Ambientes virtuais de aprendizagem em tempos de pandemia: diferentes experiências

Lucilene de Souza Tatagiba

Mestre em Matemática (Profmat/UFRJ), docente da Seeduc/RJ

Antonio Rodrigo Souza Serafim

Mestrando em Matemática (Profmat/UFRJ), docente da SME/RJ

Jocilea de Souza Tatagiba

Mestre em Educação (UERJ), docente da Seeduc/RJ

Em um mundo caracterizado por intensas mudanças tecnológicas nas mais diversas áreas da sociedade, é impensável que a educação não siga tal tendência em todas as suas etapas como agente básico na formação do cidadão que precisa ser inserido ativamente nessa nova realidade.

É fundamental que o processo de ensino-aprendizagem, em vez de provocar o desestímulo por aprender, a sensação de superficialidade e, consequentemente, a gradual (ou imediata) desistência do aluno, busque meios de atraí-lo e de fazê-lo perceber que aquele longo – e necessário – caminho pode ser prazeroso, dinâmico e de fato conectado ao mundo tal como ele se apresenta. Em outras palavras, é preciso que as metodologias educacionais estejam atentas a ferramentas que, aliadas ao que já se tem tradicionalmente, não apenas tragam o aluno a reconhecer a importância do processo, mas que também o façam ter participação ativa em seu desenvolvimento. Mas como pensar nesse processo em meio a uma pandemia?

Esse foi um dos desafios enfrentados pelos docentes nos anos de 2020 e 2021 devido à pandemia causada pelo novo coronavírus (a covid-19), doença infecciosa com alta transmissibilidade que, em casos mais graves, levou muitas pessoas a óbito no mundo inteiro. Com isso, muitos países decretaram o isolamento social, suspendendo as aulas presenciais em todas as instituições de ensino. Como o retorno das aulas presenciais tornou-se algo indefinido, fez-se necessária a criação de uma metodologia alternativa para tentar amenizar os impactos na aprendizagem dos estudantes, surgindo assim o ensino remoto emergencial. De acordo com Arruda (2020, p. 266),

A educação remota emergencial pode ser apresentada em tempo semelhante à educação presencial, como a transmissão em horários específicos das aulas dos professores, nos formatos de lives. [...]. Ela também pode envolver mais iniciativas da EaD, implementando ferramentas assíncronas (que funcionam de forma não instantânea, como fóruns de discussão) e melhor estruturação de materiais.

Nesse contexto, observamos o papel fundamental das ferramentas digitais para o processo de ensino-aprendizagem durante esses anos de pandemia. Antes, Kenski (2006) já destacava que o trabalho com recursos tecnológicos, quando bem conduzido, se mostra eficiente.

Não há dúvida de que as novas tecnologias de comunicação e informação trouxeram mudanças consideráveis e positivas para a educação. Vídeos, programas educativos na televisão e no computador, sites educacionais, softwares diferenciados transformam a realidade da aula tradicional, dinamizam o espaço de ensino e aprendizagem, onde, anteriormente, predominava a lousa, o giz, o livro e a voz do professor (Kenski, 2006, p. 46).

Entre as inúmeras maneiras com as quais a tecnologia pode atuar como meio de melhorar o ensino e instigar o estudante, aparecem os chamados ambientes virtuais de aprendizagem (AVA), que, durante o ensino remoto, teve grande aceitação por várias instituições de ensino – públicas e privadas –, abarcando tanto a Educação Básica quanto o Ensino Superior.

Segundo Pereira (2007, p. 4), os AVA são “mídias que utilizam o ciberespaço para veicular conteúdos e permitir interação entre os atores do processo educativo”. No entanto, o autor é enfático ao dizer que apenas a implementação desse recurso tecnológico não garante, por si só, o êxito, do ponto de vista educacional, uma vez que

a qualidade do processo educativo depende do envolvimento do aprendiz, da proposta pedagógica, dos materiais veiculados, da estrutura e qualidade de professores, tutores, monitores e equipe técnica, assim como das ferramentas e recursos tecnológicos utilizados no ambiente (Pereira, 2007, p. 4).

