Equidade de gênero e educação Química: uma sequência didática para o ensino de estequiometria
Isadora dos Santos Alves
Graduanda em Ciências Biológicas, bolsista de iniciação científica (UENP/CLM)
Natalia Helena Costa do Ó
Graduanda em Ciências Biológicas, bolsista de iniciação científica (UENP/CLM)
Denise Caroline de Souza
Mestra em Ensino de Ciências e Educação Matemática, docente de Química (SEE/MG)
Luis Guilherme Sachs
Doutor em Ciências dos Alimentos, docente (UENP/CLM)
Juliane Priscila Diniz Sachs
Doutora em Ensino de Ciências e Educação Matemática, docente (UENP-CLM)
A estequiometria (do grego stoicheon, elemento, e metron, medida) é um conteúdo de caráter quantitativo relacionado às fórmulas e equações químicas (Cazzaro, 1999). Historicamente, a estequiometria contribuiu para o desenvolvimento da Química Moderna, possibilitando o entendimento quantitativo acerca da matéria, por meio de representações simbólicas (fórmulas e equações químicas) e do estabelecimento de relações entre os níveis macroscópico e atômico-molecular da matéria, de modo a explicar suas propriedades, composições e transformações (Santos; Silva, 2013). A estequiometria tem sido essencial para a compreensão de muitos conteúdos da Química e para o desenvolvimento de pesquisas científicas – não apenas dessa disciplina, mas de várias outras das Ciências da Natureza.
Apesar de sua relevância à Ciência, a estequiometria é considerada um conteúdo de difícil aprendizagem, sendo citada, tanto por estudantes do Ensino Médio como do Superior, como um dos assuntos mais difíceis de se aprender (Cotes; Cotuá, 2014; Galagovsky; Giudice, 2015; Niaz, 2016; Niaz; Montes, 2012). Também há desinteresse das/os estudantes e as dificuldades de autonomia de estudo (Lima et al., 2019). Outro obstáculo bastante relevante à aprendizagem de estequiometria, que é frequentemente relatado pela literatura da área como um dos principais fatores para a falta de compreensão conceitual e significativa dessa matéria, é o uso quase que exclusivo do método tradicional de ensino (Niaz, 2016).
A aprendizagem conceitual e significativa da estequiometria requer o domínio e a associação de vários conceitos, tais como a natureza corpuscular da matéria, a quantidade de matéria, a constante de Avogadro, a conservação da matéria, o domínio do nível representacional da Química, as leis das proporções múltiplas e definidas, entre outros, bem como a sua aplicação a diversos contextos. Contudo, a aprendizagem conceitual e significativa de estequiometria é dificultada pelo fato de que tanto docentes como os materiais educacionais frequentemente enfatizam estratégias que usam algoritmos e memorização, ao invés do entendimento conceitual, que requer o reconhecimento e a organização de "pedaços" de informações.
Em função disso, as/os estudantes frequentemente tentam resolver os problemas que envolvem a estequiometria por meio da aplicação de algoritmos memorizados, deixando de lado a compreensão conceitual e sua articulação por meio do raciocínio. Além disso, muitas vezes, em consequência desses modos de ensino exclusivamente tradicionais, as/os estudantes entendem que a memorização de fatos e fórmulas representa o conhecimento da matéria (Cotes; Cotuá, 2014; Galagovsky; Giudice, 2015; Niaz, 2016; Niaz; Montes, 2012).
Outro aspecto relevante, porém pouco abordado, e que incluímos aqui para reflexão acerca do uso exclusivo dos modos tradicionais de ensino de estequiometria, refere-se às questões de gênero na Educação Científica. A esse respeito, podemos encontrar os modos tradicionais de ensino entre os vários fatores discutidos pela literatura acadêmica como causas para as disparidades de gênero nesse campo (Sinnes, 2004; Tindall; Hamill, 2004). Esse é um ponto preocupante, uma vez que, além de injustas, as disparidades de gênero na Ciência e na Educação Científica são prejudiciais ao desenvolvimento social e econômico das nações (Torresi; Pardini; Ferreira, 2010).
Muito embora não se observem diferenças entre as capacidades cognitivas de meninos e meninas (Fausto-Sterling, 2012; Piraksa; Srisawasdi; Koul, 2014), os modos tradicionais de ensino têm sido relacionados a um menor desempenho do gênero feminino (Zohar, 2006). Tal fato supõe a relevância da influência de fatores externos aos sujeitos e que impactam de modo distinto entre os gêneros. Por exemplo, em relação à compreensão conceitual de conteúdos que envolvem a estequiometria, Iztok Devetak e Aleksij Glazar (2010) observaram diferenças em função do gênero nas habilidades mentais, motivacionais e no sucesso para a compreensão de representações no nível das partículas por estudantes com 16 anos. De acordo com esses autores, as meninas tiveram pontuações mais baixas do que os meninos nas avaliações que envolviam a interpretação e a representação de desenhos de partículas.
