Diretrizes utilizadas em tempos de pandemia da covid-19 com os alunos na Orientação e Mobilidade: desafios e possibilidades

Regina Kátia Cerqueira Ribeiro

Mestre em Saúde Materno Infantil (UFF), professora de Orientação e Mobilidade no IBC

Lisânia Cardoso Tederixe

Mestre em Diversidade e Inclusão (UFF), professora de Orientação e Mobilidade no IBC

Adávia Fernanda Correa Dias da Silva

Doutora em Educação na área da Deficiência Visual (UA), professora de Orientação e Mobilidade no IBC

Marcelo Miranda Petini

Pós-graduado em Ciência da Performance Humana em Academia (UFRRJ), professor de Orientação e Mobilidade no IBC

Aspectos da orientação e mobilidade e a deficiência visual

O Instituto Benjamin Constant (IBC), criado em 1854, é uma Instituição pioneira na educação de pessoas com deficiência visual na América Latina, considerado centro de referência em nível nacional para questões de deficiência visual. Possui uma escola que atende pessoas com deficiência visual (cegos e baixa visão), surdocegueira e deficiência múltipla associada à deficiência visual nos segmentos da Educação Precoce, Educação Infantil, Ensino Fundamental e a Educação Profissional Técnica de Nível Médio. Atualmente conta com o curso de Mestrado Profissional na área de deficiência visual, atendendo ao segmento de formação em docência especializada.

A visão é um dos canais de comunicação do ser humano com o mundo, pois permite captar dados importantes; a partir desse sentido, o Sistema Nervoso Central organiza as informações advindas dos outros sentidos (Gil, 2000).

A visão é hierarquicamente o mais importante de todos os sentidos do ser humano, pois fornece informações sobre a percepção e integração de formas, contornos, tamanhos, cores e imagens que estruturam a composição de uma paisagem ou de um ambiente.

A deficiência visual pode ser congênita (quando ocorre antes ou durante o nascimento) e adquirida (quando a perda ocorre em qualquer outro período); é a limitação parcial (baixa visão) ou total (cego) resultante de imperfeições no sistema ou no órgão visual. Ela caracteriza prejuízos funcionais como menor capacidade de interação com o mundo, dificuldade em integrar respostas por meio dos outros sentidos e dificuldade na locomoção independente.

Orientação e mobilidade (OM), práticas educativas para uma vida independente (PEVI), aprendizagem do Sistema Braille, soroban e escrita cursiva é o que diferencia a grade curricular da escola especializada para pessoas com deficiência visual das demais grades curriculares do ensino regular (MEC, 2002 apud Filgueiras et al., 2008).

As técnicas de Orientação e Mobilidade (OM) vêm sendo desenvolvidas desde o século XX. Em 1945, o primeiro-tenente e médico oftalmologista do Valley Forge Hospital, Dr. Richard Hoover, após observar as dificuldades de locomoção de ex-combatentes cegos de guerra, propôs pesquisar o problema. Ao estudar a problemática da cegueira e a mecânica da marcha, Hoover criou um método revolucionário empregando um instrumento que lembrava um bastão, mas que possuía função, material e comprimento diferenciados. Hoje, na literatura, as técnicas de bengala longa são chamadas também de técnicas de Hoover.

Golkman, já em 1969, mostrava a importância do programa de OM para a conquista da autonomia e, consequentemente, a independência e a inclusão da pessoa com deficiência visual na escola e na sociedade (Machado, 2003).

Bischof (2008) afirmou que a orientação tem como princípio três questões básicas: compreensão da localização atual, compreensão da localização do objetivo e concessão das ações para alcançar um objetivo. Para a orientação adequada, são necessárias organização e análise de informações sensoriais para o planejamento e execução dos movimentos. As pessoas com deficiência visual necessitam de atendimento específico para melhor orientação, ou seja, atividades que proporcionem melhor reconhecimento para saber onde estão, aonde querem ir e como vão chegar.

Wiener, Welsh e Blash (2010) conceituaram a orientação como a noção da distância e da direção relativa dos objetos observados ou memorizados no espaço que envolve a pessoa; é a capacidade de guardar essas relações espaciais à medida que a posição muda durante a locomoção.

