Ensino de Ciências por investigações: uma sequência didática para o Ensino Fundamental I
Emily Bomfim Souza
Licencianda de Pedagogia (UPM-SP), auxiliar de professor da rede pública (SP)
Sônia Cha Kim
Licencianda de Pedagogia (UPM-SP)
A inserção da prática investigativa nas aulas de Ciências favorece o processo de aprendizagem do aluno, pois possibilita que os alunos elaborem hipóteses a partir de seus conhecimentos prévios. Considerar os conhecimentos prévios dos alunos os beneficia, pois, além de poderem refletir sobre suas próprias hipóteses, dá-lhes a autonomia de pensar, desenvolvendo seu próprio pensamento crítico. Na prática investigativa, além da oportunidade de criar hipóteses, os alunos poderão fazer investigações para encontrar a solução ou a resposta da situação proposta, buscando novos conhecimentos que se tornam mais significativos em suas futuras vivências. A aprendizagem sai do limite da memorização, cópia ou da repetição, fornecendo o desenvolvimento do raciocínio, além de despertar o interesse sobre o assunto, por trazer uma prática de ensino mais lúdica.
Promover uma proposta investigativa não é apenas propor uma pergunta para que os alunos possam solucioná-la, é criar um ambiente investigativo nas aulas, proporcionando que os alunos pesquisem, toquem, experienciem, usem, mexam, façam, refaçam e principalmente errem e tentem novamente. Todas essas habilidades procedimentais são desenvolvidas de forma gradual enquanto os alunos interagem com seus colegas, desenvolvendo também habilidades atitudinais; para a concretização de sua aprendizagem, o registro do processo é importante, desenvolvendo a habilidade conceitual.
Este trabalho traz uma sequência didática elaborada para os alunos do 5º ano do Ensino Fundamental, tendo como o tema a poluição das águas e como base teórica o ensino por investigações.
Desenvolvimento do argumento
Deve-se compreender que o processo de formação como cidadão não é somente para os alunos, mas também para os professores. Ter a oportunidade de pensar em uma sequência de ensino investigativa durante a formação acadêmica é a combinação perfeita, pois se compreende que a teoria é a luz da prática. A teoria e a prática não devem caminhar paralelamente, pois a prática sem fundamento é vazia. Desse modo, a proposta de ensino de Ciências por investigação se revelou em um primeiro momento um grande desafio, pois criar uma sequência de ensino pautada no protagonismo dos alunos e com inversão de lógica, em que a construção do conhecimento é mútua e colaborativa, leva o professor a um verdadeiro desequilíbrio frente as práticas tidas como tradicionais, “Ao fazer uma questão, ao propor um problema, o professor passa a tarefa de raciocinar para o aluno e sua ação não é mais a de expor, mas de orientar e encaminhar as reflexões dos estudantes na construção do novo conhecimento” (Carvalho, 2013, p. 2) demandando com isso uma articulação mais intensa entre a teoria e a prática.
A sequência elaborada apoiada na perspectiva de alfabetização cientifica desvela que o papel do aluno não deve limitar-se a observação e manipulação; deve caminhar para uma construção intelectual, por meio da reflexão, discussão, sistematização e investigação do que está sendo estudado. Nesse contexto, o professor como mediador deve proporcionar condições para o estabelecimento de relações entre o que o aluno já conhece e os novos conhecimentos, como reitera Carvalho (2013, p. 9),
visando proporcionar aos alunos: condições de trazer seus conhecimentos prévios para iniciar os novos, terem ideias próprias e poder discuti-las com seus colegas e com o professor passando do conhecimento espontâneo ao científico e adquirindo condições de entender conhecimentos já́ estruturados por gerações anteriores.
Em alinhamento com a abordagem teórica de Carvalho (2013), iniciamos nossa sequência de ensino investigativa (SEI) com uma proposta de leitura de texto, pois o uso de texto é um bom instrumento para mapear o grau de conhecimento que o aluno tem sobre o assunto, e a partir disso delimitar o que ele precisa saber para servir de âncora para novos conhecimentos. Em cada ciclo ou aula buscamos abordar três etapas: “resolução do problema pelos grupos, sistematização do conhecimento elaborado e trabalho escrito sobre o que fizeram” (Carvalho, 2013, p. 14); considerando a proposta investigativa das aulas, elencamos que cada uma deveria ter cerca de duas horas de duração para garantir que os alunos reflitam, discutam e pensem coletiva e individualmente sobre a proposta,
dar tempo para ele pensar, refazer a pergunta, deixá-lo errar, refletir sobre seu erro e depois tentar um acerto. O erro, quando trabalhado e superado pelo próprio aluno, ensina mais que muitas aulas expositivas quando o aluno segue o raciocínio do professor e não o seu próprio (Carvalho, 2013, p. 3).
