Educação Ambiental no âmbito da gestão escolar
José Clécio Silva de Souza
Graduado em Pedagogia, tutor (Univasf)
Décio Oliveira dos Santos
Graduado em Pedagogia, gestor de polo (Uninter)
A Educação Ambiental nos dá respostas para desafios enfrentados pela humanidade em vários âmbitos, sejam econômicos, culturais, sociais, éticos ou ambientais. Torna-se necessário compreender os novos conceitos a fim de que a sociedade abrace novos valores e procedimentos. Desse modo, é importante que exista, ainda, adesão de novas práticas de ensino para que se desenvolvam ações voltadas à construção do conhecimento, à conscientização e à participação ativa do aluno incorporadas à Educação Ambiental e à ação educativa escolar.
A crença na educação como uma construção de sociedades sustentáveis vem sendo reforçada nos últimos anos. A educação pode garantir que exista compromisso e engajamento com o futuro do planeta, fazendo-se importante repensar sobre a relação do homem com o meio ambiente. Cabe à comunidade escolar promover ações voltadas às práticas sustentáveis. É na formação escolar que o sujeito aprende a concentrar a maior parte das suas atenções e esforços na promoção da sustentabilidade. O papel da escola é de extrema importância na formação de cidadão preocupado em cuidar do nosso planeta. No entanto, esse potencial transformador da escola é limitado pelas dificuldades que os educadores e gestores escolares enfrentam no seu dia a dia.
Para a produção do trabalho foi realizada pesquisa bibliográfica buscando subsídios teóricos que abordam temas pertinentes à Educação Ambiental e à gestão escolar. Ambas, aqui, estão pautadas em leituras de obras, de matérias de revistas, de leis ambientais e educacionais e, também, na observação realizada nas escolas nas quais ministro.
O presente trabalho tem como objetivo discutir a importância de estimular o desenvolvimento de valores e atitudes que possam refletir a conscientização a respeito dos problemas ambientais, assim como incentivar o acesso à Educação Ambiental, objetivando contribuir para a construção de respostas para alguns desafios enfrentados nas Escolas e nas gestões, no âmbito da Educação Ambiental e no processo de formação dos alunos.
Breve histórico da Educação Ambiental
Há mais de 50 anos, os ecologistas discutem os efeitos da ação do homem sobre o meio ambiente. No entanto, a temática é recente nas salas de aula. No Brasil, a primeira preocupação formal com a Educação Ambiental surgiu em 1973, com a criação da Secretaria Especial do Meio Ambiente, que tinha, entre outras atribuições, a educação da população para o uso adequado dos recursos naturais. Só 15 anos depois, com a Constituição Federal de 1988, foi atribuído ao Estado o dever de “prover a Educação Ambiental em todos os níveis de ensino”. Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) estabeleceu que os currículos do Ensino Fundamental e do Ensino Médio abrangessem “o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política”. Três anos depois, a Lei da Educação Ambiental definiu-a como “um componente essencial e permanente da Educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal”. Mas não se estabeleceu quem seria o responsável pelo conteúdo a ministrar, nem por como ele seria desenvolvido em sala de aula.
Em 1997, foram estabelecidos os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), determinando como o ensino transversal seria incorporado a diferentes disciplinas. Assim, todos os professores, das mais diversas disciplinas, trabalhariam de alguma forma com o tema, como definido no Art. 10: “A Educação Ambiental será desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal”.
A Constituição Federal dedica um capítulo especial sobre o meio ambiente (cap. VI), descrevendo sobre o que é termos um Meio Ambiente equilibrado como direito de todo cidadão. Assim, forma‐se um elo entre a preservação da qualidade ambiental e a cidadania. No capítulo VI da Constituição há um item específico sobre a Educação Ambiental (Art. 225, item VI) que diz: “Cabe ao poder público promover a Educação Ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente”. No entanto, em muitos casos nossas leis não são efetivadas e nossas ações também não são satisfatórias para permitirem a construção de uma sociedade sustentável.