Sob essa ótica, para que haja, de fato, progressos ao se usar um ambiente virtual na educação, é essencial que suas potencialidades sejam plenamente exploradas pelo professor e pela instituição em proveito do aluno, seja dando dinamismo e novos ares a aspectos tradicionais do ensino, seja como ferramenta capaz de aprimorar práticas das metodologias ativas, significativas e colaborativas da aprendizagem.

O papel dos ambientes virtuais de aprendizagem em diferentes metodologias de ensino

Os AVA – bem como outros tantos recursos tecnológicos utilizados na educação nos dias de hoje – não aparecem como meros substitutos de metodologias tradicionais de ensino, e sim como ferramentas que agregam e aprimoram o processo. Kenski (2013) ressalta que os ambientes virtuais de aprendizagem possibilitam o desenvolvimento de ações educacionais online, podendo ser usados paralelamente ao ensino presencial.

Ademais, a adoção dos AVA não deve ser feita com um fim em si mesmo, isto é, simplesmente como mais uma tentativa de encaixar tecnologia no processo de ensino-aprendizagem. Para Duart e Sangrá (1999 apud Bairral, 2012, p. 78), eles “devem possibilitar flexibilidade, interatividade, inserção e vinculação na comunidade virtual constituída e permitir aos envolvidos o acesso a materiais e demais fontes de recursos disponíveis na rede”. Se assim não for, a tendência é que a implementação de tais ambientes não passe de algo que apenas torna virtual um modelo obsoleto de ensino, sem qualquer nova contribuição para o aluno.

Nesse sentido, é importante que, entre tantas opções de AVA, desde os mais simples aos mais complexos, o público-alvo e os objetivos a serem alcançados sejam levados em conta na hora da escolha do melhor ambiente a ser utilizado. É fundamental haver um dinamismo tal que o estudante se sinta atraído e identificado – e não desestimulado – a, pelo menos, tentar conhecer um modelo virtual que, bem praticado, só vem agregar ao que ele já conhece. Segundo Bannell et al. (2016, p. 108),

a característica dinâmica de um ambiente virtual se expressa na plasticidade deste e em sua modificação constante em resposta aos impulsos do usuário. Em contrapartida, sua interatividade dinâmica modifica social e culturalmente o usuário, ativando inteligências e habilidades diferentes, exigindo e favorecendo a construção de novas competências.

De acordo com Kenski (2013), não se pode limitar e restringir o ato pedagógico; é preciso oferecer opções inovadoras, amplas e abertas. Para isso, é preciso oferecer melhores condições para a participação e a interação dos alunos com os demais envolvidos, desde a disponibilização do conteúdo em diferentes formatos até a realização de atividades lúdico-colaborativas que possibilitem “a vivência e a incorporação de valores, habilidades novas e atitudes fundamentais para o convívio em sociedade, como respeito ao outro, disciplina, responsabilidade etc.” (Kenski, 2013, p. 125). Assim, além de viabilizar a comunicação e a interação de todos os participantes no processo de ensino-aprendizagem, o AVA deve permitir o armazenamento de conteúdos e atividades, a realização de fóruns, a entrega de tarefas, a avaliação de atividades com registro e divulgação de notas e a publicação de notícias e/ou informações (Giraldo; Caetano; Mattos, 2012). É em tal contexto que os AVA aparecem como importantes instrumentos no processo de ensino-aprendizagem sob o ponto de vista de diferentes metodologias, especialmente no ensino remoto emergencial. Foi o que destacou o relato de experiência feito por Tatagiba e Tatagiba (2021), que descreveu como foi a utilização de uma plataforma online no período da pandemia, apontando as principais potencialidades e limitações desse recurso no ensino remoto.

Aos olhos da aprendizagem ativa, por exemplo, na qual o professor instiga a autonomia e a proatividade do aluno na busca pelo conhecimento, é preciso um ambiente cujos recursos possibilitem a plena orientação do docente em seu papel de tutor e, ao mesmo tempo, estimulem o estudante a construir o saber de forma dinâmica e interessante. A chamada sala de aula invertida é um clássico exemplo de ferramenta que atende bem a tais pré-requisitos, até por se tratar de uma estratégia que, segundo Berrett (2012 apud Schneiders, 2018), visa mudar alguns elementos do ensino presencial ao se apresentar como alternativa à lógica tradicional. Assim, um AVA que apresente meios favoráveis à sua implementação de maneira eficiente pode ser um grande aliado para o processo, além de corroborar a ideia de que ambientes virtuais podem caminhar lado a lado com métodos tradicionais de ensino na tentativa de melhorá-los e adaptá-los aos novos tempos e necessidades.