De acordo com Anat Zohar (2006), as meninas se sentem desencorajadas a se envolver com disciplinas científicas quando os métodos de ensino promovem a aprendizagem mecânica e a resolução de problemas de forma algorítmica; ao contrário, elas se sentem mais estimuladas quando o ensino incentiva o pensamento e a compreensão profundos, com base em abordagens contextualizadas. Conforme essa autora, meninos também se envolvem mais nessas disciplinas quando o ensino favorece o pensamento e a compreensão profundos, embora, de forma geral, eles sejam menos afetados do que as meninas em relação aos métodos de ensino tradicionais. A autora salienta, entretanto, que os modos de aprender e as preferências por estratégias de ensino em Ciências, embora relacionados com o gênero, não são determinados por ele.
No que se refere à equidade de gênero no ensino de Ciências, abordagens sensíveis ao gênero apresentam características potenciais para o alcance desse objetivo, indicando princípios e conteúdos de natureza diversificada a serem considerados e integrados ao conteúdo disciplinar. A esse respeito, a literatura acadêmica aponta a interdisciplinaridade como modo de superar a fragmentação do ensino disciplinar e tradicional, proporcionando a integração de diversos conhecimentos acadêmicos, procedimentais e fenomenológicos, tornando-os relevantes para as/os estudantes e, assim, favorecendo a aprendizagem significativa das/os mesmas/os. Todavia, muitas vezes a concretização da interdisciplinaridade esbarra nos currículos de sistemas de ensino disciplinar. Como modo de contornar essa situação, é possível a promoção de momentos interdisciplinares dentro das disciplinas. Dito isso, é válido criar um momento interdisciplinar para o ensino de estequiometria, por meio das fases da metodologia da Ilha de Interdisciplinaridade de Racionalidade (IIR) de Gérard Fourez et al. (1997), da aplicação de princípios de abordagem sensível ao gênero e da integração de diversos conteúdos de natureza conceitual, procedimental e atitudinal.
Referenciais teóricos e metodológicos
Entendemos que a equidade de gênero no Ensino de Ciências trata das formas em que se tecem, conscientemente, circunstâncias favoráveis para que todas/os as/os estudantes tenham acesso a ensinos e aprendizagens de Ciências cultural e socialmente relevantes para suas vidas. Isso requer de suas/seus agentes que identifiquem e ajam para interromper as estruturas de poder que possam impedir o alcance desse objetivo; que assumam compromissos políticos e postura ética e moral; e que se atentem à diversidade, ao contexto e às histórias de vida das/os estudantes (Fortney; Morrison; Rodriguez; Upadhayay, 2019).
Considerando esses contextos em relação aos modos de promover a equidade de gênero na Educação Científica, orientamo-nos pela abordagem "sensível ao gênero", conforme foi descrita no quadro teórico elaborado pela pesquisadora Astrid Sinnes (2004). Acreditamos que tal abordagem é favorável para alcançar uma Educação Científica equitativa em gênero, visto que ela se opõe a abordagens que dão tratamento homogeneizante aos indivíduos e que desconsideram a pluralidade desses e de suas experiências de vida (Sachs, 2019).
Uma abordagem "sensível ao gênero" valoriza as diferenças entre indivíduos de um mesmo grupo de gênero, considerando que ele é diversificado. Tal abordagem rejeita as ideias de que todas as mulheres se encontram unidas pelo seu sexo, de determinismo biológico e de superioridade epistêmica de qualquer grupo em relação ao outro. O gênero não é considerado o único fator que influencia as características dos indivíduos, embora seja relevante, mas entende-se que muitos outros fatores de discriminação social se inter-relacionam entre si e com o gênero de modo complexo e que eles devem ser levados em conta. A Ciência e a Educação Científica são assumidas como atividades não neutras, que sofrem influência das perspectivas e das características das/os suas/seus desenvolvedoras/es e que, frequentemente, servem de modo desproporcional aos interesses de grupos hegemônicos. Dessa forma, tais atividades reproduzem as discriminações sociais, pois são situadas no contexto social, histórico, cultural e econômico.
A equidade de gênero, segundo uma abordagem sensível ao gênero, é alcançada, entre outras coisas, por tratamentos múltiplos e adequados às características e necessidades diversificada das/os estudantes; e que possibilitem observar as relações entre a ciência, a tecnologia e a sociedade, destacando as dimensões sociais, políticas, culturais e psicológicas da ciência, demonstrando que ela é algo construído e que sofre alterações, explicitando e avaliando os pressupostos que sustentam o desenvolvimento do conhecimento científico e os modos como o contexto social influencia esse conhecimento; conforme Gérard Fourez et al. (1997), o ensino tradicional, caracterizado pela fragmentação disciplinar e pela descontextualização de seus conteúdos, se revelou pouco eficiente para a formação de indivíduos capazes de mobilizar seus saberes disciplinares [pouco integrados entre si] para resolver os problemas complexos de seu cotidiano. Tais aspectos acarretaram dificuldades de aprendizagem e pouco interesse das/os estudantes pela Ciência. Assim, como modo de superação das dificuldades resultantes de um ensino exclusivamente tradicional e disciplinar, Gérard Fourez et al. (1997), entre outras e outros pesquisadoras/es, propõem a interdisciplinaridade na Educação.
