A união entre ludicidade e brincadeiras ao ar livre, um pilar do desenvolvimento infantil

Marielena Rocha Melegari

Licenciada em Pedagogia (UNIRIO)

Robison Zacharias Guimarães

Professor, orientador da Licenciatura em Pedagogia da UNIRIO

A presente pesquisa enfatiza o valor do lúdico na Educação Infantil, salientando que o brincar ao ar livre é um recurso metodológico. Tendo em vista que as crianças passam boa parte do seu dia na escola e tudo o que acontece dentro dela tem um valor enorme na vida das crianças é de extrema importância que sejam proporcionados aos educandos o bem-estar integral para garantir a acomodação de todas as informações que recebem. Proporcionar essa convivência ao ar livre, por meio das brincadeiras e do lúdico, permitirá que desenvolvam a imaginação, a capacidade de organização, a assimilação de regras e fortaleçam a sua saúde.

Por esse motivo, as razões que me levaram à escolha desse tema se deram quando exerci a minha profissão de professora na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais em Conceição de Macabu (APAE), no ano de 2013, numa turma de Educação Especial, assim como as experiências que obtive quando realizei o Estágio Curricular Supervisionado em Educação Infantil.

Ao trabalhar como professora na Educação Especial enfrentei algumas dificuldades. Na maioria das vezes me sentia frustrada e achava que não era capaz de lecionar. A Educação Especial exigiu de minha parte equilíbrio e paciência, pois nem sempre aquela criança com deficiência consegue aprender a escrever o seu próprio nome, às vezes ela não vai ter coordenação motora, pois seu cognitivo está afetado, ela pode ter dificuldades de concentração e levar um pouco mais de tempo para aprender. Assim, passei a trabalhar com as crianças de maneira diversificada, ao ar livre, com jogos, quebra cabeças, formas geométricas, rodas de interação, entre outros recursos pedagógicos. Os alunos exploravam o ambiente, pois estavam em contato com a natureza e interagiam uns com os outros. Utilizar o lúdico e o brincar como recursos pedagógicos ajudou na minha própria adaptação como docente. Consegui me adaptar à realidade deles, obtendo sucesso no seu processo de ensino-aprendizagem. Eles passaram a ter autonomia, sendo capazes de gerir suas necessidades básicas. Enfim, eu percebi o valor do lúdico e do brincar para a aprendizagem, o crescimento e a interação da criança, de forma prazerosa.

Logo, com as vivências obtidas na realização do Estágio Curricular Supervisionado em Educação Infantil e observando o contexto escolar, os procedimentos metodológicos utilizados em sala de aula e as ações pedagógicas no ambiente escolar, percebi que o uso do lúdico é no cotidiano. O exercício do brincar é visto como parte da rotina escolar na Educação Infantil, porém entre quatro paredes, dentro da sala de aula, favorecendo que os alunos tenham inquietações, estresses e tensões. Assim, para destacar melhor as causas e as razões da motivação desta pesquisa, lanço um olhar sobre o que diz respeito à percepção sobre a falta da apropriação de outros contextos para as brincadeiras infantis na exploração de outros espaços, como ao ar livre. Nessa perspectiva, o problema da pesquisa é o emparedamento das crianças na Educação Infantil.

A aprendizagem ao ar livre é benéfica para os alunos, pois permite que eles se desenvolvam em vários aspectos. Como diz Tiriba (2018), devemos ter uma visão alargada em relação à crença de que a aprendizagem só ocorre dentro da sala de aula e engrandecer quaisquer espaços que sejam livres.

Nesse sentido, a pesquisa tem como objetivo geral apresentar o lúdico como um recurso para potencializar o desenvolvimento da criança em diversos aspectos, com prioridade para atividades realizadas ao ar livre.  Dentre os objetivos específicos estão conceituar a ludicidade, compreender a importância do brincar e do aprender na natureza para o bem-estar dos educandos, demonstrar caminhos e estratégias de como inserir o lúdico fora dos espaços da sala de aula e identificar e relatar experiências de professores a respeito do ensino com brincadeiras fora da sala de aula.

