Resenha do livro "Inclusão na prática: estratégias para uma educação inclusiva"
Jardel Delgado Marques
Administrador, licenciando em Pedagogia (UNIRIO/Consórcio Cederj), pós-graduado em Docência no Ensino Superior e Psicomotricidade, pós-graduando em Temas e Perspectivas Contemporâneas de Educação e Ensino (Cefet/RJ- câmpus Valença)
O livro da professora Rossana Ramos aborda, com base em experiências e testemunhos dela, estratégias que podem ser adotadas a fim de tornar cada vez mais inclusivo o processo de ensino-aprendizagem, considerando as necessidades e as particularidades de cada aluna/aluno.
Figura 1: Capa do livro
Fonte: https://www.booktoy.com.br/inclusao-na-pratica-4257
O livro é dividido em oito capítulos e encerra-se com um conto da autora que fala de um dia muito especial de uma pessoa com deficiência. É importante salientar que a escrita de Rossana é lógica e chama a atenção do leitor com os exemplos que faz questão de elucidar dentro de cada tema que aborda. Logo, a leitura torna-se prazerosa e muito rica, pois os testemunhos são motivacionais e dinâmicos.
No Capítulo 1, Considerações Iniciais, Ramos explica ao leitor que o livro discute as questões teóricas e legais da Educação Especial Inclusiva, correlacionando tais temas à vasta experiência adquirida na Escola Viva, fundada por ela na cidade de Cotia/SP. Nesse capítulo, a autora assevera que a escola brasileira recebe alunas/alunos com deficiência por causa da legislação; contudo, as práticas pedagógicas ainda precisam caminhar muito para que a inclusão se efetive no meio escolar, uma vez que ainda há muitos profissionais reticentes quanto à acolhida e à permanência dessas/desses alunas/alunos nas escolas regulares.
No Capítulo 2, Ramos conta um pouco de sua trajetória e como a inclusão se tornou a tônica do seu trabalho educativo. É importante citar que a Escola Viva é uma instituição que acolhe todo e qualquer tipo de aluno; não é considerada uma instituição de ensino especializado, mas uma escola que se preocupa e efetiva a inclusão educacional.
Fica evidente que a autora é uma grande defensora da ideia de que as escolas e instituições destinadas unicamente ao acolhimento e socialização de pessoas com deficiência se tornou algo ultrapassado e que vai de encontro à inclusão educacional. Dentro desse capítulo, Ramos menciona uma fala que ouviu em uma palestra sobre a questão de extinguir essas instituições que atendem somente pessoas com deficiência e que tocou fundo em sua prática pedagógica, motivando-a a buscar mais conhecimentos para romper tais paradigmas antiquados.
O processo inclusivo aconteceu quando a mãe de uma menina com síndrome de Down a procurou desejando que a filha de sete anos pudesse estudar em sua escola. Rossana Ramos percebeu que aquele era o momento oportuno para que a inclusão pudesse ser concretizada. Dali para a frente, a Escola Viva tornou-se um importante nome dentro de inclusão educacional de pessoas com deficiência, mas não se dedica somente à escolarização dessas/desses alunas/alunos.
No Capítulo 3, Fundamentos históricos e filosóficos, é discutida a cronologia do atendimento oferecido às pessoas com deficiência. Para isso, Ramos (2016, p. 25) pontua que, "vivendo em uma sociedade de resultados, podemos dizer que a deficiência é exatamente o que não se quer, porque não combina com as leis biológicas, sociais, políticas, econômicas e religiosas". Isto é, as diferenças, de qualquer natureza, sempre estiveram associadas a algo vergonhoso e que precisava ser escondido. Todavia, a humanidade foi evoluindo e percebendo que tais questões não poderiam mais ser escondidas, mas reveladas e destacadas, uma vez que é a partir das diferenças que valores como respeito e empatia podem ser compreendidos.
Nesse terceiro capítulo, Ramos ainda estabelece uma comparação com os contos de fadas, exemplificando que a questão de diferença e deficiência foi, por muito tempo, algo escondido e temido. Ela utiliza o clássico conto dos Irmãos Grimm, Branca de Neve e os Sete Anões, para ilustrar como a deficiência foi algo posto fora do cerco social. Como no conto de fadas citado, os anões moravam na floresta, fora dos muros do reino, porque eram vistos como seres diferentes e não poderiam estar no mesmo cenário social que as pessoas vistas como normais.