De acordo com Vanderlei Lavaqui e Irinéa Batista (2007), na interdisciplinaridade aplicada à Educação é indispensável a integração de três dimensões relevantes ao processo educativo: o saber declarativo (acadêmico), o saber processual (instrumental) e o saber ser (fenomenológico). Dessa forma, entendemos que, no que diz respeito às questões da Educação, a interdisciplinaridade procura desenvolver sujeitos emancipados, autônomos, responsáveis, críticos, capazes de atuar funcionalmente na sociedade, por meio da aquisição de conhecimentos de ordem conceitual, procedimental e atitudinal.
Apesar de a interdisciplinaridade apresentar elementos potenciais para os objetivos colocados para a sequência didática (SD) de forma geral, existem dificuldades quanto à sua efetivação em vários contextos institucionais, como é o caso da maioria das escolas públicas de Ensino Médio no Brasil. A principal dificuldade está no fato de que esses loci são estruturados conforme especialidades, isto é, de modo disciplinar. A esse respeito, como meio de superar as dificuldades de implementar esses modos de ensino interdisciplinares em estruturas caracteristicamente disciplinares, Irinéa Batista e Rosana Salvi (2006, p. 180-181) propõem que, nesses contextos, se promovam "momentos interdisciplinares".
A interdisciplinaridade, nessa perspectiva, não requer a construção de um currículo interdisciplinar; por outro lado, implica a implementação de momentos particulares em sistemas ou processos que se estruturam disciplinarmente, como geralmente é o caso da disciplina de Química. A concepção de momentos interdisciplinares está
centrada na promoção de uma aprendizagem significativa, permitindo a implementação de práticas interdisciplinares na construção do conhecimento durante o processo de ensino e de aprendizagem, e não apenas associando a interdisciplinaridade a finalidades sociais, essa proposta pode se colocar como uma alternativa com potencial de proporcionar a superação da excessiva especialização dos conteúdos presentes nas disciplinas escolares, notadamente no Ensino de Ciências e de Matemática na escola média (Lavaqui; Batista, 2007, p. 413).
Entre os modos de oportunizar tais momentos interdisciplinares sugeridos por Vanderlei Lavaqui e Irinéa Batista (2007), encontram-se as Ilhas de Interdisciplinaridade de Racionalidade (IIR), de Gérard Fourez et al. (1997). A construção de Ilhas de Interdisciplinaridade de Racionalidade (IIR) integra conhecimentos de diversas áreas, a fim de proporcionar uma representação (uma explicação) teórica para determinada situação-problema. As IIR são estruturadas em momentos, denominados como segue: Preliminar - situação-problema; Clichê; O panorama espontâneo; A consulta a especialistas e às especialidades; Prática; Abertura aprofundada de algumas caixas-pretas para buscar princípios disciplinares; Esquematização global da situação-problema; Abrir algumas caixas pretas sem ajuda de especialistas; Síntese da IIR produzida (Fourez et al., 1997). Tendo apresentado os referenciais teórico-metodológicos envolvidos, por fim, na seção a seguir, apresentamos a sequência didática proposta por meio de sua articulação com os conteúdos selecionados.
Sequência didática para um ensino de estequiometria equitativo em gênero
A sequência didática (SD) aqui apresentada foi pensada para ser aplicada na 2ª série de Química do Ensino Médio. Para ela, propusemos a integração de conhecimentos da Química (estequiometria), da história da Ciência, das questões de gênero e étnico-raciais e dos saberes populares, por meio de um projeto para resolução de uma situação-problema relacionado às experiências de vida das/os estudantes.
A SD proposta é um planejamento de situações, técnicas e estratégias que poderão ser executadas no desenvolvimento das aulas para construção de uma IIR. Esse planejamento deve estar subordinado aos objetivos e recursos disponíveis (materiais, humanos etc.). Além disso, deve-se ter em mente que, ao se desenvolver esta SD, é necessário manter certa flexibilidade para se adequar às características, motivações e aspirações das/os estudantes, as atividades podem ser adaptadas ao longo do seu desenvolvimento. As/os participantes podem e devem interferir em sua construção. O ideal seria que a/o docente não influenciasse nesse processo, mas é inevitável que isso ocorra. O importante é tomar ciência e refletir a respeito dessa influência para que os objetivos propostos sejam alcançados (Schmitz, 2004). À/Ao docente cabe identificar (ou adaptar): o contexto, os destinatários, o objetivo e qual será o produto.
Assim, embora tenhamos sugerido o desenvolvimento da SD segundo as etapas propostas por Gerard Fourez et al. (1997), elas "são pistas metodológicas, que não precisam ser seguidas ao pé da letra, mas sim adaptadas e modificadas segundo as particularidades do 'terreno'" (p. 103). Ademais, cabe às/aos participantes decidir a duração de cada etapa, de acordo com seus objetivos e possibilidades. O tempo é fator relevante, pois servirá como balizador para a abertura ou não de determinadas caixas-pretas. Aqui fazemos uma proposição de tempo que, assim como as atividades, poderá ser adaptada aos objetivos e contingências. Outro aspecto relevante a ser comentado é que, na prática, não se trabalha de maneira linear: o resultado de uma etapa pode contemplar o de outra. Não há, portanto, obrigatoriedade de realizar todas as etapas; entretanto, é recomendado que se aplique cada uma delas pelo menos uma vez (Fourez et al., 1997). A seguir está um quadro que contempla as informações essenciais da SD construída.
