A importância dos jogos no ensino de Matemática no Ensino Fundamental II
Claudiano Henrique da Cunha Melo
Doutorando em Matemática (UFMG)
Claudiney Nunes de Lima
Doutor em Estatística e Experimentação Agropecuária (UFLA), professor da UFSJ, professor orientador do curso de Licenciatura em Matemática do CEAD/UFOP
A cada dia, a Educação Matemática é repensada, renovada e modificada. Desse modo, sempre há motivos para discussões sobre o tema, pois a forma tradicional de se ensinar o conteúdo é vista, quase sempre, como rigorosa, formal e abstrata.
O tema “A importância dos jogos no Ensino Fundamental II” foi escolhido devido à desmotivação observada em relação aos estudantes sobre o aprendizado da Matemática baseada em teorias tradicionais, quando prevalecem a simples memorização e a decoreba de conteúdo. Sendo assim, o objetivo principal desta pesquisa é destacar a importância de aprender Matemática de forma lúdica, destacando o ato de jogar como uma forma de alcançar uma aprendizagem significativa. Partimos da seguinte questão norteadora: “Como os jogos despertam o interesse, a imaginação e a curiosidade nos alunos das séries finais do Ensino Fundamental?”.
Um dos motivos para a introdução de jogos nas aulas de Matemática é a possibilidade de diminuir os bloqueios apresentados por muitos de nossos alunos que temem a matemática e sentem-se incapacitados para aprendê-la. Dentro da situação de jogo, onde é possível uma atitude passiva e a motivação é grande, notamos que, ao mesmo tempo em que estes alunos falam matemática, apresentam também um melhor desempenho e atitudes mais positivas frente a seus processos de aprendizagem (Borin, 2002, p. 9).
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1998, p. 42), é consensual a ideia de que não existe um caminho que possa ser identificado como único e melhor para o ensino de qualquer disciplina. No entanto, conhecer diversas possibilidades de trabalho, em sala de aula, é fundamental para que o professor construa sua prática. Dentre elas, destacam-se a História da Matemática, as tecnologias da comunicação e os jogos, recursos que podem servir como instrumentos para a construção das estratégias de ensino da Matemática. Assim é importante o professor conhecer as diversas possibilidades de trabalho para construir a sua prática.
O uso de jogos em sala de aula motiva e desperta o interesse do aluno, tornando a aprendizagem mais atraente e significativa. Em aulas com jogos, o aluno é um ser ativo no seu processo de aprendizagem, ao contrário de como se dá em aulas tradicionais, em que ele é um ser passivo. Sabe-se que o jogo possibilita momentos de prazer aos alunos e é considerado um recurso pedagógico importante no aprendizado da Matemática.
Este trabalho consiste em uma pesquisa empírica, com entrevista estruturada e semiestruturada. Participaram professores de Matemática e alunos das séries finais do Ensino Fundamental da rede estadual de ensino da cidade de Capela Nova, no estado de Minas Gerais. No questionário havia questões subjetivas, observando se os professores faziam uso de jogos nas aulas de Matemática.
O ensino-aprendizagem da Matemática
Sabe-se que, desde o início da vida escolar, muitos alunos apresentam temor em relação à Matemática. Esta insatisfação deixa claro que existem problemas que precisam ser revertidos, pois ainda há escolas centradas em procedimentos mecânicos, desprovidos de significados para os estudantes.
Sabe-se que há professores que ministram muito bem suas aulas, têm uma classe ótima e com rendimento, mas que não contam aquele truquezinho que se usa num certo tipo de equação. Deixam para pedir na prova justamente esse tipo de equação. E, satisfeitos, pensam: “Agora consegui pegar esses alunos que julgam tão sabidos. Agora eles estão nas minhas mãos”. Conseguem pegar os alunos, e as classes estão em suas mãos! Sua fama de “duro” corre; outros admiram “o quanto ele sabe” e alguns poucos, que têm um talento natural para matemática e que conseguem desvendar o truque, sentem-se realizados. Mas esses professores não estão na classe dos que eu considero como educadores. Têm mais vocação para caçador! Isso está ligado à visão de humanidade e à percepção de ser humano que esses professores têm (D’Ambrosio, 2005, p. 84).
