Atividades investigativas no ensino de Ciências: uma análise da produção acadêmica nacional

Cassiana dos Santos Souza

Mestranda em Ensino de Ciências e Matemática (UFS), pós-graduada em Ensino de Biologia (UCAM)

Fernando de Jesus Souza

Mestrando em Ensino de Ciências e Matemática (UFS), pós-graduado em Ensino de Matemática (UCAM), professor de Física da rede estadual de Sergipe

O ensino de Ciências tem passado por constantes transformações curriculares e metodológicas que levam à reflexão sobre os modelos e objetivos de ensino empregados não só na busca de desenvolver conceitos científicos, mas espera-se que os alunos tenham uma visão mais apropriada da ciência, de seus métodos, contribuições e influência social.

Segundo Krasilchik (2000), as modalidades didáticas empregadas nas disciplinas científicas dependem da concepção de ciência adotada socialmente, o que modifica as propostas curriculares em Ciências apoiadas em estudos epistemológicos. Segundo Solino, Ferraz e Sasseron (2015), os trabalhos de epistemólogos como Piaget e Vygotsky mencionam a necessidade e a importância de que o sujeito seja participante ativo do processo de aprendizagem. Nessa concepção, segundo Krasilchik (2000), as ideias prévias dos alunos levam à ampla possibilidade de debates e formulação de questões problematizadoras.

É certo que o ensino de Ciências apresenta conceitos científicos com o objetivo de levar à alfabetização científica, que, segundo Chassot (2003), seria a capacidade de saber ler a linguagem em que está escrita a natureza, desvendando os códigos da Ciência, de modo que os alunos reconheçam o papel dos saberes científicos na sociedade, posicionando-se de maneira crítica e responsável em favor da ciência e percebendo seu papel nocivo. Para que isso ocorra, se faz necessária a vinculação de práticas problematizadoras e argumentativas que agucem o espírito investigativo empregado nos métodos científicos.

De acordo com Solino, Ferraz e Sasseron (2015), tem-se dado grande destaque aos problemas como promotores de interações no ensino de Ciências, e alguns autores, como Sasseron (2015), Zômpero e Loburú (2012) e Carvalho (2013) defendem as atividades investigativas como possibilidade de alfabetização científica, tendo em vista que os alunos estão imersos numa sociedade científica e tecnológica. Desse modo, as atividades investigativas visam à mobilização dos alunos e requerem grande esforço e análise do professor, que tem o papel de constituir problemas instigadores que levem o aluno a pesquisar, a refletir e construir hipóteses, levando à argumentação, discussão e debates, o que contribui para a construção de uma cultura científica.

Assim, devido à grande importância e à necessidade de novas práticas no ensino de Ciências e às possibilidades geradas pelo ensino por investigação para a alfabetização científica, sentiu-se necessidade de investigar como esse tema, por vezes tratado como didática ou como metodologia no ensino de Ciências, vem sendo tratado nas produções acadêmicas. Para isso, foram investigadas as temáticas e práticas trabalhadas e quais os objetivos desses trabalhos, bem como as disciplinas das Ciências da Natureza em que têm sido desenvolvidas sequências de ensino investigativo, a exemplo de Ciências e/ou Biologia, Física e Química.

Por isso, este trabalho tem como objetivo descrever e analisar como as atividades investigativas vêm sendo discutidas no ensino de Ciências a partir da produção acadêmica nacional. Desse modo, este trabalho buscará responder aos seguintes problemas: como os referenciais bibliográficos discutem as atividades e práticas investigativas? Quais temáticas são abordadas nesses artigos? Quantos artigos foram publicados entre 2015 e 2020 sobre atividades e práticas investigativas no ensino de Ciências? Como essas temáticas auxiliam os professores de Ciências em suas práticas?

