Evasão escolar: um problema que se perpetua na educação brasileira

Francisco Lindoval de Oliveira

Professor tutor universitário, licenciado em Turismo (UNIRIO), especialista em Gestão Escolar (Senac São Paulo) e em Educação de Jovens e Adultos (UFF)

Luciano Nóbrega

Professor tutor universitário, professor de cursos de Gestão do Senac Rio, licenciando em Matemática (Universidade Anhanguera), especialista em Gestão da Educação Tecnológica (Cefet/RJ)

Este trabalho tem como finalidade propor uma reflexão sobre as práticas escolares adotadas a fim de enxergar os dilemas da educação e suas causas; pretende-se buscar informações consistentes que embasem as discussões sobre abandono e evasão escolar na Educação Básica para contribuir com a formação docente, propiciando um conhecimento mais profundo sobre a temática que se apresenta sob a forma de evasão do aluno da escola.

A presente pesquisa consiste em enxergar os dilemas da educação desde a perspectiva dos principais protagonistas da ação, sejam eles alunos ou professores, relatando um dos temas que ocupa espaço de relevância na história das políticas educacionais do nosso país, fazendo parte dos debates e reflexões na educação pública ou privada.

A escolha do tema ocorreu ao pesquisar e observar que há alguns autores relatando sobre um grande número de alunos em escolas públicas do Ensino Médio que abandonam a escola sem deixar explicações para professores, diretor, colegas de turma sobre o motivo da evasão, ficando a dúvida do porquê abandonar uma escola onde se tem ensino, merenda e material escolar gratuito. Isso vem preocupando as instituições de ensino em geral, pois a saída desses alunos provoca desequilíbrios sociais, acadêmicos e econômicos.

O que se vê a princípio é que a evasão escolar tem sido um dos problemas que tem atravessado décadas, necessitando que o governo e a sociedade decidam em conjunto quais serão as medidas necessárias para que haja superação desse quadro.

Também é importante observar o fato de se minimizarem frequentemente as razões de evasão mais apontadas, como a falta de recursos financeiros do aluno como a principal causa para a interrupção dos estudos. A falta de recursos financeiros não se justifica por si só, mas em geral o desligamento também ocorre pela incompatibilidade entre horário de estudo e trabalho. O problema da evasão escolar preocupa a escola e sua direção ao constatar que há alunos com pouca vontade de estudar.

Este trabalho abordou a educação como direito de todos, pois todo ser humano tem direito à educação, seja qual for a sua característica pessoal de gênero, raça, religião, condição econômica ou deficiência; nada pode ser impedimento para que esse direito seja desfrutado.

As causas da evasão escolar no Brasil são inúmeras, mas a nossa participação em pequenas ações, por menores que sejam, pode ajudar a melhorar esse cenário. Este artigo tem como objetivo geral avaliar as principais causas do efeito da evasão escolar do Ensino Médio no Brasil, segundo alguns autores, e o que tem levado os alunos do Ensino Médio a desistir da escola.

Quanto aos objetivos específicos, este trabalho pretende analisar as causas que levam o aluno a abandonar a escola e quais as possíveis alternativas de combate, além de identificar se o sistema educacional tem sido atrativo para os alunos.

Motivos que levam o aluno a abandonar a escola

O estudo apresenta o problema do abandono escolar ou evasão como algo que tem preocupado tanto os educadores como os responsáveis pelas políticas públicas. De acordo com dados de 2018 do IBGE, 11,8% dos jovens entre 15 e 17 anos estavam fora da escola, o que representa 1,2 milhão de pessoas sem atividade educacional.

Vale ressaltar que as causas da evasão escolar são variadas: podem ser de ordem socioeconômica, cultural, geográfica e didática. Paro (2001) ainda enfatiza que a grande maioria da população das nossas escolas é carente e vive em um círculo de problemas de ordem cultural, afetiva, material e psicológica. A escola deve, então, criar ações para diminuir o índice de evasão escolar, ações que estimulem tanto o aluno a permanecer em sala de aula como aproximar a família do ambiente escolar. A participação e o envolvimento da família com a vida escolar são fundamentais para o bom desempenho e a permanência do aluno na escola.

Bezerra et al.(2020), constatam que o problema da evasão também está relacionado ao tamanho das turmas. Para os autores, quanto mais alunos há em uma turma, pior o desempenho escolar deles. Os autores ainda sugerem que as turmas sejam menores para que o desempenho dos alunos seja melhorado.

Para Pereira (2003), o estudo da evasão está associado à discussão da qualidade do ensino, pois ela provoca em alguns casos a perda definitiva do aluno.

Trindade e Oliveira (2019) observam que uma das motivações da evasão escolar está associada à falta de incentivo da família e que se correlaciona a aspectos socioeconômicos, pelos quais famílias muito pobres não mantêm seus filhos em idade escolar nas escolas. Isso e muito mais dados são apresentados nos censos escolares e demográficos.

É importante destacar que evasão se diferencia de abandono. Abandono é a interrupção de um momento na vida escolar, em geral um ano letivo, quando um aluno deixa de frequentar as aulas nesse período. A evasão consiste no abandono permanente, ou seja, o aluno deixa de frequentar a escola e deixa também de fazer a (re)matrícula.