Ensinar Matemática de forma contextualizada deve ser obrigatoriamente uma das preocupações dos docentes, pois há a necessidade de o ser humano compreender os fenômenos que o cerca a fim de ampliar, aprofundar e organizar, progressivamente, o seu conhecimento e a sua intervenção sobre estes fenômenos. Isso sempre impulsionou a humanidade na construção do conhecimento matemático.
Segundo Lungarzo (1991, p. 111), “a Matemática tem uma função quase tão essencial em nossa vida quanto a linguagem. Praticamente todas as pessoas, com qualquer grau de instrução, se utilizam de uma ou outra forma de Matemática”.
É possível percebê-la com um simples olhar, seja nos contornos, nas formas, nas medidas ou nas operações básicas que são utilizadas constantemente. Sendo assim, a partir dos mais variados campos da atividade humana, torna-se cada dia mais necessário o domínio de alguns conceitos e processos matemáticos, para desenvolver a capacidade de raciocinar logicamente, atividade fundamental para a maioria das profissões, pois “a utilização do cotidiano das compras para ensinar Matemática, revela práticas aprendidas fora do ambiente escolar, uma verdadeira Etnomatemática do comércio” (D’Ambrosio, 2005, p. 23).
Atualmente discute-se muito sobre a Matemática escolar e como ela é abordada. Muitos professores transmitem aos alunos uma ideia errônea de que saber Matemática é seguir regras e fórmulas. Consequentemente, os alunos interpretam que é uma disciplina na qual não há discussões, dúvidas ou questionamentos, quando os professores afirmam aos estudantes que eles aprenderão melhor quando fizerem atividades repetitivas. Infelizmente, passam a visão de que a Matemática é uma ciência pronta, sem questionamentos ou discussões reflexivas, uma ciência acabada. Os alunos, em geral, passam a acreditar que eles como estudantes são apenas indivíduos passivos, que ouvem, obedecem e seguem regras.
É muito difícil motivar com fatos e situações do mundo atual uma ciência que foi criada e desenvolvida em outros tempos em virtude dos problemas de então, de uma realidade, de percepção, necessidades e urgências que nos são estranhas. Do ponto de vista de motivação contextualizada, a matemática que se ensina hoje nas escolas é morta. Poderia ser tratada como um fato histórico (D’Ambrosio, 2005, p. 31).
A ação pedagógica dos professores na maioria das escolas é seguir à risca o planejamento e a quantidade de conteúdos programados. Assim, a aprendizagem do aluno deixa de ser o objetivo primordial. A realidade das salas de aula é fator preocupante, pois em nenhum momento são geradas situações para que o aluno seja criativo, crítico, investigativo e desafiador, explorando os seus conhecimentos prévios e descobrindo que a Matemática é um objeto de pesquisa para trabalhar com situações problema.
Levando em consideração os fatos mencionados, percebe-se que as concepções matemáticas precisam ser modificadas, alteradas para que o ensino-aprendizagem matemático alcance uma renovação. “A educação enfrenta em geral grandes problemas. O que considero mais grave, e que afeta particularmente a Educação Matemática de hoje, é a maneira deficiente como se forma o professor” (D’Ambrosio, 2005, p. 83).
Sendo assim, uma das formas de ensino seria mudar o processo educacional, dando espaço aos alunos para atuarem como seres que pensam e agem. O professor deve ser o orientador, um monitor, não o centro do saber. Também é de suma importância a aplicação de novas propostas metodológicas que visem a uma melhoria no ensino da Matemática, tais como Etnomatemática, modelagem matemática e a ludicidade, no uso de jogos.
A ignorância dos novos enfoques à cognição tem um reflexo perverso nas práticas pedagógicas, que se recusam, possivelmente em razão dessa ignorância, a aceitar tecnologia. Ainda há uma enorme resistência de educadores, em particular educadores matemáticos, à tecnologia (D’Ambrosio, 2005, p. 55).
Matemática e a ludicidade
Observa-se, hoje, um crescente e preocupante desinteresse, por parte dos alunos de escolas de Ensino Fundamental, com o estudo da Matemática. Como consequência é comum encontrar alunos concluindo seus estudos básicos com defasagens e aversão à matéria.