Partindo desse pressuposto, consideramos relevante este estudo por constituir uma análise precisa sobre como tais atividades e práticas investigativas são percebidas no ensino de Ciências, demonstrando amplas possibilidades de trabalho do professor de Ciências, que por vezes não sabe como promover a alfabetização científica em sala de aula, devido ao desafio atual na educação. Além disso, foram criadas áreas temáticas baseadas na bibliografia com discussões sobre ensino de Ciências e atividades investigativas, o papel do professor e do aluno nesse processo.

Metodologia

Para o desenvolvimento desta pesquisa foi empregada a revisão bibliográfica, com abordagem qualiquantitativa, realizando pesquisa sistemática para encontrar periódicos científicos que discutam atividades investigativas no ensino de Ciências; para isso, foram privilegiadas produções com classificação A1, A2, B1 e B2 do Qualis da Capes, com publicação entre 2015 e 2020.

A pesquisa foi realizada no banco de dados SciELO e Google Acadêmico, utilizando as palavras-chave atividades investigativas; práticas investigativas e ensino de ciências. No SciELO foram encontrados dezesseis artigos; três deles não eram publicações na área de ensino de Ciências, e cinco tinham publicação anterior a 2015; assim, nessa plataforma foram selecionados oito artigos para esta pesquisa. No Google Acadêmico foram encontrados seis artigos, dos quais apenas três se enquadravam nos critérios da pesquisa quanto ao Qualis da Capes. Sendo assim, foram objeto deste estudo onze produções acadêmicas.

Resultados e discussão

Os artigos selecionados para esta pesquisa foram organizados em categorias para melhor tratamento dos dados, organizando-se quanto à abordagem temática conceitual, ao título do artigo, a autores, ano de publicação, revista em que foram publicados e Qualis da revista, como pode-se observar na tabela abaixo.

Quadro 1: Artigos sobre atividades investigativas

Abordagem temática/conceitual

Título do artigo

Autor(es)

Ano de publicação

Revista

Qualis

História e surgimento das atividades investigativas

A abordagem histórico-investigativa no ensino de Ciências

BATISTA, R. F. M.; SILVA, C. C.

2018

Estudos Avançados

A2

Atividades investigativas e alfabetização científica

Alfabetização científica, ensino por investigação e argumentação: relações entre Ciências da Natureza e escola

SASSERON, L. H.

2015

Revista Ensaio

A1

Promovendo a alfabetização científica por meio de ensino investigativo no Ensino Médio de Química: contribuições para formação inicial docente

MIRANDA, M. S.; SUAR, R. C.; MARCONDES, M. E. R.

2015

Revista Ensaio

A1

O papel do professor e do aluno nas atividades investigativas

Atividades investigativas de ensino: mediação entre ensino, aprendizagem e formação docente em Ciências

AZEVEDO, M. N.; ABIB, M. L. V. S.; TESTONI, L. A. 

2018

Revista Ciência e Educação

A1

Sequências de ensino investigativas no ensino de Ciências

Práticas investigativas no ensino de Microbiologia: uma proposta metodológica para iniciação à pesquisa

COSWOSK, É. D.; GIUSTA, A. S.

2015

Investigações em Ensino de Ciências

A2

Atividades de investigação e a transferência de significados sobre o tema Educação Alimentar no Ensino Fundamental

ZÔMPERO, A.  F.; FIGUEIREDO, H. R. S.; GARBIM, T. H.

2017

Ciência e Educação

A1

Sequências didáticas investigativas e argumentação no ensino de Ecologia

MOTOKANE, M. T.

2015

Revista Ensaio

A1

Ensino de Ciências por investigação: uma proposta didática “para

além” de conteúdos conceituais

BRITO, L. O.; FIREMAN, E. C.

2018

Experiências em Ensino de Ciências

B1

Engajamento de estudantes em investigação escolar sobre circuitos elétricos simples

FARIA, A. F.; VAZ, A. M.

2019

Revista Ensaio

A1

Atividades investigativas e o desenvolvimento de habilidades e competências: um relato de experiência no curso de Física da Universidade Federal do Pará

FRAIHA, S. et. al.

