Aspectos psicomotores e desenvolvimento infantil

Rosicleia Palitot da Silva

Psicopedagoga (UFPB), especialista em Psicomotricidade e Neuropsicopedagogia (UCAM)

A progressiva universalização da Educação Básica vem confirmando as insuficiências da metodologia de ensino que recorre, quase que exclusivamente, à atividade mental, mantendo os alunos em “relativa imobilidade”. Tais insuficiências apresentam-se nas inúmeras dificuldades de aprendizagem dos vários estudantes, que resultam em abandono da escola ou na conclusão da Educação Básica sem apropriação de conhecimentos básicos, como a leitura, a escrita e o cálculo aritmético (Kolyniak Filho, 2010, p. 54).

Com o objetivo de pontuar as contribuições dos aspectos psicomotores para o desenvolvimento infantil, este trabalho apresenta uma contextualização do desenvolvimento humano, com foco na fase infantil, trazendo uma abordagem dos aspectos psicomotores e sua relevância para o desenvolvimento infantil. Por fim, sob o pretexto de conclusão, apresentaremos as considerações finais quanto aos resultados encontrados na pesquisa.

Desenvolvimento humano

O campo do desenvolvimento humano constitui-se do estudo científico de como as pessoas mudam, bem como das características que permanecem razoavelmente estáveis durante toda a vida (Papalia; Feldman, 2013). Para Bee e Boyd (2011), o estudo do desenvolvimento humano é uma área do conhecimento cujo enfoque está em conhecer as mudanças que ocorrem no ciclo da vida, da concepção à velhice, em todos os domínios do desenvolvimento, a saber, o cognitivo, o emocional, o moral, o psicossocial e psicossexual, o neurológico e psicomotor e o linguístico.

Uma das maneiras de apreender conhecimentos acerca do desenvolvimento, sobretudo durante a infância, é observá-la e registrá-la a fim de ter uma maior percepção das fases do desenvolvimento infantil. Assim, é possível observar o padrão esperado e a ocorrência de algum atraso mais acentuado.

O desenvolvimento infantil é uma sequência de transformações progressivas que ocorrem nos domínios dos campos cognitivo, sócio emocional, motor e de comportamento. Durante os primeiros anos de vida, ocorre a aquisição de habilidades nos diferentes domínios do desenvolvimento. Assim, a primeira infância é uma fase de grande importância para o desenvolvimento da criança (Santos et al., 2016). Deste modo, é necessário conhecer as fases do desenvolvimento infantil e suas peculiaridades.

Desenvolvimento cognitivo infantil

As etapas do desenvolvimento cognitivo foram classificadas segundo as observações e relatos de Piaget, que as classificou em: período sensório-motor (do nascimento até os dois anos aproximadamente), período pré-operatório ou inteligência simbólica (de 2 aos 7-8 anos), período operatório concreto (de 7-8 a 11-12 anos) e período operatório formal (a partir de 12 anos, com equilíbrio entre 14-15 anos).

No período sensório-motor, de acordo com La Taille (2003), Piaget usa a expressão "a passagem do caos ao cosmo" para traduzir o que o estudo sobre a construção do real descreve e explica. De acordo com a tese piagetiana, "a criança nasce em um universo para ela caótico, habitado por objetos evanescentes (que desapareceriam uma vez fora do campo da percepção), com tempo e espaço subjetivamente sentidos, e causalidade reduzida ao poder das ações, em uma forma de onipotência". No recém-nascido, portanto, as funções mentais limitam-se ao exercício dos aparelhos reflexos inatos. Assim sendo, o universo que circunda a criança é conquistado mediante a percepção e os movimentos do pequeno (como a sucção ou o movimento dos olhos). Segundo Sampaio (2011), esse período estende-se até o aparecimento da linguagem, que acontece por volta dos 18 meses a 2 anos. O período é chamado assim, porque existe uma coordenação sensório-motora da ação, com base na evolução da percepção e da motricidade.