Quadro 1: Detalhamento da sequência didática
Momentos da IIR |
Duração prevista |
Atividades propostas |
Objetivos a serem alcançados pela/o estudante |
1 - Situação-problema |
2h/a |
- Realizar uma problematização acerca das pandemias e seus impactos, usando a História da Ciência. - Introduzir conceituação de estequiometria. |
A partir da problematização pelo estudo dos contextos sócio-históricos e culturais envolvidos nos casos das pandemias da gripe espanhola e da covid-19 no Brasil, motivar e estimular atitudes e predisposições favoráveis à aprendizagem significativa do conteúdo de estequiometria, bem como da relação entre valores e Ciência. |
2 - Clichê |
1h/a |
- Identificar as concepções prévias das/os estudantes por meio de um brainstorming; - Elaborar um perfil de respostas por meio de um quadro, que será utilizado como norteador para as etapas subsequentes. |
Conscientizar as/os estudantes de suas concepções acerca do problema. |
3 - O panorama espontâneo |
1h/a |
- Realizar, com auxílio da/o docente, uma primeira esquematização da IIR, elaborando listas de atividades, conteúdos e especialidades que possivelmente ajudarão na resposta à problematização inicial. - Listas de participantes, normas, posturas, conteúdos, bifurcações, especialistas e especialidades que possam sanar a situação-problema. |
Promover a mobilização das/os estudantes e proporcionar o desenvolvimento de habilidades de autonomia para planejar os estudos, de aprender a aprender, de avaliar as situações problemáticas, de crítica e autocrítica e de despertar a consciência social, promovendo a adoção da equidade como valor. |
4 - A consulta a especialistas e às especialidades, Prática, Abertura aprofundada de algumas caixas-pretas e Abrir algumas caixas-pretas sem ajuda de especialistas |
6 h/a |
- Abordar de forma contextualizada a temática estequiometria e aspectos relacionados à Natureza da Ciência, com suporte de especialistas e atividades investigativas. |
Compreender os conceitos relacionados a estequiometria e Natureza da Ciência, questões de gênero e saberes populares. Exercitar o raciocínio lógico, hipotético-dedutivo e analógico. |
5 - Esquematização global da situação-problema |
2 h/a |
- Elaborar um mapa conceitual ou um esquema dos principais resultados alcançados com as etapas elaboradas (pode ser elaborada ao longo de toda IIR; nesse caso o tempo pode ser reduzido). |
Compreender de forma ampla e significativa os conceitos abordados (descritos no detalhamento da SD) a fim de estabelecer uma resolução para a situação-problema. Visualizar e organizar as relações entre conceitos, procedimentos e valores envolvidos, consolidando as aprendizagens. |
6 - Síntese da IIR produzida |
2 h/a |
- Produzir um vídeo com a síntese da IIR desenvolvida, propondo uma resposta para a situação-problema inicial. - Apresentar a representação à situação-problema inicial, fornecendo uma solução para ela. - Avaliar a representação produzida. |
Ser capaz de aplicar os conhecimentos adquiridos em uma situação prática. Ser capaz de autoavaliar suas aprendizagens de caráter conceitual, procedimental e atitudinal. |
A seguir apresentamos o detalhamento da SD como sugestão para o seu desenvolvimento.
1 – Estruturação da situação-problema
Para os propósitos desta SD, sugerimos sua estruturação por meio de um problema cotidiano relacionado às vidas das/os estudantes cujas possíveis soluções requeiram a mobilização dos conceitos da estequiometria, bem como discussões acerca de algumas características de Natureza da Ciência. Dessa forma, pretende-se favorecer a criação de condições necessárias para a ocorrência de aprendizagens significativas e equitativas em gênero, atuando na motivação das/os estudantes e possibilitando o estabelecimento do maior número de vínculos substantivos e não arbitrários entre os seus conhecimentos prévios e as situações a serem resolvidas.
Dito isso, descreveremos a formulação de uma situação-problema conforme os propósitos desta SD. Para isso, consideraremos o momento recente, em que se instaurou a pandemia da covid-19. De forma geral, essa pandemia tem afetado de modo dramático o cotidiano das/os estudantes, tornando-se um tema familiar e relevante para suas vidas e, dado o seu caráter histórico, poderá continuar sendo relevante para a contextualização de abordagens de ensino mesmo após seu maior impacto. Ademais, outras epidemias podem ser esperadas e a compreensão da pandemia atual pode auxiliar em eventuais enfrentamentos futuros. Assim, propomos a formulação de uma questão com base em uma problematização inicial em que, primeiramente, as/os estudantes são informadas/os de que estudarão o conteúdo de estequiometria para tentar resolver um problema relacionado à prevenção e ao combate da covid-19.
Optamos por formular a questão com as/os estudantes após a apresentação do contexto, para que aspectos sociais – tais como classe econômica e social, raça e gênero – sejam incluídos na questão foco. Sugerimos que a/o docente apresente materiais selecionados, proponha investigações em fontes e debate(s) para avaliar a legitimidade da afirmação, amplamente repetida pela mídia no início da pandemia: "a Covid-19 afeta todas as pessoas de modo igual, independente da classe econômica e social, raça ou gênero". Vídeos e textos jornalísticos podem servir de fonte dessa investigação para a especificação do contexto.