Esse terceiro capítulo é muito importante para situar o leitor dentro da temática, propiciando reflexões relevantes que ajudam a entender que o processo de inclusão de alunas/alunos deficientes precisa ser estimulado, a fim de criar poderosas mudanças sociais a longo prazo.
A Lei de Diretrizes e Bases de 1996 apontou para o processo de inclusão dos deficientes em escolas regulares e, já naquela época, contribuições teóricas passaram a circular nos meios educacionais, entre as quais destaco as da professora doutora Maria Tereza Égler Mantoan, da Universidade de Campinas (Ramos, 2016, p. 27).
Com essa fala, Ramos se mostra alinhada ao pensamento inclusivo existente no Brasil, pois referencia um dos principais mecanismos legais da Educação, a Lei de Diretrizes Bases da Educação Nacional (LDBEN, Lei nº 9.394/96), e um dos nomes mais respeitados no campo da inclusão educacional, o da professora Maria Tereza. Cabe destacar que, a partir da LDBEN, o acolhimento de alunas/alunos deficientes passa a ser encarado de outra forma na escola regular, uma vez que essa lei dedica um capítulo a dissertar sobre esse processo educacional. Assim, pode-se afirmar que um importante passo foi dado lá em 1996.
No quarto capítulo, a autora se preocupa em trazer testemunhos que comprovem ações concretas e significativas da inclusão escolar ocorridas na Escola Viva, além de apresentar pontos relevantes para tal prática e que possam ajudar o leitor a entender melhor o assunto.
Nesse capítulo, Ramos (2016) explana alguns tópicos como: a conscientização da comunidade acerca da inclusão, a filosofia construtivista, formas de preparo da equipe escolar, a importância da aprendizagem de vida e o plano didático baseado na realidade do aluno, dentre outros temas que dialogam com as alternativas eficazes para o processo de inclusão escolar. Cabe destacar que a formação da autora e sua trajetória profissional e pessoal foram muito importantes para traçar soluções que visassem o melhor atendimento para as/os alunas/alunos.
Logo no início do Capítulo 4, Ramos afirma que equivocadamente há um pensamento de que "as PNEs atrapalham a aprendizagem das outras crianças" (2016, p. 34), concretizando-se como um discurso preconceituoso e que necessita ser combatido com mais conhecimento e modelos verdadeiramente inclusivos, no qual a individualidade de todo e qualquer aluna/aluno possa ser compreendida.
Continuando a leitura desse capítulo, fica evidente que a autora tem imensa preocupação em apresentar temas inclusivos que sejam relevantes e que podem fazer parte de inúmeros modelos pedagógicos Brasil afora, englobando família, escola e sociedade.
A conscientização da inclusão é também um trabalho que deve ser feito com os pais dos deficientes. O medo, a vergonha, a superproteção são os principais sentimentos que fazem as famílias das crianças com deficiência terem atitudes anti-inclusivas. Nesses casos, a escola precisa fortalecer os laços de confiança, garantindo que o deficiente não será discriminado ou passará por qualquer tipo de violência dentro da instituição (Ramos, 2016, p. 42).
Para que esses pontos possam acontecer, a equipe escolar precisa estar bem alinhada de modo que a família sinta confiança e dê credibilidade ao processo educativo que será ofertado. Caso contrário, a inclusão continuará sendo um sonho distante e utópico.
Outro ponto que merece atenção e que foi bem destacado pela autora no quarto capítulo é a questão do planejamento e da adaptação curricular que considerem as especificidades do aluno. Assim como em qualquer caso, a individualidade precisa ser considerada ao planejar uma ideia para ser implementada com as/os alunas/alunos deficientes. Segundo Ramos (2016, p. 48), "emerge a necessidade premente de pensar a educação como algo que atenda de fato à realidade. Ou seja, que observe o que se passa na sala de aula, bem como na escola".
Encerrando esse capítulo, a autora retoma a ideia da inclusão escolar, postulando que a "interação social é o recurso fundamental para o desenvolvimento das PNE" (Ramos, 2016, p. 56), combatendo, sobretudo, a ideia de mera integração ou segregação em escolas e classes unicamente especiais. Fica claro que a pessoa com deficiência necessita de interação e convívio com seus pares, pois desse modo poderá crescer e se desenvolver humanamente.