No período pré-operatório, o que marca a passagem do período sensório-motor para o pré-operatório é o aparecimento da função simbólica ou semiótica. Em Piaget, é neste período que se dá a emergência da linguagem. Visca (1991 apud Sampaio, 2011, p. 43) explica que nesse estágio, já há uma representação ou simbolização. A mera ação motriz própria da etapa anterior interioriza-se e transforma-se em pensamento. Existe nesse estágio uma distinção entre significante (imitação, desenho, imagem mental, jogo, palavra) e significado (situação evocada, objeto representado).

Já no período operatório concreto, a criança começa a lidar com conceitos como os números e estabelece relações. Esse estágio passa a manifestar-se de modo mais evidente o que coincide com o início do Ensino Fundamental. É caracterizado por uma lógica interna consistente e pela habilidade de solucionar problemas concretos. Dessa forma, objetos e pessoas passam a ser mais bem explorados nas interações das crianças. Inicia-se a capacidade de a criança estabelecer relações que permitam a coordenação de pontos de vistas diferentes e de cooperação com os outros. Trabalhos em grupos tornam-se possíveis sem a perda da autonomia pessoal (Goulart, 2007).

Em relação ao período operatório formal, a criança amplia as capacidades conquistadas na fase anterior e consegue raciocinar sobre hipóteses na medida em que é capaz de formar esquemas conceituais abstratos e, por meio deles, executar operações mentais dentro dos princípios da lógica formal. Rappaport (1981, p. 74) afirma que a criança adquire "capacidade de criticar os sistemas sociais e propor novos códigos de conduta: discute valores morais de seus pais e constrói os seus próprios (adquirindo, portanto, autonomia)". A dedução lógica, agora, não se efetua mais sobre o real percebido, mas sobre hipóteses.

É de suma importância tanto para o contexto escolar quanto para o familiar, o reconhecimento das etapas do desenvolvimento da criança. O desrespeito às etapas de desenvolvimento, antecipando conteúdos que ainda não são próprios da idade cognitiva, poderá ocasionar rupturas no processo de desenvolvimento da criança.

A importância da Psicomotricidade para o desenvolvimento infantil

De acordo com Alves (2008), Psicomotricidade é toda ação realizada pelo indivíduo que representa as suas necessidades e permite a sua relação com os demais. O bom desenvolvimento psicomotor é importante para fazer com que a criança melhore seu desempenho escolar e crie confiança em si, aprimorando sua autoestima. Alves (2008) ainda afirma que cada criança é única. Embora o desenvolvimento seja comum a todos, o meio em que vivemos influencia esse processo, fazendo com que crianças da mesma idade comportem-se de maneiras diferentes, porque cada criança é única e tem desenvolvimentos diferentes.

Para Le Boulch (1987), na Educação Infantil, a educação psicomotora possui papel relevante na prevenção das dificuldades escolares, promovendo um desenvolvimento total do indivíduo. Nessa etapa da vida escolar, exercícios corporais e atividades psicomotoras asseguram a noção espacial e o domínio corporal, permitindo que a criança satisfaça sua necessidade de movimento. Sendo o corpo a origem das habilidades cognitivas, a estimulação do desenvolvimento psicomotor torna-se necessária no processo global de aprendizagem. Isso traz à criança habilidades necessárias para o jogo e para a brincadeira.

Elementos básicos da Psicomotricidade

A função motora, o desenvolvimento intelectual e o desenvolvimento afetivo na criança estão intimamente relacionados. Os conceitos são basicamente os mesmos. O que muda é a forma de classificar e agrupar estes conceitos. Apresentaremos os elementos básicos para esta finalidade.

O primeiro dentre os elementos é o equilíbrio. A coordenação geral apresenta dois aspectos diferentes: a coordenação estática e a dinâmica. Sobre esse assunto, Costallat (1985) diz que a coordenação estática do equilíbrio entre a ação dos grupos musculares antagonistas, estabelece uma função do tônus e permite a conservação voluntária das atitudes, enquanto a coordenação dinâmica é a colocação em ação simultânea de grupos musculares diferentes com vistas à execução de movimentos voluntários complexos.