Apresentando apontamentos sobre a realidade no dia a dia das escolas, analisando e dialogando com os autores utilizados para fundamentar a pesquisa, observamos os aspectos qualitativos da pesquisa. Por isso, a metodologia escolhida foi o estudo de campo e a revisão bibliográfica. Por conseguinte, utilizei, como referencial teórico, autores como Alves (2004), Kishimoto (2005), Tiriba (2018), Blauth (2013), dentre outros, que colaboraram imensamente para a pesquisa. Em relação ao estudo de campo, realizei entrevista com professores da Educação Infantil para um aprofundamento na realidade das escolas, intermediada por um questionário da ferramenta Google Forms.

O artigo foi estruturado em três seções, a fim de cumprir os objetivos aqui evidenciados. Dessa forma, na primeira seção da pesquisa, apresento os referenciais teóricos, abordando os conceitos de ludicidade, termo que fundamenta a pesquisa, como o valor do brincar e do aprender na natureza para o bem-estar e a evolução da aprendizagem infantil em espaços alternativos. Na segunda seção, abordo sobre a metodologia escolhida para desenvolver a pesquisa. Na terceira seção, trago os relatos, as narrativas, as informações e as explanações de professores no que diz respeito às experiências que vivenciam na Educação Infantil, com as brincadeiras, o aprendizado, o lúdico em espaços livres, na natureza.

A ludicidade

Os momentos de descontração e lazer são primordiais para o processo de desenvolvimento de toda criança. Ou seja, trata-se de uma experiência única que além de estimular, incita a aprendizagem infantil.  Podemos dizer que o brincar faz parte e permeia o mundo da criança, desde sempre, sendo um dos instrumentos mais importantes para o seu desenvolvimento. Nesse sentido, entende-se a ludicidade como uma circunstância muito séria na Educação Infantil, tornando-se o centro para o desenvolvimento integral da criança.

Ao referir-se à ludicidade é possível perceber que o termo decorre da palavra lúdico, que significa jogo, brincadeira, divertimento e lazer. A ludicidade é um novo modo de aprendizagem que nos permite um caminho ampliado, libertário, espontâneo e diversificado para a aprendizagem da criança, conforme Rau (2013) apresenta:

A ludicidade se define pelas ações do brincar que são organizadas em três eixos: o jogo, o brinquedo e a brincadeira. Ensinar por meio da ludicidade é considerar que a brincadeira faz parte da vida do ser humano e que, por isso, traz referências da própria vida do sujeito (Rau, 2013, p. 32).

Sobre essa conjuntura, nota-se que a atitude do brincar é constitutiva do ser humano, ou seja, é uma característica natural que dá movimento à infância, fazendo parte da vida como um processo de motivação fundamental. Conduzindo-se por este caminho, Froebel alia-se a Vygotsky ao presumir a atitude do brincar como a mais profunda e significativa fase do desenvolvimento infantil, ou seja:

Brincar é a atividade mais pura, mais espiritual do homem neste estágio, e, ao mesmo tempo, típico da vida humana como um todo – a vida natural interna escondida no homem e em todas as coisas. Ele dá, assim, alegria, liberdade, contentamento interno e descanso externo, paz com o mundo. Ele assegura as fontes de tudo que é bom. Uma criança que brinca por toda parte, com determinação autoativa, perseverando até esquecer a fadiga física, poderá seguramente ser um homem determinado, capaz de auto sacrifício para a promoção deste bem-estar de si e de outros. Não é a mais bela expressão da vida da criança neste tempo o brincar infantil a criança que está absorvida em seu brincar? A criança que desfalece adormecida? [...] Brincar neste tempo não é trivial, é altamente sério e de profunda significação (Formosinho; Kishimoto; Pinazza, 2007, p. 48-49).

Nesse sentido, o brincar deve possibilitar a emancipação da criança autônoma e feliz, que corre, brinca e explora livremente. O momento do brincar não deve ser restringido e visto somente como um simples divertimento ou um passatempo. É primordial que o brincar ganhe a conotação correta no pedagógico, desenvolvendo a criança em seus mais diversos aspectos. Pensar no lúdico, desse modo, é pensar em atividades, jogos e brincadeiras que incluam e envolvam o raciocínio e o discernimento, levando a criança ao crescimento de suas competências, habilidades e capacidades.