A mobilidade é a habilidade de locomover-se com segurança, eficiência e conforto no meio ambiente, utilizando os sentidos remanescentes: audição, tato, olfato, cinestesia, memória muscular e sentido vestibular (Weishaln, 1990).

A orientação e a mobilidade são duas capacidades associadas ao movimento e ao deslocamento independentes. A orientação envolve ter consciência do espaço e de onde estamos dentro dele (onde eu estou? Aonde eu quero ir? Como faço para chegar lá?)”; já a mobilidade é “a capacidade de se movimentar com segurança” (Farrel, 2008, p. 32).

De acordo com Shumway-Cook e Woollacott (2003, p. 289), “quando falamos de mobilidade, no sentido de locomoção, é imprescindível considerar três características principais: a progressão, a estabilidade e a adaptação”.

Portanto, Orientação e Mobilidade representa um conjunto de técnicas aprendidas pela pessoa com deficiência visual para se orientar no espaço e se locomover com autonomia, independência e segurança utilizando os sentidos remanescentes, as pistas e pontos de referência do ambiente.

Santos (2007) ressalta a importância de o programa de OM ser desenvolvido de acordo com as necessidades de cada aluno. Por sua complexidade, ele requer instrução individualizada para cada educando (Brasil, 1995).

A pandemia e os modelos de ensino: Educação a Distância, ensino remoto e ensino híbrido

Desde dezembro de 2019, uma doença respiratória denominada “doença do coronavírus 2019 (covid-19) tem ameaçado a saúde do mundo inteiro; essa doença se disseminou rapidamente pela China, atingindo outros países e territórios. Pesquisas apontaram que os casos da covid-19 tiveram início no mercado Huanan Seafood Market na cidade de Wuhan, província de Hubei, na China, no qual se comercializavam peixes, frutos do mar e até mesmo animais vivos (Li et al., 2020). Esse novo coronavírus (SARS-CoV-2) é estruturalmente relacionado ao vírus que causa síndrome respiratória aguda grave (SARS) e síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS), consideradas grande emergência de doenças por coronavírus dos últimos anos (Vilela, 2020; Croda et al., 2020; WHO, 2020).

Essa doença incorreu no afastamento laboral e se tornou um grande desafio para a comunidade escolar. Por ainda não se ter conhecimento de medicamentos específicos para o seu tratamento, são necessárias medidas individuais, ambientais e coletivas como etiqueta respiratória, lavagem das mãos, distanciamento social, arejamento e exposição solar de ambientes, limpeza de objetos e superfícies e restrição ou proibição de funcionamento de escolas, universidades, locais de convívio comunitário e transporte público, além de locais onde haja aglomeração de pessoas (Garcia; Duarte, 2020).

A educação foi seguramente uma das áreas mais atingidas pela covid-19 no Brasil, em especial para os alunos das escolas públicas, sem acesso e sem recursos para acompanhamento remoto das aulas. Percebe-se que isso contribui para o aumento das desigualdades, falta de oportunidade, impossibilitando ações de inclusão. Se pensarmos nas questões que envolvem a educação de pessoas com deficiência, esse impacto é com certeza ainda maior.

Os avanços digitais no século XXI permearam a expansão de novas ferramentas de comunicação visual, ou melhor, videoconferência, como: Google Meet, Zoom, Eventials, chamada de vídeo pelo WhatsApp e outras. Essas ferramentas têm sido essenciais para a educação escolar no formato a distância na transmissão das aulas, além de possibilitar as reuniões de trabalho, palestras, convivência social segura, entre outros. Segundo Garcia et al. (2020), a educação e o ensino podem seguir caminhos que se apoiam nas tecnologias digitais, que estão subordinados a recursos, mídias e suporte com acessibilidade, e as práticas inovadoras que dependerão de quais recursos iremos utilizar: o analógico ou o digital. Essas práticas inovadoras fomentam aspectos metodológicos no saber-fazer do professor.

Entretanto, a história da Educação a Distância no Brasil não é tão atual. Começou formalmente em 1904, e os materiais eram enviados por correspondência (Mattjie, 2020). Em 1996, com base no seu Art. 80, a Lei nº 9.394 (LDBEN) passa a regulamentar a Educação a Distância (EaD) em todos os níveis e modalidades de ensino e de forma continuada (Brasil, 1996). Já no ano de 2017, o Decreto nº 9.057 veio regulamentar o Art. 80, ampliando as competências dessa modalidade de ensino e ações de monitoramento por parte dos órgãos competentes na avaliação e supervisão de cursos, polos ou instituições de ensino (Brasil, 2017).

