bastante do trabalho que é feito pelas professoras do meu filho. Logo assim que o matriculei, já pude notar uma diferença de imediato. Meu filho era bastante retraído e tímido, quase não pronunciava palavras. Através das atividades que foram feitas com ele e com a convivência dele com outras crianças, meu filho desenvolveu a fala, se tornou menos retraído e mais interativo (Mãe).

Nota-se que o ingresso da criança na Educação Infantil é importante, pois é nesta etapa que se iniciam as primeiras vivências dentro do ambiente escolar, vivências estas que irão preparar a criança para o seu ingresso noutras etapas da Educação Básica.

Perguntada se estava satisfeita com o trabalho desenvolvido pela professora do seu filho e se deveria mudar ou fazer ajustes nas atividades, ela disse estar muito satisfeita:

Apesar da correria do dia a dia, sempre procuro saber o tipo da atividade que está sendo feita com meu filho e gosto bastante do que vejo. As professoras dele são muito comprometidas com seu trabalho, apesar das dificuldades que sei que elas enfrentam. Não penso que deveria ter mudança em algo, mas rever nossas práticas seja em qualquer contexto, é sempre bom. A interação da família com a unidade escolar possibilita refletir a respeito do andamento das técnicas, métodos e metodologias utilizadas pelo professor. Assim, é possível propor ajuste ou até mesmo mudanças que visem ao desenvolvimento pleno das crianças (Mãe).

Por fim, perguntou-se sobre o hábito da criança de brincar em casa e como se dão esses momentos.

Sempre compro para ele brinquedos adequados à faixa etária na qual ele se encontra e busco sempre fazer com que ele tenha contato com livros; creio que isso o ajudará a desenvolver o hábito pela leitura. Ele gosta de brincar na sala ou no quarto juntamente com o irmão mais velho, e sempre supervisiono esses momentos. Percebo que ele aprende bastante enquanto está brincando (Mãe).

É importante ressaltar que a tarefa de educar uma criança é coletiva e não deve depender somente do corpo docente ou da equipe escolar. A família também é parte contribuinte para o desenvolvimento da criança. Fora da escola, deve haver por parte da família o incentivo para o desenvolvimento do senso crítico da criança. A família também deve oportunizar momentos de brincadeiras para a criança e estar consciente de que a ludicidade se faz eficaz no desenvolvimento da infância.

O brinquedo e as brincadeiras ajudam no desenvolver cognitivo e social da criança. A criança que brinca passa a estabelecer relação de significação social com os brinquedos que brinca. O brincar relaciona-se com a aprendizagem; pois, o brincar é aprender. É na brincadeira que reside a base daquilo que, mais tarde, permitirá à criança, aprendizagens mais complexas. O lúdico é educativo. Sua importância está em reconhecer que a infância tem uma cultura lúdica. Colocar para a criança a brincadeira é dispor de ferramentas expressivas que fomentem o aprendizado e o pleno desenvolvimento para a vida.

Considerações finais

O trabalho com a Educação Infantil é um assunto bastante delicado, por tratar-se do princípio de toda uma trajetória escolar e, consequentemente, o início do desenvolvimento educacional da criança. É nesta etapa que se deve construir uma base, um suporte para que a criança se desenvolva de forma plena. A ludicidade na infância é muito mais que a aplicação de conteúdo; é uma preparação para que a criança futuramente saiba lidar com situações, que justamente a representação social nas brincadeiras tenha sido uma orientação que a leve a se posicionar no mundo com respeito ao outro. Por exemplo, limite, respeito, solidariedade, é na infância que se aprende, para que, quando estiver jovem ou adulto, saiba quão caro são esses valores para a relação humana.

A expectativa deste artigo, ainda que brevemente, foi contribuir para se ampliar a reflexão e a compreensão do leitor sobre o universo lúdico e seus efeitos no espaço escolar. Sendo a Educação Infantil o primeiro contato da criança com um ambiente escolar, a mesma deve servir como base para o seu desenvolvimento, que posteriormente vai avançar para as etapas seguintes. Diante das informações a qual se teve acesso e em concordância com as respostas dadas pelas entrevistadas, depreende-se que se o lúdico estiver aliado à aprendizagem, esse se torna uma ferramenta eficaz no desenvolvimento da criança. Reafirmamos: o brincar não é apenas um momento de recreação ou de entretenimento, mas é através da recriação e do entretenimento que a aprendizagem é produzida e demonstra se há necessidade de se buscar novas formas e metodologias que contribuam para o desenvolvimento pleno da criança.