Alves (2004) salienta que é a partir da brincadeira que a criança aprende a criar, inventar e imaginar um brinquedo. Ou seja, tudo que está presente à sua volta pode ser um brinquedo. Um cabo de vassoura pode virar um cavalo, uma folha de árvore pode ser um pássaro, um galho pode se tornar uma espada. A criança tem esse domínio e necessita de liberdade para brincar, para se expressar e para escolher como deseja brincar. Dessa forma, a espontaneidade da criança e essa incitação de transformar e arquitetar é o que o autor destaca como fundamental no brincar, pois a estimula aos desafios e os desafios são instrumentos importantes que movem a criança para uma aprendizagem significativa. Para Alves (2004),

há brinquedos que são desafios ao corpo, à sua força, habilidade, paciência [...]. E há brinquedos que são desafios à inteligência. A inteligência gosta de brincar. Brincando ela salta e fica mais inteligente ainda. Brinquedo é tônico para a inteligência. Mas, se ela tem de fazer coisas que não são desafios, ela fica preguiçosa e emburrecida (Alves, 2004, p. 39).

De acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (Brasil, 1998), o lúdico e o ato de brincar assumem uma grande parte da vida da criança, isto é, quanto mais a criança brinca, mais ela se desenvolve e aprende. A brincadeira estará presente em todo o momento da sua infância, sendo fundamental para a sua atuação no meio no qual vive e com o qual interage.

Por fazer parte da vida da criança, “a utilização do lúdico como recurso pedagógico na sala de aula pode constituir-se em um caminho possível que vá ao encontro da formação integral das crianças e do atendimento às suas necessidades” (Rau, 2013, p. 37). Portanto, há a necessidade de que a criança brinque para que tenha um bom progresso em sua vida e aprenda a respeitar regras e limites, desprendendo-se do seu natural egocentrismo para alcançar a autonomia desejada e saber ouvir o não, reagindo de forma positiva.

Além disso, a brincadeira é direito das crianças, um direito assegurado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, ECA (Brasil, 2020), no seu Art. 16, inciso IV: “O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: [...] IV - brincar, praticar esportes e divertir-se”. Compreendemos, portanto, que o brincar, além de um direito assegurado por lei, é a base para a criança ter o seu completo desenvolvimento. Por conseguinte, faz-se necessário que as escolas assegurem e garantam esse direito, permitindo que as crianças sejam livres para expressar seu comportamento e suas aprendizagens.

Brincar e aprender em contato com a natureza

Segundo Bacelar (2009), o brincar não está vinculado somente a uma visão de prazer, mas a atitudes de emoção e raciocínio. Normalmente, a preocupação do adulto é dispor de atividades que tenham uma significação educativa para as crianças, ou seja:

Muitas e muitas vezes o mundo infantil dos brinquedos é invadido por atividades denominadas “lúdicas”, mas na realidade possuem objetivos pedagógicos claramente impostos pelos adultos. Ainda que a criança seja induzida a “brincar” com esses jogos educativos, chega um determinado momento em que ela mesma interrompe, dizendo: “– Bem, agora vamos brincar, tá?” (Bacelar, 2009, p. 27).

Dessa forma, deve-se ter visão ampliada, dando mais atenção às atividades e às práticas que sejam interessantes para a vida das crianças, a partir das quais elas possam adquirir emancipação para expressar seus sentimentos. Apropriar-se desse processo de libertação é fundamental para a aprendizagem. No entanto é necessário entender que o processo de liberdade não é algo feito de qualquer maneira, mas com planejamento.

Tiriba (2018) destaca que, de modo crescente, a criança é institucionalizada e privada dos benefícios de interagir e relacionar-se com a natureza, pois há uma separação entre ambas (criança e natureza), um fato preocupante.

As consequências são significativas: obesidade, hiperatividade, déficit de atenção, desequilíbrio emocional, baixa motricidade - falta de equilíbrio, agilidade e habilidade física - e miopia são alguns dos problemas de saúde mais evidentes causados por esse contexto (Tiriba, 2018, p. 16).

À vista disso, percebe-se que a brincadeira na natureza é essencial para a infância e a criança precisa deste vínculo para correr, saltar e brincar, com liberdade. Por meio da brincadeira livre, ela socializa e assimila o mundo à sua volta, melhorando a saúde do corpo e da mente.

Tiriba (2018) enfatiza que proporcionar experiências ricas, de invenção e criação, que integrem a natureza e seus elementos, impacta significativamente na aprendizagem das crianças. Os espaços da natureza, enriquecem a liberdade em brincar e permitem que elas descubram e compreendam como o mundo, onde vivem, funciona, bem como as diversidades existentes nele.

Kishimoto (2005) salienta que o brinquedo educativo é aquele que instrui a criança em uma conjuntura prazerosa, ou seja, o brinquedo deve ser utilizado de maneira proposital, a fim de que seja remetido para ela algum tipo de aprendizagem.

