Práticas e recursos aplicados ao ensino remoto de Geografia
Fabrizio da Costa Barros
Licenciado em Geografia (Unesa), especialista em Educação Tecnológica (Cefet/RJ), mestre em Geografia (UERJ), professor na rede privada de Educação Básica
Tecnologias da informação e comunicação no contexto da pandemia de covid-19
Analisar o contexto em que vivemos é fundamental, sobretudo em uma época em que enfrentamos grandes e vorazes mudanças decorrentes do processo de globalização, bem como a difusão acelerada das tecnologias de comunicação, informação e culturas (Santos, 2000; Harvey, 2007).
Em virtude das medidas de isolamento social adotadas para o combate à pandemia do novo coronavírus (covid-19), muitas instituições adotaram o ensino remoto como alternativa ao contexto emergencial, visando minimizar o impacto pedagógico ou como uma forma de manter algum contato com os estudantes. Neste contexto, docentes foram colocados à prova com a demanda pelo uso de equipamentos, programas de computador e aplicativos que, até o momento, não eram familiarizados.
O período de isolamento social adotado pelos governos se iniciou na cidade do Rio de Janeiro, oficialmente, em 17 de março de 2020, com a publicação do Decreto nº 46.973, de 16 de março de 2020. Até o momento de escrita deste artigo, não há um documento encerrando oficialmente a situação emergencial ou mesmo condições sanitárias que justifiquem esse encerramento.
Os diversos aspectos que têm se modificado no campo da educação estimulam as escolas ao uso de tecnologias da informação e comunicação (TIC) e outros recursos acompanhados da rede de internet, visando, principalmente, tornar o ensino dinâmico e significativo de modo que o estudante seja agente do processo de ensino e aprendizagem, pois, segundo Lopes e Ribeiro (2018, p. 2), “os estudantes de hoje estão conectados a todo instante, são exigentes, críticos, assim, parece que o ensino tradicional vem aos poucos, perdendo seu espaço”.
Recursos e inovações metodológicas, porém, não são uma necessidade atual, conforme já apontava Moran (2006) e Libâneo (2004). Contudo, o contexto tecnológico do século XXI e as demandas dos estudantes têm reforçado a necessária mudança de papel do professor, que não deve ser mais o de simples transmissor de conhecimento, mas de um mediador ou facilitador do conteúdo que é apresentado, criando condições para construção do conhecimento (Freire, 2007, p. 47) através da contribuição com um conhecimento específico mais estruturado ou por ser uma pessoa mais experiente no assunto abordado.
No atual contexto, tem ganhado espaço a lógica do estudante. No momento do estudo, ele mesmo vai realizando leituras complementares que o próprio texto ou site lhe recomenda, o que nem sempre estará de acordo com a lógica que seria observada na forma tradicional. Neste sentido, Santaella (2014, p.18) enfatiza a presença da chamada aprendizagem ubíqua e explica as novas características do leitor da era digital, considerando as transformações de aspectos cognitivos, perceptivos, sensoriais e motores, mencionando basicamente dois novos tipos de leitores:
O leitor imersivo é aquele que navega pelas configurações reticulares da informação nas redes, saltando de um conteúdo multimidiático a outros no instantâneo de um toque. O ubíquo deriva do imersivo e brotou tão logo se tornou usuário dos dispositivos móveis os quais lhe propiciaram a possibilidade de acessar as redes e se comunicarem com seus pares e mesmo ímpares de qualquer lugar e em quaisquer momentos.
Santaella (2014, p. 18) expõe que “a interatividade é a característica central de toda a cultura do computador”, e o estudante que já nasce imerso nesta cultura busca naturalmente esse dinamismo, demonstrando menos interesse e\ou resultados a partir de uma interação tradicional de Ensino que desenvolva um pensamento linear.
A autonomia, portanto, junto com a faculdade de analisar criticamente são competências cada vez mais essenciais no atual momento e demandam novas formas de se comunicar, exigindo uma comunicação interativa onde o estudante participa ativamente do processo, rompendo a lógica unidirecional tradicional (Santos, 2011).
Em um mundo globalizado, as TIC consolidam a essência desse mundo, cada vez mais conectado e acelerado, fazendo emergir no campo da educação uma demanda por inovação e atratividade para que os estudantes, principalmente os mais jovens, se sintam motivados a aprender.
