O autoconceito e a autoestima em estudantes da rede pública de ensino

André Henrique Oler de Novaes

Mestre em Ciências Fisiológicas (UEM), pós-graduando em Docência (IFMG)

Marcia Pereira dos Santos

Pedagoga (UFRJ), pós-graduanda em Docência (IFMG)

Cláudia Maria Soares Rossi

Mestra em Educação (UFLA)

O objetivo deste estudo foi avaliar o autoconceito e a autoestima de estudantes do Ensino Fundamental Fase II em uma escola da rede pública estadual no município de Floraí/PR.Os instrumentos usados na avaliação foram a Escala de Autoconceito Infantojuvenil (EAC-IJ), que se relaciona com o mundo acadêmico e o desempenho que está concentrado no espaço escolar, e a Escala de Autoestima de Rosenberg (EAR), que tem como objetivo avaliar a autoestima global do indivíduo saindo do âmbito educacional, abrangendo a trajetória pessoal e social como um todo.

O rendimento acadêmico dos estudantes é bastante afetado por variáveis psicológicas, dentre elas a autoestima e o autoconceito, elementos diferentes, mas que se relacionam. A autoestima inclui aspectos físicos, acadêmicos e sociais; refere-se ao indivíduo se sentir amado ou não. O autoconceito envolve um conjunto de crenças que o indivíduo possui acerca de si mesmo (Peixoto, 2003). Um bom desempenho acadêmico pode influenciar a construção de autoestima e autoconceito positivos em um indivíduo. Dados sobre essas variáveis psicológicas no âmbito escolar podem interferir na aprendizagem e são ferramentas que auxiliam os professores e a equipe pedagógica a elaborar estratégias para melhorar o desempenho dos estudantes. Dessa maneira, constatamos que autoconceito e autoestima baixos são fatores que podem impedir que o processo de aprendizagem se manifeste plenamente.

Existem vários motivos pelos quais o rendimento do aluno pode cair – falta de atenção e mau comportamento estão entre eles. Dessa maneira, na maioria dos casos, as dificuldades estão relacionadas à autoestima em conjunto com processos de transformações, adequações singulares e inerentes ao desenvolvimento humano (Souza, 2006). A autoestima pode ser facilmente abalada por conflitos, diante dos mecanismos de defesa e de mudança, levando à “perda da autoestima – por exemplo, a desaprovação do superego por atos ou trações que resultam em culpa ou ódio em relação a si mesmo” (Fadiman; Frager, 1986, p. 10).

A autoestima se manifesta desde o momento em que o ser humano nasce. Entre experiências positivas e negativas, o desenvolvimento também se legitima com situações que impedem a plenitude do sujeito, processos que fazem parte da normalidade de cada indivíduo. A criança é conduzida a aprender normas e condutas que originam bloqueios que podem inibir o sujeito em acontecimentos futuros. A criança desperta para a sua própria existência e com o tempo desenvolve a necessidade de afeto e amor, em um movimento natural de todo ser humano. Nesse momento, ela desenvolve a “consideração positiva” de acordo com uma recepção negativa ou positiva, o que irá interferir na autoestima. Conforme uma postura positiva ou negativa, criança e adolescente percebem o quanto são queridos, amados pelos que estão em sua volta e passam a querer despertar nos outros algo que os deixem confortáveis e a agir para garantir uma aceitação pelas suas atitudes. A autoestima tem possibilidade de movimentar outras potências no sujeito e enfatiza a força que está localizada em si mesmo como uma aceitação que liberta (Rogers, 1997).

Diante do estudo realizado neste artigo, apresentamos as definições das variáveis autoestima e autoconceito dadas por diversos autores. A autoestima, de acordo com o pensamento de Lenz e Dametto (2014), está conectada ao âmago da noção de self. E, assim como as ideias de Carl Rogers, ela ocorre no momento em que nascemos; por meio da interatividade, a criança começa a ter amor-próprio, e nesse desenvolvimento se lança a amar a si mesma ou não. Sendo assim, a autoestima vai depender da forma como se desenvolvem suas relações de afeto.