2018

Revista Brasileira de Ensino de Física

A1

O caso do esmalte e do isopor: contribuições às atividades investigativas no ensino de Química

BENEDICTO, E. C. P.

2017

Experiências em Ensino de Ciências

B1

Como observa-se no quadro, nos anos de 2015 e 2018 houve o maior número de artigos publicados sobre atividades investigativas; a Revista Ensaio foi a que teve maior número de publicações. Além disso, sete artigos enquadram-se em revista com Qualis A1, dois em A2, e apenas dois em Qualis B1.

Nesse sentido, para melhor tratamento e discussão dos dados obtidos, optou-se por categorizar os artigos em áreas temáticas de acordo com seu objetivo: História e surgimento das atividades investigativas; Atividades investigativas e alfabetização científica; Papel do professor e do aluno nas atividades investigativas; e Sequências de ensino investigativo no ensino de Ciências.

História e surgimento das atividades investigativas

Nessa área temática foi encontrado um artigo de Batista e Silva (2018) que possui como foco central realizar uma discussão sobre a abordagem histórico-investigativa no ensino de Ciências. Para Batista e Silva (2018), a proposta das atividades investigativas surge nos Estados Unidos, inicialmente denominadas “inquiry learning” por John Dewey, devido à reestruturação do ensino de Ciências, com a preocupação de estimular o papel ativo dos alunos na educação científica.

Segundo Zômpero e Loburú (2011), as atividades investigativas passam a ser preocupação no século XIX com o surgimento da Pedagogia progressista, que centrava a aprendizagem na atividade humana e na participação ativa do aluno. Assim, as atividades investigativas ao longo do tempo obtiveram diferentes denominações, como: ensino por descoberta; aprendizagem por projetos; questionamentos; e resolução de problemas, entre outras.

O que é certo é a finalidade das atividades investigativas, que presume que os alunos deixem de aprender conceitos técnicos sem entender como eles foram construídos e justificados, aprimorando o raciocínio e a capacidade cognitiva dos alunos; isso sugere um esforço intelectual que leve à autonomia e à tomada de decisão (Zômpero; Loburú, 2011; Batista; Silva, 2018).

Segundo Batista e Silva (2018), os movimentos para aprimorar o ensino de Ciências nos Estados Unidos na década de 1960 tinham o objetivo de ajudar os alunos a ser mais criativos e solucionadores de problemas. No Brasil, na década de 1950 já havia propostas curriculares que visavam essa melhoria de ensino, com o desenvolvimento de projetos como “iniciação científica” para a produção de kits destinados ao ensino de Física, Química e Biologia voltados a alunos dos cursos primário e secundário.

Vale salientar que muitas das propostas curriculares dessa época eram voltadas para a formação de cientistas, principalmente nos Estados Unidos, que passavam por tensões econômicas e sociais; no entanto, na década de 1990 esse cenário foi modificado gradativamente com as novas propostas curriculares dando ênfase ao ensino de Ciências para uma alfabetização científica; isso é enfatizado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, que defendem:

A formação de um cidadão crítico exige sua inserção numa sociedade em que o conhecimento científico e tecnológico é cada vez mais valorizado. Nesse contexto, o papel das Ciências Naturais é o de colaborar para a compreensão do mundo e suas transformações, situando o homem como indivíduo participativo e parte integrante do universo (Brasil, 1997, p. 15).

Os PCN são um importante avanço em termos de atividades investigativas; no entanto, é muito importante destacar que, segundo Zômpero e Loburú (2011), o ensino de Ciências por investigação no Brasil ainda é desafiador, tendo em vista que os professores se sentem inseguros em trabalhar com tais atividades. Mas é necessário pensar que as reformas curriculares nos anos 1990 com os PCN passaram a repensar a natureza da ciência, o que influencia atualmente a conduta e as propostas de materiais didáticos em Ciências.