O maior desafio que tivemos para elaborar a SEI foi conduzir um problema que pudesse mobilizar os alunos a buscar soluções, em um viés de inverter a lógica da aula, ou seja, não era mais o professor propondo um experimento único a ser feito; eram os alunos os responsáveis por pesquisar esses experimentos e justificar com argumentos sua executividade por outros colegas; essa ação de tirar o professor do centro realmente causa certo desconforto, pois não estamos mais no eixo de trabalhar para os alunos e sim de trabalhar com os alunos, em uma perspectiva de parceria professor-aluno e de transformação de conhecimentos espontâneos para alfabetização cientifica.
Outro ponto de desequilíbrio que nos levou a um prolongado debate foi quanto à relevância do tema tratado em aspectos conceituais e sociais, e de mesmo modo como poderíamos explicitar em objetivos e no decorrer das aulas a tríade de conteúdos; com isso novamente recorremos a teoria que nos diz que a SEI “está pautada na ideia de um ensino cujos objetivos concentram-se tanto no aprendizado dos conceitos, termos e noções cientificas como no aprendizado de ações, atitudes e valores próprios da cultura científica” (Carvalho, 2013, p. 18). Com isso, compilamos que o conteúdo conceitual caminharia pela leitura de textos, explicações de algumas doenças, podendo ser verificado pelas sistematizações que os alunos fizeram e pelo uso dos conceitos em momentos de argumentação e elaboração de dúvidas.
O conteúdo procedimental evidencia-se quando o aluno organiza e registra o que foi discutido em aula utilizando escrita ou desenho e coloca em prática por meio do experimento aquilo que previamente foi pesquisado. Por outro lado, percebe-se o conteúdo atitudinal através da comunicação oral do aluno, da sua capacidade de trabalhar em equipe, respeitar o momento de fala do colega, perceber que o que está sendo debatido, analisado e observado é coletivo e se o aluno consegue reconhecer o assunto tratado na sociedade em prol de ter motivação para agir pela transformação da realidade. Quando, por exemplo, na sequência trouxemos para discussão o caso da Maria e do Joãozinho, queríamos justamente aproximar o assunto para um contexto social real, podendo esta problemática ser apresentada tanto em um âmbito de escola pública quanto particular, pois se por um lado o aluno pode se identificar com o contexto trabalhado no caso, por outro poderá ser apresentado a uma realidade diferente da sua, fazendo com que os alunos se sensibilizem com a temática e percebam que é um problema social mais próximo do que imaginam.
Contudo, pontuo que a elaboração de uma SEI apoiada na teoria desenvolvida e discutida ao longo das aulas da disciplina de especificidades didáticas do ensino de Ciências me fez ter uma visão completamente diferente da sala de aula, pois agora percebo possibilidades de torna-la um espaço de investigação, reflexão e retroalimentação de ideias, construção de conhecimentos ativamente, enfim, com todo o “desconforto” e “desequilíbrio” causado, consigo hoje me sentir inspirada e motivada para agir diferente na sala de aula, com fome de conhecimento e força de vontade para servir de modelo e mediadora no processo de desequilibração e reequilibração, “com a função transformadora da mente dos alunos” (Carvalho, 2013, p. 4).
Os temas da sequência didática são Meio ambiente e poluição das águas. A sequência de ensino investigativa está destinada aos alunos do 5° ano do Ensino Fundamental, com duração de cinco aulas.
Justificativa
A temática poluição das águas, em torno do tema transversal meio ambiente, se faz urgente à medida que, no atual cenário mundial, o principal debate é sobre as consequências irreversíveis da ação humana para com o ambiente, acarretando diversos problemas para todos os seres vivos. Falar sobre meio ambiente nos anos iniciais é imprescindível para formação de alunos críticos e conscientes da importância de nosso planeta. Além disso, discutir questões de sustentabilidade e as causas de ações antrópicas nos rios amplia principalmente a possibilidade de o aluno conhecer, problematizar e pensar criticamente sobre a vida em todos os seus aspectos, em um desejo de conhecer as causas e promover transformações; esses elementos provam a importância da temática e do ensino de Ciências.
Sequência de ensino investigativa
Habilidades da sequência:
(EF35LP01) Ler e compreender, silenciosamente e, em seguida, em voz alta, com autonomia e fluência, textos curtos com nível de textualidade adequado.
(EF15LP09) Expressar-se em situações de intercâmbio oral com clareza, preocupando-se em ser compreendido pelo interlocutor e usando a palavra com tom de voz audível, boa articulação e ritmo adequado.