Contudo, um aspecto importante no que tange o uso de tecnologias na educação, ou mesmo considerando a Educação a Distância (EaD), é que quando não ocorre o uso de recursos inovadores ou de protagonismo por parte dos estudantes, se fracassa no processo de ensino-aprendizagem (Valente, 1997; Almeida, 2010). Com isso, o ano de 2020 mostrou de forma severa a necessária atualização que os profissionais da educação precisam sobre os novos recursos tecnológicos aplicados ao ensino e, principalmente, suas potencialidades.
As demandas em relação ao uso de equipamentos, programas de computador e aplicativos se tornaram ainda mais complexas em virtude da falta de conhecimento e interesse que muitos desses profissionais possuem em relação ao uso desses recursos. Por outro lado, também é importante considerar a falta de incentivo e capacitação, bem como de projetos das instituições escolares que visem alcançar um melhor aproveitamento desses recursos.
Este artigo toma como referência o ensino de Geografia, nas redes públicas e privadas, tendo como objetivo analisar quais as ações e as práticas de ensino adotadas por docentes da disciplina durante o período de isolamento social nas instituições de ensino do município do Rio de Janeiro, partindo da análise de aspectos de adaptação e uso de tecnologias em processos de ensino-aprendizagem.
Também cabe salientar o papel que deve ser desempenhado pela disciplina de Geografia de forma mais ativa, que é o de prover reflexões sobre a relação entre sociedade e natureza, e suas contradições (Oliveira, 1989).
Metodologia
Esta pesquisa está estruturada em três etapas. A primeira etapa constitui o levantamento bibliográfico para compreender as características e possibilidades da Geografia como disciplina escolar.
Na segunda etapa, foi elaborado e aplicado um questionário semiestruturado objetivando gerar dados. Algumas respostas abertas objetivaram alcançar uma percepção mais subjetiva dos respondentes. Ao todo, foram aplicadas treze perguntas, divididas em três blocos, com abordagem qualiquantitativa e sem identificação dos participantes.
Com o questionário aplicado, busca-se esboçar uma compreensão relacionada à adaptação e uso de tecnologias variadas no ensino de Geografia durante o período de isolamento social nas instituições de ensino das redes públicas e privadas do município do Rio de Janeiro em turmas de ensino fundamental e médio.
O primeiro bloco do questionário (perguntas 1, 2, 3 e 4) faz um levantamento mais geral da experiência, segmento, bairros e rede em que se inserem as instituições em que os docentes atuam.
O segundo bloco (perguntas 5, 6, 7 e 8) é mais específico sobre as TIC que estiveram disponíveis/acessíveis aos docentes, seja por iniciativa própria ou das instituições.
O último bloco (perguntas 9, 10, 11, 12 e 13) busca apresentar as práticas dos docentes no atual contexto em termos de aplicação das TIC e adaptações das aulas.
As respostas do questionário foram recebidas entre os dias 15 de julho de 2020 e 31 de outubro de 2020, sendo acessado via link do aplicativo Google Forms disponibilizado e divulgado em redes sociais. O número de participantes totalizou 28, sendo que quatro foram excluídos em virtude de as respostas sobre bairro mencionarem outro munícipio, restando 24 respostas tabuladas.
A terceira etapa foi a análise das respostas, buscando identificar quais TIC estiveram presentes nas práticas pedagógicas no contexto da pandemia e de que forma estes recursos foram apropriados.
Perspectivas no ensino de Geografia e uso de TIC
A perspectiva ideal da disciplina de Geografia consiste na sua importância no processo formativo em virtude de sua proposta complexa, abrangendo uma ampla série de temas e criando condições para o educando ser introduzido ao contexto em que se insere como indivíduo de forma crítica. Porém Barbosa (2016, p. 83) ressalta que:
Ao longo de sua história, essa disciplina se caracterizou como matéria mnemônica e simplista, em virtude de seus fundamentos teórico-metodológicos estarem ajustados à prática de ensino tradicional, que primava pela memorização dos dados e fatos geográficos e estava comprometida com uma educação voltada ao nacionalismo patriótico. Para o desenvolvimento dessa prática de ensino de Geografia, exige-se uma organização da escola em classes estáveis; os alunos são separados por idade; as carteiras organizadas em fileiras e alinhadas de frente para a lousa; a mesa do professor fica posicionada na parte frontal da sala; a atividade docente fica restrita ao repasse de informações aos alunos, e estes, por sua vez, são meros receptáculos de conteúdos apreendidos por meio da memorização.