Nessa problematização, a/o docente pode explorar a história de outras pandemias, por exemplo, o caso da gripe espanhola (1918) no Brasil, estabelecendo paralelos acerca da relação entre ciência e sociedade e as questões relativas à política, à economia e às categorias de classe, gênero e raça, entre os diferentes contextos históricos. A esse respeito, a/o docente pode consultar artigos como os de Adriana Goulart (2005), de Christiane Souza (2005) e de Anna Ribeiro (2020), que tratam da história da gripe espanhola nas cidades do Rio de Janeiro, de São Paulo e de Botucatu, respectivamente, bem como procurar reportagens da época para ilustrar suas colocações.
Com base nesses referenciais, ao se traçarem paralelos entre o contexto brasileiro da pandemia da Covid-19 e o contexto brasileiro da gripe espanhola (1918), é possível notar aspectos que podem suscitar reflexões acerca da Natureza da Ciência.
Um paralelo relevante, que pode ser discutido, diz respeito às ideias de senso comum acerca das doenças que, muitas vezes, se opõem aos conhecimentos científicos. A esse respeito, por exemplo, a gripe espanhola era referida como uma doença que afetaria apenas a população idosa. Essa noção de senso comum teve como implicação uma elevada taxa de mortalidade pela doença, pois pessoas mais jovens, partindo desse pressuposto, por vezes ignoravam as recomendações acerca de estratégias de prevenção e combate à doença feitas pelas autoridades de saúde. A relação entre ciência e sociedade também pode ficar explícita a partir da insatisfação da população da época com tais estratégias e com os serviços de saúde deficientes para certos grupos sociais. A Ciência não apresentava soluções satisfatórias para as classes socioeconômicas mais vulneráveis, que sofriam com a falta de organização do Estado para o enfrentamento da doença. Faltavam a elas alimentos, remédios e hospitais. O avanço e a agressividade da gripe ultrapassavam a capacidade de produção de medicamentos. A doença apresentava um padrão de mortalidade diferenciado por grupos sociais. As mortes durante a epidemia não ocorriam apenas pela doença, mas também pela fome.
Em virtude da ineficiência do Estado e da resposta insatisfatória da ciência (Medicina e Saúde) diante dos problemas sociais que envolviam o contexto da pandemia da gripe espanhola, a população desenvolveu seus próprios tratamentos, tais como: amplo consumo de limão (a ponto de faltar a fruta em São Paulo); queima de alcatrão para limpeza de edifícios; inalação de vaselina; uso de sal de quinino; e até mesmo a procura por curandeiros/as. Essas práticas eram parte da vida da população, principalmente para as classes sociais e econômicas mais baixas, que não tinham acesso aos serviços de saúde.
Com base no contexto da gripe espanhola, por comparação, pode-se explorar os problemas da relação entre ciência e sociedade no cenário político e pandêmico atual. Para isso, indicamos a inclusão, nas discussões de sala de aula, dos elementos de classe, raça e gênero. Essas discussões podem ser conduzidas de modo a evidenciar o fato de que, historicamente, a Ciência não tem sido neutra, isto é, seus produtos não atendem igualmente a todas as pessoas, visto que, em função de fatores como classe, raça/etnia, gênero, contexto político, social e econômico, entre outros, ela pode apresentar soluções que são viáveis apenas a uma parcela da população, como é o caso da recomendação de isolamento social. Todavia, é relevante destacar que o ideal de equidade na ciência deve ser perseguido para dar atendimento tanto a seu objetivo cognitivo quanto ao social (Lacey, 2008).
A partir dessa proposta de contextualização e da conclusão a que ela pode ser conduzida, a/o docente pode informar às/aos estudantes de que irá propor a elas/es um problema que envolve a pandemia da covid-19 e que elas/es terão que estudar para propor uma solução envolvendo o conteúdo de estequiometria. Nesse momento, sugerimos que a/o docente questione oralmente as/os estudantes sobre o que já sabem a respeito desse conteúdo, registrando suas primeiras noções. Em seguida, a/o docente pode apresentar algumas noções mais fundamentais acerca desse conteúdo, explicando brevemente o significado do nome, do que se trata (aspectos quantitativos acerca das fórmulas e equações químicas) e da relevância que esse conteúdo tem para a Química e para a sociedade (sem citar o caso da pandemia). Nesse momento não é necessário aprofundar, pois uma abordagem mais direta e detalhada dos conceitos da estequiometria será realizada nas fases de consulta aos especialistas e às especialidades, de prática e/ou de abertura aprofundada de algumas caixas-pretas. O que importa nessa primeira aproximação é garantir informações suficientes para que as/os estudantes consigam expressar as suas primeiras ideias ou ideias espontâneas acerca da questão foco a ser estruturada.