De acordo com Batllori (2004, p. 14), “nos primeiros anos de vida é assim: quem de nós se atreveria a dar uma aula magistral (“daquelas de antes”) a uma criança de seis anos sobre qualquer assunto? Suponho e espero que ninguém. Mas quando as crianças já são mais velhas, então parece que o jogo na escola é uma coisa de ‘pequenos’ e quase uma perda de tempo. Erro crasso”.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) sugerem, como recurso, o uso dos jogos. Este seria um dos caminhos para se “fazer Matemática” na sala de aula, fornecendo contextos dos problemas e servindo como instrumento para a construção de estratégias de resolução de problemas.
Além de ser um objeto sociocultural em que a Matemática está presente, o jogo é uma atividade natural no desenvolvimento dos processos psicológicos básicos; supõe um “fazer sem obrigação externa e imposta”, embora demande exigências, normas e controle (Brasil, 1998, p. 47).
Nesse contexto, o trabalho com jogos matemáticos pode vir a se tornar uma alternativa para a elaboração de didáticas que objetivem a otimização do processo de ensino-aprendizagem da Matemática, no que diz respeito à assimilação de técnicas de criação de algoritmos e utilização do raciocínio lógico-matemático na resolução de problemas. Os jogos de estratégia sempre despertaram curiosidade na maioria das pessoas, quer pela simplicidade de suas regras, quer pelo desafio de descobrir a melhor maneira de vencer o jogo.
Assim sendo, além de tornar o raciocínio lógico-matemático familiar ao estudante, a utilização de jogos no ensino da Matemática pode vir a ser uma ferramenta poderosa na interação social, pois o aluno deve expressar para os outros participantes do jogo como chegou à determinada solução, confrontando as maneiras diferentes e os questionamentos de seus colegas para a solução de um mesmo problema.
Um bom jogo deve ser interessante e desafiador, proporcionando a participação ativa dos jogadores durante todo o processo. Tal participação deve levar em conta o estágio de desenvolvimento do aluno, referente à atividade mental e física de cada um. Não podemos cobrar igualmente a participação de um aluno que tem um comportamento mais retraído com outro que é ativo e mais participativo. Em algumas situações a participação ativa restringe-se a uma atividade física, porque seu pensamento ainda não foi completamente diferenciado da ação.
O jogo na escola foi muitas vezes negligenciado como uma atividade de descanso ou apenas como um passatempo. Embora esse aspecto possa ter lugar em algum momento, não é essa a ideia de ludicidade de um trabalho sobre a qual organizamos nossa proposta, porque esse viés tira a possibilidade de um trabalho rico, que estimula as aprendizagens e o desenvolvimento de habilidades matemáticas por parte dos alunos. Quando propomos jogos nas aulas de matemática, não podemos deixar de compreender o sentido da dimensão lúdica que eles têm em nossa proposta (Smole et al., 2007, p. 10).
Sabe-se que, quando o professor propõe um jogo a seus alunos, deve tê-lo jogado anteriormente para que o conheça, conseguindo criar e registrar as próprias estratégias a fim de realizar intervenções pedagógicas adequadas no momento da aplicação, em sala de aula.
Atualmente, um dos principais objetivos da educação é procurar personalizar o ensino respeitando as diferenças de aprendizagem de cada estudante, seguindo mudanças sociais e culturais, tornando o ensino da Matemática mais divertido, motivador e desafiador. O jogo é um dos recursos metodológicos que apresenta caráter lúdico e desafiador. Além do mais, o jogo é melhor do que folhas de exercícios, porque o retorno é imediato, fornecem oportunidades para criar estratégias e são mais estimulantes.
Segundo D’ Ambrósio, citado por Alves (2001, p. 23),
a verdadeira educação é uma ação enriquecedora para todos os que com ela se envolvem, e sugere que em vez de despejarmos conteúdos desvinculados da realidade nas cabeças dos alunos, devemos aprender com eles, reconhecer seus saberes, e juntos buscarmos novos conhecimentos. E mais, entender as Etnomatemáticas dos alunos, aliando-as às nossas temperadas com as acadêmicas. Assim poderemos gerar momentos felizes e criativos em sala de aula.
