Uma breve contextualização da identidade feminina em Americanah

Wellington Ricardo Felix dos Santos

Mestrando em Culturas Africanas, da Diáspora e dos Povos Indígenas (UPE - Câmpus Garanhuns)

Tárcia Lopes dos Santos

Mestranda em Culturas Africanas, da Diáspora e dos Povos Indígenas (UPE - Câmpus Garanhuns )

Silvania Núbia Chagas

Docente adjunta (UPE - Câmpus Garanhuns), coordenadora do Núcleo de Estudos sobre África e Brasil (NEAB) e do Programa de Mestrado Profissional em Culturas Africanas, da Diáspora e dos Povos Indígenas (Procadi)

Considerações iniciais

A realização deste artigo surge da compreesão da narrativa do livro Americanah, que aborda a história de uma moça nigeriana, Ifemelu, que vivia com sua família em Lagos e namorava Obinze. Contudo, seu país vivenciavam greves constantes, fazendo com que as aulas na faculdade em que ela estudava fossem totalmente instáveis, levando-a a buscar ajuda tanto da sua tia quanto de sua amiga que viviam nos Estados Unidos.

Por essa linha de pessamento, torna-se possível identificar o processo inicial da diáspora e o retorno que se identifica com as identidades que vêm sofrendo grandes transformações. Transformações estas que fazem com que Ifemelu amadureça em sua estadia nos Estados Unidos.

O desenvolvimente deste artigo teve como base a leitura da desconstrução da identidade, apresentando uma nova forma de ver a personagem Ifemelu em seu contexto feminista imposto em situação de diáspora no romance. O embasamento teórico em Stuart Hall e Homi Bhabha, entre outros, permite uma breve reflexão acerca da desconstrução das identidades femininas no romance Americanah, sendo elas trabalha das com viés crítico quanto aos movimentos pós-colonialistas. A metodologia para este artigo foi feita em leituras tanto do livro em questão quanto de alguns autores já citados.

A identidade na literatura pós-colonial

Dentro do contexto de mudanças na estrutura social, ela vem afetar a cultura dos indivíduos envolvidos, atingindo de forma profunda sua identidade a partir do surgimento e do acesso a novas culturas. Diante dessa fala, Hall, em seu livro A identidade cultural na pós-modernidade, ressalta:

Um tipo diferente de mudança estrutural está transformando as sociedades modernas no final do século XX. Isso está fragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, que no passado nos tinham fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais (Hall, 2006, p. 9).

Em outras palavras, durante todo o seu processo de evolução as identidades já sofrem grandes alterações provocadas pela globalização. Ainda de acordo com Hall (2006), a temática identidade vem sendo discutida em todos os campos, dentre eles nas teorias sociais, embora saibamos que as identidades estão sendo tranformadas diante do processo de modificações com o surgimento de outras identidades, fazendo assim um fracionamento delas, quando até o presente momento sabíamos que era unificada.

Nessa concepção, Hall (2006) tinha como objetivo, na costrução de sua obra, analisar quais são as principais questões relacionandas à identidade natural, sendo possível assim uma melhor análise das crises de identidade dentro da visão cultural. Ainda na visão de Hall (2006), as identidades estão sendo modificadas, mais especificamente descentradas. De acordo com ele, as questões voltadas para a sociedade moderna, estando ligadas em meados do século XX, deixaram marcas tanto nas questões estruturais quanto em fatores interligados às questões de gênero e sexualidade, assim como a nacionalidade, raça e etnia, permitindo uma clara visão quanto à perda da centralização na construção de um indivíduo social, por meio das possíveis mudanças que vêm atingir as identidades de forma tanto individual quanto geral, posicionando possíveis dúvidas diante das ideias unificadas. As possíveis mudanças, para Hall (2006, p. 9), estão “classificas no abalo na identidade pessoal como um deslocamento, em outras palavras, descentralização do sujeito”.