A imagem corporal diz respeito à noção do corpo que se desenvolve graças à função semiótica e ao movimento, nascendo daí todo um novo período que leva a criança da ação à representação. Essa função semiótica traduz a aquisição de novas condutas como a imitação, a imagem mental, o jogo simbólico, a linguagem e o desenho. Assim, quando a criança adquire a referência de si mesma, têm de fato a referência do próprio corpo. Costallat (1985) afirma que o corpo e suas capacidades se constroem organicamente antes do nascimento, mas não há noção de sua existência. Seu descobrimento e tomada de consciência são um processo de evolução posterior, que se entrelaça com o desenvolvimento vital, integrando-se no esquema corporal. A postura, a visão, a acuidade perceptiva, a mobilidade e a preensão, organizam experiências e levam paulatinamente à tomada de consciência da existência do corpo. Para Fonseca (1994), a noção de esquema corporal traduz um processo psicofisiológico cuja origem está nos dados sensoriais, evidenciados e fornecidos pelas estruturas motoras resultantes do movimento realizado pelo sujeito.

A lateralidade é outro elemento fundamental. Segundo Queirós e Schager (apud Alves, 2008, p. 62), o termo lateralidade refere-se à prevalência motora de um lado do corpo. Essa lateralização motora coincide com a predominância sensorial do mesmo lado e com as possibilidades simbólicas do hemisfério cerebelar oposto. Dessa maneira, é possível aceitar a ideia de que a lateralidade não somente se manifesta por meio das atividades motoras, mas também por meio de aferências sensoriais e sensitivas e pela diferenciação funcional de ambas as metades do cérebro. Alves (2008, p. 63) respalda que o conhecimento do próprio corpo não depende unicamente do desenvolvimento cognitivo, mas também da percepção, formada pelas sensações visuais, táteis, sinestésicas e pela contribuição da linguagem, que ajuda a precisar os conceitos, estabelecendo a distinção entre o seu eu e o mundo exterior. Portanto, paralelamente ao conhecimento e à teorização do resto do esquema corporal, aparece e se define a lateralidade. A lateralização não é só um processo motor, pois se apresenta como uma integração de estruturas cognitivas, linguísticas e relacionais, que se convertem em uma organização práxica. Machado (1999) afirma que o conceito de dominância lateral, sob o ponto de vista funcional, mostra que os dois hemisférios cerebrais não são simétricos, havendo sempre um hemisfério mais importante, ou seja, um hemisfério dominante.

Sobre o elemento de estruturação espaço-temporal, Alves (2008) diz que existem diferentes etapas que marcam a aquisição de um espaço coordenado e não poderiam ser compreendidas sem que se faça referência à evolução da percepção do próprio corpo. No decorrer do período pré-escolar, a criança deverá passar de um espaço topológico ao espaço euclidiano. Para Holle (1979), a lateralidade é uma sensação interna de que o corpo possui dois lados e que existem duas metades do corpo. Estas metades não são exatamente iguais. Ser capaz de perceber a lateralidade revela a sensação de que os dois lados do corpo não são exatamente os mesmos e que uma das mãos é usada mais facilmente do que a outra. Esse é o início da discriminação entre direita e esquerda. O conhecimento estável da esquerda e da direita só é possível entre 6 e 7 anos de idade e a reversibilidade não é possível antes dos seis anos de idade. A importância de conhecer a diferença entre esquerda e direita pode ser ilustrada por atividades do nosso cotidiano, por exemplo, o indivíduo deve saber quando um objeto está à sua esquerda ou direita, precisa da mesma noção ao andar pelas ruas da cidade, para orientar-se, para escrever e outras ações.  De acordo com Alves (2008, p. 72), entre os 6 e 7 anos a criança estará apta a reproduzir, mentalmente, seu corpo de acordo com os três eixos: alto – baixo, frente – atrás e direita – esquerda. O corpo será um fator de referência e de orientação, permitindo a estrutura do espaço circundante.