Tendo o conhecimento prévio como base para a significação e a concretização de conteúdos estudados no presente, a aprendizagem significativa também pode encontrar nos AVA potenciais aliados em sua prática. Marcas registradas dessa metodologia, os mapas conceituais, além de proporcionar ao estudante uma maneira atrativa e interessante de relacionar saberes adquiridos em diferentes tempos, também são capazes de incentivar o uso de novas ferramentas didáticas e tecnológicas, de modo que o conhecimento seja construído ativamente e a capacidade de aprender seja fortalecida (Galante, 2014; Carabetta Júnior, 2013; Souza; Boruchovitch, 2010). Sob essa perspectiva, em uma rápida pesquisa pela internet, tanto professores quanto alunos são capazes de encontrar softwares e aplicativos gratuitos que podem ser facilmente incluídos em ambientes virtuais adequados a esse fim, seja como atividades didáticas, seja como recursos pedagógicos para o ensino.

Para as diretrizes da aprendizagem colaborativa – cujo foco é a troca de saberes e o compartilhamento de ideias entre os próprios alunos para que, com a mediação do professor, atinjam um objetivo comum – os AVA também podem se mostrar bastante úteis. Além disso, para Grabinger e Dunlap (1996 apud Loiselle, 2002), “a presença de atividades de aprendizagem colaborativa é uma condição necessária ao estabelecimento de ambientes de aprendizagem ricos”. Ao longo da pandemia de covid-19, por exemplo, a existência de grupos, fóruns e outros recursos que permitem a interação entre estudantes e professores, reforçando a metodologia colaborativa, foi um dos principais critérios de escolha do ambiente virtual a ser utilizado no ensino remoto pelo próprio docente, pela instituição ou pelos órgãos públicos responsáveis.

Ambientes virtuais Moodle e Google Classroom

O Moodle e o Google Classroom são softwares de acesso gratuito e livres de anúncios, executados num ambiente virtual e dotados de recursos que apoiam a aprendizagem. Ambos possuem ferramentas semelhantes, que podem ser utilizadas em qualquer dispositivo com acesso à internet.

A instalação e a configuração do Moodle podem ser complicadas para leigos, pois isso “pressupõe a existência de um software servidor web com capacidade para interpretar código escrito em php. Também há necessidade de um programa gerenciador de banco de dados (SGBD)” (Costa, 2018, p. 19). Por outro lado, o Moodle conta com um poderoso diferencial: sua capacidade de adaptação aos diferentes fins, uma vez que seu sistema é livre e aberto e, assim, permite sua configuração de acordo com as necessidades e projetos de cada instituição.

Menos complexo em relação a questões técnicas, mas igualmente eficiente para o que se dispõe a fazer, o Google Classroom aparece como um ambiente virtual de aprendizagem de fácil manuseio, bastando a simples instalação do aplicativo no smartphone ou o acesso na versão web. Ao efetuar o registro na plataforma com uma conta Google, os usuários são vinculados a diversas funcionalidades externas – compartilhamento de arquivos, recebimento de novas postagens, aulas e reuniões ao vivo, gravações, atividades assíncronas – por meio de ferramentas do próprio servidor, como Gmail, Drive, Meet, Docs e Forms.

Tanto por meio do Moodle quanto por meio do Google Classroom, é possível estabelecer interações síncronas e assíncronas entre professor-aluno e/ou aluno-aluno, proporcionando um aprendizado além da sala de aula física: o aluno continua estudando e interagindo em casa ou em outro ambiente, uma vez que o acesso pode ser realizado em qualquer local, flexibilizando o aprendizado. É o que corroboram Pimentel e Gomes (2019, s/p):

As interações podem ocorrer em tempo real (bate-papo ou videoconferência) ou por meio de mensagens ou fóruns de discussão. Esses espaços dialógicos de troca permitem que o aluno tenha contato com os materiais nos quais são mediados os conhecimentos, com o professor e com pares, por meio de uma sala de aula virtual, em qualquer lugar e a qualquer momento.