Diante desse processo, Hall (2006) apresenta em sua obra três conceitos teóricos de identidade na pós-modernidade: o sujeito do iluminismo, o sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno. Com esses três conceitos, é possível partir para uma visão de que a consciência na qual o sujeito esta inserido não permite uma identidade, isto é, se formos partir da identidade de maneira que a relação aos outros possa vir dar origem a um novo sujeito social, tendo uma visão voltada para a modernidade.

Hall (2006, p. 13) ressalta que, ao “assumir identidades distintas, o sujeito naquele momento está vinculado ao seu ‘eu’”. Ainda para o autor, é possível compreender que “o sujeito vem a ser composto por diversas características identitárias que poderão gerar um conflito”. Desse modo, a necessidade do sujeito de ter sua identidade própria dá a entender a necessidade de criar uma narrativa pelo próprio indivíduo.

Ao contextualizar como o fenômeno da globalização, a partir das mudanças e suas consequências, torna-se visível em aspectos primordiais para a construção da identidade do sujeito na pós-modernidade, principalmente quando englobam o contexto da globalização, por mais que as sociedades modernas se encontrem em constantes mudanças, fazem assim uma grande distinção das sociedades tradicionais.

Diante dessa breve explanação, permitindo melhor aprofundameto dentro do tema em questão, tendo como foco a identidade, Hall (2006) expõe o posicionamento diante dos teóricos contemporâneos, tendo como meta construir um panorama que esteja interligado às concepções do sujeito do iluminismo, assim como o sujeito sociológico e o pós-moderno. Fica claro que a busca de conceituar identidade, dá-se como embasamento o ato de afirmar que a identidade está fixada de forma estável para melhor retratar o sujeito moderno, com auxilio da compreensão do percurso histórico diante da concepção do sujeito.

Portanto, a construção da identidade do sujeito é contínua, de forma inconsciente e ao longo de sua vida. Hall (2006, p. 38) afirma que tal “identidade passa por um processo de deslocamento, se fragmentando, por mais que o sujeito esteja em seu ato de vivência, estando assim reunido ou unificado, tendo como possíveis resultados a criação da fantasia de si mesmo como uma pessoa única”. Ou seja, o sujeito sempre estará incompleto, sempre em processo de construção, de evolução, de formação identitária.

Em outras palavras: Hall conclui seu processo de compreensão de forma que a nação esteja além da organização sociopolítica, por mais que englobe todo o sistema de representação social. Assim, as culturas são consideradas uma fonte de conhecimento, de significados culturais que exercem grande influência na construção da identidade cultural do indivíduo.

Breve contextualização da identidade

Ao perpassar o diálogo com a breve visão de Hall na construção da identidade, será feita neste tópico uma breve explanação na visão de Homi Bhabha, em seu livro O local da cultura. É importante explicar que ambos os autores são importantes para a construção do próximo item, que abordará a personagem Ifemelu.

Na visão de Bhabha (1998), o sujeito passa por um processo de transformação pelo acesso a outras culturas. É nesse primeiro momento que a socidade, ao passar pelo processo de colonização – vale ressaltar que não ocorreu de forma espontânea –, faz surgir um sujeito híbrido, com base em sua própria experiência cultural como tal.

Bhabha (1998, p. 20) afirma que esse “processo de modernização faz com que o sujeito em sua consciência pretenda se adequar em qualquer ambiente, assim como em qualquer identidade que venha ser possível para o mesmo, desde as categorias conceituais, como classe, gênero e etnia”. Focando o processo que aborda questões das diferentes culturas, esse processo de articulação recebe o nome de entre-lugares, fenômeno que oferta um campo para novas estratégias de subjetividade que irão dar origem a novos signos identitários e colaborar para uma nova definição diante da própria visão sobre a sociedade.