Conforme ressaltado por Tiriba (2018), vemos hoje nas escolas um acervo muito grande de brinquedos industrializados, sem cunho educativo, que não possuem vida. Algo que é desinteressante para a criança. Por essa razão, oferecer a elas situações desafiadoras, que as levem a brincar a partir da terra, da folha, da água e dos elementos da natureza, irá corroborar para o seu potencial, a sua aprendizagem e a sua imaginação, porque a criança precisa sair das quatro paredes e de ter esse tempo de liberdade.

A ludicidade e os espaços escolares

Quando se fala em ludicidade no âmbito escolar, isto não se refere ao simples esparramar de brinquedos, deixando que as crianças brinquem de qualquer jeito, sem mediação e orientação. Incluir o lúdico vai muito mais a fundo do que a técnica de manipular brinquedos, deve-se procurar meios da criança poder usar a sua criatividade, aprendendo a respeitar as regras. Por isso, as sugestões de brincadeira trazem reflexão, pensamento e preparação, a fim de cumprir um propósito, de dar tempo e espaço para que brinquem.

Nessa perspectiva de busca por métodos para a introdução do lúdico ao ar livre, importante acentuar as vivências atualmente abordadas sobre o que vem acontecendo nas salas de aula, com o resgate das brincadeiras antigas, como amarelinha, pular corda, esconde-esconde, do contato com a terra, de subir em árvores, dentre outras. Estas atividades divertem e potencializam o aprendizado da criança, ultrapassando o óbvio e personificando o ensino, permitindo que explorem o ambiente natural e construam atitudes essenciais de afinidade e pertencimento, como ressalta Bacelar (2009): 

Viver e permitir a vivência da ludicidade é uma conquista que se constrói consciente e pacientemente, fazendo contato com as coisas simples do cotidiano, observando os detalhes dos acontecimentos a nossa volta, dando-se conta das mudanças que acontecem no nosso interior. É uma obra de arte. E, como o artista, o educador precisa buscar conhecer, viver e realizar com maior perfeição, a cada dia, a tarefa da Educação Infantil (Bacelar, 2009, p. 83).

Assim, ao aliar natureza, meio educativo e liberdade em brincar, a criança desperta para a construção da autonomia e da criatividade. Como salientado por Tiriba (2018), a importância de uma infância livre, vai além da sala de aula, por isso, devemos valorizar e enaltecer a importância do contato da criança com brinquedos e com a natureza. Esta valorização provoca um desemparedamento desse indivíduo.

O brincar ao ar livre favorece a articulação exclusiva entre pares, num lento exercício de encontro e contato com o outro, levando a oportunidades para o desenvolvimento de atitudes de empatia, escuta, colaboração e resolução de conflitos (Tiriba, 2018, p. 89).

Do mesmo modo, Blauth (2013) afirma que o brincar liga a criança à sua existência e ao seu corpo. Para ele, o brincar, na natureza, está relacionado à alegria e ao prazer, pois oferece a oportunidade de uma aprendizagem de novos cheiros, novos comportamentos e novos sons. O autor apresenta várias brincadeiras e brinquedos produzidos a partir de componentes naturais. O contato com a natureza, o momento de descanso, de correr e subir em árvores, favorece as vivências corporais, tornando esses momentos mais atrativos e propícios ao aprendizado. Nesse sentido, observamos o que diz o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI):

A brincadeira favorece a autoestima das crianças, auxiliando-as a superar progressivamente suas aquisições de forma criativa. Brincar contribui, assim, para a interiorização de determinados modelos de adulto, no âmbito de grupos sociais diversos. Essas significações atribuídas ao brincar transformam-no em um espaço singular de constituição infantil (Brasil, 1998, p. 27).

A ludicidade deve ir além da sala de aula, para que o aluno não fique limitado às quatro paredes. Para tanto, realizar atividades em áreas que extrapolam os espaços escolares é uma ação ímpar para o processo de aprendizagem ocorrer de modo completo.

As brincadeiras livres devem ocorrer em ambientes planejados para essa finalidade, de modo que as crianças possam vivenciar durante esse processo experiências de cuidado como corpo, capazes de lhes propiciar bem-estar e oportunidade de auto-organização (Brasil, 2012, p. 37).