(EF15LP10) Escutar, com atenção, falas de professores e colegas, formulando perguntas pertinentes ao tema e solicitando esclarecimentos sempre que necessário.
(EF15LP13) Identificar finalidades da interação oral em diferentes contextos comunicativos (solicitar informações, apresentar opiniões, informar, relatar experiências etc.).
(EF05CI04) Identificar os principais usos da água e de outros materiais nas atividades cotidianas para discutir e propor formas sustentáveis de utilização desses recursos.
(EF05CI05) Construir propostas coletivas para um consumo mais consciente e criar soluções tecnológicas para o descarte adequado e a reutilização ou reciclagem de materiais consumidos na escola e/ou na vida cotidiana.
Aula 1 – Introdução à investigação
Objetivos da aula:
• Possibilitar que os estudantes construam conceito sobre poluição dos rios;
• Comunicar seus argumentos sobre o tema em forma oral e com registros escritos;
• Ler, escrever e sublinhar os pressupostos que embasam o conceito sobre poluição dos rios.
Tempo estimado da aula: 2h/a
Desenvolvimento:
Primeiro procedimento: Trazendo repertório
Para iniciar a aula, o professor solicitará que a turma se divida em quatro grupos menores, de tal forma que permita que circule livremente pelos grupos. O professor entregará para cada aluno um texto que fala sobre poluição dos rios (ver Apêndice 1), porém o título do texto e as partes que falam explicitamente “poluição dos rios” serão suprimidas, com o intuito de os alunos identificarem esse fenômeno com base no contexto geral trazido. Esta dinâmica foi baseada na oficina de estudos dirigidos: Aula leve, com referência no livro A nova sala de aula, do professor Fábio Mendes, e ofertado pela UFRGS. A dinâmica de leitura será elencada na lousa; conforme os alunos forem realizando uma etapa, a outra será posta. A primeira etapa consiste em tranquilizar os alunos, por ser um conteúdo novo, e o professor solicitará uma leitura rápida do texto, de dois minutos cronometrados, em que os alunos captarão um panorama do texto. Nessa etapa o professor deverá caminhar pelos grupos incentivando a leitura.
Com o tempo inicial encerado, será elencada na lousa a segunda etapa, que consiste em uma leitura mais aprofundada e calma. O professor exemplificará que nessa etapa não haverá cronometragem e os alunos deverão ler calmamente o texto e marcar com o lápis os trechos que considerem mais importantes (se essa dinâmica nunca foi feita antes, o professor poderá mostrar na lousa como pode ser feita a marcação no texto). Conforme os alunos forem realizando, o professor caminhará pelos grupos para motivar a realização da atividade. Os alunos deverão levantar a mão quando encerrarem a etapa. Com essa etapa encerada pela maioria dos alunos, o professor solicitará a terceira etapa, que é sublinhar as principais palavras de cada trecho marcado na etapa anterior. Por ser uma etapa mais rápida, terá em sequência a quarta etapa explicada. Nessa etapa os alunos deverão fazer registros livres: textos, desenhos, esquemas e outros, com base nas marcações e palavras-chave sublinhadas. Caso os alunos consigam encerar a quarta etapa, o professor pedirá que, como desafio, criem perguntas sobre o texto como se eles fossem o professor.
Para finalizar essa dinâmica de leitura, o professor irá propor uma roda de discussão em que os alunos poderão debater o que entenderam do texto, o que acharam da atividade e lançar as questões que elaboraram aos outros colegas para assim ampliar as discussões. Por fim, o professor desvelará as partes suprimidas do texto para comparar com as ideias levantadas pelos alunos e poderá perguntar: “Como vocês aprenderam tudo isso, se eu não passei o conteúdo?” e os alunos perceberão que foram eles os protagonistas do processo de aprendizagem.
Terminando a aula: introduzindo a investigação
Por ser uma sequência de ensino, todas as aulas deverão ter elementos que as conectem. Desse modo, para introduzir as atividades que serão trabalhadas nas aulas seguintes, será proposta uma experiência. O professor apresentará aos alunos uma caixa plástica grande e transparente com água (porém posteriormente será envolta com papel cartão preto, para que os alunos não vejam como ficou a água após a intervenção) e fará uma proposta:
“Hoje vocês deverão colocar dentro desse recipiente todos os restos de alimentos e materiais que consumirem no intervalo das aulas, podendo ser casca de banana, sacola plástica, embalagens, pedaço de maçã, enfim, tudo aquilo que colocariam no lixo; solicito que coloquem nesse recipiente”. |
Pedirá que os alunos registrem em forma livre o que imaginam que acontecerá com a água do recipiente. O professor irá tirar uma fotografia do recipiente antes e depois da intervenção dos alunos.