Podemos, assim, ponderar que o autoconceito e a autoestima precisam de afeto para que indiquem uma postura altruísta não somente com relação à escola, mas à vida em sociedade e, “enquanto pessoa, no contexto de uma experiência e de uma aprendizagem pessoais” (Rogers, 1997, p. 12).

O ser humano tem predisposição para traçar um rumo positivo de aprendizagem e transformar a sua própria realidade. O estudo desenvolvido neste artigo constata que a afetividade e a cognição nas suas implicações educacionais têm grande contribuição para que seja possível a compreensão do homem como ser integral, que pode somar para a superação da divisão clássica entre mente e corpo existente na cultura ocidental (Ferreira; Acioly-Régnier, 2010).

Há um olhar que não visa englobar o ser humano em sua totalidade; ao se importar apenas com algumas partes do que a criança pode ser e não ser visualizada como alguém que envolve toda a sua potência, pode levar o autoconceito a ficar distante da sua condição de ser. As experiências que são rejeitadas, mas que para o indivíduo podem funcionar, indicam um autoconceito que se distancia da sua própria essência (Hall; Lindzey; Campbell, 2000).

Um desdobramento com complexidade do self, assim como o pensamento de Lenz e Dametto (2014), quando se relaciona a Rogers (1997), se desenvolve independente de uma maneira que possa ser satisfatória ou frustrante da busca de estima relacionada ao que o “eu” pode experienciar. A autoestima se estabelece em uma necessidade que se manifesta como algo inato no indivíduo.

Tendo como base teórica as ideias de Carl Rogers que assinalam a necessidade de uma relação de afeto para o movimento de mudanças de que o indivíduo necessita, podemos dizer que o sujeito pode ter a predisposição em traçar um rumo positivo e transformar a sua própria realidade. Rogers ressalta que o ser humano precisa ser aceito na sociedade; ter o seu lugar de pertencimento é relevante para que ele caminhe rumo à autorrealização e à construção do ser humano com autoaceitação incondicional centrada na pessoa, “com uma afeição em relação a si mesmo” (Rogers, 1997, p. 60).

Outros autores reforçam a ideia de que a autoestima se constitui a partir de uma visão afetiva, como é o caso de Branden (2000), que diz que a “disposição para experimentar a si mesmo como alguém competente para lidar com os desafios básicos da vida e ser merecedor da felicidade” (Branden, 2000, p. 50).

Tendo como referência também os conceitos de La Taile, Kohl e Datas (1992), que colocam em evidência o indivíduo considerado como um ser global e social, com afeto, cognição e motricidade, é essencial a promoção de uma educação voltada para a autonomia que fortalece a autoestima, em que a sala de aula se torna uma oficina de convivência e onde o professor é o mediador – na abertura e liberdade de quem ensina e de quem aprende.

Podemos mencionar a autoestima de professores e do quadro profissional da escola que, como as ideias de Lopes (2010), apresentam fatores que também influenciam a autoestima dos estudantes, principalmente na geração de baixa autoestima, o que nos leva a relacionar ao contexto em que estão inseridos, em que a desigualdade e a injustiça encontram solo fértil para se propagar, diante de um esforço constante para vencer as dificuldades relacionadas às condições ruins de trabalho e os baixos salários. Dessa maneira, os alunos podem perder o compromisso com a escola, que influenciam o desenvolvimento da autoestima.

Trazemos também a visão de Walon (1995 apud Ferreira; Acioly-Régnier, 2010), que provoca o entendimento das relações entre educando e educador e situa a escola no centro do desenvolvimento dos sujeitos. A afetividade, o ato motor e o conhecimento são etapas percorridas pela criança que direcionam para a compreensão do processo de desenvolvimento e que indicam a direção dos processos de ensino-aprendizagem e as relações aluno-professor. No campo da Educação está relacionada também a união entre o homem e o mundo. Percebemos que as relações sociais estão repletas de contradições e dificuldades, geram violência e desconfiança, por meio de disputas no mercado de trabalho e da divisão de capital. Junto a esse panorama, estão inseridos o analfabetismo, as dificuldades dos estudantes para se manterem na escola e a Educação de Jovens e Adultos, em que a “questão de relação entre cognição e afetividade, ao lado da violência, sem dúvida, constitui um ponto focal da agenda educativa no século XXI” (Ferreira, Acioly-Régnier, 2010, p. 22).