Em relação ao elemento musicalidade/ritmicidade, Alves (2008) afirma que o ritmo é considerado um dos conceitos mais importantes da orientação temporal. Ele não envolve apenas noções de tempo, mas está ligado ao espaço também. Toda criança tem um ritmo natural, espontâneo. As manifestações do bebê são ritmadas. Tem a hora de repouso e as horas de impulsos. A criança manifesta-se por meio delas.  A vida moderna interfere no ritmo de cada indivíduo, porém muito de nosso ritmo natural conserva-se conosco. O ritmo pode ocorrer em várias áreas de nosso comportamento. Ele traduz uma igualdade de intervalos de tempo sob três tipos de ritmos: motor, auditivo e visual.

Sobre a coordenação motora fina, esta representa uma coordenação segmentar, normalmente com a utilização das mãos exigindo precisão nos movimentos para a realização das tarefas complexas, utilizando também os pequenos grupos musculares (Alves, 2008).

Já a coordenação motora ampla, conforme Alves (2008, p. 58), é a coordenação existente entre os grandes grupamentos musculares. Para a criança, é mais fácil fazer movimentos simétricos e simultâneos, pois só em uma segunda etapa ela movimenta os membros separadamente. Para uma criança, interromper subitamente um movimento é difícil, mas esse controle muscular é indispensável para, futuramente, facilitar a sua caligrafia e concentração necessária à aprendizagem escolar.

Metodologia

O presente estudo caracteriza-se como uma pesquisa descritiva do tipo estudo de caso. A bateria psicomotora foi realizada com uma criança do sexo feminino com cinco anos, residente na cidade de João Pessoa/PB, que cursava o Jardim II em uma unidade de ensino particular da cidade.

Para tanto, utilizou-se a bateria psicomotora, que consiste em uma série de atividades propostas para cada aspecto ou elemento psicomotor: equilíbrio, imagem corporal, lateralidade, estruturação espaço-temporal, musicalidade/ritmicidade, coordenação motora fina e coordenação motora ampla.

O procedimento aplicado, inicialmente, foi apresentar o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) à genitora da participante a fim de receber autorização para proceder com a bateria. Após autorização, foi combinado o local e o horário para a execução da bateria. A execução da bateria deu-se assim:

1 - Equilíbrio

Atividade 1: Equilíbrio estático

Para essa atividade foi utilizada a brincadeira “o mestre mandou”, objetivando a execução das modalidades desejadas, que consistiu em pedir para juntar os pés de olhos abertos, depois juntar os pés de olhos fechados, ficar em pé apenas com um pé de olhos abertos e, por último, ficar em pé com apenas um pé e de olhos fechados por 30 segundos. Assim, foi possível verificar o equilíbrio da criança observada.

Atividade 2: Equilíbrio dinâmico

Para essa atividade foi utilizada uma fita autocolante na cor vermelha da largura de 1,5cm. Objetivando a execução das modalidades desejadas, a atividade consistiu em pedir para andar em cima da linha. Depois, foi desenhada no chão uma amarelinha. Suas limitações foram marcadas com a mesma fita mencionada e foi pedido para que a observada pulasse respeitando as regras da brincadeira, que é pular só uma vez em cada casa, com apenas um pé e não pisar em cima da linha. Também foi solicitado que a criança pulasse como sapo, agachada com as duas mãos no chão e usasse os quatros membros.

2 - Imagem corporal

Atividade 1: Esquema corporal simples

Para essa atividade, foi utilizada uma música improvisada que pedia para a observada localizar nela mesma cada parte do corpo conforme mencionadas: cabeça, olho, boca, nariz, orelha, braço, perna, pé e mão.

