A importância do ensino de Língua Inglesa nas escolas brasileiras: uma proposta de reformulação das diretrizes institucionais e dos conteúdos

Felipe de Araujo Rodrigues

Mestrando em Linguística Aplicada ao Ensino de Língua Inglesa como Segunda Língua, especialista em Literatura de Língua Inglesa, licenciado em Letras Português-Inglês (Uniabeu)

Com o objetivo de refletir sobre a importância do ensino de Língua Inglesa e suas literaturas no contexto globalizado da atualidade, este artigo visa identificar a importância da disciplina como elemento de inclusão social e meio de formação do cidadão brasileiro no mundo moderno. O determinismo social implícito nos PCN nega ao indivíduo o direito de decidir por seu destino; contudo, segundo Augusto (2001), há necessidade de desconstruir a distorção implícita na legislação educativa, que coloca o ensino de Língua Estrangeira numa posição “marginal” e “instrumental” para os menos favorecidos. Essa desconstrução, além de fornecer ao cidadão, pela educação, a possibilidade de acesso à língua inglesa, fornece também subsídios intelectuais para o indivíduo se adaptar à aldeia global, que cada vez mais exige de todos nós uma comunicação plena como regra de sobrevivência.

Panorama do ensino de Língua Estrangeira

No que diz respeito à organização da educação brasileira e seu plano de ensino, é possível observar pelos Parâmetros Curriculares de Língua Estrangeira para o Ensino Médio que, teoricamente, o conhecimento das línguas estrangeiras serve de instrumento de acesso a outras culturas e outros grupos sociais, além de determinar que a língua – tanto na modalidade oral quanto na escrita – seja compreendida como prática social cujo ponto de estudo inicial seja o texto. Contudo, essa definição não restringe o texto apenas à perspectiva discursiva, mas incentiva também a prática da leitura e do desenvolvimento de estratégias de compreensão auditiva, oralidade, leitura e escrita. Essas práticas foram introduzidas na Reforma de 1931 e bem defendidas nos 33 artigos citados em O ensino das línguas vivas, do professor Carneiro Leão.

Entretanto, após as esplendorosas décadas de 1940 e 50, marcadas pela reforma Capanema de 1942 – apropriadamente denominados anos dourados das línguas estrangeiras no Brasil, embora, segundo Leffa (1999), alguns estudiosos atribuam um aspecto nacionalista e até mesmo fascista em falas mais radicais –, percebe-se em autores como Leffa (1999) e Augusto (2001) que o ensino das línguas estrangeiras assumiu posição marginalizada, secundária e instrumental, de acordo com a legislação socioeducativa brasileira.

Outro ponto importante é que documentos legais mais específicos, como os PCN, negam a importância das habilidades orais e da escrita ao afirmar que “somente uma pequena parcela da população tem a oportunidade de usar línguas estrangeiras como instrumento de comunicação oral, dentro ou fora do país” (Brasil, 2001, p. 20).

Os PCN (2001) afirmam que é direito de todos os brasileiros o aprendizado da língua estrangeira conjuntamente com a língua materna. Entretanto, ao analisar o contexto educacional brasileiro, nota-se que não são oferecidas condições de ensino ao educando no que se refere à língua estrangeira. Sob a perspectiva dos conteúdos, não é possível perceber uma sequência de estudos definida e sistematizada entre as séries ou entre os anos letivos tal como é entre as disciplinas ditas regulares. Em função das turmas numerosas e dos desnivelamentos em termos de leitura e outros conhecimentos básicos que interferem negativamente no trabalho do professor de língua estrangeira, os métodos de ensino acabam por deixar de lado fatores como inovação e motivação. Ainda sobre os conteúdos, pode-se fazer um paralelo entre o programa de Língua Portuguesa no que diz respeito ao ensino de Literatura Brasileira. Embora haja muitos debates sobre os métodos de ensino da disciplina e as políticas públicas que regem os interesses de consolidação dela no Ensino Médio, mesmo que utilizada como base para o ensino de gramática, existe minimamente um esforço por parte dos docentes em trabalhar o assunto em sala de aula.