Aula 2 – Experimentando: antes e depois
Objetivos da aula:
• Possibilitar que os estudantes construam o conceito de poluição e decomposição.
• Elaborar perguntas e suposições sobre os assuntos em estudo.
• Utilizar as informações obtidas para justificar suas ideias.
• Organizar e registrar informações por intermédio de desenhos, esquemas e textos.
• Buscar e coletar informação por meio de observação direta e indireta e experimentação.
• Comunicar-se através da oralidade e escrita: de suposições, dados e conclusões.
Tempo de aula: 2h/a
Desenvolvimento:
Primeiro procedimento: retomada do experimento
Para retomar o que foi discutido na aula anterior, o professor solicitará que os alunos leiam ou mostrem os registros que fizeram sobre como imaginavam que a água da caixa plástica ficaria. Nesse momento, o professor permitirá que os alunos conversem sobre as hipóteses levantadas (o professor poderá falar o nome “hipóteses” para familiarizar os alunos com esse termo) e irá anotar na lousa algumas características da “nova” água que os alunos sugerirem. Após as discussões encerradas, o professor colocará sobre a mesa a caixa plástica envolta em papel cartão preto e removerá calmamente o papel para desvelar a situação da água.
O professor deverá questionar os alunos se as hipóteses levantadas correspondem à real situação da água. Nessa etapa é importante que o professor permita que os alunos cheguem perto da caixa e observem o que aconteceu com os resíduos orgânicos e inorgânicos depositados na água, assim como notem se, após uma semana, houve ou não mudanças na coloração e no odor da água e especulem sobre o que pode ter provocado todas essas alterações.
Segundo procedimento: sistematização dos conhecimentos
Com as observações mais aproximadas, o professor irá expor a imagem da água antes da intervenção dos alunos e será feita uma roda de conversa em que os alunos poderão explicitar suas observações e os novos achados. Cabe ao professor, como mediador, instigar a discussão, fazendo perguntas, como:
- Como podemos explicar as mudanças ocorridas na água?
- Perceberam alguma diferença nos resíduos orgânicos depositados na água? O que explica isso?
- Alguns materiais ficaram intactos; por quê?
- A água com essa coloração e esse odor pode ser consumida?
Outros questionamentos, poderão ser feitos conforme o andamento das discussões, mas o importante é que seja uma conversa ativa dos alunos e que o professor não tenha pressa para ouvir os seus argumentos, pois esse é o momento de aprendizado por troca de conhecimentos, e o aluno deve ter liberdade intelectual para construir relações, ou seja, os alunos deverão ter liberdade para trazer respostas às novas questões com base em seus conhecimentos prévios, provocando o que Piaget chamava de “estado de desequilíbrio cognitivo”, muito importante para aprender novos conceitos, procedimentos e atitudes. Nessa etapa, o professor deverá acrescentar às discussões dos alunos suas próprias considerações, mostrando que, assim como os alunos, ele também está presente nesse processo de investigação, e essa participação irá fomentar que os alunos interajam com o objeto de experimentação, lançando novas discussões e hipóteses, favorecendo que saiam dos conhecimentos espontâneos para conhecimentos científicos.
Após as discussões levantadas pelos alunos, o professor irá solicitar que cada um individualmente faça um registro escrito e em desenho do experimento, explicitando as discussões feitas. Esse registro individual é importante para o professor verificar a compreensão de cada aluno sobre o problema proposto. Com os registros feitos, os alunos serão convidados a ler para a turma as suas colocações.
Terminando a aula
Para finalizar a aula, o professor fará uma provocação, com um problema:
“É possível tornar essa água suja limpa novamente?”. |
Essa provocação busca instigar o interesse dos alunos e motivá-los para a resolução de um problema iminente: “tornar a água suja limpa novamente”. Para tanto, o professor não dará respostas; muito pelo contrário, solicitará que os alunos façam uma pesquisa (caso não saibam, explicará como pesquisar informações seguras na internet ou nos livros didáticos) na qual apresentem formas simples e eficazes para solucionar o problema proposto. Ficará a cargo dos alunos trazer as alternativas de solução para a aula seguinte e que essas propostas devem estar acompanhadas de explicações e a viabilidade de serem executadas.
AULA 3 – Estudo de caso – Águas contaminadas
Objetivos da aula:
• Reconhecer as principais formas de poluição e outras agressões ao meio ambiente de sua região, identificando as principais causas e relacionando-as aos problemas de saúde da população local.
• Estabelecer relações entre a falta de saneamento básico com a aquisição de doenças.
• Elaborar perguntas e suposições sobre os assuntos em estudo.