Diante do que foi exposto, vimos que há muitos motivos que levam o aluno a deixar de estudar, como: necessidade de entrar no mercado de trabalho, falta de interesse pela escola, dificuldades de aprendizado, doenças crônicas, deficiência no transporte escolar, falta de incentivo dos pais, mudança de endereço etc.

O problema da evasão escolar sob o aspecto legal

O termo evasão escolar é utilizado em vários contextos com diferentes significados; são tantas variações que acabam dificultando o entendimento dos motivos reais que influenciam e constituem-se como dificuldade para ações efetivas no combate ao problema.

No entanto, a evasão escolar é um problema que atinge todos os níveis de ensino da educação no Brasil, onde muitos jovens e crianças abandonam a escola para ingressar no mercado de trabalho, pois a prioridade para eles não é a educação, mas a própria sobrevivência, tendo como base que o Brasil é um dos países mais desiguais em distribuição de renda no continente. Para Krawczyk (2009),

A evasão, que se mantém nos últimos anos, após uma política de aumento significativo da matrícula no Ensino Médio, nos revela uma crise de legitimidade da escola que resulta não apenas da crise econômica ou do declínio da utilidade social dos diplomas, mas também da falta de outras motivações para os alunos continuarem seus estudos (Krawczyk, 2009, p. 9).

A evasão escolar tem sido consequência de diversos fatores, como produto de um processo educativo fracassado, produzido pela própria escola. A escola tem sido um caminho para a libertação da ignorância, e o que se tem visto hoje é que em algumas famílias os pais não têm preocupação com o futuro dos filhos quando abandonam o ambiente escolar por quaisquer que sejam as necessidades ou motivos; alguns nem tomam conhecimento do abandono da escola por seus filhos.

De acordo com a legislação brasileira, é obrigatório frequentar a escola até o fim do Ensino Fundamental, o que pode incentivar famílias – especialmente as de baixa renda – a considerar encerrado o ciclo de estudos antes do início do Ensino Médio e a exigir que os alunos passem a contribuir para o orçamento doméstico. Libâneo (1992, p. 14) afirma que

igualdade e oportunidade para todos no processo de educação e na compreensão de que a prática educacional se faz pela transmissão e assimilação dos conteúdos de conhecimento sistematizados pela humanidade na aquisição de habilidades de assimilação e transformação desses conteúdos no contexto de uma prática social.

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/96) e com o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), um número elevado de faltas sem justificativa e a evasão escolar acabam ferindo os direitos das crianças e dos adolescentes. Cabe à instituição escolar utilizar recursos dos quais disponha para garantir a permanência dos alunos. O acesso e a permanência do aluno na escola são um direito fundamental, garantido constitucionalmente, o que demonstra que a escola é a instituição de maior expressão da educação na sociedade, uma vez que é um espaço onde o aluno pode relacionar-se com seus pares, com o ambiente e com profissionais da educação.

Em síntese, os temas principais da LDB são: a autonomia da escola, a modernização da gestão, o acesso às novas tecnologias, a universalização do ensino e a formação para o trabalho. Mas o que vemos hoje de forma incisiva nas escolas é a flexibilidade do currículo, das avaliações e da organização do ensino que privilegia as competências em lugar da inteligência nos processos.

É importante ressaltar que a LDB e os sistemas estaduais de educação são atualmente as leis que regulamentam o direito social à educação previsto pela Constituição Federal e pelas constituições estaduais.

As influências da desigualdade social no contexto da evasão escolar

Atualmente, a desigualdade social afeta diretamente os setores de menor poder aquisitivo e é motivo de preocupação constante dos sistemas de ensino públicos e privados. Por isso, Alonso (2009) aborda essa questão como um dos fatores responsáveis pela saída de alunos dos bancos escolares desde o Ensino Fundamental.

Portanto, ainda temos uma diversidade de fatores para a evasão escolar que resultam de vários processos sociais e culturais, desde a criação da instituição escolar, o que acarreta desigualdade tanto intelectual como financeira e cultural, que é sentida desde a Educação Básica, em virtude da ausência de oportunidades que os alunos tiveram em relação ao acesso a conhecimentos diversos. Essas desigualdades devem ser reconhecidas; caso contrário, haverá um bom número de alunos incluídos no sistema escolar, mas sem se apropriarem do conhecimento que o processo de ensino e aprendizagem exige.

Cabe mencionar ainda que o estudo da evasão é um campo vasto e complexo, o qual envolve questões pedagógicas, psicológicas, sociais, políticas, econômicas e administrativas, entre outras.

Mecanismos de prevenção da evasão escolar

”O importante, não resta dúvida, é não pararmos satisfeitos ao nível das intuições, mas submetê-las a análise metodicamente rigorosa de nossa curiosidade epistemológica” (Freire, 1996, p. 45).

A evasão escolar é um problema de ordem nacional, caracterizando-se pelas repetências sucessivas e pelo fracasso escolar de estudantes que não chegam a concluir o ciclo do ensino estudantil.