Após a contextualização, a/o docente pode estruturar e/ou apresentar a questão foco junto às/aos estudantes: a estequiometria é o assunto da Química que envolve o entendimento das relações quantitativas das fórmulas e equações químicas – por exemplo, da relação entre as quantidades de reagentes necessários e dos produtos que podem ser formados, das concentrações e composições das misturas, entre outras coisas. A estequiometria, portanto, é fundamental para entendermos vários aspectos de nossa vida cotidiana. No presente momento, estamos enfrentando uma pandemia pela covid-19, que já ocasionou diversas mortes. Ao contrário do que se pensa, essa doença não é "democrática", isto é, não afeta as pessoas de forma igualitária ou independente de fatores como classe, raça e gênero. Diante disso, questionamos: como podemos usar o conhecimento de estequiometria para compreender e desenvolver algum(uns) tipo(s) de proposta(s) para combater a pandemia da covid-19 e reduzir os seus impactos desiguais?
É relevante destacar que as discussões da questão foco não devem se restringir às soluções apenas no nível do sujeito. Embora essas soluções possam ser as mais viáveis de serem conduzidas em termos práticos em uma abordagem de aula, as discussões realizadas não devem isentar o Estado e a sociedade ou a coletividade das suas responsabilidades; pelo contrário, essas devem ser colocadas no foco das discussões e críticas.
2 – Clichê
A contextualização deve culminar com a formulação da questão foco e com a solicitação às/aos estudantes de que apresentem suas respostas espontâneas. Sugerimos que a/o docente solicite às/aos estudantes que comuniquem verbalmente suas ideias iniciais acerca da questão por meio de um brainstorming e, em seguida, solicite que as registem por escrito, de modo individual, e entreguem os registros à/ao docente (por meio digital ou não, dependendo do momento, do desejo ou necessidade de realizar ou não o ensino remoto). A/O docente poderá organizar um quadro de respostas a ser apresentado para o trabalho da etapa seguinte. É possível que as/os estudantes forneçam respostas iniciais à situação-problema mencionando preparo de vacinas, uso de álcool 70º INPM ou álcool em gel, de água sanitária e/ou de sabão, sem, entretanto, relacionar com o problema de equidade, uma condição de contorno estabelecida pela situação-problema.
Conforme nossa proposta, as fases de problematização e clichê não serão mera colocação de um questionamento às/aos estudantes; logo, o tempo dispendido nelas será significativo, principalmente na fase de problematização, cujo tempo deve ser suficiente para que ocorra boa compreensão e estruturação da situação-problema, pois essa fase é crucial para o desenvolvimento frutífero das demais etapas da abordagem. Esse tempo é justificável, visto que a aprendizagem da estequiometria é um pré-requisito para o desenvolvimento de grande parte dos conteúdos da Química.
3 – Panorama espontâneo
Sugerimos que esta fase não ocorra no mesmo dia que a anterior, Clichê, para que a/o docente tenha tempo de organizar um quadro com as respostas das/os estudantes; esse quadro será trabalhado no planejamento do projeto. Nessa fase, pode-se elaborar diversas listas, tais como:
Lista de envolvidos: determina a relação de grupos sociais ou indivíduos envolvidos na situação estudada (estudantes, especialistas, destinatários etc.). Ao elaborar essa lista, se evidencia que o problema não é de ordem meramente técnica ou científica.
Lista de normas e condições impostas pela situação estudada: define as normas envolvidas na situação, podendo ser normas impostas por determinados poderes (Legislativo, a direção de uma escola etc.) e normas que não são impostas por um poder específico. Por exemplo, ao se envolver em um experimento ou elaboração de produtos que requerem reagentes químicos, é preciso atentar para normas de segurança de trabalho, como o uso de EPI, entre outras. Na situação considerada para este projeto, também é necessário planejar as ações obedecendo a normas de higiene e de prevenção à covid-19. Na listagem de propostas de soluções à situação-problema que aparecem nas respostas iniciais das/os estudantes, será necessário refinar (ou reduzir) a lista de opções para aquelas que seriam viáveis de serem colocadas em prática em termos materiais e conceituais, isto é, em função dos objetivos e recursos disponíveis.
Lista de posturas e tensões: define benefícios, inconvenientes e consequências que o assunto abordado ocasionaria. Por exemplo: quanto tempo as/os agentes usariam como trabalho extraclasse? Qual o custo dos materiais necessários? Como devem ser organizados os trabalhos em grupo e as práticas no contexto imposto pela covid-19? Trata-se, portanto, de uma lista de questionamento das variáveis, suas vantagens e desvantagens, consequências, valores, interesses dos atores envolvidos etc.
Lista de caixas-pretas: define as caixas-pretas que poderiam ser estudadas a fundo, ou ao contrário, não serem examinadas. Isto é, serão definidos quais conteúdos, conhecimentos ou dispositivos serão estudados em maior profundidade mais adiante, com auxílio de especialistas e especialidades. Por exemplo, se as/os participantes decidirem que fabricarão sabão para doar a populações carentes, elas/es podem realizar a sua produção seguindo uma receita sem se aprofundar na compreensão dos valores culturais ou dos mecanismos químicos envolvidos, podendo ignorá-los ou, pelo contrário, podem escolher "abrir uma caixa-preta" a esse respeito, consultando especialistas ou especialidades para compreender o valor cultural e os conceitos químicos envolvidos.
