Verdade ou mentira? O papel do conhecimento científico em um contexto interdisciplinar
Ronaldo Adriano Ribeiro da Silva
Professor adjunto da Faculdade de Ciências Biológicas (UFPA), doutor em Ensino de Ciências (UEL), com doutoramento sanduíche no exterior na Universidade do Minho - Portugal
Ricardo Ferreira Vale
Docente da Escola Estadual Professor Rousset / SEE - . Sete Lagoas / MG
Valéria Ferreira Álvares
Docente da Escola Estadual Professor Rousset / SEE - . Sete Lagoas / MG
Diante do cenário epidêmico da covid-19, a educação escolar deparou-se com a necessidade de adaptar as metodologias e práticas pedagógicas a um novo contexto. O processo de ensino remoto constituído de aulas síncronas e assíncronas surgiu com o objetivo de suprir as aulas presenciais. Dessa forma, foi necessário aos educadores (re)planejar suas estratégias e metodologias de ensino, agregando a essas ferramentas tecnológicas um recurso pedagógico no processo de ensino-aprendizagem. De acordo com Souza (2020), as ferramentas digitais podem contribuir para as práticas de ensino possibilitando estreitar as relações de interatividade entre educador e educando.
Segundo a Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2017), nossa proposta abrange o desenvolvimento das seguintes competências:
Competência 5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas. Competência 7. Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva (Brasil, 2017).
Dentro das competências descritas, o ensino de Ciências deverá facilitar a alfabetização e o letramento científico, possibilitando aos educandos a apropriação e a aplicação de termos e conceitos da vida cotidiana. Gravina e Munk (2019) enfatizam que o ensino de Ciências deverá possibilitar aos educandos uma aprendizagem significativa.
As falsas notícias (fake news) emergem como temática bastante atual e controversa, com a qual, provavelmente, os educandos se depararam na era digital. Gaudêncio (2021), em seu trabalho “A alfabetização científica e o letramento científico frente às fake news do novo coronavírus”, aponta que o uso das tecnologias em tempos de disseminação de informações é necessário em todos os campos do conhecimento da Educação Básica contribuindo para uma formação de cidadania e criticidade do educando.
Para Cerencio (2020, p. 91), “as fake news são o resultado de um processo de criação de conteúdo (ou deturpação de um conteúdo já existente) e divulgação dele via internet com o objetivo de alcançar o maior número possível de usuários, em geral com intenções políticas ou econômicas”. Dentro dessa perspectiva, as fake news emergem como uma temática contemporânea e controversa, com a qual provavelmente os educandos se depararam na era digital.
O objetivo geral do trabalho foi proporcionar aos educandos conhecimentos básicos para reconhecer de maneira crítica as informações divulgadas na mídia, distinguindo as fontes de informações confiáveis e as fake news acerca da covid-19.
A propagação de notícias falsas acerca da eficiência e segurança das vacinas durante a pandemia da covid-19 pode ocasionar o aumento nas taxas de abstenção e disseminação do vírus, aumentando os números de óbitos e de contaminação.
Metodologia
A atividade foi realizada nas disciplinas de Ciências e Língua Portuguesa, tendo a participação de 61 educandos do 8° ano do Ensino Fundamental de quatro turmas da Escola Estadual Professor Rousset, localizada no município de Sete Lagoas/MG e desenvolvida em quatro aulas de 40 minutos de forma online, utilizando a plataforma Google Meet.
Na primeira aula, foi atribuída à disciplina de Língua Portuguesa uma abordagem relacionada a panfleto. A educadora realizou um levantamento de conhecimentos prévios acerca das vivências e experiências cotidianas relativas a recebimento, distribuição e leitura de panfletos. Após a abordagem inicial, a educadora apresentou o conceito e a estruturação de um panfleto (função, elementos constituintes e o processo de elaboração).
No segundo momento, o educador de Ciências realizou questionamentos referentes a fake news: definição, identificação, recursos midiáticos usados na propagação, reconhecimento da veracidade. Após as discussões foi apresentado um material em PowerPoint com matérias jornalísticas referentes a fake news e à pandemia da covid-19. Posteriormente, foi exibido outro trabalho em PowerPoint com os tópicos inicialmente abordados na parte diagnóstica; junto a eles, foram agregados: conceito de fake news, surgimento do termo, tipos (sátira ou paródia, falsa conexão e falso contexto), conteúdos (enganoso, impostor, manipulado e fabricado), possíveis consequências e discernimento de notícias.