A Geografia tradicional está baseada justamente neste modelo teórico-metodológico mencionado, cuja origem reside no continente europeu no século XIX, época de consolidação dos Estados-Nação e do capitalismo industrial, assim como da “urbanização e concentração populacional nas cidades” (Vesentini, 1989, p. 31).
Enguita (1989, p. 130) destaca que o ensino e a Geografia como disciplina escolar contribuem para a homogeneização cultural dos povos que passam a ter um governo centralizado. Nesse processo de expansão do ensino, sobretudo o público, o objetivo era consolidar uma nova identidade após a formação dos Estados. Com isso, novos territórios estavam se formando.
Haesbaert (2004) conceitua território como uma área cujos limites são definidos pelo exercício do poder. Os governos, por exemplo, exercem o poder político. Desta forma, se fez necessária a homogeneização cultural entre os povos que passaram a viver em um mesmo território, sendo, portanto, importante “ensinar”, por exemplo, a capital, os países que fazem fronteira, quem é o chefe de Estado, etc., não sendo necessário um ensino crítico.
De acordo com Cavalcanti (2010), as práticas mnemônicas, reconhecidas pela estruturação de fatos fragmentados ao longo do livro didático, dividindo e descrevendo aspectos físicos, humanos e econômicos, são características da Geografia Tradicional e Geografia Quantitativa, herdadas pelo Brasil para o ensino da Geografia. Essa fragmentação também é reflexo da fragmentação da ciência, apontada por Santos (2008a).
Cavalcanti (2010) também aponta um levantamento realizado entre 1980 e 1996 onde indica um aumento da quantidade de estudos com a temática Geografia no ensino, o que reflete preocupação com o que tem sido alcançado diante da relação “potencial da disciplina” x “práticas atuais”.
Nesse contexto, Passini (2015, p. 118) destaca justamente que, na medida em que as escolas avançam em termos de estrutura e recursos, se torna necessário um esforço e uma postura diferente do professor, mencionando que “as possibilidades de o professor ser um problematizador para incentivar a busca do conhecimento exige que ele seja atualizado, leitor crítico e tenha acesso a novos métodos e tecnologias”.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) orientam que, no Ensino Fundamental, seja desenvolvida nos estudantes a capacidade de compreender a cidadania como participação social e política, além de exercer direitos e deveres políticos, civis e sociais através de atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito; posicionamento crítico, responsável e construtivo nas diferentes situações sociais, entre outros (Brasil, 1998).
Ainda de acordo com os PCN, os temas estudados devem ser flexíveis, mas não fragmentados, permitindo uma abordagem holística, não devendo o material didático funcionar como barreira, que impele a aplicação de um determinado momento específico do ano letivo.
No primeiro eixo no quarto ciclo é proposto estudar “Evolução das tecnologias e as novas territorialidades em redes”. Nesse eixo é importante uma abordagem crítica sobre os meios tecnológicos, considerando suas possibilidades, benefícios e malefícios, evidenciando os aspectos sociais, culturais e ambientais comumente percebidos como produtos da modernidade, da evolução da técnica, do acesso e imposição de tecnologias nos diferentes lugares do mundo, já que, nesta etapa o estudante já consolidou conhecimentos relacionados às categorias de análise da Geografia, sendo ainda mais importante o estímulo ao pensar crítico sobre as tecnologias desenvolvidas (Brasil, 1998, p. 100).
Mais atualizada, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) destaca justamente que importância da Geografia para a Educação Básica reside na condição de desenvolver o pensamento geográfico capacitando o educando para interpretar as transformações no mundo e relacionar os elementos envolvidos nessas transformações (Brasil, 2018, p.356).
Outro aspecto relevante é que, nesta etapa da vida, o educando tende a compreender e ter mais em contato com as questões ambientais, sociais, políticas expostas pela mídia, sofrendo grande influência nas redes sociais virtuais.
Nesse contexto, a Geografia se torna um agente no fornecimento de elementos para melhor compreensão desses fenômenos, visto que é a disciplina responsável por abordar, de forma mais aprofundada, os temas como redes/globalização na educação básica, sobretudo pela natureza do seu objeto de estudo e ensino (as interações entre sociedade e natureza). Atualmente, a diversidade de TIC disponíveis pode contribuir positivamente com essa responsabilidade, o que possibilita novas propostas de ensino a partir de novos recursos. Nesse aspecto, Passini (2015, p. 119) menciona que,
com sucessivas mudanças ocorridas no que se refere ao objeto e método do Ensino da Geografia, ocorreram também mudanças nas propostas de ensinar e aprender tanto no Ensino Fundamental como no Ensino Médio. Algumas inovações propostas podem melhorar a motivação dos alunos, na medida em que os tornam ativos no processo da construção de conceitos, habilidades e valores. Alguns professores ministram suas aulas de forma expositiva seguindo uma Geografia altamente descritiva e totalmente dependente do livro didático.