Na maioria dos casos, a literatura é apresentada aos alunos em conjunto com as aulas de Língua Portuguesa sob um viés conotativo, simbólico, historicamente explorado nas obras literárias consagradas na literatura luso-brasileira, isto é, ao discente são apresentadas obras com as quais é possível que ele se familiarize com as escolas literárias, autores, obras importantes e consagradas da literatura nacional, estabelecendo então um status de importância a elas para a formação integral do indivíduo. Entretanto essa mesma importância não é dada ao ensino das literaturas estrangeiras, ainda que em conjunto com a aula sistematizada da língua correspondente, que por sua vez acaba por ser posta em posição de pouca relevância se comparada ao ensino de literatura de língua materna.

A condição atual do ensino de Língua Inglesa no país

Algumas pesquisas revelam estatísticas preocupantes em relação à condição de ensino-aprendizagem de língua inglesa no país. O British Council, uma organização internacional do Reino Unido que trata das relações culturais e oportunidades educacionais do ensino de Língua Inglesa, em 2016 revelou que apenas 5% dos brasileiros são fluentes em língua inglesa, tornando o país o 40º no ranking internacional de fluência. Em 2020, uma nova pesquisa realizada pela English First divulgou resultados ainda mais alarmantes para o país: entre 100 países avaliados, o Brasil alcançou a 53ª posição no ranking.

O baixo desenvolvimento e a falta de proficiência no idioma, em muitos casos, são camuflados em currículos de profissionais que atestam possuir certo nível de proficiência no idioma, mas que, diante de uma simples entrevista, alcançam resultados que revelam níveis reais de domínio da língua muito abaixo do esperado para os famigerados intermediário ou avançado descritos nos documentos. A revista Mundo RH divulgou dados de uma pesquisa feita pela GlobalEnglish em que 13 mil colaboradores de empresas brasileiras tiveram seus conhecimentos e habilidades avaliados e obtiveram resultado médio de 2,93, de 10 como nota máxima.

As muitas dificuldades que o ensino de Língua Inglesa enfrenta no Brasil são provenientes de fatores que transitam desde questões histórico-sociais até interesses políticos. Contudo, podemos dizer que a regulamentação descentralizada contribui significativamente para o mau desempenho do ensino de Língua Inglesa nas escolas públicas. Um dado importante é que a escolha pelo ensino de Língua Inglesa até 2016 estava a cargo dos governos estaduais, isto é, era uma opção dentro da grade curricular das escolas. Com a Medida Provisória nº 746/16, o idioma ganhou status de única língua estrangeira obrigatória no ensino regular a partir do 6º ano. Contudo, essa alteração passou a valer somente em 2020, quatro anos após ser votada.

Mesmo com os movimentos legais em prol da institucionalização do ensino de Língua Inglesa nas escolas públicas, a disciplina ainda é vista como marginalizada e instrumental, com estratégias de ensino que não consideram o desenvolvimento de habilidades comunicativas nos alunos brasileiros. Ao contrário disso, há preocupação com o cumprimento do calendário com ênfase apenas em conteúdos gramaticais com pouca aplicação prática, principalmente no que diz repeito à comunicação. A falta de material autêntico em língua inglesa, como textos literários e até mesmo não literários, que reforcem a prática da leitura e do desenvolvimento de estratégias de compreensão auditiva, oral e escrita acaba por contribuir para o desinteresse dos alunos em aprender a se comunicar em inglês. O texto literário como parte da linguagem pode contribuir para o desenvolvimento das habilidades comunicativas dos alunos, pois a literatura como parte da linguagem e com toda a riqueza contextual que pode oferecer, ao ser adequadamente explorada nas salas, cria um ambiente propício para o desenvolvimento comunicativo. Para Fillola (2002 apud Silva; Pereira, 2017, p. 72), o ambiente criado para o uso dos trabalhos literários contém inúmeras e diferentes possibilidades para o enriquecimento das competências comunicativas para o aluno de língua estrangeira.