Paiva e Lourenço (2011) também apresentam uma urgência no atual contexto da sociedade em tratar das dificuldades encontradas no universo da sala de aula. A evasão e o fracasso escolar se apresentam como os principais termômetros de que algo está fora do eixo. Algumas engrenagens podem possibilitar uma aprendizagem relevante para o autoconhecimento. Não faz muito tempo que os resultados acadêmicos negativos faziam parte de um conjunto de fatores – psicológicos, biológicos, sociológicos e pedagógicos. Na atualidade, é cada vez mais notória, e se conserva em crescimento, a constatação de variáveis ligadas ao afeto e à motivação; dessa maneira, o autoconceito – com espaço no contexto da educação e com relações altruístas entre professor e aluno –, está inserido em mecanismos de aprendizagem e passa a atuar no campo motivacional dos estudantes, passando a exercer influência no desempenho acadêmico.

Percebemos, com base nesse cenário, que o autoconhecimento e a autoestima foram avaliados de modo a apresentar sua relevância, seus pontos chave de referência, a percepção de interferências no aprendizado e a possibilidade de aplicação de uma metodologia que abranja o campo de desenvolvimento do estudante.

Metodologia

O presente estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos – CEPH/IF Sudeste MG – para apreciação por meio da Plataforma Brasil. Foi aprovado sob protocolo CAAE 36392720.6.0000.5588 em 12 de novembro de 2020. Os participantes deste estudo são 22 alunos do 6º ao 9º ano de uma escola da rede pública de ensino da cidade de Floraí/PR com idades entre 11 e 15 anos. Foram consideradas duas variáveis para a análise dos resultados: o gênero dos alunos e seu desempenho escolar. Este último foi avaliado pelo aluno por meio da pergunta: “A maioria de suas notas/médias encontra-se entre:”, e as alternativas de resposta foram: a) abaixo de 70 pontos, b) 70 e 85 pontos ou c) 85 e 100 pontos. Dessa forma, poderíamos dividir os alunos em três grupos distintos, de acordo com seu desempenho escolar: desempenho baixo, desempenho médio ou desempenho alto.

Das 22 respostas obtidas, 11 (50%) foram do sexo masculino e 11 (50%) do sexo feminino. Em relação ao desempenho, 36% dos alunos que responderam à pesquisa possuem desempenho médio e 64% apresentam desempenho alto (Figura 1).

Figura 1: Distribuição dos alunos quanto a gênero e desempenho escolar

Dois instrumentos de avaliação psicológica foram utilizados para a realização deste estudo: um mensurou o autoconceito dos alunos e o outro a sua autoestima.

A Escala de Autoconceito Infantojuvenil (EAC-IJ) (no Anexo A) foi desenvolvida por Sisto e Martinelli em 2004 e tem como objetivo avaliar o autoconceito da criança e do adolescente em quatro diferentes contextos sociais: pessoal, social, familiar e escolar (Sisto; Martinelli, 2004). Esse instrumento contém 20 questões com três alternativas de resposta para cada uma (nunca, às vezes ou sempre). Quando as questões possuem tom negativo, a distribuição dos pontos para cada uma das respostas é: nunca=2 pontos, às vezes=1 ponto e sempre=0 pontos. Quando as perguntas têm caráter positivo, os pontos são: nunca=0 pontos, às vezes=1 ponto e sempre=2 pontos. Dessa forma, o escore total máximo do aluno poderá ser de 40 pontos. Quanto maior a pontuação final, mais positivo o autoconceito é considerado.