Portanto, uma aula rígida em padrões tradicionais, tanto nos aspectos da ciência geográfica como das práticas pedagógicas, dificulta o processo de aperfeiçoamento do ensino para o contexto do século XXI. Por isso, faz-se necessário o melhor aproveitamento de recursos que auxiliem o docente nessa na prática pedagógica para alcançar a formação plena do discente e o desenvolvimento das competências que são mencionadas.
Análise a partir de questionários
A pesquisa aplicada inicia abordando o tempo de experiência docente (Gráfico 1), fato apontado como de grande importância na prática docente em diversos estudos (Castro; Fleith, 2008; Saraiva, 2017; Ramos; Barin, 2018), contribuindo para o desenvolvimento de propostas metodológicas eficientes, refletindo também na criatividade para superar determinadas barreiras no processo de ensino-aprendizagem (Castro; Fleith, 2008).
Gráfico 1: Tempo de experiência do docente
Fonte: Dados da pesquisa (2020).
A segunda pergunta do questionário (Gráfico 2) aborda o segmento de atuação. Neste quesito temos a maioria dos profissionais atuando no Ensino Fundamental (9) ou no Ensino Fundamental e Médio (12). Uma parcela pequena atua somente no Ensino Médio (3). Convém destacar a importância de atividades lúdicas justamente com crianças do Ensino Fundamental (Fuchs; Schütz, 2020), sobretudo no contexto de ensino remoto, em que há maior demanda, mas também há diversas possibilidades.
A terceira pergunta do questionário (Gráfico 2) visa explorar, no município, onde estão localizadas as instituições de ensino em que os participantes da pesquisa atuam. As respostas consideraram a única em que atuam ou a de maior carga horária. Nesse sentido, percebe-se que, apesar do número relativamente baixo de respondentes, os professores inseridos no ensino remoto estão em bairros que contemplam todas as zonas da cidade (norte, sul, oeste e centro).
Gráfico 2: Bairro da instituição de ensino em que o docente atua
Fonte: Dados da pesquisa (2020).
A quarta pergunta busca distinguir se há maior participação de profissionais da rede privada ou pública. Este tema nos indica que tanto instituições públicas quando privadas possuem equipamentos e profissionais, para, em um primeiro momento, darem continuidade às atividades de ensino, sendo que pouco mais da metade dos respondentes (14) se insere na rede privada.
A quinta pergunta (Gráfico 3) busca apreciar os recursos e iniciativas presentes nas instituições de ensino e que estavam disponíveis aos profissionais, buscando verificar, mesmo que ainda de forma incipiente, como as instituições têm se mobilizado nesse contexto. Observa-se que a maioria das instituições disponibiliza alguma plataforma com ambiente virtual de aprendizagem (AVA), buscando manter as atividades básicas, como a orientação de atividades e disponibilização de materiais para estudo. Convém observar que as lives (transmissões ao vivo) se tornaram as aulas ao vivo, momento síncrono em que discente e docente têm o encontro em substituição ao presencial. Contudo, também devemos observar possíveis limitações em virtude do conhecimento técnico de cada profissional e das condições de cada equipamento utilizado.
Gráfico 3: Recursos e iniciativas de TIC disponibilizados pela instituição
Fonte: Dados da pesquisa (2020).
A sexta pergunta foi uma questão aberta para aqueles que responderam “outros” na pergunta anterior, buscando identificar outros recursos ou iniciativas de TIC que as instituições disponibilizaram aos profissionais. Contudo, apenas um respondente menciona que não houve qualquer tipo de suporte da instituição em que atua e utiliza notebook próprio para as aulas.
Perguntados se o uso de recursos especificamente nas aulas de Geografia já era praticado pelo profissional antes do período de isolamento social, na sétima pergunta, 15 respondentes afirmaram que já utilizavam. A partir dos nove respondentes que mencionaram que não faziam uso de qualquer tipo de TIC anteriormente, podemos inferir a existência de profissionais atuando sem uma capacitação que permita o bom aproveitamento dos recursos que podem ser aplicados em algum conteúdo específico do currículo da disciplina ou mesmo recursos mais genéricos, não específicos para Geografia.