Como apresentado no manual de orientação pedagógica Educação, brinquedos e brincadeiras de creche, elaborado pelo Ministério da Educação (Brasil, 2012), essas experiências fazem com que a criança recupere o prazer. Porém é necessário que sejam realizadas em um ambiente planejado, a fim de intensificar o contato, a interação e as descobertas das crianças. O brincar livre também precisa ser intermediado pelo ouvido atento e o olhar sensível do professor, ou seja, é preciso uma intencionalidade, um objetivo para que haja o sustento do desenvolvimento da aprendizagem infantil.

Metodologia de pesquisa

Conforme Fonseca (2002), citado por Gerhardt e Silveira (2009), metodologia significa a forma de organizar uma pesquisa, ou seja, as direções e os percursos empregados para a sua execução da proposta:

a) como a discussão epistemológica sobre o “caminho do pensamento” que o tema ou o objeto de investigação requer; b) como a apresentação adequada e justificada dos métodos, técnicas e dos instrumentos operativos que devem ser utilizados para as buscas relativas às indagações da investigação; c) e como a “criatividade do pesquisador”, ou seja, a sua marca pessoal e específica na forma de articular teoria, métodos, achados experimentais, observacionais ou de qualquer outro tipo específico de resposta às indagações específicas (Gerhardt; Silveira, 2009, p. 13).

Dessa forma, a metodologia escolhida para desenvolver a pesquisa foi o estudo de campo. Porém, diante do cenário de pandemia causado pela covid-19 e com as aulas presenciais suspensas, realizamos um questionário com professores para levantamento de dados sobre a Educação Infantil, de diferentes cidades do Estado do Rio de Janeiro, com indagações acerca da temática: “a Educação Infantil prioriza trabalhar o lúdico em outros espaços com a natureza ou somente em sala de aula?”. Para isso, elaborei um questionário pela ferramenta do Google Forms, com 18 questões.

De acordo com Gerhardt e Silveira (2009), os benefícios de uma pesquisa de levantamentos é o conhecimento conclusivo da realidade e o alcance dos dados em tabelas, o que oferece melhor correção para a análise dos dados.

A pesquisa foi desenvolvida sob uma abordagem qualitativa, que “preocupa-se, portanto, com aspectos da realidade que não podem ser quantificados, centrando-se na compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais” (Gerhardt; Silveira, 2009, p. 32). Da mesma forma, para a revisão bibliográfica, foram utilizados livros e artigos sobre a abordagem dada ao tema de alguns referenciais teóricos.

Resultados e discussão

Esta seção trará os dados conseguidos com o estudo de campo e a abordagem qualitativa, a partir de um questionário com a ferramenta Google Forms, com doze questões objetivas e seis questões discursivas, destinado a professores que atuam na Educação Infantil, em diferentes cidades do Estado do Rio de Janeiro (Araruama, Carapebus, Conceição de Macabu, Guapimirim, Itaocara, Mendes, Paraíba do Sul e Tanguá), para levantamentos de informações e opiniões acerca da temática.

Dessa forma, o convite para a participação e a colaboração na pesquisa foi feito a 33 professores com idade entre 20 e 40 anos; foram analisados e discutidos seu ponto de vista e seus relatos sobre as experiências e a realidade das creches em relação ao uso do lúdico.

Vale destacar que na análise dos resultados optei por expor as informações em forma de gráfico e escolhi não divulgar os nomes dos professores. A seguir, está a análise conforme sinalizam os gráficos.

Gráfico 1: Idade dos entrevistados

Gráfico 2: Formação acadêmica dos professores

Gráfico 3: Tempo de atuação na Educação Infantil

Gráfico 4: Tipo de escola em que trabalha

Gráfico 5: Docente em creche ou escola

Gráfico 6: Faixa etária dos alunos

Gráfico 7: Acha o lúdico importante para o desenvolvimento infantil?

Gráfico 8: Faz uso da ludicidade com os alunos?

Quando questionados se fazem uso da ludicidade e se acham importante para o desenvolvimento infantil, a maioria dos professores tiveram respostas significativas e positivas, ou seja, consideram o lúdico importante, porém me chamou a atenção o fato de um único professor não achar importante o seu uso, contudo utilizar-se dessa metodologia, em sala de aula, mesmo assim.

A esse respeito é preciso refletir, porque sabemos que o brincar é próprio da criança e sob essa lógica não há como prescindir das brincadeiras. Contudo é necessário um planejamento, para suscitar o desenvolvimento da aprendizagem, pois o brincar não se dissocia da condição do aprender. Partindo deste pressuposto, vale ressaltar que 100% dos professores entrevistados fazem uso da ludicidade com seus alunos.