A Tabela 1 exibe de forma resumida as principais funcionalidades presentes nas plataformas Moodle e Google Classroom.

Tabela 1: Principais funcionalidades presentes nas plataformas Moodle e Google Classroom

Principais funcionalidades

Ferramentas e recursos

Moodle

Google Classroom

Material instrucional

Permite disponibilização de materiais em diferentes formatos (arquivos, imagens, vídeos, links) e compartilhamento de tela em transmissões ao vivo.

Permite disponibilização de materiais em diferentes formatos (arquivos, imagens, vídeos, links).

Comunicação e mediação

Fóruns de dúvidas; chats públicos e privados; ambiente próprio para videoconferências (com compartilhamento de tela e possibilidade de gravação).

Meet; Hangouts (chat); mural de avisos; perguntas, dúvidas e interações (fórum).

Avaliação da aprendizagem

Atividades de fixação e avaliativas produzidas; participação dos alunos em aulas ao vivo e interações nos fóruns.

Atividade; atividade com teste; perguntas.

Acompanhamento da aprendizagem

Relação de notas e acesso dos alunos à plataforma; controle de presença em aulas ao vivo e feedback.

Quadro de notas e feedback.

Metodologia

O estudo realizado apresenta uma abordagem qualitativa e foi desenvolvido como relato de experiência; os autores são professores atuantes na Educação Básica das redes privada e pública do Rio de Janeiro. Os docentes expuseram suas experiências sobre os ambientes virtuais utilizados por eles durante o ensino remoto nos anos de 2020 e 2021, o Moodle e o Google Classroom.

A plataforma Moodlefoi utilizada pelo docente que descreveu a experiência realizada em uma escola particular no município do Rio de Janeiro, com um grupo de aproximadamente 150 alunos, enquanto a experiência realizada com a plataforma Google Classroomfoi realizada em uma escola pública estadual em Cachoeiras de Macacu/RJ, com uma amostra de 145 alunos. Essa plataforma foi adotada pela Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (Seeduc/RJ) durante o período do ensino remoto.

O objetivo deste relato foi refletir a respeito dos ambientes virtuais de aprendizagem, da maneira como podem ser trabalhados e dos impactos que geram na relação dos alunos com o ensino, sem deixar de lado questões sociais que, infelizmente, ainda aparecem como grandes obstáculos enfrentados por jovens e adultos que buscam ter acesso a uma educação de qualidade.

Uma experiência na escola privada com o uso do Moodle

Já bastante conhecido nas universidades, oMoodle ganhou destaque também no Ensino Básico durante a adoção das aulas remotas ao longo da pandemia de covid-19. No entanto, em geral, seu uso teve predominância na rede privada e em algumas instituições públicas federais, como o Colégio Pedro II, provavelmente por se tratar de uma plataforma que exige custos na disponibilização e manutenção de recursos e ferramentas.

O Moodle é um ambiente virtual de aprendizagem dos mais completos, versáteis e organizados, atendendo desde o simples compartilhamento de conteúdo até a realização de aulas síncronas, criação de tarefas avaliativas com inúmeros recursos e o monitoramento de frequência e desempenho dos alunos.

Por outro lado, diante dessa complexidade, o Moodle não é algo intuitivo e fácil de ser manuseado, seja por professores, estudantes, responsáveis ou pela própria instituição de ensino. É o que relata um dos autores deste trabalho a partir de sua experiência em uma escola privada da cidade do Rio de Janeiro durante o período de aulas exclusivamente online, em 2020. O experimento envolveu um grupo de cerca de 150 alunos de todos os anos do Ensino Fundamental; o uso da plataforma era obrigatório. Porém, por motivos diversos (desemprego dos responsáveis e dificuldades de adaptação ao novo modelo de ensino, entre outros), cerca de 10% desses estudantes não cumpriram o ano letivo e, portanto, não participaram das atividades com o Moodle.