Para Bhabha (1998), será somente por meio da desconstrução da ideia de identidades no caso de comportamento fixo que se poderá ter a desfragmentação dos conceitos criados sobre as identidades, mediante construções dos conceitos de entre-lugares, dos estranhamentos e da hibridização, dentre outros. A partir da iniciação dos conceitos voltados para as questões culturais é que ocorrerão alterações superficiais sobre a identidade, ocorrendo um deslocamento no espaço da identidade cultural para que possa ocorrer a diferenciação entre culturas.

Fica claro para o autor, ao impor sua rejeição quanto aos conceitos dos binarismos, a permissão para que o sujeito, como indivíduo híbrido, não venha a se adaptar a outra cultura que tenha sido vista como rígida. Sendo assim, a cultura nesse momento passa a ter outra visão, ou seja, ela passa a ser articulada distinta de entre-lugares.

É de fundamental importância esclarecer os questionamentos do sujeito nesse entre-lugar, posto em um terceiro espaço, sendo que nesse momento a cultura não se encontra fixa e que os signos sejam possíveis atos de transformações e ressignificações.

É seguindo o texto da pós-colonialidade que Bhabha vai se deparando com algumas dúvidas referentes à insistência quanto à distinção do ponto de localização do ato; dessa forma, a imagem estará ligada a possíveis distinções entre o outro, distinções estas que em nenhum momento devemos expor como objeção, já que Bhabha (1998, p. 86) ressalta que o outro precisa ser visto como algo que passa pelo processo de rejeição necessária de uma identidade primordial para que assim seja inserido ao sistema de distinção, que dará o acesso à cultura, apresentando ao sujeito, dessa forma, a realidade da linguagem simbólica e histórica.

É nesse momento que o colonialismo, ao desenvolver um discurso autoral, torna-se de forma básica para que possa desempenhar a dominação das sociedades, surgindo a necessidade de descrever tanto de forma consisa quanto direta perante o discruso colonial, fazendo com que o colonizado seja visto como selvagem e infantil, ao se criar uma narrativa que os apresentem como seres incapazes, desenvolvendo dessa forma o outro ao tentar  se justificar, além de perpetuar o domínio sobre as sociedades colonizadas.

Americanah e a identidade feminina

As narrativas da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie vêm sendo traduzidas para o português e publicadas pela Companhia das Letras. A obra escolhida para análise é Americanah; esse título é um adjetivo para aquelas pessoas que emigram da Nigéria para os Estados Unidos e retornam com sotaques e costumes americanos. Essa produção literária fala de comunidades diaspóricas que trazem em suas vivências questões relacionadas a etnicidade, hibridismo, pós-colonialidade e globalização.

Para a autora, a negroafricanidade se constitui em relação de ilegitimidade a partir da representação da figura do nigeriano bastardo em território americano, que se configura na escolha temática manifesta na metaficção historiográfica e na polifonia. Assim:

O conceito de metaficção historiográfica, conforme discute Linda Hutcheon (1991), tem por característica apropriar-se de personagens e/ou acontecimentos históricos sob a ordem da problematização dos fatos concebidos como “verdadeiros”. Isto é, o que diferencia a metaficção historiográfica de um romance histórico é a autorreflexão causada pelo questionamento das “verdades históricas”. A literatura, nessa perspectiva problematizadora da história, possui, sem dúvidas, um esquema de referências ao passado. O resgate de um acontecimento feito através da obra de arte sempre gera polêmica, pois nessa “visita” ao passado pode-se descobrir “verdades” até então não reveladas, devido às relações de interesse e poder de “grupos” conservadores (Hutcheon, 1991 apud Jacomel; Silva, 2009, p. 740).

Para Bakhtin, o conceito de polifonia é:

a multiplicidade de vozes e consciências independentes e imiscíveis e a autêntica polifonia de vozes plenivalentes constituem, de fato, a peculiaridade fundamental dos romances de Dostoievski. Não é a multiplicidade de caracteres e destinos que, em um mundo objetivo uno, à luz da consciência una do autor, se desenvolve nos seus romances; é precisamente a multiplicidade de consciências equipolentes e seus mundos que aqui se combinam numa unidade de acontecimentos, mantendo a sua imiscibilidade (Bakhtin, 2005, p. 4).