Uma forma de estimular os estudantes a jogar seriamente é deixar um tempo reservado a cada final de jogo para fazerem relatos em grupos, podendo discutir problemas sociais e alguns conflitos que surgirem.
Muitos docentes ainda não aceitam e ficam surpresos com o fato de mesclar a Matemática, considerada um corpo de conhecimento rígido, rigoroso e exato, com diversão e entretenimento. Em contrapartida, porém, há cada vez mais profissionais que compartilham a ideia de que se o jogo for utilizado de forma programada e sistemática é possível ajudar os alunos a interiorizar conhecimentos matemáticos que, com uma metodologia tradicional, passariam despercebidos.
O jogo é considerado um recurso indispensável nas aulas de Matemática. No contexto escolar deveria se integrar ao programa de forma séria e rigorosa. Contudo é preciso selecionar os jogos que devem ser usados, determinar os objetivos que se pretende alcançar e concretizar a avaliação das atividades lúdicas. Sendo assim, o jogo não será visto como um recurso didático usado unicamente como prêmio aos alunos mais ágeis na realização das tarefas escolares.
É do conhecimento de todos os profissionais da Educação Matemática que o uso do jogo nas aulas de Matemática é um recurso que deve ficar subordinado à Matemática e não o inverso. Também é de fundamental importância, não confundir os estudantes com ideias enganosas, tais como, “nas aulas de Matemática, os alunos só estão jogando”. Na verdade, eles estão aprendendo Matemática por meio de jogos.
Por meio dos jogos e de atividades lúdicas, os alunos percebem a necessidade e a utilidade de aprender Matemática, encarando novos conteúdos sem medo do fracasso inicial e aprendendo com o próprio erro e com o dos colegas. Por meio dos jogos, os alunos buscam, com autenticidade, o processo de socialização e a própria autonomia pessoal, jogam em função de sua própria capacidade, desenvolvem a atenção, a percepção, a memória, a resolução de problemas e a busca de estratégias, entre outros, gerando uma aprendizagem significativa.
Segundo Kamii (1991) e Krulik (1993), citados por Diniz (Smole et al., 2007, p. 11):
- O jogo deve ser para dois ou mais jogadores, sendo, portanto, uma atividade que os alunos realizam juntos;
- O jogo deverá ter um objetivo a ser alcançado pelos participantes, ou seja, ao final, haverá um vencedor;
- O jogo deverá permitir que os alunos assumam papéis interdependentes, opostos e cooperativos, isto é, os jogadores devem perceber a importância de cada um na realização dos objetivos do jogo, na execução das jogadas, e observar que um jogo não se realiza a menos que cada jogador concorde com as regras estabelecidas e coopere, seguindo-as e aceitando suas consequências;
- O jogo precisa ter regras preestabelecidas que não podem ser modificadas no decorrer de uma jogada, isto é, cada jogador deve perceber que as regras são um contrato aceito pelo grupo e que sua violação representa uma falta, havendo o desejo de fazer alterações, isso deve ser discutido com todo o grupo e, no caso de concordância geral, podem ser impostas ao jogo daí por diante;
- No jogo deve haver a possibilidade de usar estratégias, estabelecer planos, executar jogadas e avaliar a eficácia desses elementos nos resultados obtidos, isto é, o jogo não dever ser mecânico e desprovido de significado para os jogadores.
Os jogos matemáticos e a construção do conhecimento
A utilização dos jogos na escola não é algo atual, pois é bastante conhecido o seu potencial para o ensino-aprendizagem em muitas áreas do conhecimento. Sendo assim, trabalhar de maneira lúdica, utilizando os jogos matemáticos como ferramenta no ensino, proporciona ao aluno o prazer de ser um cidadão ativo, pensante, questionador e reflexivo, dando-lhe uma maior qualidade no que diz respeito à receptividade da disciplina.
Os jogos podem contribuir para um trabalho de formação de atitudes - enfrentar desafios, lançar-se à busca de soluções, desenvolvimento da crítica, da intuição, da criação de estratégias e da possibilidade de alterá-las quando o resultado não é satisfatório - necessárias para aprendizagem da Matemática (Brasil, 1998, p. 47).