A Escala de Autoestima de Rosenberg (EAR) (Anexo B) foi criada por Rosenberg em 1965, traduzida e adaptada para a realidade brasileira por Hutz em 2000 e revisada e atualizada por Hutz e Zanon em 2011, sendo validada por outros autores (Dini; Quaresma; Ferreira, 2004; Hutz; Zanon, 2011; Pechorro et al., 2011; Romano; Negreiros; Martins, 2007; Sbicigo; Bandeira; Dell’Aglio, 2010). Essa escala objetiva avaliar a autoestima global dos indivíduos. Vale lembrar que a autoestima diz respeito à avaliação que o sujeito faz de si mesmo, implicando um sentimento de valor, o qual engloba um componente afetivo, culminando na expressão de uma atitude de aprovação ou desaprovação em relação a si próprio (Rosenberg, 1965). Essa escala é composta por 10 questões com quatro opções de resposta (concordo totalmente, concordo, discordo e discordo totalmente).

Para os enunciados positivos, a pontuação das respostas é: concordo totalmente=4 pontos, concordo=3 pontos, discordo=2 pontos e discordo totalmente=1 ponto. Nos enunciados negativos, a pontuação é: concordo totalmente=1 ponto, concordo=2 pontos, discordo=3 pontos e discordo totalmente=4 pontos. Portanto, uma pontuação alta reflete autoestima elevada. As pontuações finais dos alunos podem variar entre 10 e 40 pontos. Autoestima elevada é considerada quando o sujeito atingir pontuação final maior ou igual a 30 pontos; quando a pontuação for menor que 30 pontos, a autoestima é considerada baixa ou insatisfatória (Simonetti, 1989).

Primeiramente, a direção e a equipe pedagógica da escola foram contatadas para a realização do estudo. A aplicação da Escala de Autoconceito Infantojuvenil e da Escala de Autoestima de Rosenberg foi realizada de forma remota, por meio de formulário online da plataforma Formulários Google.

O formulário foi enviado para a coordenação da escola com a orientação de solicitar a autorização dos responsáveis pelos menores para que participassem da pesquisa. Após autorização dos responsáveis, o formulário foi encaminhado para os e-mails dos alunos. Juntamente com o formulário, foram enviados o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e o Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE). Os alunos somente conseguiram acessar as perguntas depois que o TCLE foi autorizado pelos pais e depois de terem aceitado o TALE. A participação na pesquisa foi totalmente voluntária e com riscos mínimos aos participantes. Caso houvesse qualquer cansaço ou desconforto, o participante poderia entrar em contato com os pesquisadores e interromper sua participação a qualquer momento. Após o preenchimento do questionário, o participante recebeu uma cópia com suas respostas, bem como uma via do TCLE e do TALE.

Os dados coletados foram analisados utilizando o software IBM SPSS Statistics 20. Cada aluno apresentou uma pontuação final para cada escala psicométrica utilizada (autoconceito e autoestima). Foram realizados testes não paramétricos, como o Mann-Whitney, para verificar se houve diferença nos escores de autoconceito e autoestima entre os gêneros e relacionada aos desempenhos escolares dos alunos. Além disso, a correlação entre os escores das escalas de autoconceito e autoestima foi calculada por meio do coeficiente de correlação de Spearman. Os resultados das análises foram considerados estatisticamente significativos quando p<0,05.

Resultados e discussão

Após a aplicação das duas escalas, os testes foram avaliados e foram gerados os escores para cada aluno. A Tabela 1 apresenta os dados obtidos na aplicação da Escala de Autoconceito Infantojuvenil para os alunos e para os grupos, de acordo com gênero e desempenho escolar.

A média do escore de autoconceito de todos os alunos foi de 23,64 pontos, com desvio padrão de 4,77. O escore mínimo avaliado foi de 9 pontos e o máximo, de 29 pontos. O primeiro quartil (Q1) representa 25% dos escores, sendo eles menores ou iguais a 22 pontos; o segundo quartil (Q2) representa 50% dos escores, os quais chegam até 23 pontos; o terceiro quartil (Q3) representa 75% dos dados, todos eles menores ou iguais a 27 pontos.

Tabela 1: Estatística descritiva dos dados da Escala de Autoconceito Infantojuvenil

Variável

N

Média

D.P.