Ao longo de boa parte desse período, foram frequentes as dúvidas vindas de todos os grupos da comunidade escolar no que diz respeito ao uso da plataforma – uma completa novidade para praticamente todos os envolvidos. Atenta a isso e alinhada ao que enfatiza Pereira (2007, p. 4) no que diz respeito à necessidade de haver plena coordenação entre toda a comunidade escolar no uso de um recurso tecnológico, a escola disponibilizou a todo tempo técnicos de informática para que pudessem prestar os esclarecimentos necessários por meio das principais redes sociais, tanto em textos instrutivos quanto em áudios e vídeos divulgados.

Tudo isso permitiu que o trabalho remoto com o Moodle tivesse êxito. O ambiente permite que cada professor tenha em seu perfil acesso a todas as suas turmas, com uma espécie de pasta para cada uma. No espaço dedicado a cada classe, além de ter acesso a informações como frequência e desempenho dos estudantes ali alocados, o professor é capaz de disponibilizar todo o material usado em suas aulas (arquivos, slides e gravações) em tópicos, da maneira que melhor lhe convier, corroborando o ponto de vista de Duart e Sangrá (1999 apud Bairral, 2012, p. 78) sobre os vínculos que devem ser constituídos entre professores e alunos num ambiente virtual.

Nesse contexto, e ainda ao encontro do que dissertam Duarte e Sangrá (1999 apud Bairral, 2012, p. 78), o Moodledispõe de um software próprio para videoconferências que conta com ferramentas como compartilhamento de tela, gravação e chat. Percebe-se aqui a interação e o dinamismo defendidos por Bannell et al. (2016, p. 108) no uso de um recurso tecnológico.

A princípio, portanto, não havia necessidade do uso de recursos externos para a realização de aulas ao vivo. Mas, devido à sobrecarga do sistema e a empecilhos como a exclusão automática de reuniões gravadas depois de uma semana, o que poderia comprometer a flexibilidade de acesso do aluno às aulas passadas, a instituição precisou lançar mão de outros meios para a realização de atividades síncronas, como o Zoom e o Google Meet.

Em relação a exercícios, atividades de fixação e avaliações, o Moodle oferece suporte para a criação de questões dos mais variados tipos, que podem ser feitas em editores de texto comuns e transferidas adequadamente para a plataforma ou produzidas diretamente lá. Para os alunos, tais tarefas são disponibilizadas sob a forma de questionários a serem abertos e fechados em dias e horários estabelecidos previamente pelo professor. Além disso, há a possibilidade de o estudante resolvê-los em uma ou mais tentativas, ver seus acertos e erros e ter acesso à sua nota, sempre de acordo com os critérios predeterminados pela escola e pelos professores.

Um dos maiores dilemas enfrentados pela comunidade escolar durante o ensino remoto foi o acompanhamento da aprendizagem, que, na medida do possível, é algo contemplado pelo Moodle. Os responsáveis, por exemplo, podiam ter acesso não apenas às notas dos estudantes nas tarefas avaliativas, mas também verificar se realmente entraram na plataforma no horário previsto das aulas, por quanto tempo a acessaram e o que fizeram por lá. O Moodle traz ainda uma espécie de diário de classe, recurso oferecido ao professor para que possa sinalizar, ao longo de um período, se o aluno esteve em sua aula ao vivo, faltou, chegou atrasado ou foi dispensado, dados que também podem ser acessados a todo tempo por quem se interessar.

Uma experiência na escola pública com o uso do Google Classroom

O relato a seguir fala de uma experiência realizada em uma escola estadual no interior do Rio de Janeiro, em Cachoeiras de Macacu, utilizando a plataforma Google Classroom. As informações que são compartilhadas aqui referem-se à disciplina de Matemática, cuja amostra foi de 145 alunos. Destes, 70% não tiveram condições de realização das atividades utilizando os recursos tecnológicos oferecidos. Com isso, a Seeduc/RJ disponibilizou também as apostilas impressas para os alunos que não conseguiam acessar a plataforma. Assim, esses alunos foram à escola pegar o material impresso que deveria ser entregue em data determinada. Os outros 30% dos alunos conseguiram ter acesso à plataforma.