Hoje, com as tecnologias digitais, a Educação a Distância tornou-se uma modalidade de ensino que acontece em um ambiente virtual por meio de uma plataforma de EaD, no qual alunos e professores não estão presentes fisicamente para que a aula aconteça. Ou seja, as aulas podem ser ao vivo ou disponibilizadas gravadas por módulos e os participantes estarem em espaços físicos diferentes.

O ensino híbrido funciona de forma simultânea, isto é, o ensino acontece em dois ambientes: presencial e virtual. Nesses ambientes, os alunos acompanham o mesmo conteúdo.

O ensino híbrido é um programa de educação formal no qual um aluno aprende, pelo menos em parte, por meio do ensino on-line, com algum elemento de controle do estudante sobre o tempo, lugar, modo e/ou ritmo do estudo, e pelo menos em parte em uma localidade física supervisionada, fora de sua residência” (Christensen; Horn; Staker, 2013, p. 7).

O ensino híbrido apresenta um conteúdo mais flexível e utiliza as tecnologias digitais como meio de transmitir conhecimento, configurando uma parte da rotina escolar. A mistura do ensino presencial na escola com o ensino on-line contribui para um “modelo de ensino híbrido”. Sendo assim, essa proposta de ensino desencadeia um conjunto de aspectos, como: modelo de rotação, modelo flex, modelo à la carte, modelo virtual enriquecido (Bacich; Tanzi Neto; Trevisani, 2015).

O ensino remoto não tem o mesmo significado que ensinar a distância, embora use tecnologias digitais; as aulas não são gravadas e a presença do professor é contínua, tanto de forma síncrona como assíncrona. Nas aulas síncronas, há interação entre professor e aluno ao vivo por meio de um aplicativo de videochamadas, enquanto nas aulas assíncronas professor e aluno interagem em uma plataforma, na qual o professor complementa as aulas síncronas com postagem de material, também para sanar as dúvidas recorrentes dos alunos. “O ensino remoto permite o uso de plataformas já disponíveis e abertas para outros fins que não sejam estritamente os educacionais, assim como a inserção de ferramentas auxiliares e a introdução de práticas inovadoras” (Garcia et al., 2020, p. 5). Durante esse período de pandemia, o ensino remoto “emergencial” ganhou muita ênfase nas escolas como recurso de ensino necessário. “O ensino remoto emergencial é uma mudança temporária na forma de ensinar, utilizando uma modalidade alternativa de transmissão de conhecimento devido a circunstâncias críticas” (Hodges et al, 2020, p. 95).

Nesse contexto, foi fundamental pensar e refletir como poderíamos oferecer as aulas de Orientação e Mobilidade enquanto os alunos não pudessem ter aulas presenciais.

Etapas do atendimento durante a pandemia

Motivados pelos desafios inerentes à pandemia atual e por observar a carência de informações de utilização de tecnologias e materiais na área da deficiência visual no que diz respeito a Orientação e Mobilidade, optamos por relatar nossas experiências – que no formato presencial são essencialmente práticas e individualizadas e que no momento tivemos que optar por um currículo alternativo durante o ensino remoto.

Segundo Grollmus e Tarrés (2015), relato de experiência é uma metodologia em forma de narrativa, de modo que o autor quando narra pela escrita está divulgando um acontecimento vivido. Nesse sentido, o relato de experiência é um conhecimento que se transmite com aporte científico.

A princípio, como todas as instituições escolares, pensamos que seria uma breve paralisação das atividades, porém o tempo foi passando e a pandemia se prolongou. A gestão do IBC, ao perceber que seria uma fase mais duradoura, procurou fazer uma análise das condições de acesso digital dos docentes e discentes, pensando na reelaboração do calendário escolar para adequação de carga horária compatível para o trabalho escolar remoto e oferecer formação em diferentes mídias de plataforma digital para docentes, discentes e responsáveis.

Também foram estabelecidas normativas de trabalho em caráter temporário para reorientar as rotinas acadêmicas e administrativas da escola e procedimentos internos do Departamento de Educação (DED), como calendário de biênio para os anos letivos de 2020 e 2021, considerando para o planejamento pedagógico dos anos letivos a oferta de no mínimo 800 horas com atividades remotas e/ou presenciais (quando fosse possível).