Nessa perspectiva, as narrativas da autora são permeadas de metaficção historiográfica e polifonia, que são características das literaturas pós-coloniais. Essas literaturas são carregadas de binarismos: colonizador e colonizado, superior e subalterno, metrópole e colônia, emigração e migração etc. Assim, com a entrada e saída dos colonizadores e a retirada, isto é, a saída dos colonizados, ocorre o contato com outras culturas, perdendo e ganhando elementos, ocorrendo dessa forma um processo de transculturação. Para Said (2011), a cultura acaba sendo associada à ideia de nação, é aquilo que vai diferenciar a sua comunidade da outra, ou seja, o nós e eles. 

Com o fluxo das migrações e com os deslocamentos, intensificam-se vários problemas ligados às questões territoriais. Esses elementos de pertencimento já não estão ao alcance, ocorrendo dessa forma a fragmentação dessas identidades.

Em Americanah ocorrem esses deslocamentos; algumas histórias, como a da personagem Ifemelu, mostram que há dificuldades ligadas às questões diaspóricas e uma das questões é a racial e as diferenças culturais. Quando ela chega aos Estados Unidos enfrenta esses dilemas que a afligem. A língua, o cabelo e os costumes são temas recorrentes nessa narrativa. Seu ex-namorado, Obinze, também é obrigado a ir tentar a vida em outro país; vai à Inglaterra, só que de forma clandestina, e usa um nome falso para tentar trabalhar no país. Então nessa história temos o contato com três continentes: o africano (Nigéria), lugar de origem dos dois personagens; o norte-americano (Estados Unidos) e o europeu (Inglaterra). A corrupção e o sucateamento das instituições na Nigéria obrigam esses personagens a imigrar para esses outros continentes/países, fazendo com que percam o contato e depois de um tempo se reencontrem em seu país de origem.

No romance são observadas as questões da pós-colonialidade e como o poder colonizador ainda está entranhado na formação cultural desses personagens. O processo de descolonização de Ifemelu ocorre por meio de reflexões sobre diferença cultural, espaço, território, identidade, subjetividade, etnicidade, raça, políticas de representação, uso da língua como forma de dominação e várias formas de opressão.

Essas reflexões são ressaltadas nesta citação:

Ela gostava do campus, grave com tanto saber, dos prédios góticos com suas paredes cobertas de hera, e do modo como, de noite, à meia-luz, tudo se transforma em uma cena fantasmagórica. E, acima de tudo, gostava do fato de que, nesse lugar de confronto afluente, podia fingir ser outra pessoa, alguém que tivera acesso a esse sagrado clube americano, alguém com os adornos da certeza (Adichie, 2014, p. 219).

O branco, o americano e essa nação neoliberal são vistos como algo supremo, algo a ser alcançado; quem não faz parte desse “clube” tenta se adequar de todas as formas. Assim, Ifemelu tenta fingir que é o colonizador, o dominante. E nessa adequação vai deixando a sua cultura, a sua tradição para trás. A pressão neocolonizadora marginaliza a cultura da protagonista e, nesse ínterim, ela tem o choque de que, além de ser o outro, ela é o outro de cor.

Fanon explica em seu livro Pele negra, máscaras brancas (2008) que o negro, devido à colonização e à construção histórica do que é ser negro pela visão eurocêntrica, não aceita a sua cor, pois ela carrega um peso estrutural de subalternidade e ele tem medo de se aceitar. “O negro quer ser branco. O branco incita-se a assumir a condição de humano” (Fanon, 2008, p. 27).