As aulas expositivas por meio de livros didáticos focalizam o saber, mas geralmente ficam sem sentido para os alunos, e o ensino da Matemática torna-se impessoal, insuficiente e ineficaz, porque a simples reprodução de exercícios não efetiva nenhuma aprendizagem. É neste contexto que o jogo ganha um espaço como uma ferramenta ideal, proporcionando estímulo ao interesse do aluno, ajudando-o a construir suas novas descobertas e enriquecendo a sua personalidade. Segundo Smole et al. (2007, p.13), para que os alunos possam aprender enquanto jogam é preciso que o jogo apresente tanto a dimensão lúdica quanto a educativa.
Sabe-se que atualmente um dos principais objetivos da educação é procurar personalizar o ensino, respeitando as diferenças no ritmo de aprendizagem de cada aluno, seguindo as mudanças sociais, culturais e tecnológicas, tornando o ensino da Matemática mais divertido, motivador e desafiador, necessariamente aliado à construção e à formalização dos conceitos relacionados à disciplina em questão. O jogo é um dos recursos metodológicos que apresenta um caráter lúdico e desafiador. Portanto, cabe aos docentes estar atentos às jogadas dos estudantes, verificar se todas as regras estão sendo obedecidas e fazer intervenções somente quando necessário, garantindo uma melhor aprendizagem na utilização de material concreto.
Um jogo desenvolvido pelo professor pode contemplar diferentes objetivos em relação ao ensino de Matemática, dentre os quais se destacam: exercitar o domínio de determinados algoritmos, desenvolver habilidades de cálculo mental, construir determinadas ideias matemáticas bem como explicar dificuldades encontradas em conteúdos específicos. Paralelamente, o trabalho com o jogo pode estimular a formação de atitudes pessoais, tais como respeito aos colegas, cooperação e iniciativas (Ribeiro, 2009, p. 38).
O jogo: Comando
Segundo Ribeiro (2009, p. 18) “é importante destacar que as atividades lúdicas são inerentes ao ser humano, não somente no universo infantil, mas também nas vivências dos adultos”.
O jogo Comando (Smole et al., 2007, p. 49-51) é indicado para estudantes do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental. Ele possibilita explorar a comparação de números decimais, habilidades de cálculo mental e de estimativa. Vale ressaltar aqui algumas orientações:
- organização da classe: grupos de dois a quatro alunos;
- recursos necessários: cada grupo recebe um baralho com trinta cartas, três de cada um dos algarismos de 0 a 9, uma folha de registros e cartas com vírgulas em quantidade igual à de jogadores.
Analisando as regras do jogo e os possíveis comandos, percebe-se que algumas vezes é possível o empate quando dois jogadores podem conseguir números iguais ou quando ninguém consegue realizar o comando. Nesses casos, não está previsto nas regras o que deve fazer, mas é proposital. A intenção é que cada grupo resolva localmente o que fará em uma situação não prevista e que depois a classe tenha um momento determinado pelo professor para discutir essas situações. Nesses casos, o jogo permite a tomada de decisão, a percepção dos alunos sobre o valor das regras e de como elas se constroem em um processo de resolução de problemas.
As regras:
- Decide-se quem começa e quem preencherá a folha de registros;
- As trinta cartas são embaralhadas e colocadas no centro da mesa com as faces voltadas para baixo;
- Cada jogador tem uma carta com vírgula e, na sua vez de jogar, pega três cartas e monta com elas um número decimal de acordo com o comando do professor;
- O professor dará os comandos. Por exemplo: “monte com suas três cartas o maior número decimal possível”. O aluno deverá usar as suas três cartas e a vírgula com o objetivo de atender o comando do professor;
- O jogador que conseguir formar o número “comandado” pelo professor fica com as cartas dos oponentes. Se o jogo é realizado em dupla, o vencedor fica com seis cartas: três cartas do adversário e mais três cartas;
- Na folha de registros são anotados os comandos, os nomes dos jogadores, os números formados com as três cartas e o nome do vencedor da rodada;
- O jogo continua com nova escolha de cartas e novo comando do professor;
- Ganha o jogo aquele que, ao final de seis rodadas, possuir o maior número de cartas.