Durante esse período, a professora era responsável pela postagem de materiais e atividades. Estas eram diversificadas entre questões discursivas, objetivas e fóruns de discussão. A partir do desempenho de seus alunos, a docente planejava e elaborava estratégias a serem desenvolvidas nas aulas seguintes.

Com a ferramenta “Materiais”, era possível inserir vídeos, textos e links. Os materiais foram selecionados atendendo aos conteúdos referentes ao currículo de cada série, com linguagem acessível e dinâmica. Os alunos acessavam os materiais e tiravam suas dúvidas via comentários, mensagens instantâneas ou videoconferência. Os estudantes manifestavam mais preferência pelos vídeos do que pelos materiais escritos, pois conseguiam entender melhor a matéria e, posteriormente, sinalizavam os pontos que não haviam compreendido.

O material era postado no dia da semana destinado àquela aula e, no decorrer da semana, os alunos podiam perguntar por meio de mensagens; na semana seguinte, era realizada uma aula via videoconferência (Meet) na qual a professora sinalizava os pontos principais e se dispunha a esclarecer as dúvidas. Esse foi o método que eles mais gostaram. Esse é um fato observado por Tatagiba e Tatagiba (2021), uma vez que os alunos destacaram as videoconferências realizadas pelo Meet como “o recurso que mais contribuiu para a aprendizagem devido ao contato com o professor e com os colegas, uma vez que podiam esclarecer as dúvidas sobre exercícios e conteúdos que não conseguiram compreender” (Tatagiba; Tatagiba, 2021, p. 8).

Os estudantes mais tímidos, que não queriam se expor, preferiam utilizar o chat ou perguntavam por mensagem utilizando o aplicativo Hangouts. Com isso, verificamos, assim como Pimentel e Gomes (2019) já haviam apontado, que as interações ocorrem em diferentes momentos, seja por meio da videoconferência ou das mensagens, e que esse espaço virtual permite a troca de conhecimento entre eles.

Nas aulas síncronas, realizadas pelo Meet, foi possível perceber a dificuldade dos alunos em ter um local apropriado para estudos. Quando alguns iam perguntar algo e abriam os seus microfones, era possível ouvir crianças chorando, pessoas conversando e outras interferências externas que faziam o aluno fechar o microfone e utilizar o recurso do chat para realizar a sua pergunta.

Para avaliar o aprendizado, quase todos os recursos oferecidos pelo Google Classroom foram utilizados. Além dos materiais para consulta, era postada uma lista de exercícios, podendo haver variações entre questões discursivas, objetivas ou fórum de discussão.

Nas questões discursivas, os alunos respondiam em seus cadernos e postavam a foto da resolução; os que não tinham a possibilidade de fotografar podiam utilizar o editor de texto para enviar. Nesse tipo de questão, os alunos eram mais ativos, perguntavam e tiravam as dúvidas; o resultado foi considerado bom pelos professores. Verificou-se que as questões de múltipla escolha apresentaram número maior de erros, visto que a maioria dos alunos não perguntava e o resultado não foi satisfatório. Nos fóruns de discussão, foram levantadas questões do cotidiano e atualidades: os alunos discutiam a importância daquele tema na sociedade e o relacionavam com a Matemática; além disso, eles precisavam interagir com os colegas. Essa atividade foi considerada excelente, pois um aluno contribuiu com o outro com muito respeito e com colocações pertinentes. Logo, percebemos a importância da aprendizagem colaborativa. Além disso, vimos que a utilização da plataforma, além de favorecer a comunicação e a interação dos alunos e professores, permitia o armazenamento das atividades, a realização de fóruns, a publicação de avisos importantes em murais, dar feedback das atividades realizadas pelos alunos, pontos importantes que já foram apontados por Giraldo, Caetano e Mattos (2012).