A mudança da Nigéria para América não a faz perceber, logo de início, a forma como sua pronúncia da língua inglesa, sua cultura e seu papel social e o fato de ser africana irão interferir em sua vida ao longo de toda a história. Então ela passa a relatar em seu blog, “Curious observations by a non-American black on the subject of blackness in America”, questões relacionadas a negritude, xenofobia, subalternidade; essa ferramenta passa a ser também um local de denúncia e enfretamento.

Ifemelu, por estar em um país neoliberal como empregada doméstica, babá, motorista etc., profissões vistas como inferiores pelos norte-americanos, e por ser negra, mulher, africana, imigrante, acaba sendo estereotipada e subjugada em vários momentos da narrativa, pois para o americano ela não está apta a galgar empregos considerados nobres. Assim, uma das questões para ela almejar um lugar nessa sociedade é o domínio da língua. Então a língua passa a ser uma das condições para ela se sentir inserida na cultura americana, e ao adotar essa postura ela passa a assimilar a cultura do colonizador.

No final do outono, Ifemelu consegue um trabalho de babá. No entanto, recebe um conselho de Ruth, a consultora de emprego da universidade onde ela estuda, que a deixa arrasada.

Ruth disse: “Meu conselho? Tire essas tranças e alise o cabelo. Ninguém fala nessas coisas, mas elas importam. A gente quer que você consiga esse emprego”. Tia Uju havia dito algo parecido no passado e, na época, Ifemelu rira. Agora, sabia que não devia rir. “Obrigada”, disse (Adichie, 2014, p. 220).

Depois de alisar o cabelo, ele começa a cair; esse processo a deixa arrasada, uma vez que ele reflete a cultura do colonizador que a sufoca, colocando-a em um lugar de subalternidade. Nessa perspectiva, o conceito de subalterno é definido como sendo “as camadas mais baixas da sociedade constituídas pelos modos específicos de exclusão dos mercados, representação política e legal, e da possibilidade de se tornarem membros plenos do estrato dominante” (Spivak, 2010, p. 12).

A partir desse momento, a narrativa ganha outra roupagem; Ifemelu utiliza o seu blog para denunciar o racismo, a xenofobia e outras formas de segregação. Assim, a personagem o utiliza como instrumento que promove espaço de fala a partir de mecanismos provenientes das classes hegemônicas da sociedade com o intuito de alcançar e dar voz a tantas pessoas que passam por tais situações diaspóricas.

Esse contato com outras experiências culturais tornam o sujeito híbrido, isto é, modificado. Para Bhabha (1998), essas novas posições do sujeito só são possíveis devido ao distanciamento de categorias conceituais que ele denomina binarismo, que identificamos com base na “classe” ou no “gênero”, no que ela chama de entre-lugares, que se configuram como processo de articulação das diferenças culturais.

Assim, Ifemelu caminha nesse terceiro espaço que carrega as marcas da sua cultura e traz também as marcas do colonizador e sabe andar e se deslocar nesse entre-lugar, isto é, nesse terceiro espaço. Dessa forma, ela utiliza a língua, a cultura, os costumes do americano e não perde o seu traço cultural, mas sente dificuldade de se religar quando há um retorno ao seu lugar de origem, pois muitas vezes se torna um processo traumático.  Como afirma Hall (2003), “na situação da diáspora as identidades tornam-se múltiplas”.

Essas formações e essas identificações culturais que o sujeito diaspórico já possuía, bem como as que adquiriu na experiência diaspórica, não desaparecem; eles se entrelaçam, fazendo surgir novas formações e novas identificações culturais. Nas palavras de Hall,

muitos sentem falta dos ritmos de vida cosmopolita com os quais tinham se aclimatado. Muitos sentem que a "terra" tornou-se irreconhecível. Em contrapartida, são vistos como se os elos naturais e espontâneos que antes possuíam tivessem sido interrompidos por suas experiências diaspóricas. Sentem-se felizes por estar em casa. Mas a história, de alguma forma, interveio irrevogavelmente (Hall, 2006, p. 27).