Exemplos de comandos do professor
Monte suas cartas:
- Menor número decimal possível.
- Número decimal mais próximo de 0.
- Número decimal entre 1 e 2.
- Número decimal menor que 1,03.
- Número próximo de 0,97.
Variações possíveis:
a) Fazer o jogo com as mesmas regras, mas usando apenas duas cartas.
b) Usar cartas que incluam números negativos.
Apresentação e análise de resultados
A partir da análise das respostas da entrevista semiestruturada realizada com professores de Matemática do Ensino Fundamental II sobre o uso de jogos nas aulas de Matemática, pretendeu-se destacar a realidade da rede estadual de ensino da cidade de Capela Nova/MG, em relação ao processo de ensino da Matemática.
Como se trata de uma escola pequena, situada no interior de Minas Gerais, foram entrevistadas apenas três professoras de Matemática e um professor de Química que estava lecionando a disciplina de Matemática nas séries finais do Ensino Fundamental. Desses quatro professores, um não demonstrou estar à vontade para responder, pois aceitou, mas não entregou o seu relato. Indagados sobre qual tipo de jogo utilizam na sala de aula para ensinar Matemática, todos disseram que não utilizam jogos em suas aulas.
Sendo assim, questionados sobre: quais as potencialidades e/ou habilidades o jogo desenvolve, qual o conteúdo explorado, como é a aprendizagem dos alunos, como é utilizado o jogo, quais as dificuldades encontradas, como é o comportamento dos alunos na prática em sala, vantagens e desvantagens do uso dos jogos, como os alunos registram as jogadas, se respeitam normas e regras, como é a rotina da aula, como são avaliados, sobre a atuação do professor durante a aplicação dos jogos e se conseguem identificar a aprendizagem por meio de jogos, os docentes não souberam responder, tendo em vista que os jogos não fazem parte do cotidiano escolar desses professores.
Dos oito alunos entrevistados, do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental (dois de cada ano), todos responderam que não estudam conteúdos matemáticos por meio de jogos. Indagados sobre qual tipo de jogo aprenderam na aula de Matemática, qual conteúdo foi explorado por meio do jogo, como é a aprendizagem na prática e o que acham de aprender Matemática por meio deste recurso metodológico, todos responderam que desconhecem a prática deste uso, por não aprenderem Matemática com jogos.
Questionados sobre o que acham de aprender Matemática de forma lúdica, dois alunos disseram que, como não tem acesso a jogos, não saberiam opinar e os demais disseram que apesar de não aprenderem Matemática dessa forma, consideram que é um recurso que estimula à aprendizagem. Em seguida foi perguntado “se o professor não utiliza o jogo como recurso didático, o que prevalece ao repassar os conteúdos”. Todos disseram que é o uso do livro didático, com explicações na lousa. Sobre o que acham da forma como o professor ensina Matemática: o aluno 1, destacou a rigidez como um impasse para a aprendizagem. Os alunos 2 e 3 disseram que gostam da forma como o professor ensina. O aluno 4 disse que as explicações são rápidas demais e, por isso, não consegue acompanhar. O aluno 5 disse que aprende fácil, enquanto o 6 disse que gosta das aulas, mas talvez se o professor usasse jogos seria melhor. O aluno 7 disse que é normal a aula do professor, pois sempre aprendeu pelo mesmo método e o aluno 8 disse que a aula é sem motivação e sem inovações.
Sobre como são avaliados na disciplina, os alunos 1, 2 e 3 disseram que é por meio de testes, provas e comportamento. O aluno 4 disse que é mal avaliado. O aluno 5 disse que a avaliação aplicada pelo professor é regular. Os alunos 6 e 7 acham que são bem avaliados pelo professor e o aluno 8 diz não apresentar dificuldades em Matemática, por isso não se preocupa com a avaliação.
Finalmente, sobre o que acham da disciplina de Matemática, os alunos 1 e 2 acham legal e interessante, porém complicada. O aluno 3 acha muito útil, pois afirma que “sem ela não conseguiria nada”. O aluno 4 diz não gostar da matéria, mas acha legal. Os alunos 5 e 6 acham a Matemática a disciplina mais importante e mais difícil. O aluno 7, acha importante aprender Matemática, mas vê a disciplina com o mesmo valor das demais disciplinas e, por fim, o aluno 8 acha que por se tratar de uma Ciência Exata é de grande valor para a vida.