Gráfico 9: Possui tempo definido para as brincadeiras ou elas acontecem aleatoriamente?

Verificou-se que a maioria dos professores entrevistados não tem tempo definido para que as brincadeiras ocorram, deixando que aconteçam de forma aleatória.

Nesse contexto, pode-se perceber que “o brincar na escola ficou resumido ao tempo do recreio. Isso, quando esse tempo acontece ou é permitido” (Schlindwein; Laterman; Peters, 2017, p. 49).

Gráfico 10: Acha que é fundamental possuir recursos para o trabalho com a ludicidade?

Dos professores entrevistados, 75,8% acham que é fundamental possuir recursos para um trabalho com ludicidade.

Gráfico 11: Costuma fazer uso do lúdico fora da sala de aula, em outros ambientes?

Diante das informações, é possível notar que 97% dos professores possuem um olhar exploratório e costumam valorizar o lúdico fora da sala de aula, ou seja, em outros ambientes, como o pátio da escola. Levando-se em consideração alguns pontos de vista de professores entrevistados é importante mencionar as seguintes falas:

Quando questionados sobre o lúdico, alguns professores responderam:

São brincadeiras e jogos que estimulam a aprendizagem, podendo ser praticado tanto na sala de aula como em ambiente livre.

É uma brincadeira que vai atrair a atenção das crianças, ensiná-la, além de diverti-la.

Qualquer brincadeira que use a imaginação, que pode ou não ter algum objetivo.

É levar o imaginário das crianças para o aprendizado delas, pois é através das brincadeiras, do faz de conta que elas aprendem brincando, e se torna uma aula atrativa.

É ensinar de maneira prazerosa, através de brincadeiras e atividades que despertem o interesse do educando para determinado conteúdo, a fim de desenvolver suas habilidades e competências, de forma significativa.

Ao refletir sobre as falas dos professores pode-se notar que julgam favorável o uso do lúdico para o desenvolvimento infantil, destacando que é uma maneira eficiente e agradável de atrair a criança para estimulá-la no desenvolvimento de suas habilidades.  A esse respeito, Rau (2013, p. 30) destaca que “brincar é coisa séria! Isso envolve uma atitude por parte do adulto, seja ela nos momentos planejados ou livres, seja durante a atuação pedagógica voltada à aprendizagem significativa.”.

Faz-se necessário que o professor procure traçar metas e planejamentos onde o lúdico esteja presente, seja valorizado e sejam criados meios de expandi-lo no processo de ensino-aprendizagem.

Diante das falas dos professores, é pertinente afirmar que o lúdico está presente em diversas formas: no ambiente escolar, dentre as atividades “tradicionais” como morto vivo, amarelinha, corda, bola, brincadeiras livres e que permitem às crianças a vivência de diferenciadas aprendizagens, fundamentais para o seu desenvolvimento.

A esse respeito, Tiriba (2018) nos faz entender a importância de a criança viver momentos de liberdade, onde correr, subir em árvores ou sujar-se são grandes aliados no desenvolvimento de uma aprendizagem significativa. Por outro lado, não oferecer a oportunidade à vivência de momentos assim, trará prejuízos à criança e um empobrecimento do seu repertório.  Ainda sobre a ótica de Tiriba, destaca-se: 

Brincar na areia, participar de piqueniques à sombra das árvores, pendurar-se nelas, encantar-se com o canto dos pássaros ou com a beleza das flores, tomar banho de chuva, cultivar uma horta, criar uma escultura a partir de um galho e descobrir como a vida se desenvolve são experiências importantes que colocam a criança frente à beleza e ao mistério da vida. Simultaneamente, a qualidade sistêmica da natureza oferece à criança a noção de complexidade e interdependência, valores fundamentais para pensar sua ação no mundo e as próprias relações sociais, incluindo reflexões sobre o paradigma antropocêntrico (Tiriba, 2018, p. 21-22).

Podemos compreender que nem sempre é necessário possuir recursos comprados ou prontos para o brincar, pois tudo, na natureza, pode ser uma fonte de aprendizado e pode se tornar um brinquedo nas mãos das crianças, tais como, a areia, as folhas, os galhos e as pedras, por exemplo. Vários elementos naturais podem ser incorporados na produção infantil e possuir várias alternativas imaginativas, pois a criança é capaz de criar e transformar, por meio da sua criatividade. É neste trajeto que o desenvolvimento acontece, pois ela brinca com seu corpo, se move e se relaciona com o outro, assim também conhece e aprecia o mundo à sua volta.