Valor mínimo

Q1

Q2 (mediana)

Q3

Valor máximo

Autoconceito

Masculino

Feminino

Desempenho médio

Desempenho alto

22

11

11

8

14

23,64

23,18

24,09

21,25

25,00

4,77

6,35

2,66

6,58

2,82

9

9

21

9

21

22

22

22

16

23

23

25

23

23

25

27

28

27

26

27

29

29

29

29

29

O teste de Mann-Whitney analisou se as variáveis independentes gênero e desempenho escolar possuem efeito sobre os escores de autoconceito. Não houve diferença significativa dos escores de autoconceito entre os alunos do sexo feminino e masculino (U=53,000; p>0,05); ou seja, o gênero não teve efeito sobre o autoconceito neste estudo (Figura 2A). Também não houve diferença estatisticamente significativa entre os alunos que possuem médio e alto desempenho escolar (U=36,500; p>0,05), indicando que o desempenho escolar não teve efeito sobre o autoconceito dos alunos neste estudo (Figura 2B).

Figura 2: (A) Autoconceito dos alunos divididos pelo gênero masculino e feminino; (B) Autoconceito dos alunos divididos pelo desempenho escolar médio e alto

A Tabela 2 apresenta os dados obtidos na aplicação da Escala de Autoestima de Rosenberg para os alunos e para os grupos, divididos de acordo com o gênero e o desempenho escolar.

A média do escore de autoestima de todos os alunos foi de 28,05 pontos, com desvio padrão de 3,68. De acordo com Simonetti (1989), uma pontuação maior ou igual a 30 pontos indica autoestima elevada. A média do escore de autoestima do grupo amostrado encontra-se muito próxima desse valor. Além disso, 36% dos alunos alcançaram um escore de autoestima maior ou igual a 30 pontos.

O escore mínimo avaliado foi de 18 pontos e o máximo, de 33 pontos. O primeiro quartil possui dados com valores até 26; o segundo quartil com até 28 pontos; e o terceiro quartil (Q3) chega a 30 pontos.

Tabela 2: Estatística descritiva dos dados da Escala de Autoestima de Rosenberg

Variável

N

Média

D.P.

Valor mínimo

Q1

Q2 (mediana)

Q3

Valor máximo

Autoestima

Masculino

Feminino

Desempenho médio

Desempenho alto

22

11

11

8

14

28,05

26,91

29,18

25,38

29,57

3,68

4,13

2,92

3,70

2,76

18

18

25

18

25

26

25

27

23

27

28

28

28

27

30

30

30

32

28

32

33

33

33

29

33

Analisando a variável gênero, não houve diferença significativa entre os escores de autoestima entre os alunos dos dois grupos (U=44,000; p>0,05), indicando que o gênero não possui efeito sobre a autoestima dos alunos neste estudo (Figura 3A). Por outro lado, houve diferença significativa dos escores de autoestima entre os grupos de alunos que possuem desempenho escolar médio e alto (U=21,000; p<0,05). Portanto, o desempenho escolar tem efeito na autoestima dos alunos avaliados neste estudo: a autoestima é maior em alunos com desempenho escolar alto, quando comparada com alunos com desempenho médio (Figura 3B).

Figura 3: (A) Autoestima dos alunos divididos pelo gênero masculino e feminino; (B) Autoestima dos alunos divididos pelo desempenho escolar médio e alto

Com o teste de correlação não paramétrica de Spearman, é possível verificar se as duas variáveis dependentes autoconceito e autoestima estão correlacionadas. A análise dos dados apresentou correlação positiva moderada (r=0,541; p<0,01) entre o autoconceito e a autoestima; isso não significa necessariamente que uma causa efeito sobre a outra, mas sim que as duas variam juntas (Figura 4).

Figura 4: Correlação entre as variáveis autoconceito e autoestima

As escalas de autoconceito e autoestima que apresentamos neste estudo, direcionadas com base nas variáveis desempenho escolar e gênero, apontavam para uma direção em que o processo de ensino-aprendizagem estava baseado em ações já preestabelecidas, inseridas em certa normalidade. Porém o mundo se deparou com uma pandemia de maneira a abalar a humanidade e passamos a nos questionar sobre o futuro da educação e as novas formas e mecanismos de aprendizagem.