Sendo assim, pode-se perceber, por meio dessas entrevistas, que os profissionais da área de Matemática ainda estão centrados em metodologias de ensino tradicionais. Sendo assim, vimos que suas práticas pedagógicas não são renovadas para uma aprendizagem significativa.
Dentro deste contexto, percebe-se também que o ensino matemático é feito somente por meio dos livros didáticos, com explicações na lousa. Dessa forma, verifica-se que há “medo” e “apatia” da maioria dos estudantes em relação à Matemática, devido à má formação dos docentes, a falta de investimentos e a cobranças da própria escola.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1998, p. 47), um dos objetivos do ensino da Matemática nas séries finais do Ensino Fundamental é identificar os conhecimentos matemáticos como meios para compreender e transformar o mundo à sua volta, percebendo o caráter de jogo intelectual, característico da disciplina Matemática, como um aspecto que estimula o interesse, a curiosidade, o espírito de investigação e o desenvolvimento da capacidade do aluno em resolver problemas.
Isso posto, percebe-se uma defasagem no ato de ensinar Matemática, pois os conteúdos são repassados de forma mecânica, equivocada e descontextualizada. A ausência de jogos nos materiais didáticos oferecidos impossibilita aos estudantes um aprendizado criativo e eficiente.
É notório que o jogo é uma atividade desencadeadora de diversas atitudes já pontuadas até o momento e que a validade dos jogos no ensino não se limita apenas à Matemática nem às crianças da pré-escola e do Ensino Fundamental. No entanto, essa é uma prática que encontra ainda bastante resistência quando da sua aplicação nas aulas, de modo mais específico nas aulas de Matemática, em outros níveis de ensino (Alves, 2001, p. 28).
Não há receituário pronto de como ensinar Matemática. O que se sabe é que há várias formas de se aprender Matemática e alcançar níveis elevados de conhecimento. Uma delas seria utilizar os jogos educativos para que o ensino não fique centrado em “decorebas” de números, fórmulas e regras.
Em se tratando da pesquisa aqui apresentada há de se ressaltar, em forma de gráficos, os resultados do que foi feito após análise das entrevistas, de forma estruturada, com os oito alunos das séries finais do Ensino Fundamental da rede estadual de ensino da cidade de Capela Nova do estado de Minas Gerais. Sendo assim, pelos gráficos abaixo, observam-se os resultados e a análise desta pesquisa.
No gráfico apresentado na Figura 1, observa-se que do total de 75% dos alunos entrevistados disseram que a aprendizagem de Matemática se dá por meio da explicação do professor. Ou seja, a maioria dos professores de Matemática ainda estão centrados em modelos tradicionais de ensino.
Figura 1: Gráfico da aprendizagem de Matemática dos alunos das séries finais do Ensino Fundamental
Pelo gráfico da Figura 2, pode-se observar que os alunos entrevistados, em sua maioria, disseram que os recursos de aprendizagem que o professor utiliza são somente livros didáticos.
Figura 2: Uso dos diversos elementos que contribuem para a aprendizagem da Matemática
Interessante observar pelo gráfico apresentado na Figura 3 que os recursos utilizados pelo professor são o livro didático (100%), bem como a lista de exercícios (12,5%). Sabe-se que o livro didático é um dos recursos metodológicos que o professor pode e deve utilizar, desde que não seja considerado como único guia a ser seguido. Além disso, são usadas muitas listas de exercícios, com atividades repetitivas.
Figura 3: Recurso mais utilizado pelos professores
Pela análise do gráfico da Figura 4, conclui-se que o ensino da Matemática, para a maioria dos alunos, é bom (87,5%). Apenas 12,5% consideram ótimo. Portanto é recomendável uma reflexão sobre a ação pedagógica dos professores de Matemática no ato de ensinar, de forma que o ensino seja satisfatório para todos, independentemente da classe socioeconômica.