Ao serem questionados sobre a importância de realizar atividades fora da sala de aula, os professores relataram:

Ao ar livre a criança se sente mais solta e livre para liberar suas emoções, seja de forma verbal ou corporal.

Faz toda a diferença na aprendizagem, pois está não deve ficar limitada dentro da sala de aula. Ocupar outros espaços escolares, oferece ao aluno um mundo de novas descobertas e novos significados.

Eles precisam ter contato com o meio ambiente que os cercam, ficar só dentro da sala de aula é cansativo. A criança precisa de movimento e espaço para brincar e aprender, usar sua imaginação e criatividade.

Evita a sensação de enclausuramento, prisão entre paredes, as brincadeiras fora da sala de aula dar mais liberdade aos alunos.

Eu acredito que as brincadeiras lúdicas devem ser exploradas ao ar livre também, é um cenário para que eles inventem histórias e personagens.

Partindo das observações e dos registros apresentados, pode-se considerar que os professores acham significativa a prática de atividades lúdicas fora da sala de aula. Lá fora, em contato com a natureza e com outros espaços externos, a criança desfrutará de várias experiências sensoriais e sonoras.

Nesse sentido, percebo que os professores partilham do entendimento de que:

a prática lúdica das crianças precisa ser ampliada nos espaços da escola, promovendo uma relação entre pares e a apropriação de espaços possíveis para brincar. O lúdico não pode se restringir a somente os espaços já institucionalizados como o espaço de casa, do público ou outros ambientes (Schlindwein; Laterman; Peters, 2017, p. 48).

Sem dúvida, situações de clausura reduzem as vivências da infância. Por essa razão é importante traçar soluções que permitam esse contato. De acordo com as informações obtidas na entrevista é considerável entender que mesmo sabendo da importância do lúdico, a maior parte dos professores enfrenta dificuldades em intensificar o trabalho com a ludicidade para além das salas de aula. Dessa forma é fato, pelas descrições dos professores, que há o emparedamento da criança, pois não é habitual que elas desfrutem do deleite de brincar ao ar livre, na natureza. Como citado pelos docentes, há falta de recursos apropriados, falta de pessoas para ajudar, afinal, todos os movimentos dependem de disposição, tempo e espaço.

Ainda que os professores reconheçam o valor e a importância de oferecerem oportunidades às brincadeiras ao ar livre é possível inferir que as crianças passam a maior parte do tempo em salas de aula. Talvez por receio dos professores, por insegurança ou por medo dos riscos. A esse respeito Tiriba (2018) salienta sobre a necessidade de se atravessar os muros da escola.

É necessário desconstruir a ideia e a realidade de uma vida escolar entre paredes porque não podemos correr o risco, no processo de democratização do acesso à escola, de estender a todos esse modelo nefasto. Pois o sentimento de respeito à natureza está relacionado à convivência, aos laços afetivos em relação aos lugares, aos seres, às coisas, ao universo biótico e abiótico (Tiriba, 2018, p. 341).

Tanto a brincadeira na sala de aula, quanto as brincadeiras ao ar livre, de acordo com os professores entrevistados, são práticas de ludicidade que proporcionam aprendizado. No que diz respeito ao brincar é certo que a criança aprende muito quando exercita a brincadeira livre, pois o brincar livre a iniciativa a imaginar, a dar as suas opiniões, a definir regras, a experimentar e a explorar, fazendo as suas escolhas, livrando-se da sensação do emparedamento.

Baseando-se neste cenário é fato que as crianças precisam cada vez mais de oportunidades para experimentar a aprendizagem livre e se conectar com a natureza e o mundo. Segundo Tiriba (2018):

Essa disposição dos tempos e espaços, em especial nos lindos dias de sol lá fora, sempre me produziu uma sensação de que algo estava errado, sempre me pareceu estranha e inadequada. Estranha à interação com a realidade social: fechada entre muros, desarticulada dos cenários onde ocorre a vida de verdade, indiferente, insensível ou artificial na relação com o que, de fato, mobiliza e tem significado. E inadequada à saúde do corpo, à relação dos humanos com o mundo natural, ao desfrute do vento, do sol, este elemento vital, cuja energia assegura a vida de cada ser, da Terra! Inadequada porque indiferente à beleza do universo mais amplo em que estamos situados, às necessidades do corpo e do espírito. Um espaço contido, de crianças e adultos entre paredes, mas fervilhando de energias humanas. Lugar onde o movimento livre dos corpos é tido como perturbação de uma ordem necessária à aprendizagem (Tiriba, 2018, p. 24).