A oitava pergunta (Gráfico 4) buscou identificar quais TIC já eram utilizadas como recursos em aulas; os profissionais mencionam quais eram utilizadas. Há referência ao Google Earth e Google Maps, aplicativos que podem ser muito bem aproveitados na Geografia por permitirem a observação do espaço geográfico, tornando-se um recurso muito interessante diante da limitação de uma atividade de campo presencial. Também são mencionadas outras TIC muito presentes nas práticas com finalidade de dinamizar as aulas, como o Kahoot, Mentimeter, Google Classroom e jogos digitais.
Gráfico 4: Exemplos de TIC utilizados pelos docentes
Fonte: Dados da pesquisa (2020).
Também é importante considerar a metodologia aplicada, e não apenas os recursos. Desta forma, a nona pergunta (Gráfico 5) buscou verificar se, além do uso de TIC, há um incentivo ao protagonismo dos estudantes a partir das metodologias ativas nas aulas. De acordo com Valente, Almeida e Geraldini (2017), as metodologias ativas são entendidas como “a aplicação de práticas pedagógicas para envolver os alunos, engajá-los em atividades práticas, nas quais eles são protagonistas da sua aprendizagem”. Observar-se-á que esta metodologia de ensino ainda não é uma prática consolidada, de modo que menos de 1/3 dos respondentes dizem utilizar esta metodologia frequentemente e sempre, inclusive em avaliações. Os demais utilizam raramente (8) e ocasionalmente (9).
Gráfico 5: Uso de metodologias ativas por parte dos docentes
Fonte: Dados da pesquisa (2020).
Freire (2007, p. 38) destaca que “ensinar exige reflexão crítica sobre a prática”. Diante disso, a décima pergunta (Gráfico 6) avalia a qualidade das aulas on-line a partir de uma percepção dos próprios docentes. Considerando que as aulas sofreram adaptações para o remoto, já que muitas instituições da educação básica ainda não adotam o EaD como padrão, buscou-se incentivar uma ação reflexiva nos docentes quanto a suas aulas remotas. Metade das respostas indica que a qualidade das aulas ficou inferior em relação à modalidade presencial.
Gráfico 6: Percepção da qualidade das aulas remotas
Fonte: Dados da pesquisa (2020).
Considerando a importância da disciplina de Geografia no processo formativo dos discentes, a décima primeira pergunta verifica se houve associação entre algum tema do currículo de sua turma ao contexto atual da pandemia, constatando que a grande maioria dos docentes (22) buscou debater este assunto em suas aulas.
A décima segunda pergunta (Gráfico 7) buscou esboçar uma compreensão sobre as dificuldades encontradas pelos docentes em suas rotinas em virtude das restrições das atividades presenciais. De acordo com 25% dos docentes, as dificuldades não foram grandes no novo formato de aulas - o que não possui uma relação com a questão da qualidade das aulas necessariamente. Porém, parte significativa dos docentes menciona que as dificuldades se deram em função da baixa habilidade ou interesse para interação mediada por tecnologias.
Gráfico 7: Dificuldades encontradas pelos docentes durante o ensino remoto
Fonte: Dados da pesquisa (2020).
A décima terceira e última pergunta foi aberta, buscando uma descrição mais detalhada das adaptações realizadas pelos docentes para as aulas remotas. Foi possível verificar algumas demandas indiretas que foram impostas aos docentes sem preparo ou apoio efetivo das instituições privadas ou do próprio Estado, como a necessidade de adaptar espaço físico nas residências, a gravação e edição (mesmo que simples) de vídeos para plataformas como YouTube, elaboração de roteiros para aulas cronometradas além da compra de equipamentos complementares para gravação de vídeos. Também é mencionada a adaptação da metodologia aplicada. O Quadro 1 traz o registro de algumas respostas.