Diante desse panorama, podemos dizer, no que se refere às escalas de autoconceito e autoestima, que muitas crianças e jovens podem estar com a autoestima e o autoconceito abalados, por uma situação talvez nunca imaginada.

No que está relacionado aos dados obtidos através da Escala de Autoconceito Infantojuvenil, foi perceptível que o gênero não foi fator relevante e não interferiu nos resultados, assim como os desempenhos escolares médio e alto também não demonstraram diferença significativa para o autoconceito.

Os estudos realizados resultaram na conclusão de que a autoestima dos alunos, quando relacionada à especificidade de gênero, não alterou, não interferiu e não tem efeito. Porém com relação ao desempenho escolar, como atuação na vida acadêmica do estudante, apresenta influência da autonomia nas avaliações que este estudo apresenta, em que a autoestima elevada está ligada a um bom desempenho.

A percepção que o estudante tem da expectativa do professor sobre ele é um fator que influencia sua autoestima. Professores tendem a ter diferentes expectativas para diferentes grupos de alunos. E, a partir dessas expectativas, professores possuem diferentes comportamentos. Por exemplo: para alunos com bom desempenho, os professores tendem a dar um apoio maior; e eles tendem a controlar o comportamento dos alunos com baixo desempenho, a fim de evitar a indisciplina. Os alunos percebem esses comportamentos de seus professores como símbolo da expectativa dos docentes sobre eles e com isso avaliam a si mesmos com base nessa percepção, o que acaba influenciando na autoestima (Kususanto; Chua, 2012).

A expectativa que os professores carregam sobre alguns alunos pode influenciar seu comportamento em sala de aula e assim confirmar sua própria expectativa. Por exemplo, quando um professor tem a expectativa de que certa turma de alunos terá bom desempenho, ele irá ter comportamentos (sorrir mais, ter mais calma) que apoiarão os alunos a alcançar esse bom desempenho (Kususanto, Chua, 2012).

Apresentamos os resultados que justificam não uma relação direta entre autoestima e autoconceito, mas aponta uma correlação entre as duas variáveis que ocorre de forma simultânea. Podemos ainda apostar em práticas pedagógicas que possam elevar o autoconceito e a autoestima para aplicação em sala de aula.

A motivação que impulsiona o professor a atuar de maneira a motivar seus alunos caminha para uma autoestima elevada com uma aprendizagem produtiva. Professores desmotivados, por vertentes que os desqualificam, podem abrir espaço para que as práticas não sejam aplicadas tanto para motivar os alunos quanto para elevar a autoestima (Lopes, 2010).

Ao considerar o planejamento de uma aula, podemos afirmar que a autoestima elevada favorece o aprendizado e indica bem-estar em ambiente que valoriza a participação para um aprendizado significativo.

Considerações finais

Ao avaliar o autoconceito e a autoestima em estudantes de uma escola da rede pública estadual no município de Floraí/PR, relacionando ao desempenho escolar e ao gênero dos estudantes como objetivo a ser alcançado, percebemos que essas variáveis psicológicas se relacionam de maneira que o afeto possa indicar uma envergadura de altruísmo com relação à sociedade de modo geral. A afetividade se estabelece como caminho que facilita a estruturação da autoestima e o processo que envolve o aprendizado do estudante.

Foi possível verificar como as variáveis gênero e desempenho escolar afetam ou não o desempenho acadêmico dos estudantes. O desempenho escolar interfere na autoestima dos estudantes avaliados neste estudo. Percebemos que a autoestima elevada está presente em alunos com desempenho escolar alto.

Diante disto, as escalas utilizadas permitiram avaliar o autoconceito e a autoestima dos alunos. Com esses instrumentos, as equipes pedagógicas podem traçar objetivos com o intuito de elevar o autoconceito e a autoestima também dos docentes, buscando aprimorar o desempenho escolar.