Atividade 2: Esquema corporal complexo

Para essa atividade, foi utilizada a brincadeira “o mestre mandou” objetivando a execução das modalidades desejadas, o que consistiu em pedir que a observada mostrasse nela mesma onde ficavam sobrancelhas, dentes, cílios, língua, cotovelos, joelhos, unhas e bochechas.

3 - Lateralidade

Para a realização dessa atividade utilizaram-se materiais diferenciados, conforme o objetivo da tarefa.

Atividade 1: Lateralidade ocular

Foi utilizado um tubo em formato cilíndrico (carretel de linha) e pediu-se que a observada olhasse na direção de uma das observantes (observante Y) e relatasse para a outra observante (observante X), que se encontrava de costas, o que a observante Y estava fazendo. A finalidade era descobrir qual a lateralidade ocular predominante.

Atividade 2: Lateralidade pedal

Para essa atividade foi utilizada a simulação de um jogo de futebol na fase das penalidades máximas. Utilizou-se uma bola de tamanho médio e de peso leve e foi pedido que a observada chutasse na direção de uma das observantes (X) a fim de fazer um gol. A finalidade era descobrir qual a lateralidade pedal predominante.

Atividade 3: Lateralidade manual

Para essa atividade foi utilizada a simulação de um jogo de basquete. Utilizou-se uma bola de tamanho médio e de peso leve e foi pedido que a observada ficasse batendo na bola por alguns segundos para que se observasse o seu manejo. A finalidade era descobrir qual a lateralidade manual predominante.

Atividade 4: Lateralidade auditiva

Para essa atividade foi utilizada a brincadeira “cabra-cega”. Para isso, utilizou-se uma blusa macia de cor escura para vendar os olhos da observada, colocando-a de costas a uma distância de 1,7m, enquanto as observantes dispuseram-se do lado direito (observante X) e esquerdo (observante Y) da observada. Ambas pediam que ela se encontrasse (observante Y) e depois foi repetida a atividade. Dessa vez, invertidas as posições das observantes, direita (observante Y) e esquerda (observante X), a fim de descobrir qual a lateralidade auditiva predominante.

4 - Estruturação espaço-temporal

Para a realização dessa atividade utilizaram-se materiais diferenciados.

Atividade 1: Noção de Direito x Esquerdo e Frente x Atrás

Utilizou-se um trecho da música Toda sorte de bênçãos, que diz: “Para a direita, para a esquerda, para a minha frente e para trás. Por todo lado, sou abençoado, em tudo o que eu faço, sou abençoado”. O objetivo era descobrir se a criança possuía domínio sobre a estrutura espaço-temporal.

Atividade 2: Noção Cima x Baixo

Para essa atividade utilizou-se a brincadeira “vivo-morto”, que consiste em vivo = cima e morto = baixo. O objetivo era descobrir se a criança possuía domínio sobre a estrutura espaço-temporal.

Atividade 3: Noção Dentro x Fora

Utilizaram-se bambolês para observar se a criança conseguiria pular para dentro dos bambolês segundo o comando de voz “dentro” e pular para fora dos bambolês quando o comando de voz fosse “fora”.

Atividade 4: Noção Pequeno x Grande

Para essa atividade foram colocados três lápis de tamanhos diferentes e foi pedido que a observada retirasse o lápis maior e o lápis menor.

5 - Musicalidade/ritmicidade

Atividade 1:

*  *  *  *: utilizou-se a sequência ritmada de quatro palmas.

Atividade 2:

* *    * *: Utilizou-se a sequência ritmada de duas palmas seguidas de uma pausa e depois a repetição da sequência ritmada de duas palmas.

Atividade 3:

*    * * *: Utilizou-se uma palma seguida de uma pausa e depois uma sequência ritmada de três palmas.

6 - Coordenação motora fina

Para a realização desta atividade, utilizaram-se materiais diferenciados, conforme o objetivo da tarefa.