O que ocorre muitas vezes é a busca pelos culpados pelo fracasso, percebendo que a partir daí há um jogo em que a culpa é do aluno, da família ou da classe social onde vive; ninguém assume a responsabilidade, transferindo a qualquer um ou a qualquer coisa.

Em princípio, a escola deve desenvolver um trabalho que leve transformação à sociedade, tendo em vista a construção de um ser que saiba planejar, superar obstáculos, compreender e transformar a sociedade.

Por sua vez, a evasão escolar tem sido um desafio para as escolas, pois muitas vezes é interpretada em vários contextos com diferentes significados. Essas variações dificultam o entendimento dos motivos reais que influenciam o processo e as ações efetivas de combate ao problema. Entretanto, a exclusão ou evasão de alunos, do ponto de vista de Bourdieu (2004, p. 221), no texto intitulado Os excluídos do interior, em que relata alunos que ficam na escola e, ao concluírem seu curso, recebem diplomas desvalorizados. Muitos desses estudantes são provenientes de famílias pobres e com pouca cultura, mas com todas as chances de obter um diploma que não deveria ser desvalorizado, que ao final de uma longa escolaridade, paga muitas vezes com sacrifício, seguindo a um destino provável de exclusão, o que leva alguns a não querer terminar ou se formar, abandonando o curso ao ver que não aproveitarão a sua formação e o tão esperado diploma para ser profissional de carreira.

Conclusão

Entende-se que, mais que procurar culpados, é preciso compreender que existem fatores externos como a desmotivação da família e a necessidade de emprego, entre outros, em que com certeza a tomada de consciência só ocorrerá sob a pressão dos fracassos vividos e dos obstáculos encontrados pelo sujeito quando ele tenta atingir os objetivos que o motivam.

Outras pesquisas sobre evasão escolar apresentam faces distintas; constatam que a evasão é resultado da decisão do aluno ou de uma combinação de fatores sociais, sejam eles econômicos e pessoais, seja a necessidade precoce de ingresso no mercado de trabalho, sejam as dificuldades encontradas em razão das condições desfavoráveis de currículo escolar, de professores e de organização da escola. Outras facetas podem ser a imaturidade do estudante, reprovações sucessivas, dificuldades financeiras, falta de perspectiva de trabalho, ausência de laços afetivos na escola, estudo por imposição familiar, casamentos não planejados e nascimento de filhos, gerando baixa autoestima generalizada entre os jovens.

Ainda existe uma gama de estudos com ampla reflexão sobre a evasão e suas diversas causas, com base na visão do aluno; por isso não é pretensão aqui esgotar as reflexões, visto que ainda é um problema muito complexo para tratar ainda por muito tempo. É importante que se priorize também a compreensão das questões de ordem acadêmica, como as expectativas do aluno em relação ao curso e a instituição que deveria encorajá-lo ou estimulá-lo a priorizar a conclusão do seu curso.

Vale ressaltar que a evasão escolar traz prejuízos sociais e acadêmicos tanto para as instituições de ensino quanto para a sociedade. Essa realidade expõe uma das fragilidades do sistema educacional brasileiro pelo fato de não conseguir manter o aluno em sala de aula.

Os gestores deveriam optar por tornar as aulas mais atraentes para os alunos; a escola deveria fazê-los entender como o conteúdo pode fazer a diferença na vida do aluno, porque em um país com tantos problemas sociais, como o Brasil, o principal motivo da evasão ainda é o desinteresse.

Referências

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BEZERRA, Leonardo Ferreira; GONÇALVES, Clayton Pereira; CUNHA, Diego de Oliveira da; OLIVEIRA, Francisco Lindoval de. Análise da correlação entre a média de alunos por turma na taxa de rendimento de alunos nas escolas públicas de Ensino Médio no Município do Rio de Janeiro. Revista Educação Pública, v. 20, nº 36, 22 de setembro de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/36/analise-da-correlacao-entre-a-media-de-alunos-por-turma-na-taxa-de-rendimento-de-alunos-nas-escolas-publicas-de-ensino-medio-no-municipio-do-rio-de-janeiro. Acesso em: 30 set. 2020.

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TRINDADE, M. F. B.; OLIVEIRA, F. L. Idosos na EJA: fatores que motivam a inclusão e permanência. Trivium: Revista Eletrônica Multidisciplinar, Pitanga, v. 6, nº 2, ed. especial, set. 2019. Disponível em: http://revista.ucpparana.edu.br/index.php/Trivium/issue/archive. Acesso em: 10 out. 2020.

Publicado em 25 de maio de 2021

Como citar este artigo (ABNT)

OLIVEIRA, Francisco Lidoval de; NÓBREGA, Luciano. Evasão escolar: um problema que se perpetua na educação brasileira. Revista Educação Pública, v. 21, nº 19, 25 de maio de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/19/evasao-escolar-um-problema-que-se-perpetua-na-educacao-brasileira

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1 Comentário sobre este artigo

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Jurandir de Jesus Montes • 9 meses atrás

Gostei muito desse artigo, estou escrevendo um projeto de pesquisa sobre evasão escolar. pretendo mergulhar nesse assunto e escrever meu TCC sobre esse assunto.

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Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.