É compreendida, assim, a complexidade do fazer científico, de modo que os alunos desenvolvam uma visão mais ampla e adequada da ciência e tecnologia na sociedade. Por isso, educar o discente cientificamente com atividades investigativas requer preparação dele para o meio social e para o mundo do trabalho, reconhecendo os fenômenos à sua volta.

Atividades investigativas e alfabetização científica

Nessa área temática foram encontrados dois artigos, um de Sasseron (2015) e outro de Miranda, Suar e Marcondes (2015). O artigo de Sasseron (2015) busca discutir as relações entre alfabetização científica, ensino por investigação e a argumentação no ensino de Ciências para estabelecer uma cultura científica escolar; para isso, a autora discute cultura escolar e cultura científica, buscando ao longo do texto relacionar esses aspectos com o ensino de Ciências.

No artigo de Miranda, Suar e Marcondes (2015) analisam-se os níveis investigativos e os indicadores de alfabetização científica em estudantes do 2º ano do Ensino Médio em Química durante uma sequência de aulas; por destacar em seu título a alfabetização científica e ter como intuito analisar essa concretização, optou-se por incluí-lo nesta área temática.

Nessa perspectiva, é necessário buscar definir a alfabetização científica, que, para Chassot (2003), é saber ler a linguagem em que está escrita a natureza, desvendando seus códigos; uma capacidade de leitura que deve ser ampliada aos poucos. Sasseron (2015), em seu artigo, define alfabetização científica como “a capacidade construída para a análise e a avaliação de situações que permitam ou culminem na tomada de decisões e o posicionamento” (Sasseron, 2015, p. 56). Uma perspectiva mais social, que nunca se encerra no processo de formação, já que a todo tempo o aluno está aprendendo.

Tendo isso em vista, Miranda, Suar e Marcondes (2015) buscaram em sua pesquisa estabelecer meios de promover a alfabetização científica baseando-se nas atividades investigativas; segundo as autoras, o ensino por investigação é uma ferramenta metodológica favorável à construção do conhecimento e para a promoção da alfabetização científica, pois busca colocar o aluno frente a problemas a serem resolvidos, promovendo o caráter investigativo.

Desse modo, a consolidação das atividades investigativas para a alfabetização científica no ensino de Ciências leva ao que Sasseron e Carvalho (2011) chamam de enculturação científica, pressupondo que o aluno reconheça as noções, ideias e conceitos científicos como parte do seu corpus, bem como outras e demais culturas.

Por isso, pensar alfabetização científica é também refletir sobre a cultura científica em sala de aula, que Sasseron (2015) define como um conjunto de ações e de comportamentos envolvidos na atividade de investigação e divulgação de um novo conhecimento sobre o mundo natural. Dessa maneira, o aluno, ao vivenciar atividades de investigação, está realizando comportamentos próprios do fazer científico e realizando descobertas e análises do mundo; isso é possível quando o aluno propõe problemas, formula hipóteses e divulga suas ideias.

Para Miranda, Suar e Marcondes (2015), as ideias contempladas no ensino investigativo podem auxiliar na promoção de habilidades relacionadas ao processo de alfabetização científica em sala de aula; isso foi evidenciado nas atividades investigativas realizadas pelas autoras, na sequência didática apresentada, que foi pautada em uma situação problema, criação de hipóteses e atividade investigativa experimental para o estudo de diluição de soluções no ensino de Química.

As atividades desenvolvidas permitiram aos alunos se envolver com as investigações e as discussões propostas; eles foram imersos numa nova cultura e perceberam as diferentes formas para adquirir conhecimento, de forma a levá-los a enxergar o mundo de maneira mais crítica. Segundo Chassot (2003), o aluno alfabetizado cientificamente, além de ler o mundo e enxergá-lo de maneira crítica, pode ter a capacidade de transformá-lo, tendo em vista o seu posicionamento em temas sociais e científicos.