Atividade 1: Atitude de encaixe

Para essa atividade utilizou-se um tabuleiro emborrachado com números de 0 a 9 em duas modalidades. Primeiro, o encaixe da forma/sobra e depois o encaixe das partes montadas para agruparem-se umas nas outras.

Atividade 2: Alinhavados e clipes

Nessa atividade foi utilizado um tênis para ser colocado o cadarço fazendo o alinhavado. Em seguida, havia atividade de colocação de clipes.

Atividade 3: Abotoar e desabotoar botões

Para essa atividade utilizou-se uma boneca e duas mudas de roupas, uma com botões de pressão e outra com botões e casas.

Atividade 4: Recorte de papel

Nessa atividade foi usada uma folha de papel com desenhos impressos e separados por uma margem que deveria ser respeitada na hora do corte.

7- Coordenação motora ampla

Para a realização desta atividade utilizaram-se atividades diferenciadas, conforme o objetivo da tarefa.

Atividade 1: Pular

Foi usado o trecho da música Eu fui comprado, que diz: “Todo mundo pulando, pulando, pulando, pulando. Na presença de Deus” (4x). Assim, pode-se observar a postura do pulo.

Atividade 2: Subir e descer escadas alternando os pés

Para essa atividade foi usado um lance de escada de cimento revestida de mármore com cinco batentes, do rol de acesso do térreo ao primeiro andar, a fim de observar a subida e a descida com alternância dos pés.

Atividade 3: Andar para a frente e para trás

Foi solicitado à observada que andasse cinco passos à frente e, depois, dez passos para trás.

8- Análise de dados

Os dados foram analisados a partir da frequência dos erros ou acertos obtidos conforme o protocolo de observação da bateria psicomotora.

Resultados

Neste trabalho, buscamos demonstrar a relevância dos aspectos motores para o desenvolvimento infantil por intermédio da realização de uma bateria psicomotora. A seguir, apresentaremos os resultados da pesquisa de acordo com a sequência apresentada no protocolo de observação da bateria e as considerações acerca deles.

Na modalidade de equilíbrio estático, a atividade realizada foi a brincadeira “o mestre mandou”, concluída sem dificuldade nas três primeiras modalidades, mas que não foi atingida na última etapa. A participante, com apenas cinco anos, teve dificuldades em fechar os olhos e equilibrar-se. O equilíbrio com os olhos fechados é muito difícil até para adultos.Na modalidade de equilíbrio dinâmico, andando sobre a linha, a observada o fez com precisão, demonstrando postura equilibrada e concentrada. Pulando como um sapo, a participante mostrou destreza e agilidade nos movimentos. Já na amarelinha, apresentou certa dificuldade em respeitar as regras da brincadeira. 

No que diz respeito ao esquema corporal simples e complexo, constatou-se que a participante conseguiu nomear as partes do corpo sem dificuldade. Assim, podemos observar que a participante observada apresenta organização do esquema corporal adequada a sua faixa etária. 

Nas atividades realizadas para se perceber a predominância da lateralidade na participante, constatou-se que a criança ainda não possui a predominância lateral ou a sua predominância é ambidestra (quando não existe um predomínio estabelecido de um dos lados e a criança usa indiscretamente os dois lados, significando uma condição de lateralidade cruzada, que se manifesta em olho dominante direito ou uma mão dominante esquerda), pois apresentou predominância ocular direita, pedal direita, manual esquerda, enquanto na outra atividade de coordenação motora fina, de cortar papel, a execução da atividade foi realizada com a mão direita. Conforme Alves (2008), as crianças necessitam fazer experiências com a utilização de ambos os lados do corpo. Agindo desta forma, favorecemos o desenvolvimento máximo dos seus movimentos. A partir dos sete anos, a criança será capaz de perceber que direita e esquerda não dependem somente uma da outra, mas também da posição de outras pessoas em relação a ela e seus deslocamentos, acontecendo, então, uma descentralização de seus pontos de referência. Também, a partir dessa idade, as crianças que não apresentam uma lateralidade definida, certamente encontram dificuldades na aprendizagem escolar. Essa afirmação de Alves tranquiliza os estudiosos, pois a participante tem apenas cinco anos. Portanto, encontra-se na fase do pré-operatório e ainda disponibiliza de tempo para que se confirme a sua lateralidade ambidestra ou define-se uma predominância destra ou sinistra.