A partir desse momento, a equipe de Orientação e Mobilidade do DED do IBC, que hoje conta com quatro professores, passou a se reunir por meio de videoconferência por meio do WhatsApp e do Google Meet. Durante esses encontros, foram repensadas as atividades e as adaptações de conteúdos e materiais, promovendo inicialmente o contato com os alunos como forma de acolhimento dentro desse contexto não previsto (a pandemia); de forma gradativa, o grupo se organizou repensando o planejamento de OM, os conceitos, os conteúdos importantes, a essencialidade do currículo que pudesse nesse momento agregar conhecimentos e facilitar o aprendizado quando o retorno presencial ocorresse. Dessa forma, foram produzidos textos e áudios com a finalidade de trabalhar conceitos básicos para uma melhor compreensão dos conteúdos por parte dos alunos sobre Orientação e Mobilidade; esses materiais seriam adaptados e veiculados pela internet, a fim de minimizar os impactos deletérios dessa pandemia no ensino-aprendizagem dos alunos com deficiência visual. No decorrer do período, por meio da Portaria nº 2 do IBC, de 03 de fevereiro de 2021, o ano escolar no IBC foi constituído no formato de dois anos em um ano. Sendo assim, as turmas de nono ano foram atendidas pela equipe de OM no primeiro semestre de 2021, correspondendo ao ano letivo de 2020, ficando as turmas de sétimo ano e oitavo ano para serem atendidas no segundo semestre de 2021, referente ao ano letivo de 2021.

Algumas orientações foram pensadas pela equipe, procurando ouvir os alunos e suas impressões na etapa inicial do trabalho. O estresse, as incertezas, a ansiedade e outros sintomas emocionais foram percebidos na dinâmica do trabalho durante o acolhimento.

Selecionamos para nosso relato os alunos que foram atendidos no segundo semestre de 2021. São alunos de sétimo e oitavo ano do Ensino Fundamental, que a partir do mês de outubro puderam escolher se continuariam com aulas remotas ou passariam para aulas presenciais. Os alunos que permaneceram no atendimento remoto continuaram recebendo materiais com conceitos relacionados à OM e tendo atendimento em grupo (turma). Aqueles que optaram por aulas presenciais puderam participar de aulas práticas e individualizadas de OM.

Na Tabela 1 apresentamos o perfil dos alunos do sétimo e oitavo ano que estavam matriculados no segundo semestre de 2021.

Tabela 1: Perfil dos alunos do segundo semestre de 2021

 

Turma 1

7º ano

Turma 2

7º ano

Turma 3

8º ano

Turma 4

8ºano

Turma 5

8º ano

Condição Visual:  Cego

2

5

6

4

4

Condição Visual: Baixa Visão

3

1

0

2

5

Sexo Feminino

3

3

2

3

5

Sexo Masculino

3

3

4

3

4

Nº de alunos participantes do ensino remoto

3

6

5

6

4

Total de alunos

5

6

6

6

9

O atendimento remoto foi dividido em dois momentos: o primeiro, de acolhimento, em que abordamos assuntos sobre política de uso dos ambientes virtuais, para que os alunos soubessem como atuar dentro desses espaços fazendo com que esse convívio fosse respeitoso, regras importantes de etiqueta virtual para utilização de redes sociais e formas de checagem de notícias falsas com alertas de fake news. Essas ações iriam auxiliar no desenvolvimento de atividades importantes para o aprendizado de OM no segundo momento do atendimento.

Como já elucidado, as aulas práticas de OM não podem ser realizadas a distância por questão de segurança do próprio alunado, visto que as técnicas que levam à locomoção independente com uso de bengala são realizadas em ambientes externos e é necessário ter um profissional qualificado com formação em Orientação e Mobilidade para ensinar e auxiliar o aluno nas técnicas de forma adequada. Porém, como ainda não havia sido liberado pelo Comitê Operativo de Emergência do Instituto Benjamin Constant (COE/IBC), nesse segundo momento as aulas de OM foram direcionadas para conteúdos conceituais sobre Orientação e Mobilidade.