Figura 4: Avaliação do ensino de Matemática
Considerações finais
Falar em Matemática e jogos, dentro da educação e fora dela, é um desafio, pois diante de novos paradigmas educacionais a sociedade vem impondo novos padrões de exigência nos quais prevalece o raciocínio lógico matemático. Sendo assim, não há possibilidade de pensar o ensino matemático sem pensar na inserção de jogos nas aulas de Matemática, ponto de partida norteador desta pesquisa.
Há alguns anos, a Matemática era vista como um simples conhecimento de números, baseada nas teorias de vários pesquisadores e documentos oficiais como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, matrizes curriculares, parâmetros curriculares, dentre outros. Com o tempo, a Matemática passou a ter novas perspectivas: modernização e evolução.
Desse modo, as atividades lúdicas, por meio da utilização de jogos em sala de aula, passaram a ter reconhecimento. Por meio desta nova metodologia de ensino, os alunos com dificuldades de aprendizagem passaram a ser desafiados ao aprendizado matemático e a vê-lo como algo interessante.
A Matemática é um processo permanente que não se esgota. Assim, por meio do jogo, o aluno se torna mais crítico e confiante para desenvolver seu raciocínio lógico matemático. Entretanto, transformar a Matemática de forma radical pode desestabilizar as práticas pedagógicas. A proposta de mudança é uma questão bastante complexa. Por isso é missão do educador ensinar Matemática sempre com a preocupação de não fragmentar o processo de aprendizagem, para que os estudantes possam desenvolver sua autonomia e criatividade, considerando os estudos matemáticos significativos tanto para a vida escolar como para a vida em sociedade.
Assim, conclui-se que, nas últimas décadas, diversos pesquisadores têm investido no papel dos jogos na aprendizagem da Matemática, porque eles ajudam na construção dos conceitos, apresentando momentos desafiadores aos alunos a fim de colocá-los, constantemente, diante de situações problema.
É dever da escola e dos educadores ajudarem o aluno a desenvolver as suas capacidades, competências e habilidades matemáticas, por meio dos jogos.
Referências
ALVES, E. M. S. A ludicidade e o ensino de Matemática. Campinas: Papirus, 2001.
BATLLORI, J. Jogos para treinar o cérebro. Trad. Fina Iñiguez. São Paulo: Madras, 2004.
BORIN, J. Jogos e resolução de problemas: uma estratégia para as aulas de Matemática. 4ª ed. São Paulo: IME-USP; 2002.
BRASIL. MEC. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. Brasília: MEC/SEF, 1998.
D’AMBRÓSIO, Ubiratan. Etnomatemática: elo entre as tradições e a modernidade. 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
______. Educação Matemática: da teoria à prática. 12ª ed. Campinas: Papirus, 2005.
FLEMIN, M. Jogos como recursos didáticos nas aulas de Matemática no contexto da Educação Básica. Educação Matemática em Revista, ano 14, nº 26, mar. 2009. Disponível em: http://www.sbem.com.br/files/revista14_26.pdf. Acesso em: 17 out. 2020.
LUNGARZO, C. O que é Ciência. Lógica. Matemática. São Paulo: Círculo do Livro, 1991.
PESSOA, G.; PAREDES, T. Uma proposta para o uso de jogos nas aulas de matemática: da fundamentação a confecção de jogos de estratégias. VIII ENEM – MINICURSO – GT 7 – FORMAÇÃO DE PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA, LEMAT-UFPE. Recife, 15 a 18 de julho de 2004. Disponível em: http://www.sbem.com.br/files/viii/pdf/07/MC01923995430.pdf. Acesso em 29 out. 2020.
SMOLE, K. S.; DINIZ, M. I.; MILANI, E. Jogos de matemática de 6º a 9º ano.In: Cadernos do Mathema Ensino Fundamental. Porto Alegre: Artmed, 2007.
Publicado em 18 de outubro de 2022
Como citar este artigo (ABNT)
MELO, Claudiano Henrique da Cunha; LIMA, Claudiney Nunes de. A importância dos jogos no ensino de Matemática no Ensino Fundamental II. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 39, 18 de outubro de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/39/a-importancia-dos-jogos-no-ensino-de-matematica-no-ensino-fundamental-ii
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