Foi constatado na participante que ela possui a estruturação espaço-temporal nos itens: direito x esquerdo, cima x baixo, frente x atrás e dentro x fora. Contudo, a criança não conseguiu mostrar a diferenciação entre pequeno x grande.

O ritmo avaliado nesta bateria foi o auditivo. Na atividade, constatou-se que a nossa participante estava pouco atenta aos comandos e não consegui realizar a atividade com êxito. Por não se concentrar no ritmo das batidas das palmas e na execução, batia palmas desordenadamente e em maior quantidade do que a solicitada.

A participante estudada apresentou bom desempenho nas atividades relacionadas à função motora fina, com 100% de acerto nas atividades de abotoar e desabotoar botões assim como nas de recorte de papel. 97% de acerto na atitude de encaixe e 90% de acerto na atitude de alinhavar. A atividade em que a participante apresentou maior dificuldade foi na de articular uma sequência de cinco clipes. A atividade que apresentou expressiva dificuldade na realização foi articular uma sequência de cinco clipes (100%), seguida do alinhavado (10%). De forma geral, observou-se rapidez, entusiasmo nos movimentos, disponibilidade e maturidade consciente, pois a participante quando viu a atividade da articulação de clipes foi logo falando: “Essa aí, eu não sei fazer, não consigo!”. Porém, conseguiu realizar a tarefa com sucesso, após as dicas e as instruções passadas pelo grupo de observadoras.  Ficou claro que a participante não apresentava dificuldades, mas receio de realizar uma atividade totalmente nova para ela.

Na última atividade, a participante mostrou-se empolgada e ágil. Com movimentos precisos, subiu e desceu um lance de escadas com cinco degraus, alternando os pés, tanto na subida quanto na descida. Na hora dos pulos, fez com precisão, pulando com ambos os pés e em sincronia. Quando solicitada para andar para frente, assim o fez. E quando solicitada para andar para trás, houve uma pausa e leve inclinação de cabeça para o lado direito. Em seguida, uma marcha ré, rápida e coesa.

Partindo da análise dos dados relativos aos testes da função motora, entende-se que a participante estudada apresentou um bom desenvolvimento da coordenação motora fina, porém com dificuldade na realização de uma atividade específica que testava tal função. É importante ressaltar que esta é uma função de extrema importância, pois é requerida em tarefas diárias, tais como, segurar a colher e o garfo, escrever, cortar com tesoura, amarrar o cadarço, vestir-se, alimentar-se, dentre outras. A participante apresentou boa coordenação motora grosseira, imagem corporal e equilíbrio, com exceção das atividades relacionadas ao equilíbrio estático e ao equilíbrio dinâmico. Essas funções são muito requisitadas no cotidiano, mas ainda estão em desenvolvimento na faixa etária estudada, em vias de organização. Quanto à função perceptual, identificou-se que o esquema corporal da criança avaliada se apresentou organizado.

Vale lembrar que a criança percebe seu corpo através de todos os sentidos, particularmente através do sentido do tato, assim como pela visão e pelo sentido sinestésico, portanto a participante avaliada apresenta um bom desenvolvimento desses sentidos.

A consciência corporal e certo senso de lateralidade e direção são necessários ao indivíduo para perceber as coisas assim como as partes de si mesmo. Estas representam pré-condições para a percepção do espaço. Em relação à orientação espacial, a participante conseguiu orientar-se no espaço sem problema, apresentando dificuldade apenas no item que diz respeito à diferenciação de pequeno x grande. Nesse sentido, Fonseca (1994) afirma que é importante que tal função esteja desenvolvida, pois a criança precisa saber em qual direção deve ler e escrever, além de saber que a direção é um dos pré-requisitos para encontrar o caminho na rua, assim como para aprender os pontos cardeais e as noções de Geografia.