• Utilizar as informações obtidas para justificar ideias.
• Organizar e registrar informações por intermédio de desenhos, esquemas e textos.
• Comunicar-se através da oralidade e escrita: de suposições, dados e conclusões.
Tempo de aula: 2h/a
Desenvolvimento:
Primeiro procedimento: estudo de caso – Maria e Joãozinho
Esta aula iniciará com a apresentação de um estudo de caso de Maria e Joãozinho (caso criado pelas autoras), dois irmãos que foram parar no hospital da cidade por motivos até então desconhecidos. O professor irá ler esse caso (apresentado no final deste artigo) em voz alta, pedindo para que todos os alunos fiquem bem atentos às informações e anotem no caderno as partes do caso que acharem pertinentes para resolvê-lo. A leitura se encerrará a princípio antes de o médico levantar hipóteses sobre as possíveis causas que levaram as crianças ao hospital. Nesse momento, o professor solicitará que os alunos, em grupo, discutam o caso e formulem hipóteses que possam apontar o causador do problema de Maria e Joãozinho.
Após as discussões e com as evidências contidas na história de Maria e Joãozinho, espera-se que os alunos percebam que o que motivou a ida dos dois ao hospital foi o consumo de água contaminada, em função da ausência de saneamento básico. Para contextualizar, o professor ou professora perguntará se os alunos conhecem algum lugar parecido com o relatado na história; essa pergunta pode tanto refletir a realidade de alguns alunos quanto no mínimo permitir que estabeleçam relações com regiões da cidade que não têm água tratada, levando a problemas de saúde para a população local.
Com essas explanações, o professor contará o final da história para os alunos: o médico dará o diagnostico de febre tifoide e cólera, respectivamente, a Maria e Joãozinho e dará orientações sobre o tratamento. Cólera? Febre tifoide? Talvez esses sejam nomes desconhecidos para os alunos, mas eles já sabem que são doenças causadas por água contaminada. A fim de ampliar o repertório dos alunos sobre essas doenças, a sala será organizada com a ajuda dos alunos em três estações.
Segundo procedimento: rotação por estações
Orientações:
- Dividir a sala em três grupos grandes (10 alunos aproximadamente).
- Cada grupo passará por uma estação pelo menos uma vez.
- Cada estação terá um documento de orientação.
- Todos os recursos utilizados serão previamente trazidos pelo professor e/ou disponibilizados pela escola.
- O professor deverá passar pelos grupos e cronometrar o tempo para troca dos grupos.
Organização dos espaços |
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Espaços |
Atividade |
Duração |
Papel do aluno |
Papel do professor |
Espaço 1 |
Assistir ao vídeo Doenças causadas pela falta de saneamento básico e fazer anotações das principais informações do vídeo. |
10 minutos |
Ter autonomia para selecionar e anotar os conteúdos mais relevantes presentes no vídeo e partilhar o recurso tecnológico de modo que todos do grupo consigam assistir. |
Disponibilizar os materiais necessários para execução da aula e mediar possíveis problemas técnicos ou conflitos entre os alunos. |
Espaço 2 |
Leitura de reportagens sobre doenças causadas pela água contaminada. Em seguida deverão fazer um desenho que represente o que foi lido. |
10 minutos |
Ter autonomia para escolher uma das reportagens a ser lida e usar a criatividade para produzir uma ilustração para a reportagem. |
Disponibilizar os materiais necessários para execução da aula e mediar possíveis problemas técnicos ou conflitos entre os alunos. |
Espaço 3 |
Produzir panfletos e cartazes contra a contaminação e em prol do tratamento das águas. |
20 minutos |
Seguir as instruções para produzir os objetos sugeridos, trabalhando de forma coletiva e respeitando o tempo de produção do colega. |
Disponibilizar os materiais necessários para execução da aula e mediar possíveis problemas técnicos ou conflitos entre os alunos. |
O que pode ser feito para observar se os objetivos da aula forem cumpridos?
Após todos os grupos terem participado de todas as estações, será feita uma roda de conversa para que o docente receba um retorno de como foi a aula e, sobretudo, identifique dúvidas que tenham ficado sobre o assunto; a participação de todos os alunos é primordial para a consolidação dos objetivos da aula.
Recursos de personalização pós-avaliação (opcional)
Após as explanações serem finalizadas, será sugerido que os grupos coloquem as produções em um mural da sala e serão avisados que posteriormente utilizarão as produções em uma apresentação cientifica para os familiares.
Terminando a aula: Experimento retomada
Com os novos aprendizados sobre doenças causadas por água contaminada, o professor retomará a solicitação feita na aula anterior: “é possível tornar essa água suja limpa novamente?”. Perguntará aos alunos: “como vocês conseguiram resolver o problema?”. E pedirá que eles compartilhem suas pesquisas com a turma.