No terceiro momento, como atividade extraclasse, foi solicitado aos educandos uma pesquisa na mídia e/ou orais relacionados à covid-19, objetivando a construção de um panfleto que abordasse a temática. Para a confecção dele, foi sugerido aos educandos que utilizassem o programa PowerPoint ou desenho livre. Na socialização das atividades, foram apresentadas e debatidas as produções.
Resultados e discussão
Durante a realização da atividade, observamos que os educandos demonstraram entusiasmo, interesse e empenho para executar a construção do panfleto. Apresentamos, a seguir, algumas das produções realizadas.
Figura 1: Panfleto sobre fake news
Figura 2: Panfleto sobre informação falsa sobre o coronavírus
Figura 3: Panfleto sobre fake news
Figura 4: Panfleto envolvendo fake news e covid-19
Por fim, foi aplicado um questionário avaliativo utilizando o Google Forms para avaliar as contribuições da atividade no processo de ensino-aprendizagem. Os resultados são apresentados nos gráficos a seguir.
Gráfico 1: Conhecimentos prévios sobre fake news
Gráfico 2: Dificuldades para a construção do panfleto
Gráfico 3: Critérios utilizados para identificar informações
Gráfico 4: Concepções posterior à aplicação da metodologia
Gráfico 5: Avaliação da atividade
Diante da avaliação dos resultados, nos aproximamos das ideias de Gaudêncio (2021), que adverte acerca da necessidade de uma formação midiática, junto aos educandos, para que eles sejam capazes de perceber e identificar a veracidade das informações. Dessa maneira, poderão estar capacitados para a percepção e diagnóstico de falsos conceitos científicos.
No fim do formulário, solicitamos aos educandos para escreverem uma palavra relacionada ao que a realização da atividade relacionada às fake news representou para eles. A partir das respostas dadas, elaboramos uma nuvem de palavras.
Figura 5: Nuvem de palavras
Conclusão
Consideramos que a atividade contribuiu de forma satisfatória para o processo de ensino-aprendizagem, promovendo uma reflexão acerca das causas e consequências da criação e disseminação de fake news. Quando inseridas na sociedade, essas falsas notícias podem interferir de forma negativa nas decisões diárias, vivências e experiências.
Por fim, sugerimos que outras áreas de conhecimento realizem atividades com esse foco, fomentando, assim, o desenvolvimento de habilidades de cultura digital e possibilitando aos envolvidos no processo de ensino-aprendizagem a capacidade de ler as informações com criticidade, de ser autônomos na tomada de decisões, de comparar informações, de saber identificar argumentos contraditórios e de ter um olhar científico para a alfabetização e o letramento científico.
Referências
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_20dez_site.pdf. Acesso em: 20 jul. 2021.
CERENCIO, Priscilla. De olho no futuro: projetos integradores - Ciências Humanas e Sociais aplicadas. São Paulo: Ática, 2020.
GAUDÊNCIO, Jéssica. A alfabetização científica e o letramento científico frente às fake news do novo coronavírus. Educação, Cultura e Comunicação, v. 12, nº 24, 2021. Disponível em: http://fatea.br/seer3/index.php/ECCOM/article/view/142. Acesso em: 15 jul. 2021.
GRAVINA, Michele das Graças Pacheco; MUNK, Michele. Dinâmicas de oficinas de textos em Biologia: ferramentas para a alfabetização científica em tempos de fake news. Experiências em Ensino de Ciências, v. 1 4, nº 3, p. 612-620, 2019. Disponível em: https://if.ufmt.br/eenci/artigos/Artigo_ID673/v14_n3_a2019.pdf. Acesso em: 15 jul. 2021.
SOUSA, Rana Rose Rico Martins Borges de. Potencialidades educacionais do ciberespaço: uma reflexão sobre a utilização das redes sociais virtuais em práticas de ensino. Revista Educação Pública, v. 20, nº 45, 24 de novembro de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/45/potencialidades-educacionais-do-ciberespaco-uma-reflexao-sobre-a-utilizacao-das-redes-sociais-virtuais-em-praticas-de-ensino. Acesso em: 15 jul. 2021.
Publicado em 30 de novembro de 2021
Como citar este artigo (ABNT)
SILVA, Ronaldo Adriano Ribeiro da; VALE, Ricardo Ferreira; ÁLVARES, Valéria Ferreira. Verdade ou mentira? O papel do conhecimento científico em um contexto interdisciplinar. Revista Educação Pública, v. 21, nº 43, 30 de novembro de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/42/verdade-ou-mentira-o-papel-do-conhecimento-cientifico-em-um-contexto-interdisciplinar
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