Nessa etapa, foram disponibilizados esclarecimentos sobre como seriam as aulas de OM para os pais, responsáveis e alunos. Como também foi realizada uma pesquisa junto aos alunos sobre outras possibilidades de interação remota que fossem melhores para o recebimento das atividades.

Os métodos para o desenvolvimento das aulas no formato remoto aconteceram por meio de contato por Google Sala de Aula e WhatsApp Business para postagem de atividades assíncronas e Google Meet e WhatsApp Business para atividades síncronas. A cada semana era enviado um tópico com o conteúdo sobre orientação e mobilidade por meio de textos e podcast para que os alunos pudessem escolher o material mais acessível, além de vídeos com audiodescrição. Também era encaminhado, como complemento das atividades, um formulário com perguntas sobre o assunto daquela semana. Nas aulas síncronas, os alunos podiam discutir e sanar as dúvidas sobre os assuntos abordados nos materiais postados no WhatsApp Business e no Google Sala de Aula. A opção de atendimento em grupo se manteve mesmo após o acolhimento, por representar melhor dinâmica nas aulas.

Nos materiais encaminhados, procuramos abordar tópicos que pudessem facilitar o desenvolvimento da OM quando o retorno presencial acontecesse. No Quadro 1 apresentamos algumas propostas que foram desenvolvidas.

Quadro 1: Atividades desenvolvidas

Atividades sensoriais que estimulam os sentidos remanescentes (audição, sistema háptico, olfato e resíduo visual).

Atividades que auxiliam a construção de mapa mental, pistas e pontos de referência.

Conceito do que é Orientação e Mobilidade.

Orientação e mobilidade, locomoção e autonomia no trabalho.

Temas transversais como a importância da OM nas Paralimpíadas para atletas com deficiência visual.

Histórico de Orientação e Mobilidade.

Técnicas de autoproteção.

Bengala longa, suas cores e a representação de cada deficiência: baixa visão, cegueira e surdocegueira.

A Orientação e Mobilidade e acessibilidade urbana.

Cão-guia.

Reflexões sobre os resultados das propostas diante dos desafios no atendimento remoto

Em função de a OM ser uma atividade basicamente de caráter prático, presencial e individualizado, torna-se difícil a sua execução em aulas totalmente on-line ou em atividades remotas e em grupos.

Nesse sentido, vale destacar algumas observações que consideramos importantes e que devem ser apresentadas; nós a tivemos no momento de acolhimento e nas atividades conceituais assíncronas e síncronas de OM.

Na Tabela 1, descrevemos o que aconteceu durante esse período: dos 37 alunos, onze não tinham aceito o convite para participar do Google Sala de Aula e não estavam participando das atividades síncronas pelo Google Meeting nem pelo WhatsApp Business; era um quantitativo muito grande. Sentimos então a necessidade de entender melhor como os alunos estavam se adaptando a essa nova realidade e o porquê da não participação nas aulas. Solicitamos que a Divisão de Orientação Educacional, Psicológica e Fonoaudiológica (DOE) entrasse em contato com os responsáveis e pudemos perceber que, mesmo com a oferta aos responsáveis e alunos de curso de tecnologias assistivas no início do ano, eles ainda apresentavam dificuldades para acessar, por questões práticas de uso; muitos não tinham computador, acesso à internet e celular próprio, pois algumas famílias só tinham um celular de uso comum e outros preferiram não aderir às aulas nesse formato.

Identificamos que alguns conteúdos abordados nas aulas remotas despertaram grande interesse dos alunos por serem temas que desenvolvem o debate da conscientização da OM no cotidiano e facilitam o aprendizado das técnicas de OM. São eles: sentidos remanescentes, construção de mapa mental, pistas e pontos de referência, locomoção e autonomia no trabalho, histórico de Orientação e Mobilidade, bengala longa e suas cores; e quanto à representação de cada deficiência: baixa visão, cegueira e surdocegueira, acessibilidade urbana e cão-guia.

A partir do mês de outubro de 2021, o COE/IBC facultou aos alunos a escolha de continuidade no ensino remoto ou o retorno ao ensino presencial. Porém a maioria dos alunos que estávamos atendendo preferiu continuar no ensino remoto e só retornar ao presencial no ano de 2022.