Quadro 1: Descrições das adaptações feitas para aulas remotas (estratégias, recursos e metodologias utilizados)
Maior organização do tempo e do planejamento das aulas. |
Entre as atividades que utilizo faço alguns jogos dentro de sala de aula, para fazer uma revisão sobre energia montei com o Google site uma sala de escape (escaperoom) adaptada para o modelo virtual, onde os alunos deveriam realizar tarefas, algumas gamificadas para concluir o desafio final. |
Adaptação do espaço de gravação, tirando objetos que chamem atenção nos vídeos e aumentando a iluminação. Criar um roteiro e cronometrar o tempo para cada tópico, garantindo o tempo da aula. |
Prioridade para conteúdo mais imagético e menos uso de vídeos, não ultrapassando oito minutos. |
Em função da ausência de contato com os alunos devido ao ensino remoto, o ritmo da aula ficou mais acelerado, pois não há tantas intervenções como nas aulas presenciais. Isso me fez pensar em alternativas para ampliar a interação, por exemplo, posso usar vídeos do YouTube, criar mapas no Google MyMaps, usar sites diversos, o objetivo principal nisso é quebrar o ritmo da aula e aproximar os alunos. |
Adaptação do espaço para as aulas e obtenção de hardwares. |
Há menções sobre variadas adaptações feitas por iniciativa e recursos dos próprios docentes, assim como há maior preocupação com tempo e qualidade dos vídeos, ao vivo ou gravados, e menor ênfase em dinamização a partir de jogos e aplicação de metodologias ativas.
Considerações finais
A escola não é onde ocorrem apenas aprendizagens, mas interações sociais. Para Moran (2017), a aprendizagem ocorre formal ou informalmente, com o estudante sozinho ou em grupo, presencialmente ou on-line. Então, certamente, a inserção de recursos tecnológicos contribuiria para o acesso à informação de forma coletiva no ambiente escolar. Contudo, a escola e os profissionais envolvidos não têm acompanhado o desenvolvimento da sociedade e suas tecnologias no mesmo ritmo.
A necessidade de profissionais atualizados e resiliência nas instituições têm gerado grande pressão sobre o ambiente escolar, sobretudo em virtude das novas demandas que têm sido levadas aos profissionais da educação, em especial os docentes, que precisam se reinventar constantemente para que consigam alcançar os objetivos de ensino. Nos últimos anos, esses objetivos passam pela apropriação de TIC que não fiquem restritas nas interações sociais.
As TIC, atualmente, em plena ascensão, entretanto, podem não ter seu uso alinhado com mudanças práticas e metodológicas significativas caso esses profissionais não participem de forma ativa deste processo. As TIC são desenvolvidas pelos setores e profissionais da tecnologia e são apresentados aos docentes como algo indispensável ao processo de ensino e aprendizagem. Porém, não raramente, o docente não se sente confiante para utilizar determinados recursos, pois simplesmente não foi treinado para fazer seu uso de maneira adequada (Buckingham, 2010).
Entretanto, o atual contexto pode se consolidar como o impulso para mudanças mais sólidas e consistentes em direção ao uso eficiente das TIC, ambicionando que elas não sejam utilizadas temporariamente e/ou superficialmente como recursos ilustrativos. Porém, é importante que a sequência desse processo se dê com diálogo entre gestores públicos, instituições privadas e profissionais da educação, visando aproveitar de forma eficiente a familiarização com as TIC que está ocorrendo.
O questionário possibilitou acessar diretamente os docentes, aproximando significativamente as opiniões e impressões que estes têm sobre o uso de TIC e ensino remoto. Contudo, um fator negativo do procedimento adotado foi o baixo alcance, o que pode ser justificado por diversos fatores, sobretudo o contexto atual e a mudança da rotina da população nas variadas esferas.
Mesmo carecendo de mais amplitude em relação ao número de respondentes, a pesquisa permitiu esboçar alguns questionamentos que envolvem justamente o interesse e afinidade com os recursos tecnológicos, mas que não devem ser preponderantes no município.
Podemos observar a existência de docentes que não possuíam qualquer habilidade prévia ou mesmo interesse para o uso das TIC em suas aulas, tornando as demandas atuais ainda mais extenuantes. Este é um aspecto que pode se desdobrar em novos estudos mais aprofundados visando compreender melhor as justificativas e principais dificuldades existentes para um docente se apropriar de novos recursos educacionais e modificar sua metodologia de ensino.
Referências
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Publicado em 14 de setembro de 2021
Como citar este artigo (ABNT)
BARROS, Fabrizio da Costa. Práticas e recursos aplicados ao ensino remoto de Geografia. Revista Educação Pública, v. 21, nº 34, 14 de setembro de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/34/praticas-e-recursos-aplicados-ao-ensino-remoto-de-geografia
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