Lista de "bifurcações": uma "bifurcação" surge quando há necessidade de optar entre estratégias. Muitas dessas escolhas são técnicas, porém algumas têm dimensão ética; todavia, qualquer que seja a escolha, ela não deve ser facilmente reversível. Por exemplo: se a produção de sabão foi uma decisão do grupo, podem surgir várias opções de processos e materiais para a sua realização. Existem materiais de custo menor disponíveis em certas localidades e que são mais ecológicos (alguns são até mesmo considerados como lixos ou descartes), mas que a sua obtenção e o manuseio serão mais trabalhosos do que outros obtidos mais facilmente no comércio. Pode-se escolher a fabricação de sabão por meio de um processo artesanal, que possibilita a interação com elementos das culturas locais, ou optar por um processo descrito em livros de Química e que possibilita pouca relação com os saberes culturais.
Lista de especialistas e especialidades: é definida de acordo com cada IIR e de acordo com o contexto. É necessário fazer uma lista dos/as especialistas que, eventualmente, poderão esclarecer o problema estudado. Essa lista dependerá das escolhas em relação às caixas-pretas. Quanto a esse aspecto, pensamos ser relevante informar às/aos estudantes que a problemática colocada exige também respostas que envolvem conceitos da Química, pois ela requer que se compreenda "como a estequiometria pode ajudar". Para responder a essa questão, haverá necessidade de elencar os conceitos químicos e exemplares do conteúdo de estequiometria necessários para compreender. A interferência da/o docente nessa fase terá que ser maior ou menor na medida em que as/os estudantes tenham maior ou menor dificuldade em elencar tais conceitos.
Nessa fase, a/o docente deve manter a atenção nas sugestões das/os estudantes, pois isso permitirá avaliar o nível de conhecimento/desenvolvimento delas/es e auxiliá-las/os na construção das listas, ampliando as possibilidades e, em seguida, avaliando-as. Após discussão coletiva mediada pela/o docente, é possível que as opções sejam reduzidas a uma ou duas.
Considerando que as respostas das/os estudantes à questão problema podem ser relacionadas ao preparo de vacinas, álcool 70º INPM ou álcool em gel, a água sanitária e/ou a sabão etc., durante as discussões para elaboração de listas no panorama espontâneo a ponderação do problema com as/os estudantes pode levar à conclusão de que deveriam propor modos mais econômicos de produzir sabão para a doação ou para ensinar a prepará-lo (visto que as populações carentes teriam dificuldade de acesso a esses produtos). Por questão de segurança, pode-se decidir pesquisar os modos de preparo mais seguros, além de econômicos, e quais produtos analisados as/os estudantes ou as/os destinatárias/os teriam condições, diante de todas as limitações listadas, de produzir. Após discussão na fase de panorama espontâneo, as/os estudantes podem reduzir as suas opções, por exemplo, à produção de álcool (supondo que conseguiriam obter álcool 95% diretamente de uma usina da cidade a custo baixo ou mesmo dos postos de combustíveis para automóveis) e/ou de sabão.
4 - Consulta aos especialistas e às especialidades, prática e abertura aprofundada de algumas caixas-pretas
Sugerimos que a/o docente elabore atividades contextualizadas que poderiam ser realizadas com as/os estudantes de modo a promover aprendizagem dos conteúdos de estequiometria e, ao mesmo tempo, mobilizar discussões de Natureza da Ciência, por exemplo, em relação à diferenciação e ao diálogo que podem ser estabelecidos entre os conhecimentos científicos e os saberes populares ou da tradição, bem como em relação às questões de gênero e a ciência. A seguir, indicamos uma atividade que pode ser desenvolvida com as/os estudantes no aprofundamento acerca dos assuntos de estequiometria. Ela foi pensada baseada em algumas hipóteses acerca de possíveis resultados que poderiam ser obtidos para as etapas anteriores.
Atividade de ensino
Tendo em consideração que as/os estudantes podem ter apresentado dificuldades ainda básicas com relação à estequiometria, sugerimos que a/o docente inicie o assunto pelo balanceamento de equações químicas com base em uma contextualização histórica envolvendo a relação da princesa Isabel com a Química. Para isso, propomos que as/os docentes consultem referências como os artigos de Carlos Filgueiras (2004) e de Cássia Silva, Maria Silva e André Reis (2018). Esses artigos contextualizam a educação em Química recebida pela princesa Isabel e trazem alguns exemplos de exercícios de balanceamento de equações químicas realizados por ela. No que tange às discussões acerca do conteúdo da Química a ser tratado, sugerimos que a/o docente chame a atenção para a nomenclatura de certos compostos e as formas como se escreviam a equação química e as fórmulas dos compostos na época da princesa Isabel, "que era dominada pelo conceito de equivalente, na ausência de uma distinção clara entre átomos e molécula. "[A]té então, a fórmula da água era HO e os índices se escreviam acima e não abaixo dos símbolos dos elementos" (Filgueira, 2004, p. 353). A partir disso, a/o docente pode estabelecer relação entre os significados das equações químicas da época da princesa e as formas atuais de representá-las, que conta com o conhecimento bem estabelecido da "teoria" atômico-molecular e com instrumentos de medidas (como os espectrômetros), que possibilitam determinações precisas da estequiometria das espécies químicas. Assim, as/os estudantes devem aprender a diferenciar o coeficiente estequiométrico, que representa a proporção com que as espécies envolvidas reagem e se formam, da atomicidade, que é a quantidade de átomos de um dado elemento químico presente em uma espécie química e, a partir disso, entendendo que as quantidades dos elementos químicos presentes nas espécies reagentes são iguais àquelas dos produtos, aprendendo a balancear as equações químicas por tentativa.