Embora no Rio de Janeiro ainda haja necessidade de manter o distanciamento social, isso não ocorre em determinados ambientes, principalmente em transportes públicos, onde observamos maior aglomeração de pessoas. Constatamos que tal fato foi fator preponderante para a opção de um quantitativo muito grande de alunos por se manter no ensino remoto.

Outro fator que que foi determinante na escolha do ensino remoto foi o número reduzido de alunos que já tomaram a segunda dose da vacina contra a covid-19.

Considerações finais

Ao iniciarmos com as atividades de acolhimento, pudemos refletir que, mesmo com todas as limitações, mesmo sendo um momento muito delicado, em que alguns alunos perderam amigos e familiares, o material oferecido e os encontros remotos foram as únicas formas que encontramos para minimizar as angústias desses alunos fora da escola e motivá-los a continuar a participar dos encontros.

Durante esse período pandêmico, a identificação de tecnologias de apoio e adaptação de recursos foi importante para promover a participação do aluno com deficiência visual na OM, visto que essa atividade é essencialmente prática e individualizada.

Para a participação do aluno, foi necessária uma metodologia alternativa de OM para as aulas remotas, com o oferecimento de materiais com conceitos e debates sobre a conscientização da OM no cotidiano.

Dessa forma, foi possível acolher e estimular a participação dos alunos, bem como agregar atividades que irão auxiliá-los em sua orientação e mobilidade quando houver o retorno presencial e as aulas práticas puderem ser oferecidas.

Partindo dessas considerações, e corroborando Machado et al. (2003) quando afirmam que o aluno estará apto a aprender as técnicas com rapidez e eficiência somente após ter interiorizado os conceitos de Orientação e Mobilidade, percebemos a importância de oferecer discussões sobre esses conteúdos quando estivermos no ensino totalmente presencial.

Embora a OM seja um atendimento individualizado, pretendemos oferecer esses materiais em grupo por meio de oficinas ou encontros periódicos com debates sobre OM. Incitar essas discussões poderá se constituir em conhecimento e aprendizado dos alunos com deficiência visual.

A Orientação e Mobilidade promove a autonomia, independência e participação na sociedade da pessoa com deficiência visual; embora a metodologia alternativa tenha estimulado o debate sobre um tema tão importante, destacamos a necessidade de o programa de OM com relação a suas técnicas de guia vidente, autoproteções e bengala longa ser oferecido em sua integralidade, de forma prática, com aulas presenciais e individualizadas.

Este relato de experiência poderá representar uma prática pedagógica diferenciada, indicando possibilidades, recursos e dinâmicas de trabalho na escola que propiciam maior autonomia. A aprendizagem deve ser ativa e dinâmica e o aluno deve ser o protagonista de sua aprendizagem.

Referências

BACICH, Lilian; TANZI NETO, Adolfo; TREVISANI, Fernando de Mello (Org.). Ensino híbrido: personalização e tecnologia na educação. Porto Alegre: Penso, 2015. e-PUB. Disponível em: https://www2.ifal.edu.br/ensino-remoto/professor/apostilas-e-livros/ensino-hibrido.pdf/. Acesso em: 15 ago. 2021.

BISCHOF, Eileen Marie. Practices for determining the provision of orientation and mobility instructor for students with low vision. 2008. 131 f. Tese (Doutorado em Filosofia) - Florida State University. Flórida, 2008. Disponível em: http://fsu.digital.flvc.org/islandora/object/fsu%3A181987. Acesso em: 31 ago. 2021.

BRASIL.  Secretaria de Educação Especial. Subsídios para organização e funcionamento de serviços de Educação Especial: área de deficiência visual. Brasília: MEC/Seesp, 1995.

______. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394. Acesso em: 4 ago. 2021.

______. Decreto nº 9.057, de 25 de maio de 2017. Regulamenta o Art. 80 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Decreto/D9057.htm#art24. Acesso em: 4 ago. 2021.

CHRISTENSEN, C. M.; HORN, M. B.; STAKER, H. Ensino híbrido: uma inovação disruptiva? Uma introdução à teoria dos híbridos. Porvir, p. 7, 2013. Disponível em: http://porvir.org/wp-content/uploads/2014/08/PT_Is-K-12-blended-learning-disruptive-Final. Acesso em: 5 ago. 2021.