De acordo com documentos importantes que norteiam a Educação no Brasil (BNCC, 2018; RCNEI, 1998; DCN, 2002), a criança não necessitará ingressar no Ensino Fundamental alfabetizada, porém é na Educação Infantil que as primeiras noções de tempo, espaços e movimento devem ser estimuladas; E o lúdico tem o papel de facilitador desse processo.

Analisando determinados momentos da rotina das crianças da instituição de ensino, da Creche-Escola Dona Zizi, notou-se que há muito que se avançar com relação ao uso da brinquedoteca. Durante a pesquisa foi constatado que as crianças não têm liberdade para esse espaço com autonomia conforme diz a DCNEI. Elas não podem manusear os brinquedos, tão pouco escolher os tipos de brincadeiras para a aula. O acesso à brinquedoteca é controlado constantemente pela professora. Ela é quem faz a prévia seleção dos brinquedos e das brincadeiras a serem aplicadas. Não oportuniza a criança opinar e escolher o brinquedo e qual o tipo de brincadeira ela gostaria de realizar. O planejamento está pronto, não é flexível.

Existem normativas educacionais para a valorização do lúdico, como está assegurado nas Diretrizes Curriculares Nacionais e no Referencial Curricular Nacional para a Educação Básica. Porém, tem sido pouco eficaz por parte do governo federal uma vez que ele controla as normativas da Educação Infantil. Do outro lado, é responsabilidade dos municípios fazer a execução. Os municípios têm a obrigação de gerir os rumos da Educação Infantil, contudo, o que tem se visto até aqui são setores da educação na esfera municipal, não cumprirem as exigências básicas das Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil. São necessárias políticas educacionais municipais direcionadas à Educação Infantil e com eficiência.

O objetivo desta pesquisa não foi gerar demérito da prática do professor da Educação Infantil. Mas apresentar caminhos para subsidiar a sua prática, visto que a criança está na creche-escola para aprender. O lúdico é meio, é forma e é conteúdo para a criança tornar-se mais autônoma e responsável pela construção de seus próprios conhecimentos. Brincar é uma importante forma de comunicação pela qual a criança reproduz suas vivências. A brincadeira na Educação Infantil é uma atividade essencial para a criança, cedo ela pode se comunicar por meio de gestos, sons, e mais tarde representar um determinado papel social pelas lembranças simbólicas significadas pelas brincadeiras. Na infância, a ludicidade deve ser vivenciada e acompanhada. Neste sentido, a contribuição da escola e família é essencial para o bom desenvolvimento dessa faixa etária, visando o êxito do ensino-aprendizagem.

Referências

ALMEIDA, Paulo Nunes. Dinâmica lúdica: técnicas e jogos pedagógicos. São Paulo: Loyola, 2000.

ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. São Paulo: LTC, 1981.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394/96. Brasília, 1998.

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______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.

______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Diretrizes Curriculares Nacional para a Educação Básica. Brasília, 2002.

______. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.

CHATEAU, Jean. O jogo e a criança. São Paulo: Summus, 1987.

KISHIMOTO, Tizuko Morchida (Org.). O brincar e suas teorias. São Paulo: Pioneira, 2003.

KUHLMANN Jr., M. Infância e Educação Infantil. Porto Alegre: Mediação, 1998.

OLIVEIRA, Vera Barros. Brinquedoteca: uma visão internacional. Petrópolis: Vozes, 1997.

______ (Org.). O brincar e a criança do nascimento aos seis anos. Petrópolis: Vozes, 2000.

PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e representação. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

SANTOS, Marli Pires. O lúdico em diferentes contextos. 8ª ed. Petrópolis: Vozes, 1999.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

WINNICOTT, D. W. A criança e o seu mundo. Rio de Janeiro: LTC, 1982.

Publicado em 27 de abril de 2021

Como citar este artigo (ABNT)

DUARTE, Juli Rodrigues; MOTA, Edimilson Antônio. O lúdico no processo de Aprendizagem na Educação Infantil. Revista Educação Pública, v. 21, nº 15, 27 de abril de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/15/o-ludico-no-processo-de-aprendizagem-na-educacao-infantil

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