Quanto à ritmicidade, observou-se um baixo desempenho. Ao reproduzir ritmo codificado, apresentou discrepância na persistência psicomotora. O ritmo varia mais ou menos de indivíduo para indivíduo, sob a influência de fatores como a percepção, a reação, o comprimento comparativo dos membros, o temperamento e o estado de ânimo momentâneo. A concentração, de modo geral, exige certa maturidade, pois os sentidos relevantes devem estar intactos, especialmente a visão e a audição. É importante que tal função esteja bem desenvolvida, pois a concentração é a base para o bom aproveitamento escolar e para a aprendizagem de novas tarefas. Fonseca (1994) menciona que primeiro a criança deve ter desenvolvido a consciência corporal, para depois desenvolver a dominância manual e a lateralidade. A participante estudada apresentou dominância lateral indefinida ou ambidestra. Ressalta-se a importância da aquisição da lateralidade, pois quando se tem dificuldade em distinguir o lado direito do esquerdo, a criança não entende o trânsito, não escreve bem e possui uma concepção incompleta da direção e do espaço, acarretando, no futuro, para o indivíduo, a dificuldade de orientação espacial e de localização no mundo em que habita.

Esperamos ter contribuído para um melhor entendimento dos aspectos psicomotores gerais. Nosso objetivo é contribuir para os estudos em psicomotricidade e demonstrar o quanto a questão motora interfere em outras habilidades como cognição, linguagem, pensamento, memória e audição. A investigação do processo evolutivo da criança e a identificação de problemas relacionados ao seu desenvolvimento psicomotor possibilitam a intervenção precoce em atrasos evolutivos e a implementação de programas de estimulação para crianças com distúrbios de desenvolvimento ou em risco.

Referências

ALVES, F. Psicomotricidade: corpo, ação e emoção. 4ª ed. Rio de Janeiro: Wak, 2008.

BEE, H.; BOYD, D. A criança em desenvolvimento. Porto Alegre: Artmed, 2011.

COSTALLAT, D. M. Psicomotricidade: a coordenação viso-motora e dinâmica manual da criança infradotada, método de avaliação e exercitação gradual básica. Rio de Janeiro: Globo, 1985.

FONSECA, V. da. Psicomotricidade: filogênese, ontogênese e retrogênese. Rio de Janeiro: Wak, 2009.

______. Psicomotricidade e Psiconeurologia: introdução ao sistema psicomotor humano. Rev. Neuropsiq. Infância, Adolesc., v. 2, nº 3, p. 23-33, 1994.

HOLLE, B. Desenvolvimento motor na criança normal e retardada. São Paulo: Manole, 1979.

KOLYNIAK FILHO, C. Motricidade e aprendizagem: algumas implicações para a educação escolar. Construção Psicopedagógica, São Paulo, v. 18, nº 17, p. 53-66, 2010.

LA TAILLE, Y. Prefácio. In: PIAGET, J. A construção do real na criança. 3ª ed. São Paulo: Ática, 2003.

LE BOULCH, J. Educação psicomotora: psicocinética na idade escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987.

MACHADO, A. Neuroanatomia funcional. São Paulo: Atheneu, 1999. 

PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. 12ª ed. Porto Alegre: AMGH, 2013.

RAPPAPORT, C. R. Modelo piagetiano. In: RAPPAPORT, C. R.; FIORI, W. R.; DAVIS, C. Teorias do desenvolvimento: conceitos fundamentais. v. 1. São Paulo: EPU, 1981. p. 51-75.

Publicado em 12 de abril de 2022

Como citar este artigo (ABNT)

SILVA, Rosicleia Palitot da. Aspectos psicomotores e desenvolvimento infantil. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 13, 12 de abril de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/13/aspectos-psicomotores-e-desenvolvimento-infantil

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