Assim, o ensino de Ciências não deve apenas pautar-se no campo teórico, mas nas práticas ligadas ao cotidiano e nas relações complexas da sociedade. Dessa forma, ao pensar nas atividades investigativas para uma alfabetização científica, refletimos sobre como os alunos observam o fazer científico e sua construção e como podem aplicar esse conhecimento em suas relações sociais e cotidianas.

Papel do professor e do aluno nas atividades investigativas

Nesta área temática foi encontrado um artigo de Azevedo, Abid e Testoni (2018) que tem como objetivo discutir conceitualmente a atividade investigativa de ensino (AIE) e a atividade investigativa de aprendizagem (AIA) como modos de aprendizagem da docência, e modos de aprendizagem possibilitados aos estudantes. Dentro dessas atividades de ensino e aprendizagem, existe o papel de mobilização primeiro do professor e segundo do aluno.

Segundo os autores, o professor tem papel importante nessas atividades e constrói uma unidade de ensino investigativo conduzindo a aprendizagem dos alunos; assim, nas atividades investigativas de ensino o sujeito é o professor, de modo que as ações de planejamento, desenvolvimento e reflexão levem à aprendizagem.

Sobre o papel do professor nas atividades investigativas, Batista e Silva (2018) ressaltam “como crucial, já que ele é o mediador do processo investigativo e é sua função fornecer as condições e orientações para os alunos compreenderem o que estão fazendo para resolver o problema proposto” (Batista; Silva, 2018, p. 99).

O papel do aluno é desencadeado pelo problema de aprendizagem, o qual conduz o estudante a planejar ações para resolvê-lo (Azevedo; Abid; Testoni, 2018). No entanto, o problema pode ser tanto uma atividade experimental como entrevistas, atividades de campo, rodas de conversas, leitura e discussão, através da mediação do professor.

Nesse sentido, é possível que os alunos tenham capacidade de analisar uma problemática em diferentes contextos, e o professor é aquele que cria condições para os alunos se desenvolverem cognitivamente. No esquema a seguir, observam-se os passos e ideias da AIE e da AIA.

Nesse esquema percebe-se um ponto crucial na realização das atividades investigativas, que é a formulação de novos problemas; isso ocorre nas atividades de ensino e de aprendizagem, que consiste na ideia de que o professor na investigação pode sempre propor novos problemas que podem surgir até mesmo nas discussões e análises dos alunos, de modo que haja sempre o replanejamento. Além disso, pode-se perceber no esquema de atividade de aprendizagem o constante registro dos alunos entendendo como ocorreu a consolidação da aprendizagem.

Figura 1: Sistematização das atividades investigativas de ensino e de aprendizagem

De acordo com Carvalho (2013), é preciso criar um ambiente investigativo na sala de aula de Ciências levando os alunos gradativamente a ampliar sua cultura científica. Isso exige a construção de um “bom problema” que leve o aluno à mobilização e gere seu interesse.

Segundo Carvalho (2018), um bom problema é aquele que dá condições para os alunos resolverem e explicarem o fenômeno envolvido; para que as hipóteses sejam levantadas pelos alunos; para os alunos relacionarem o que aprenderam com o mundo em que vivem; para que os conhecimentos aprendidos sejam utilizados em outras disciplinas do conteúdo escolar, dentre outros fatores.

É evidente que os passos na construção de uma atividade investigativa em Ciências requerem esforço por parte do professor e não têm a simples ideia de formar cientistas, mas apresentar o método científico de maneira motivadora. Por isso, o papel do professor é mediar esses processos, planejando e replanejando práticas que levem em conta as concepções cotidianas dos alunos; o papel dos alunos é criar métodos para solucionar problemas, argumentar e divulgar o conhecimento científico.

Sequências de ensino investigativas no ensino de Ciências

Nesta última área temática foram encontrados sete artigos, sendo quatro voltados para a área de Ciências e Biologia, dois voltados para a área de Física e um voltado ao ensino de Química; todos eles tiveram a finalidade de aplicar uma sequência de ensino investigativo para análise de alguns conteúdos específicos.