Possivelmente os alunos trarão exemplos de filtros caseiros de água feitos de areia, pedras, algodão, carvão ou outros modelos de filtro. Com isso, eles terão que explicar por que seu experimento deveria ser testado em sala por todos os colegas. Três experimentos diferentes serão escolhidos democraticamente pelos alunos, que se dividirão em três grupos (que posteriormente se subdividirão em seis). Cada grupo ficará responsável por um experimento e deverá providenciar os materiais necessários para testá-lo em sala na aula seguinte (o professor pode se dispor a ajudar na aquisição de alguns materiais). Ficará combinado que, no dia da apresentação dos experimentos, cada grupo (10 alunos cada) terá duas responsabilidades:
- Metade dos integrantes do grupo deverá executar o experimento;
- A outra metade irá explicar a utilidade de cada elemento do experimento e simultaneamente fazer um esquema em forma de desenho para mostrar passo a passo como outras pessoas poderiam reproduzi-lo.
AULA 04 – Experimentos dos alunos
Objetivos da aula:
• Reconhecer o processo de filtragem da água.
• Elaborar perguntas e suposições sobre os assuntos em estudo.
• Utilizar as informações obtidas para justificar suas ideias.
• Organizar e registrar informações por intermédio de desenhos, esquemas e textos.
• Comunicar-se pela oralidade e escrita: de suposições, dados e conclusões.
Tempo de aula: 2h/a
Desenvolvimento:
Primeiro procedimento: Apresentação do experimento
A aula iniciará com os preparativos dos grupos, que organizarão a sala de aula como um laboratório científico para seus experimentos. Conforme orientado na última aula, cada grupo terá duas funções e deverá apresentar seu experimento aos demais grupos. Os grupos preparados deverão começar as apresentações. Nesse momento, cabe ao professor observar o desempenho do grupo e dos componentes individualmente, se estão engajados com a proposta, se entenderam o objetivo do experimento, se estão trabalhando bem em equipe, se conseguem comunicar aos demais colegas as etapas de execução do experimento e outros. Cada grupo apresenta seu experimento ao mesmo tempo que explica para os outros grupos por meio de esquema ou desenho sua funcionalidade e suas etapas. Será feito desse modo com todos os grupos. Após as apresentações, será feita uma discussão com todos os alunos sobre como foi realizar esses experimentos e as dúvidas que ainda possuem. Todos os grupos produziram registros dos experimentos e serão exibidos no mural da sala.
Término da aula: alunos e comunidade
Ao longo da sequência de ensino investigativo sobre poluição das águas, os alunos produziram esquemas, desenhos e sínteses, expuseram experimentos e debateram um estudo de caso; agora deverão compartilhar com a comunidade os seus conhecimentos. Os alunos serão informados de que na próxima semana deverão organizar em sala uma exposição de tudo que produziram durante as últimas aulas e poderão convidar seus parentes para visitar a exposição na qual os próprios alunos serão os guias para explicar o percurso de aprendizagem.
Aula 5 – Finalização da sequência e avaliação
Objetivos da aula:
• Utilizar as informações obtidas para justificar suas ideias.
• Comunicar-se pela oralidade e escrita: de suposições, dados e conclusões.
Tempo de aula: 2h/a
Desenvolvimento:
A Aula 5 será destinada ao dia da “apresentação científica”, em que os alunos compartilharão os conhecimentos adquiridos ao longo da sequência investigativa, porém os preparativos para esse dia ocorrerão durante toda a semana.
Primeiro procedimento: Abertura “Apresentação cientifica”
O professor organizará com os alunos a sala para recepcionar o grupo de familiares. Com a chegada deles, o professor dará as boas-vindas e explicará a dinâmica da exposição:
A sala estará organizada em três “estações”, que seriam três espaços separados para cada grupo. Cada grupo apresentará todo o processo de aprendizagem que obteve durante a execução do projeto com o tema Poluição das Águas. Desde os momentos em que os alunos tinham que jogar os resíduos dentro de uma caixa transparente de água até a montagem do filtro caseiro. A forma como os alunos irão apresentar será livre, podendo ser uma apresentação escrita em cartaz, com desenhos e legendas, um mapa mental ou apenas uma apresentação verbal. Cada grupo apresentará para todos os familiares visitantes, que irão até a sua estação para conhecer suas elaborações. É importante que todos os alunos participem ativamente durante a apresentação.