Educação de valores e atitudes
A necessidade da construção de valores e o acesso à informação como fatores de transformação social são molas propulsoras para uma Educação de qualidade. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) refletem a visão de que a “aprendizagem de valores e atitudes é pouco explorado do ponto de vista pedagógico. Há estudos que apontam a importância da informação como fator de transformação de valores e atitudes. Conhecer os problemas ambientais e saber de suas consequências desastrosas para a vida humana é importante para prover uma atitude de cuidado e atenção a essas questões, valorizar ações preservacionistas e aquelas que proponham a sustentabilidade como princípio para a construção de normas que regulamentam as intervenções econômicas” (Brasil,1997, p. 53). Por isso, faz-se necessário o engajamento nas ações, associando-se a teoria à pratica para que os conceitos estudados criem sentido, levando o aluno à reflexão sobre os cuidados necessários com o nosso planeta e seus recursos (água, solo, fauna e flora) assim como despertando-o para compreender o seu protagonismo nesse cenário onde suas ações são de extrema importância para preservação do planeta.
O estudo sobre o meio ambiente, mesmo estando presente nos currículos escolares, ainda é trabalhado em muitas situações desassociado das ações, distanciando os alunos da conscientização sobre as suas práticas. O ponto de partida para a elaboração de projetos significativos consiste na maneira como o tema é trabalhado nas escolas. As ações, os projetos e as práticas desenvolvidos pela comunidade escolar são de suma importância, assim como papel do professor e sua capacidade de formar alunos com consciência e capacidade de afirmar valores, fazendo opções de caráter pessoal e coletivo. Trata-se, portanto, de Educação mais ampla, que desenvolva comportamentos, atitudes e afirme valores.
Para que a atuação dos educadores traga resultados, faz-se necessária a obtenção de um conhecimento prévio, com capacitação profunda sobre o tema para conseguir envolver os aprendizes no trabalho dos conceitos.
Para muitos educadores, o tema encontra-se desgastado. Pensam que a educação socioambiental é distribuir sementes ou mudas de árvores, incumbindo o aluno a criar algum tipo de arte com garrafas pet ou jornais. Entretanto, tais práticas não inserem o aluno na ação. Outro fato observável na maneira como se trabalha o tema é a exposição dele em termos mundiais, por meio dos meios de comunicação de massa. O tema passa a ser ensinado apenas pela citação dos riscos, como das possíveis inundações, dos efeitos do aquecimento global, do degelo do Ártico. Tais previsões catastróficas distanciam o aluno do tema, impossibilitando-o de uma ação para contribuir com o não acontecimento de tais catástrofes. O ideal é desenvolver projetos nos quais o aluno possa interagir envolvendo-se com bons conceitos, trabalhando assuntos que possam fazer parte da sua vida e que possam, por meio das suas ações, fazer a diferença visível na escola, na família, no bairro e na cidade onde vivem.
Dessa forma, a escola estaria trabalhando com o educando uma educação socioambiental, desenvolvendo comportamentos e atitudes, afirmando valores, orientando-o a um papel integrante, dependente e transformador dentro da sociedade da qual participa.
Conhecer para preservar
O crescimento das cidades nos distancia cada dia mais do contato com a natureza. Esse contato ajuda os alunos a exercitarem sentimentos, a construir valores e a compreender a relação de causa e efeito das nossas ações. Os alunos precisam ter contato com a natureza, experimentá-la para que possam compreendê-la. Só assim se sentirão responsáveis por ela.
Assim, podemos destacar o papel das escolas na produção de espaços naturais dentro das suas instituições a fim de aproximar os alunos da natureza. Estes espaços podem ser representados por árvores verdes, jardins, hortas e, até mesmo, pela presença de animais, trazendo o aluno para a convivência natural. Desse modo, o aluno aprenderá a respeitar e a entender o seu papel e sua contribuição para sobrevivência do planeta. Uma escola sustentável pode levar o aluno à sensibilização e à conscientização de suas ações.