Desses artigos, três discutiam sequências investigativas no Ensino Superior, dois no Ensino Médio e dois no Ensino Fundamental, um destes era voltado às séries iniciais. Vale salientar que as sequências investigativas de ensino (SEI), segundo Carvalho (2013), consistem numa sequência de atividades planejadas para que os alunos demonstrem seus conhecimentos prévios para iniciar os novos, passando do conhecimento espontâneo ao científico.

Para Batista e Silva (2018), existem alguns passos nas sequências investigativas: construção de um problema e sua introdução para os alunos; criação de hipóteses, ideias, debates, reflexões e argumentações entre os alunos; experimentação e avaliação dos dados, em busca de um resultado; expectativas iniciais do problema confrontadas para obtenção de uma resposta; relatar a resposta final e discuti-la entre os alunos e o professor para a finalização do problema.

Como destacam os autores, a sequência investigativa inicia-se com um problema que dá margem aos alunos para criarem suas hipóteses. Segundo Carvalho (2013), os problemas podem ser classificados como: problema experimental, no qual o aluno tem a missão de utilizar materiais didáticos para solucioná-lo, manipulando o material para obter a resposta de que necessita; as demonstrações investigativas, nas quais o professor manipula os materiais e questiona os alunos sobre como a ação deve ser feita; e o problema não experimental, que consiste na elaboração de um problema inicial utilizando ferramentas como textos, imagens, estudos de caso, nos quais os alunos não necessitem manipular materiais.

Nos artigos selecionados para esta área temática, observou-se certa diversidade de problemas, sendo apenas um com demonstrações investigativas; o problema era: De onde vem o arco-íris? Como fazer para que um arco-íris apareça no quadro branco utilizando um recipiente de plástico transparente, cartolina branca e uma lanterna? A ideia era que o professor manipulasse o experimento e os alunos demonstrassem suas hipóteses sobre como desenvolver a atividade proposta (Brito; Fireman, 2018).

Essa visão condiz com o que Carvalho (2013) discute sobre as demonstrações investigativas: para a autora, é preciso dar tempo para que os alunos criem hipóteses e indiquem soluções, produzindo a argumentação.

Pode-se destacar quatro artigos com proposta de problemas experimentais. Um tratou do tema eletricidade no ensino de Física, e o objetivo era de que os alunos criassem um circuito simples, envolvendo três atividades investigativas: na primeira, os alunos deveriam montar um circuito simples com uma lâmpada; na segunda atividade, os alunos tinham o objetivo de prever, observar e explicar o brilho de uma lâmpada quando ligada a pilhas de tamanhos diferentes, ambas de 1,5 volt; por fim, foi solicitada aos alunos a montagem de circuitos em série e paralelo com duas lâmpadas (Faria; Vaz, 2019).

Dois artigos trataram de problemas não experimentais trabalhando com estudo de caso, com o intuito de os alunos criarem hipóteses para os problemas evidenciados; nesses artigos foram trabalhados: educação alimentar e tópicos sobre ecologia. No artigo de Zômpero, Figueiredo e Garbim (2017), são discutidas questões associadas à educação alimentar, com problemas como este:

Marcelo é um senhor de 50 anos que não tem bons hábitos alimentares. Ele procurou um médico por não estar se sentindo bem. O médico lhe disse estar com algumas carências nutricionais de sais minerais, devido aos seguintes sintomas que apresenta: 1. Osteoporose e seus ossos são fracos; 2. Muito cansaço e anemias frequentes; 3. Câimbras musculares frequentes. Após a leitura dos sintomas do senhor Marcelo, discuta com seu grupo e indique suas hipóteses para a carência de minerais que pode estar relacionada com cada um dos sintomas que ele apresenta. Após consultar materiais na internet, escreva um texto para concluir a atividade confrontando suas hipóteses com as informações obtidas nos textos (Zômpero; Figueiredo; Garbim, 2017, p. 665).