Terminando a sequência: avaliação
Este é o momento de encerramento da sequência de ensino por investigações; nele o professor deve ouvir o que os alunos acharam desse tipo de aprendizagem. Após o horário estimado para o término do evento de apresentação científica aos familiares, o docente irá fazer uma roda de conversa com os alunos para ouvi-los sobre como foi para cada um:
- A experiência da aula investigativa;
- O que acharam da aprendizagem através das pesquisas;
- O que acharam da experiência da montagem do filtro;
- Se a coleta de informações através de pesquisas foi útil para a compreensão no processo de aprendizagem;
- Compartilhar pontos positivos e pontos negativos das aulas;
- Ao realizar os experimentos, ter que pesquisar, apresentar, se se sentiu motivado a aprender mais sobre o assunto;
- Se gostou das aulas das últimas semanas e o que não gostou;
- Se acredita que aprendeu mais com essa maneira de apresentar as aulas e por quê;
- O que sugere para as próximas aulas.
O professor avaliará os alunos desde o início da sequência até o final, percebendo seus avanços individuais e coletivos em aspectos conceituais, procedimentais e atitudinais. Com esse feedback dos alunos, o professor poderá repensar sua prática e adotar novas estratégias para motivar os alunos nas próximas sequências de ensino. Com isso, o professor poderá propor que os alunos registrem por escrito as respostas para estas perguntas:
- Que coisas novas você aprendeu durante as aulas?
- Você acredita que seu desempenho foi satisfatório? Pode melhorar? Como?
- Você percebe a importância do tema poluição das águas no seu dia a dia? Explique.
- Se pudesse resumir as últimas aulas em uma frase, qual seria?
Essas perguntas estarão acompanhadas de um quadro para a última etapa da avaliação – a autoavaliação –, pois é importante que cada aluno tenha o seu momento de reflexão sobre a aprendizagem, incluindo ativamente os alunos no processo de ensino-aprendizagem.
Convivência social |
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Eu respeito às diversas opiniões dos meus colegas? |
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Eu participo ativamente dos trabalhos em grupo durante o projeto? |
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Responsabilidade e empenho |
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Concentrei-me nas aulas e nas atividades propostas? |
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Fiz perguntas aos colegas e professores quando não entendi algo? |
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Empenhei-me em todas as atividades solicitadas? |
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Avaliação da sequência |
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Você acha que o tema abordado nas aulas investigativas é de extrema importância social? |
LEGENDA | |||
Nota de 80% a 100% |
Nota de 50% a 70% |
Nota de 0% a 40% |
Considerações finais
A teoria e a prática no processo de ensino-aprendizagem devem estar acompanhadas uma da outra, pois a teoria é que vai dar à luz as ações práticas. Ao manter-se apenas em teorias ou fatos, o ensino muitas vezes acaba sendo decorativo, sem alcançar a compreensão e o patamar dos conceitos. Nem a teoria nem a prática são mais importantes uma que a outra, pois a partir dos fatos é que se pode alcançar os conceitos. Quando o aluno tem a capacidade de se apropriar de seus conhecimentos por meio das práticas e baseando-se em teorias, como o experimento realizado na sequência, no qual o aluno teve que aprender primeiramente sobre algumas doenças e depois realizar pesquisas sobre os sintomas e as causas e, por último, a elaboração de um filtro caseiro para tentar solucionar o problema. Nesse processo todo, o aluno se beneficiou, pois fez parte do processo de ensino-aprendizagem, obtendo seu próprio conhecimento.
O ensino de Ciências tem a capacidade de formar um cidadão mais crítico e autônomo, dependendo das práticas pedagógicas do docente. Em nossa sequência didática, apresentamos os três tipos de conteúdos para que o desenvolvimento do aluno possa ser realizado em todas as dimensões, acreditando que o aluno já faz parte da sociedade; logo, já é um agente contribuidor. O conteúdo conceitual faz parte das ações práticas do professor quando ela expõe leituras de textos e explicações sobre algumas doenças causadas pela contaminação da água. Percebe-se o conteúdo procedimental quando os alunos registram seus pensamentos sobre o texto e o experimento, fazem o experimento e criam perguntas sobre o assunto proposto. O conteúdo atitudinal é realizado nas rodas de conversa e no trabalho em grupo no qual o aluno terá que aprender a respeitar diferentes opiniões, a saber ouvir o próximo, a esperar a sua vez e a trabalhar em equipe.