O isolamento social desencadeou uma série de problemas envolvendo os alunos, entre eles o desânimo e até mesmo a depressão. Na tentativa de reanimá-los, foi realizado um jogo online com a turma – o Kahoot! - via Meet. No Kahoot! o professor pode criar perguntas que possibilitam a revisão dos conteúdos abordados. O aluno que respondesse à questão corretamente em menos tempo ganharia o jogo. Foi muito divertido, e os discentes disseram que queriam mais atividades desse tipo. Tal situação nos faz refletir sobre a fala de Moran (2004, p. 28):

Quando alunos e professores estão conectados, surgem novas oportunidades de interação, antes simplesmente impensáveis. O que vale a pena fazer quando estamos em sala de aula e quando estamos só conectados? Como combinar, integrar, gerenciar a interação presencial e a virtual? Como ‘dar aula’ quando alunos estão distantes geograficamente e podem estar conectados virtualmente?

Em vista disso, a experiência com os AVA foi positiva, pois eles oferecem vários recursos que contribuem para o acesso aos materiais e à comunicação e possibilitam a ampliação das discussões. Isso não significa dizer que as plataformas podem substituir as aulas presenciais, mas elas podem contribuir significativamente como apoio ao processo de ensino-aprendizagem.

Conclusão

Os ambientes virtuais de aprendizagem podem ser uma ferramenta tecnológica capaz de colaborar de maneira efetiva para o processo de ensino-aprendizagem. Além de oferecer recursos que permitem aos envolvidos o acesso a diversos materiais, inclusive àqueles disponíveis na rede, os AVA ainda contribuem para a comunicação, a interação e a flexibilidade no plano de estudos do aluno, já que, a princípio, não há horário fixo para acessá-los.

Sua eficiência, no entanto, assim como a de qualquer outro recurso tecnológico utilizado na Educação, não depende exclusivamente das ferramentas disponíveis neles: a predisposição da instituição ao novo e o planejamento adequado do professor são fundamentais para que um ambiente virtual não se torne apenas um repositório de conteúdo ou algo com fim em si mesmo. As atividades e os materiais disponibilizados precisam cumprir seus objetivos de forma atrativa e instigante para o aluno; caso contrário, tudo não passará de mera informatização do ensino tradicional.

Dessa forma, sob o ponto de vista da dinamização das metodologias de aprendizagem, a adoção de um AVA pode atuar efetivamente na proatividade do aluno: ao invés de apenas receber as informações, ele terá condições de pesquisar e discutir os temas abordados, tornando-se protagonista na construção do saber. O discente pode, ainda, interagir, compartilhar ideias e trocar conhecimento com todos os outros envolvidos, tornando essa aprendizagem, além de ativa, significativa e colaborativa. Para que isso ocorra, é papel do professor e da instituição se atentar às potencialidades que os AVA oferecem de acordo com os objetivos almejados para que sua escolha se justifique ao longo do processo, tal como os relatos de experiência apresentados aqui buscaram abordar.

Aliás, nesses mesmos relatos, observou-se também a discrepância entre os ensinos público e privado, uma vez que, de acordo com os dados expostos pelos autores, apenas 30% dos alunos da instituição pública aqui considerada acessaram a plataforma utilizada pela professora durante as aulas remotas em 2020, enquanto cerca de 90% dos estudantes da escola privada em questão tiveram contato com a deles. Tais fatos vêm reforçar, mais uma vez, que a falta de acesso – seja por falta de internet, equipamento tecnológico ou mesmo de estrutura familiar adequada – é um fator que ainda promove a desigualdade educacional e de acesso em nosso país.

No entanto, apesar de algumas limitações quanto ao seu uso, os AVA são excelentes ferramentas de apoio para o ensino-aprendizagem e podem ser utilizados não apenas no ensino totalmente online, mas também em perfeita harmonia com o ensino presencial, uma vez que eles oferecem recursos que contribuem para o desenvolvimento do pensamento crítico e criativo dos alunos em um ambiente que vai além da sala da aula.

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Publicado em 28 de março de 2023

Como citar este artigo (ABNT)

TATAGIBA, Lucilene de Souza; SERAFIM, Antonio Rodrigo Souza; TATAGIBA, Jocilea de Souza. Ambientes virtuais de aprendizagem em tempos de pandemia: diferentes experiências. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 11, 28 de março de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/11/ambientes-virtuais-de-aprendizagem-em-tempos-de-pandemia-diferentes-experiencias

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