CRODA, J. et al. Covid-19 in Brazil: advantages of a socialized unified health system and preparation to contain cases. J. Braz. Soc. Trop. Med., v. 53, p. 1-6, 2020. doi: 10.1590/0037-8682- 0167-2020.

FARREL, M. Dificuldades de aprendizagem moderadas, graves e profundas. Porto Alegre: Artmed, 2008.

FILGUEIRAS, L. A. M.; PEREIRA L. H. L.; MELCA, F. M. A. Processo ensino-aprendizagem dos alunos com necessidades educativas especiais: o aluno com deficiência visual. Rio de Janeiro: Editora UniRio. 2008.

GARCIA, L. P.; DUARTE, E. Intervenções não farmacológicas para o enfrentamento à epidemia da Covid-19 no Brasil. Epidemiol. Serv. Saúde, v. 29, nº 2, p. e2020222, 2020. doi: 10.5123/ s1679-49742020000200009.

GARCIA, Tânia Cristina Meira et al. Ensino remoto emergencial: proposta de design para organização de aulas. Cadernos de Ensino Mediado por TIC. Natal: Secretaria de Educação a Distância da UFRN, 2020. Disponível em: https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/29767. Acesso em: 5 ago. 2021.

GIL, M. (Org.). Deficiência visual. Brasília:MEC/SEAD, 2000.

GROLLMUS, Nicholas S.; TARRÈS, Joan P. Relatos metodológicos: difractando experiências narrativas de investigación. Fórum Qualitative Social Research, v. 16, nº 2, mayo 2015. Disponível em: https://www.ssoar.info/ssoar/handle/document/47405. Acesso em: 10 ago. 2021.

HODGES, Charles et al. A diferença entre ensino remoto emergencial e ensino a distância. Trad. Nathália Marcon e Rozane R. Rebechi. Revista de la Red Iberoamericana de Terminología, nº 18, p. 92-100, 2020. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/riterm/article/view/109402. Acesso em: 12 jul. 2021.

LI, Q. et al. Early transmission dynamics in Wuhan, China, of novel coronavirus–infected pneumonia. N. Engl. J. Med., v. 382, p. 1.199-1.207, 2020. doi: 10.1056/NEJMoa2001316.

MACHADO, Edileine Vieira. Orientação e Mobilidade: conhecimentos básicos para a inclusão do deficiente visual Brasília: MEC/Seesp, 2003.

MATTJIE, Nicole Utzig. A história da Educação a Distância no Brasil. Ensino Digital, 2020. Disponível em: https://ensino.digital/blog/a-historia-da-educacao-a-distancia-no-brasil. Acesso em: 5 ago. 2021.

SANTOS, Miralva Jesus dos. A escolarização do aluno com deficiência visual e sua experiência educacional. 2007. Dissertação (Mestrado em educação) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2007. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/10613/1/Miralva%20dos%20Santos.pdf. Acesso em: 20 set. 2021.

SHUMWAY-COOK, Anne; WOOLLACOTT, Marjorie H. Controle motor: teoria e aplicações práticas. 2ª ed. São Paulo: Manole, 2003. Cap. 12-15, p. 289-426.

VILELA, D. A. M. The value of mitigating epidemic peaks of covid-19 for more effective public health responses. J. Braz. Soc. Trop. Med., v. 53, p. e20200135, 2020. doi:10.1590/0037- 8682-0135-2020.

WEISHALN, R. Orientation and Mobility in the blind children. New York: Englewood Cliffs, 1990.

WIENER, William; WELSH, Richard; BLASCH, Bruce (Eds.). Foundations of Orientation and Mobility: history and theory. Vol. 1. 3ª ed. Nova York: AFB Press, 2010.

WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Pneumonia de causa desconhecida - China: notícias de surto de doença. Genebra: OMS, 2020.

Publicado em 08 de março de 2022

Como citar este artigo (ABNT)

RIBEIRO, Regina Kátia Cerqueira; TEDERIXE, Lisânia Cardoso; SILVA, Adávia Fernanda Correa Dias da; PETINI, Marcelo Miranda. Diretrizes utilizadas em tempos de pandemia da covid-19 com os alunos na Orientação e Mobilidade: desafios e possibilidades. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 8, 8 de março de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/8/diretrizes-utilizadas-em-tempos-de-pandemia-da-covid-19-com-os-alunos-na-orientacao-e-mobilidade-desafios-e-possibilidades

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.