Durante o processo de elaboração da sequência didática, é notável a relevância da aula de Ciências, pois respeita os conhecimentos prévios dos alunos e suas hipóteses de pesquisas. Uma boa abordagem didática contempla os três conteúdos de ensino (conceitual, procedimental e atitudinal); assim, o aluno, além de construir seus conhecimentos, fazendo parte do processo de ensino-aprendizagem, poderá ser um cidadão de autonomia moral, que acontece com a interação em ambientes sociais. A relevância do ensino de Ciências está em possibilitar aos alunos que encontrem respostas para suas questões, através de pesquisas e experimentos; a ação de praticar um experimento faz com que eles possam compreender de forma significativa, dando-lhes oportunidade de interpretar o observado.
Referências
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Educação é a Base. Brasília, MEC/Consed/Undime, 2017.
CARVALHO, A. M. P. O ensino de Ciências e a proposição de sequências de ensino investigativas. In: CARVALHO, A. M. P. (Org.). Ensino de ciências por investigação: Condições para implementação em sala de aula. São Paulo: Cengage Learning, 2013. p. 1-20.
SOUZA, Líria Alves de. Poluição da água. Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/quimica/poluicao-agua.htm. Acesso em: 16 out. 2020.
Apêndice 1
Apêndice 2
Maria e João são irmãos e moram no bairro da Terra Firme, periferia de Belém, no Pará. Um bairro bem humilde, que não tem acesso a saneamento básico, ou seja, os moradores não têm acesso a água limpa para seus afazeres nem água potável para beber. Quando necessitam de água “boa” (limpa), os moradores vão até o poço buscá-la. Devido a essa situação precária que o povo da região vive, muitos voluntários de ONGs fazem trabalhos para a conscientização da população para não poluir o rio a fim de evitar a escassez da água, e pressionam os governantes para fornecer saneamento básico na região. Enquanto isso não surte efeitos rápidos, eles também distribuem galões com água mineral aos moradores a cada duas semanas.
Fonte: Terra Firme, Belém. Thiago Araújo. Folhapress.
Um dia, como de costume, Maria, de 9 anos, e seu irmão Joãozinho, de 4 anos, foram pela manhã brincar nas redondezas do córrego, porém esse dia foi diferente dos outros. Estavam eles e seus amigos da vizinhança brincando e de repente Maria começou a sentir dor, uma dor tremenda na barriga, mas não deu muita atenção, pois imaginava que poderia ser fome. Continuou a brincar, mas a dor só aumentava, e agora acompanhada de dores de cabeça, calafrios e ânsias de vômito. Para não assustar Joãozinho, Maria resolveu se sentar na beira do córrego e reparou que seu irmão estava distante, se contorcendo de dores na barriga e vômito intenso. Preocupada, levou João para casa. Sua mãe, muito ocupada, cortando os mariscos para vender na feira, imaginou que seu filho estivesse exagerando e pediu para que ele comesse algo e bebesse água que passaria a dor. Maria não contou que também estava passando muito mal; era a filha mais velha e precisava estar forte para cuidar de seu irmãozinho. Algumas horas se passaram e a diarreia de João só aumentava, e ele estava ficando muito desidratado. Maria começou a ter diversas manchas vermelhas pelo corpo, febre alta e dor intensa de cabeça. A mãe percebeu a gravidade do caso e levou seus filhos ao pronto-socorro. Após um bom tempo, eles foram atendidos por um médico.
O Dr. José perguntou para a mãe das crianças se elas haviam comido algo estragado ou se tinham alguma alergia. Com a negativa da mãe, o médico ficou intrigado. Examinando as crianças, percebeu que Maria tinha manchas vermelhas pelo corpo e muita febre e que João estava muito desidratado. Então resolveu perguntar a Maria onde eles moravam. Maria contou a situação da região e do córrego próximo à sua residência. Com isso, o médico ficou pensando no que estava provocando aqueles sintomas e pediu alguns exames para comprovar suas hipóteses. Com o diagnóstico em mãos, disse que Maria tinha febre tifoide e João estava com cólera, doenças provocadas pelo consumo de água contaminada. Maria confessou que ela, João e alguns amigos, em um dia de muito calor, acabaram bebendo a água de um balde próximo ao córrego; ela parecia limpa, mas tinha um gosto estranho. Assim o Dr. José, medicou as crianças e orientou que a água, mesmo que pareça limpa, pode estar contaminada por bichinhos quase invisíveis, chamados microrganismos, como as bactérias, que podem provocar sérias doenças; para matá-las, antes de ingerir a água é importante fervê-la.
Publicado em 23 de fevereiro de 2021
Como citar este artigo (ABNT)
SOUZA, Emily Bomfim; KIM, Sônia Cha. Ensino de Ciências por investigações: uma sequência didática para o Ensino Fundamental I. Revista Educação Pública, v. 21, nº 6, 23 de fevereiro de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/6/ensino-de-ciencias-por-investigacoes-uma-sequencia-didatica-para-o-ensino-fundamental-i
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