A gestão escolar é um campo de atuação que envolve diversos públicos, alunos, pais, professores, funcionários. Todos exercem um papel de igual importância dentro das decisões e dos planejamentos na gestão. Segundo Libâneo, “as concepções de gestão escolar refletem, portanto, posições políticas e concepções de homem e sociedade. O modo como uma escola se organiza tem um caráter pedagógico, ou seja, depende de objetos mais amplos sobre a relação da escola com a conservação ou transformação social” (Libâneo, 2001, p. 3).
A gestão dever seguir o caminho da permacultura (sistema de planejamento para a criação de ambientes humanos sustentáveis e produtivos em equilíbrio e harmonia com a natureza). A expressão surgiu do inglês “permanent agriculture” e foi criada por Bill Mollison e David Holmgren na década de 1970, um método para planejar, atualizar e manter um sistema ambientalmente sustentável, cujos valores e práticas podem ser adaptados ao contexto da sala de aula, fomentando atividades interdisciplinares e projetos educativos. Além disso, pode criar significativa ligação com a comunidade local, formando uma parceria de transformação do espaço em volta.
O sucesso desses projetos reside no fato de repensar o papel da escola, fora da visão embutida costumeira e tradicional, como se a gestão escolar fosse apenas da competência da direção e da coordenação. Tentar desenvolver uma gestão que possibilite a participação de toda comunidade, é dever de todos os atores educacionais.
Partindo da necessidade de uma gestão escolar consistente e transformadora, a equipe escolar deve buscar subsídios para inserir a Educação Ambiental no contexto educacional. O desenvolvimento de projetos que possibilitem a inserção dos alunos nesse contexto, gera atitudes diárias de respeito ao meio ambiente e de sustentabilidade, apoiadas nos conteúdos trabalhados em sala de aula. Partindo da perspectiva que todo projeto deva estar envolto de significados para os alunos, conduzindo as transformações ao redor, a sala de aula é o início de toda a reflexão e atitude diferente em relação ao tema. Entretanto, há muitos desafios a serem enfrentados pelos profissionais da educação que dificultam a execução de bons trabalhos e criam uma distância entre as expectativas sociais depositadas na educação e as respostas que elas têm sido dadas a sociedade. Alguns fatores são responsáveis pelos insucessos nos projetos educacionais, tais como a insuficiência de recursos, a desvalorização dos profissionais, a má gestão dos projetos, dentre outros.
No entanto, devemos acreditar que, de fato, a educação permanece sendo um instrumento de transformação social. O papel dos gestores, no desenvolvimento de iniciativas pontuais, é fundamental na busca por uma escola sustentável que engaje a comunidade escolar, trazendo os alunos ao protagonismo de suas ações.
Ao fazer o estudo sobre Educação Ambiental, foi possível destacar novas vertentes segmentadas dentro do tema, as quais chamaram a atenção pelo grau de importância na formação do indivíduo, tais como, a ecoalfabetização (que consiste na busca por maneiras de operacionalizar a sustentabilidade ecológica por meio da observação e do aprendizado com os sistemas naturais). A ecoalfabetização ou Alfabetização ecológica teve como um dos seus mentores o físico norte americano Fritjof Capra, também autor do livro Alfabetização ecológica (educação das crianças para um mundo sustentável). O livro reúne teoria e prática sobre a educação socioambiental, levando o leitor a pensar como educar para que as crianças atinjam o máximo do seu potencial, respeitando a natureza.
Segundo Capra (2005), ecologia é o estudo de como a casa Terra funciona, isto é, o estudo das relações que interligam todos os moradores da casa Terra. Diante do que temos experimentado no planeta, hoje, faz-se urgente um projeto de alfabetização para o saber ecológico – educar para uma vida sustentável. A Alfabetização ecológica tornou‐se um requisito essencial e deveria ser uma preocupação central da educação em todos os níveis, do Ensino Médio às Universidades (Capra, 2005).
É uma questão de sobrevivência das gerações futuras, “nas próximas décadas, a sobrevivência da Humanidade dependerá da nossa alfabetização ecológica - nossa capacidade de compreender os princípios básicos da ecologia e viver de acordo com eles” (Capra, 2005, p. 15).