Referências

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LA TAILLE, Y.; KOHL, M. O.; DANTAS, H. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992.

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SISTO, F. F.; MARTINELLI, S. C. Escala de Autoconceito Infantojuvenil (EAC-IJ). São Paulo: Vetor, 2004.

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SOUZA, M. D. D. Relação entre vínculos afetivos e processo de aprendizagem: um estudo com alunos de São João Del-Rei. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Presidente Antônio Carlos, Barbacena, 2006.

Anexo A – Escala de Autoconceito Infantojuvenil (EAC-IJ)

1. Acho que sou o pior da turma.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

2. Acho que sou o mais burro dos meus amigos.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

3. Considero-me o mais bobo dos meus amigos.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

4. Sinto-me mais esquisito do que os outros.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

5. Sinto que não consigo ajudar meus amigos.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

6. Quando perco no jogo, tenho vontade de ficar só.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

7. Considero-me o mais esperto da classe.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

8. Penso que sou o mais divertido da classe.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

9. Gosto de ser o líder nos trabalhos em grupo.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

10. Imagino que sou o mais bondoso da classe.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

11. Meus colegas concordam com tudo o que falo.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

12. Acho que sou muito preocupado.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

13. Quando erro, sinto-me muito mal.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

14. Considero-me muito nervoso.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

15. Tenho muitos problemas.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

16. Tenho medo.

(2) Nunca (1) Às vezes (0) Sempre

17. Tomo muito cuidado com as coisas em casa.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

18. Fico alegre e contente quando estou com meus irmãos.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

19. Digo a verdade quando estou com minha família.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

20. Quando ajudo em casa faço tudo certo.

(0) Nunca (1) Às vezes (2) Sempre

Obs.: O número entre parênteses corresponde ao valor da alternativa em pontos.

Anexo B – Escala de Autoestima de Rosenberg (EAR)

1. Eu sinto que sou uma pessoa de valor, no mínimo, tanto quanto as outras pessoas.

(1) Discordo totalmente (2) Discordo (3) Concordo (4) Concordo totalmente

2. Eu acho que eu tenho várias boas qualidades.

(1) Discordo totalmente (2) Discordo (3) Concordo (4) Concordo totalmente

3. Levando tudo em conta, eu penso que eu sou um fracasso.

(4) Discordo totalmente (3) Discordo (2) Concordo (1) Concordo totalmente

4. Eu acho que sou capaz de fazer as coisas tão bem quanto a maioria das pessoas.

(1) Discordo totalmente (2) Discordo (3) Concordo (4) Concordo totalmente

5. Eu acho que eu não tenho muito do que me orgulhar.

(4) Discordo totalmente (3) Discordo (2) Concordo (1) Concordo totalmente

6. Eu tenho uma atitude positiva com relação a mim mesmo.

(1) Discordo totalmente (2) Discordo (3) Concordo (4) Concordo totalmente

7. No conjunto, eu estou satisfeito comigo.

(1) Discordo totalmente (2) Discordo (3) Concordo (4) Concordo totalmente

8. Eu gostaria de poder ter mais respeito por mim mesmo.

(4) Discordo totalmente (3) Discordo (2) Concordo (1) Concordo totalmente

9. Às vezes eu me sinto inútil.

(4) Discordo totalmente (3) Discordo (2) Concordo (1) Concordo totalmente

10. Às vezes eu acho que não presto para nada.

(4) Discordo totalmente (3) Discordo (2) Concordo (1) Concordo totalmente

Obs.: O número entre parênteses corresponde ao valor da alternativa em pontos.

Publicado em 02 de março de 2021

Como citar este artigo (ABNT)

NOVAES, André Henrique Oler de; SANTOS, Marcia Pereira dos; ROSSI, Cláudia Maria Soares. O autoconceito e a autoestima em estudantes da rede pública de ensino. Revista Educação Pública, v. 21, nº 7, 2 de março de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/7/o-autoconceito-e-a-autoestima-em-estudantes-da-rede-publica-de-ensino

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