Para que a/o docente possa trabalhar esses conteúdos de estequiometria, sugerimos que elabore um texto a partir das informações contidas nas referências pesquisadas e inclua questões que, após a leitura das/os estudantes, possam servir para dialogar e discutir tais conteúdos. Propomos como exemplos para esse tipo de questões os resumos 1, 2 e 3 apresentados por Cássia Silva, Maria Silva e André Reis (2018, p. 117).
No que tange ao conteúdo de Natureza da Ciência (NdC), a história do contexto da época envolvendo a princesa Isabel possibilita discutir a questão de equidade de raça/etnia, gênero e classe na Educação Científica e na ciência. A princesa Isabel foi uma das poucas mulheres a ter educação em Ciências, porque o imperador queria que a sua filha recebesse uma "educação de homem", dada a sua posição como futura governante. Em contraste, as pessoas das classes sociais e econômicas mais baixas, as mulheres e as pessoas negras, em geral, não tinham acesso a esse tipo de educação. Isso acarretou ao longo da história a sub-representação de mulheres e negros na Ciência. A Ciência, portanto, sofreu influência do contexto social, refletindo suas desigualdades e discriminações. É possível também discutir as especificidades envolvendo essas categorias, como a condição das mulheres negras em relação às brancas, das mulheres negras em relação aos homens negros, das mulheres brancas em relação aos homens negros, entre outras intersecções possíveis. Outro aspecto importante a ser aproveitado é o fato de a princesa Isabel ser lembrada pela assinatura da Lei Áurea. A esse respeito, é relevante discutir com as/os estudantes como a luta das pessoas negras foi invisibilizada ou deixada de fora da história oficial. Nesse sentido, a/o docente pode elaborar um texto a partir de uma pesquisa a esse respeito para ser discutido em conjunto com as/os estudantes, sugerir consulta aos especialistas ou às especialidades disponíveis ou abrir uma caixa-preta sem ajuda de especialistas.
5 - Esquematização global da situação-problema
Sugerimos que as/os estudantes, primeiro individualmente e depois em grupo, organizem esquemas gráficos ou mapas conceituais acerca das principais situações e dos conceitos envolvidos na resolução da situação-problema. Essa fase pode ocorrer em um momento específico, após as etapas apresentadas anteriormente, ou ser desenvolvida ao longo das etapas precedentes. Em seguida, cada grupo apresenta e explica à turma a representação obtida nessa etapa.
6 - Síntese da IIR produzida
Sugerimos que a/o docente solicite às/aos estudantes a elaboração de um vídeo que explique os diferentes processos de produção de sabão e como os conceitos de estequiometria se encontram envolvidos nessa produção e apresentem suas propostas de resposta para a questão foco.
Uma observação a ser feita aqui é que, junto ao vídeo, dependendo da solução dada pelas/os estudantes, é recomendado que elas/es decidam agir de modo a intervir no contexto. Desse modo, diversas ações podem ser propostas pelas/os estudantes, tais como: produzir (ou comprar) e doar máscaras e sabão à população carente; produzir e disponibilizar vídeos de produção e controle de qualidade de sabão caseiro com recursos alternativos para geração de renda durante a pandemia etc.
Por fim, para o Teste da Representação Construída, de forma coletiva, avaliam-se os vídeos produzidos: as equipes e a/o docente avaliam cada representação em função da solução dada ao problema e à aprendizagem dos conteúdos da estequiometria.
Considerações finais
O ensino de Química em cenário brasileiro sofre críticas acerca da sua forma tradicional de ser conduzido; em outras palavras, ainda se prioriza o ensino focado na memorização e aplicação de algoritmos de forma disciplinar, fragmentada. Além das críticas relacionadas ao não alcance de aprendizagem significativa e ao desinteresse de estudantes, destacamos outra consequência desse tipo de ensino, muito comum, porém pouco debatida: a desigualdade de gênero na Química. Frente às críticas, visamos neste artigo apresentar uma sugestão de prática interdisciplinar – ancorada nas Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade de Fourez – e sensível ao gênero para abordagem do conteúdo de estequiometria na Educação Básica.
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Publicado em 30 de novembro de 2021
Como citar este artigo (ABNT)
ALVES, Isadora dos Santos; Ó, Natalia Helena Costa do; SOUZA, Denise Caroline de; SACHS, Luis Guilherme; SACHS, Juliane Priscila Diniz. Equidade de gênero e educação Química: uma sequência didática para o ensino de estequiometria. Revista Educação Pública, v. 21, nº 43, 30 de novembro de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/43/equidade-de-genero-e-educacao-quimica-uma-sequencia-didatica-para-o-ensino-de-estequiometria
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