O quinto capítulo, "Mitos, enganos e equívocos na inclusão", discorre sobre alguns processos de inclusão escolar que podem tender ao fracasso, pois os objetivos não se tornam coerentes e mensuráveis para determinado tipo de aluna/aluno. O primeiro ponto de vista que a autora aborda e problematiza é a afirmativa que diz que "as PNE têm de frequentar escolas especiais" (Ramos, 2016, p. 62).
Desde os capítulos iniciais, a autora deixa claro o seu posicionamento quanto a esse processo, que pode ser visto como uma exclusão assistida, isto é, na qual a pessoa com deficiência é privada do contato com pessoas da mesma idade e que são diferentes. Ramos (2016, p. 63) afirma que "a queda de braço entre a escola especial e os inclusivistas só terminará quando o próprio Estado intervier legalmente nesse tipo de segregação".
Além desse ponto de vista, Ramos (2016) trata da questão da sexualidade da pessoa com deficiência, o que merece um olhar especial, a fim de desmistificar o senso comum, de que a sexualidade do deficiente é mais aflorada do que em outras pessoas. Tal fala, além de ser preconceituosa, pode colocar em risco o processo de inclusão escolar. Assim, é importante que a criança deficiente tenha convívio com outras pessoas para que possa se preservar, se cuidar e aprender a controlar seus impulsos sexuais.
O sexto capítulo é o mais rico, pois traz muitos relatos experimentados pela autora na Escola Viva. São exemplos e testemunhos que preservam a identidade dos sujeitos e que podem orientar educadores na implementação de práticas inclusivas em suas escolas. Fica claro, nos exemplos apresentados, que, para o sucesso da inclusão educacional, é necessário o olhar sensível por parte da escola e o apoio incondicional da família. Toda mudança gera profundas marcas na escola, na família e, consequentemente, na sociedade.
O sétimo capítulo da obra aponta caminhos para a avaliação da/do aluna/aluno deficiente. É sabido que todo processo educativo precisa ser avaliado, a fim de apontar novos rumos, confirmar passos certeiros ou servir de ferramenta para implementar modificações na estrutura escolar. Num modelo inclusivo, a ferramenta avaliativa vai muito além de simplesmente fornecer subsídios para aprovação ou reprovação das/dos alunas/alunos; ela aponta pontos frágeis e pontos já solidificados na adaptação curricular que essas/esses alunas/alunas têm garantidos por lei.
De acordo com Ramos (2016, p. 104), "o momento de avaliar não pode ter dia e hora para acontecer. Ao contrário, precisa ser contínuo para professores e alunos. [...] Deve valer-se de critérios múltiplos, bem como considerar a subjetividade".
Dessa forma, Ramos traz um processo avaliativo dividido em duas etapas e que, ao final, gera um relatório e uma nota. Cabe destacar que a nota dada ao aluno não deve ser considerada o único critério para julgar sua aptidão, mas a nota simboliza muitas coisas, como a assiduidade da/do aluna/aluno, a responsabilidade no cumprimento das tarefas propostas, os avanços nas áreas intelectual e psicomotora, as relações sociais e o cuidado com os materiais próprios e da escola. Todos esses pontos precisam estar bem claros na mente do educador responsável pela avaliação, pois, como ratifica a autora, "a escola não é uma corrida para ver quem chega primeiro, mas uma oportunidade que todos devem ter de desenvolver-se" (Ramos, 2016, p. 111).
Nas Considerações Finais de sua obra, a autora reassume o compromisso de dizer que a inclusão transpassa a questão de ser um processo de mera assistência. A inclusão torna-se um processo efetivo de desenvolver ações humanas e sociais em prol de mudanças significativas no trato social, visando o bem comum e a democracia real.
Ao fim de sua obra, Ramos traz um conto intitulado "Naquele dia", que conta a rotina e os passos de uma menina no dia do seu transplante de córnea, permitindo que ela enxergasse a vida com cor e alegria. O conto vai se desenrolando com um tom enigmático que nutre a curiosidade do leitor até o fim, de modo que se surpreenda com o desfecho.
Referência
RAMOS, Rossana. Inclusão na prática: estratégias eficazes para a Educação Inclusiva. 3ª ed. São Paulo: Summus, 2016.
Publicado em 27 de abril de 2021
Como citar este artigo (ABNT)
MARQUES, Jardel Delgado. Resenha do livro "Inclusão na prática: estratégias para uma educação inclusiva". Revista Educação Pública, v. 21, nº 15, 27 de abril de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/15/resenha-do-livro-inclusao-na-pratica-estrategias-para-uma-educacao-inclusiva
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