O papel da Educação na mudança do saber
A questão ambiental apresenta-se revigorada na conjuntura atual, caracterizada por novas e diferentes abordagens, tendo como preocupação fundamental o papel da Ciência e da técnica na construção de novos conceitos e mentalidades que possam contribuir para uma mudança paradigmática do saber. A educação torna-se o intermediário principal para essa mudança. Cabe a ela rever o seu papel, porque somente por sua intermediação se tornará possível imprimir nos seres humanos os novos valores, os pensamentos e as ações para a formação de novas mentalidades, aptas a participarem de uma política ambiental mais justa. É preciso que a visão do desenvolvimento a qualquer custo dê espaço para o desenvolvimento sustentável, como apontado por Milton Santos: “no lugar do consumismo exacerbado leve a cidadania, e ao invés de desenvolver o individualismo estimule a vida solidária e coletiva entre os homens” (1994).
A deficiência na realização de trabalhos ambientais feitos por muitas escolas, reforça a ideia do consenso que a conjuntura atual da Educação Brasileira e sua política não têm correspondido aos anseios de uma escola pública de qualidade. Isso aponta ainda para a falta de percepção das relações que existem entre os objetivos da educação, em especial, os vinculados à questão ambiental. A educação, de forma geral, deve proporcionar o desenvolvimento da cidadania e de seus educandos, para uma participação mais efetiva na busca de políticas ambientais mais justas.
Para bons resultados é necessário que mudanças aconteçam na Educação. É preciso levar em conta algumas das características da sociedade atual, tais como, o consumismo desenfreado, o isolamento, a passividade política, a perda da essência do próprio ser humano como ser histórico, dentre outras. É nesse contexto que aparecem novas dimensões educativas, como o componente ético, orientado à transformação dos comportamentos em uma educação para a paz, para a saúde, para o consumidor e a Educação Ambiental. Essas novas dimensões da educação impulsionam restabelecer conteúdos, metodologias, atitudes e incluem o sentido do “como educar”. No entanto, a capacitação da comunidade escolar, a melhoria da qualidade de ensino e o desenvolvimento de programas interdisciplinares devem permitir uma maior compreensão dos problemas ambientais como ferramentas necessárias aos profissionais da educação.
Considerações finais
O acelerado processo de destruição do meio ambiente tem gerado um grande desafio para a educação, que passa a adquirir novos significados no processo de construção de uma sociedade sustentável, democrática, participativa e socialmente justa, capaz de exercer a solidariedade com as gerações presentes e futuras.
Por meio da Educação Ambiental nas escolas, esperamos que o aluno se posicionasse dentro da sociedade como cidadão ativo e modificador do meio, com o dever de preservar o meio ambiente para si e para as futuras gerações. Enfim, é de extrema importância entender que a escola é formadora de opiniões e que a prática ambiental, no espaço escolar, possibilita formar cidadãos mais conscientes de suas ações para com o meio.
O desafio da sustentabilidade representa o processo de evolução da sociedade e encontra‐se intimamente ligado ao processo de fortalecimento da democracia, da efetivação da cidadania, da construção de um mundo mais justo e da reafirmação de valores éticos. Nesse sentido, o papel da escola é essencial para impulsionar as transformações de uma Educação que assuma um compromisso com a formação de valores de sustentabilidade. Ademais, nosso desejo é que esse tema seja continuadamente problematizado e discutido no âmbito da educação.
Referências
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96). Brasília: Senado Federal, 2017.
______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Supremo Tribunal Federal, 2017.
______. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Introdução. Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997.
CAPRA, Fritjof. Alfabetização ecológica: a educação das crianças para um mundo sustentável. São Paulo: Cultrix, 2005.
LIBÂNEO, José Carlos. O sistema de organização e gestão da escola. 4ª ed. Goiânia: Alternativa, 2001.
SANTOS, Milton. Técnica, espaço e tempo. 4ª ed. São Paulo: Hucitec, 1994.
Publicado em 26 de julho de 2022
Como citar este artigo (ABNT)
SOUZA, José Clécio Silva de; SANTOS, Décio Oliveira dos. Educação Ambiental no âmbito da gestão escolar. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 27, 26 de julho de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/26/educacao-ambiental-no-ambito-da-gestao-escolar
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