Conclusão

Diante desta breve análise das condições de ensino de Língua Inglesa no Brasil, é possível perceber que há necessidade de criar um plano de ensino mais integrado e sistematizado dentro das instituições públicas de ensino no que se refere ao ensino de Língua Inglesa. As pesquisas aqui citadas nos conduzem ao entendimento da relevância que o ensino de daquele idioma possui e provocam uma reflexão sobre aqueles que foram historicamente considerados os anos dourados do ensino das línguas estrangeiras. Além disso, percebe-se que, diante do cenário global, em que a comunicação é a chave do sucesso, faz-se necessária a integração dos conteúdos de língua inglesa dentro das salas como meio de preparar o indivíduo para o mundo cada vez mais conectado.

De acordo com Spink e Medrado (2004, p. 48), a linguagem, como meio de expressão polissêmica que é, dá ao indivíduo a oportunidade de “transitar por inúmeros contextos e vivenciar variadas situações”; conforme Collie e Slater (1989),

o uso de textos literários em sala de aula de Língua Inglesa oferece ao estudante um arranjo incomensurável de possibilidades que podem ser exploradas pelo professor visando aumentar a sua competência linguística, assim como ampliar o seu conhecimento de mundo, construindo uma identidade cultural e uma mentalidade intercultural, motivando o estudante a interagir com outras culturas que interferem na sua relação com o mundo (apud Yamakawa, 2013, p. 179).

Diante dos pressupostos teóricos apontados, é possível concluir que o ensino de Língua Inglesa e suas literaturas pode contribuir para a formação do aluno nesse contexto globalizado e de constante avanço tecnológico tão presente na atualidade. Contudo, mudanças de aspecto institucional e de conteúdos fazem-se necessárias na realidade das escolas públicas para que haja ensino de qualidade que reflita na prática o que os textos legais expressam, isto é, que o cidadão brasileiro tenha direito à educação pública e que ela seja de qualidade. Como professor, espera-se que esta reflexão possa contribuir para a melhoria do sistema de ensino de Língua Inglesa no país.

Referências

AUGUSTO, R. C. O inglês como capital cultural no contexto de escolas regulares: um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada), Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2001.

BRASIL. MEC. Secretaria de Ensino Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos. Brasília: MEC/SEF, 1998.

BRASIL. MEC. Secretaria de Ensino Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais - terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental: língua estrangeira. Reimpressão. Brasília: MEC/SEF, 2001.

LEFFA, Vilson J. O ensino de LE no contexto nacional. Contexturas, São Paulo, nº 4, p. 13-24, 1999.

SILVA, M. J. F; PEREIRA, C. C. A inserção do texto literário em aulas de E/LE. Revista Eletrônica Científica Ensino Interdisciplinar, Mossoró, v. 3, nº 07, 2017.

SPINK, Mary Jane; MEDRADO, Benedito. Produção de sentidos no cotidiano: uma abordagem teórico-metodológica para análise das práticas discursivas. In: SPINK, Mary Jane (Org.). Práticas discursivas e produção de sentidos no cotidiano. São Paulo: Cortez, 2004.

YAMAKAWA, Ibrahim Alisson. Ensino de Língua Inglesa, o papel do texto literário na formação do leitor. In: I ENCONTRO DE DIÁLOGOS LITERÁRIOS: UM OLHAR PARA ALÉM DAS FRONTEIRAS. Campo Mourão. Anais... p. 179, 2013. Disponível em: https://dialogosliterarios.files.wordpress.com/2013/06/anais1c2baencontrodedialogosliterarios.pdf. Acesso: 11 ago. 2020.

Publicado em 11 de janeiro de 2022

Como citar este artigo (ABNT)

RODRIGUES, Felipe de Araujo. A importância do ensino de Língua Inglesa nas escolas brasileiras: uma proposta de reformulação das diretrizes institucionais e dos conteúdos. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 1, 11 de janeiro de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/1/a-importancia-do-ensino-de-lingua-inglesa-nas-escolas-brasileiras-uma-proposta-de-reformulacao-das-diretrizes-institucionais-e-dos-conteudos

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