Levando em conta as opções dos professores, observamos que as intervenções nas brincadeiras acontecem para orientar nas dificuldades e nos conflitos que surgem entre alunos, visando a oferecer um enriquecimento no tipo de atividade que escolhem realizar. De acordo com o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil,

A intervenção intencional baseada na observação das brincadeiras das crianças, oferecendo-lhes material adequado, assim como um espaço estruturado para brincar permite o enriquecimento das competências imaginativas, criativas e organizacionais infantis. Cabe ao professor organizar situações para que as brincadeiras ocorram de maneira diversificada para propiciar às crianças a possibilidade de escolherem os temas, papéis, objetos e companheiros com quem brincar ou os jogos de regras e de construção, e assim elaborarem de forma pessoal e independente suas emoções, sentimentos, conhecimentos e regras sociais (Brasil, 1998, p. 29).

Sendo assim, cabe ao professor ser o mediador no processo, organizando espaços, adaptando situações, planejando e orientando para que a criança brinque com qualidade e obtenha uma aprendizagem significativa a partir daquele momento. Assim, considerando os dados da entrevista, de maneira geral, percebemos que os professores compreendem a importância do lúdico para a rotina da sala de aula, relatando que o brincar livre é uma prática que faz toda a diferença.

Considerações finais

Por meio das experiências obtidas na prática como educadora e na realização do Estágio Curricular Supervisionado, em Educação Infantil, observei a realidade do contexto escolar e o não uso dos espaços externos no trabalho com a ludicidade, o que me levou a pensar sobre a temática desta pesquisa.

Por esse motivo, durante o processo de investigação, trouxe reflexões acerca da importância do lúdico para o desenvolvimento infantil, reforçando as carências infantis e a necessidade de uma aprendizagem ao ar livre, no cotidiano escolar. Para isso, segui a temática central da pesquisa, a saber, “a união entre ludicidade e brincadeiras, ao ar livre, como pilar para o desenvolvimento infantil”.

Durante a pesquisa foram analisados o conceito e o valor da ludicidade, assim como a sua metodologia, parte fundamental na Educação Infantil. Também foi abordada a influência e a importância do brincar para o aprendizado infantil, quando em contato com a natureza, tanto para a saúde como para o bem-estar geral dos educandos.

Apresentamos a metodologia de pesquisa e, por meio dela, os resultados e as discussões obtidos via questionário do Google Forms com 33 professores que atuam na Educação Infantil, em diferentes cidades do Estado do Rio de Janeiro, quando constatamos que no cotidiano da Educação Infantil os espaços e o tempo são organizados de forma tradicional. Os professores demonstraram que fazem o uso de diversas atividades para a socialização dos alunos, tais como, brincadeiras de roda, amarelinha e dramatizações.

Como relatado pelos professores entrevistados, mesmo sabendo da importância das vivências livres, pela falta de espaços adequados e recursos, nem sempre é possível oferecer esse convívio, predominando as práticas de emparedamento, o que lamentavelmente restringe o contato das crianças com a natureza.

Concluímos, portanto, que os docentes normalmente priorizam o aprendizado desenvolvido dentro da sala de aula, entre as quatro paredes. Vale destacar que a pesquisa não revela um resultado com informações conclusivas, pois outros estudos sempre serão bem-vindos. Há de se investigar o tema de modo contínuo, a fim de expandirmos o nosso entendimento e conhecimento a respeito.

Referências

ALVES, R. O desejo de ensinar e a arte de aprender. Campinas: Educar DPaschoal, 2004.

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Publicado em 08 de novembro de 2022

Como citar este artigo (ABNT)

MELEGARI, Marielena Rocha; GUIMARÃES, Robison Zacharias. A união entre ludicidade e brincadeiras ao ar livre, um pilar do desenvolvimento infantil. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 42, 8 de novembro de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/42/a-uniao-entre-ludicidade-e-brincadeiras-ao-ar-livre-um-pilar-do-desenvolvimento-infantil

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