Dessa forma, quando a personagem descreve como foi o seu retorno à Nigéria constata-se um choque de realidade, pois Ifemelu, por passar 13 anos vivendo nos Estados Unidos, transformou-se em um sujeito híbrido, contraditório e plural. Nesse processo, ela redescobre a si e redescobre também o seu país, pois o que antes era familiar agora é um espaço de redescobrimento cultural.

Considerações finais

A realização deste artigo, tendo como base o livro pós-colonial Americanah, permitiu uma nova reflexão ao processo identitário do universo feminino. Neste caso, a obra está voltada à personagem Ifemelu, que, na busca por realização profissional, iniciou uma nova realidade social nos Estados Unidos. Nessa concepção, fica claro que tais identidades se tornam de fundamental importância para o campo dos saberes, vindo a abordar tanto as questões sociais quanto as questões da literatura.

É importante ressaltar que a obra literária pós-colonial Americanah tem como tema principal a identidade, ficando clara pelo título da obra a possível identificação das mudanças identitárias que a população nigeriana vem sofrendo a partir do momento da saída do seu país natal. Nesse sentido, perpassa o ato de uma contribuição dentro do campo social, assim como na cognitiva, fazendo assim ser algo de fundamental importância para uma melhor análise dentro da visão ou da perspectiva plural para que somente assim seja possível aos subalternos ganhar espaço e voz no meio social.

Dentro desse contexto, a personagem principal da obra, Ifemelu, torna-se uma representante de segundo plano. Por ser negra africana, ganha seu espaço de voz, relatando sua experiência como imigrante nos Estados Unidos, sendo possível expor sua visão pela qual foi condicionada no processo organizacional e social do país.

Ficou claro na análise da obra pós-colonial Americanah que podemos associar o lugar do(a) negro(a) tido(a) como subalterno(a) nos dias atuais em que eles continuam sendo vistos como subalternos. É importante ressaltar que essa conjuntura não se dá apenas nos Estados Unidos, mas no Brasil também. Aqui nos deparamos constantemente com uma guerra de conflitos raciais entre a polícia e a comunidade negra, da favela, com cada vez maiores proporções. Na busca de um silenciamento desde os séculos passados, a sociedade negra vem se deparando cada dia mais com uma inclinação para a tentativa da opressão das classes minoritárias.

Portanto, na visão de etnia e raça, a obra e a personagem mostram uma realidade vivida pelo processo da imigração, que veio a ser o ponto chave dentro de diversos fatores, como idade e classe social, pois, por mais que tenham partido do mesmo país, bem como da mesma etnia, as vivências foram distintas, permitindo que as personagens seguissem caminhos diferentes dentro das suas descobertas sociais.

Referências

ADICHIE, C. N. Americanah. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.

BHABHA, Homi K. O local da cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998.

BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoievski. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005.

FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: Ed. UFBA, 2008.

HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. Tomaz Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. 11ª ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

HALL, S. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Org. Liv Sovik; trad. Adelaine La Guardia Resende. Belo Horizonte: Ed. UFMG; Brasília: Unesco, 2003.

JACOMEL, M. C. W.; SILVA, M. C. Discurso histórico e discurso literário: o entrelace na perspectiva da metaficção historiográfica. In: CELLI – COLÓQUIO DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS E LITERÁRIOS. 3, 2007, Maringá. Anais... Maringá, 2009, p. 740-748.

SAID, E. Cultura e imperialismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

SPIVAK, G. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2010 .

Publicado em 18 de janeiro de 2022

Como citar este artigo (ABNT)

SANTOS, Wellington Ricardo Felix dos; SANTOS, Tárcia Lopes dos; CHAGAS, Silvania Núbia. Uma breve contextualização da identidade feminina em Americanah. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 2, 18 de janeiro de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/2/uma-breve-contextualizacao-da-identidade-feminina-em-iamericanahi

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