Scarpa, Sasseron e Silva (2017) enfatizam que, no processo de atividade investigativa, por meio da atividade de resolução de tarefas, é posto aos alunos um trabalho prático e intelectual, já que os discentes precisam pensar no como fazer e colocar em prática o que eles avaliaram, de modo que possam fazer/compreender; isso exige um trabalho intelectual que leva o aluno a adquirir autonomia e confiança; a partir disso, há a oportunidade de organização das informações existentes e outras que vão sendo obtidas e construídas.

Tais finalidades são defendidas pelos documentos oficiais do currículo em Ciências: a Base Nacional Comum Curricular discute que o processo investigativo deve ser entendido como elemento central na formação dos estudantes e ainda orienta que a realização de práticas investigativas não precisa necessariamente de etapas definidas ou a mera manipulação de objetos em laboratórios (Brasil, 2018).

É importante que as propostas de sequências investigativas despertem a curiosidade e o desejo do aluno em solucionar o problema, tanto que todos os artigos dessa área temática concordam em que essas sequências permitem a interação dos alunos e desenvolvem a argumentação e tomada de decisão, aspectos cruciais para uma educação científica.

Considerações finais

Diante do abordado neste artigo, foi possível perceber que as práticas e atividades investigativas fazem parte do campo de preocupação do ensino de Ciências. No entanto, nos anos observados houve um número pouco expressivo de trabalhos na área, principalmente nos anos de 2019 e 2020, o que mostra a necessidade de novos estudos nessa área, levando em conta o grande potencial do tema para o ensino de Ciências.

Os artigos selecionados problematizam questões associadas à história e ao surgimento das práticas investigativas, analisando como as reformas atingem diretamente as propostas curriculares em Ciências, além de discutir as atividades investigativas e alfabetização científica enfatizando como os passos e etapas dessas atividades contribuem para uma alfabetização científica, colocando o aluno frente a problemas a serem resolvidos que instiguem o caráter investigativo.

Em relação ao papel do professor e do aluno nas atividades investigativas, percebe-se que, para consolidar o fazer científico em sala de aula, o professor pode realizar um planejamento bem articulado e propor problemas instigadores que despertem a curiosidade de seus alunos, cabendo aos discentes elaborar meios para solução de problemas que possam ajudá-los a construir conhecimentos, criar, testar e confrontar suas hipóteses.

Na última área temática sobre sequências de ensino investigativas no ensino de Ciências, os autores relatam práticas e atividades que demonstram a possibilidade de trabalho no ensino de Ciências e Biologia, Química ou Física com problemas experimentais, não experimentais e demonstrações investigativas que despertam a curiosidade e a análise dos alunos para uma alfabetização científica. Isso auxilia os professores dessa área a saber como fazer e como planejar e avaliar atividades que levem à descoberta e à consolidação do conhecimento.

Assim, com o recorte adotado nesta pesquisa, pode-se notar a necessidade de inovação e adoção de novos métodos em Ciências que auxiliem os professores em suas práticas, de modo que os alunos tenham papel ativo e adquiram a capacidade de investigar. É preciso, ainda, que os professores tenham acesso à formação continuada e possam lidar e planejar a investigação em sala de aula como um meio democrático de levar os alunos a terem acesso ao fazer científico e ao papel instigador e nocivo das ciências, posicionando-se de maneira responsável e autônoma.

Referências

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Publicado em 06 de dezembro de 2022

Como citar este artigo (ABNT)

SOUZA, Cassiana dos Santos; SOUZA, Fernando de Jesus. Atividades investigativas no ensino de Ciências: uma análise da produção acadêmica nacional. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 45, 6 de dezembro de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/45/atividades-investigativas-no-ensino-de-ciencias-uma-analise-da-producao-academica-nacional

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