A Educação de Jovens e Adultos no Brasil e o contexto social dos alunos dessa modalidade
Manoel Messias Gomes
Mestre e doutor em Ciências da Educação (Emil Brunner World University – EUA)
A EJA como política de Estado
A Educação de Jovens e Adultos (EJA), de acordo com o Art. 37 da LDBEN (Lei nº 9.394/96), é destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no Ensino Fundamental e Médio na idade própria. O §1º desse artigo afirma que os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos que não puderam efetuar os estudos na idade regular oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames.
Em seu §2º, o artigo afirma que o poder público “viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola mediante ações integradas e complementares entre si”. Já o §3º preconiza que a Educação de Jovens e Adultos deverá articular-se preferencialmente com a Educação Profissional, na forma do regulamento. Em seu Art. 38, a LDBEN assinala que os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular. Em seu §1º, esse artigo prescreve que os exames a que se refere realizar-se-ão:
- no nível de conclusão do Ensino Fundamental para os maiores de quinze anos;
- no nível de conclusão do Ensino Médio, para os maiores de dezoito anos.
Em seu §2º, o mesmo Art. 38 é claro em afirmar que “os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por meios informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames”.
O Plano Nacional de Educação (PNE, 2014-2024), em sua Meta 8, se propõe a elevar a escolaridade média da população de 18 a 29 anos “de modo a alcançar, no mínimo, doze anos de estudo no último ano de vigência deste plano” para as populações do campo da região de menor escolaridade no país e dos 25% mais pobres e “igualar a escolaridade média entre negros e não negros declarados à Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (p. 67). Em sua Estratégia 8.2, o plano se propõe a “implementar programas de Educação de Jovens e Adultos para os segmentos populacionais considerados em sua Meta 8 que estejam fora da escola e com defasagem idade-série, associados a outras estratégias que garantam a continuidade da escolarização, após a alfabetização inicial”. O Plano Nacional de Educação, em sua Meta 9, se propõe a elevar a taxa de alfabetização da população com quinze anos ou mais “para 93,5% até 2015 e, até o final da vigência deste PNE, erradicar o analfabetismo absoluto e reduzir em cinquenta por cento a taxa de analfabetismo funcional” (p. 68).
Estratégias do PNE (2014-2024)
Em suas estratégias, o PNE é claro em estabelecer:
9.1 – assegurar a oferta gratuita de Educação de Jovens e Adultos a todos os que não tiveram acesso à Educação Básica na idade própria;
9.2 – realizar diagnóstico dos jovens e adultos com Ensino Fundamental e Médio incompletos para identificar a demanda ativa por vagas na Educação de Jovens e Adultos; [...]
9.7 – implementar ações de alfabetização de jovens e adultos com garantia de continuidade da escolarização básica; [...]
9.11 – assegurar a oferta de Educação de Jovens e Adultos nas etapas de Ensino Fundamental e Médio às pessoas privadas de liberdade em todos os estabelecimentos penais, assegurando-se formação específica dos professores e das professoras e implementação de diretrizes nacionais em regime de colaboração;
9.12 – considerar, nas políticas públicas de jovens e adultos, as necessidades dos idosos, com vistas à promoção de políticas de erradicação do analfabetismo, ao acesso a tecnologias educacionais e atividades recreativas, culturais e esportivas, à implementação de programas de valorização e compartilhamento dos conhecimentos e experiências dos idosos e à inclusão dos temas do envelhecimento e da velhice na escola.
A meta 10 se propõe a oferecer no mínimo 25% das matrículas de Educação de Jovens e Adultos nos Ensinos Fundamental e Médio, na forma integrada à Educação Profissional. Em sua estratégia 10.7, o PNE se propõe a fomentar a produção de material didático, o desenvolvimento de currículos e metodologias específicas, os instrumentos de avaliação, o acesso a equipamentos e laboratórios e a formação continuada de docentes das redes públicas que atuam na Educação de Jovens e Adultos articulada à Educação Profissional (Brasil, 2014, p. 69-70).
A Educação de Jovens e Adultos na Região Nordeste
A Região Nordeste sempre foi um celeiro de experiências de campanhas de Educação Popular, principalmente de Educação de Adultos, devido a seus elevados índices de analfabetismo. Todos esses movimentos e campanhas de alfabetização popular – pelo MEB, MCP, MPC, da Ceplar, do Mobral e outros movimentos e campanhas –, em maior ou menor grau, tiveram seu momento de, mediante campanhas de alfabetização, influir positiva ou negativamente, como o caso do Mobral, que, em vez de contribuir para a diminuição do analfabetismo, contribuiu decisivamente para o aumento das taxas de analfabetismo funcional nessa região.
Sabemos que a história da EJA no Brasil perpassa a trajetória do próprio desenvolvimento da educação e vem institucionalizando-se em nossa sociedade ao longo do tempo, deixando a grande maioria dos brasileiros de fora das decisões políticas e do acesso aos direitos básicos da cidadania, entre os quais uma educação de qualidade, e dos benefícios da humanidade e do desenvolvimento econômico.
Uma escolarização inacessível ou de baixa qualidade, em que se percebem os alarmantes índices de evasão, reprovação e repetência destinada à grande maioria dos brasileiros, tem legitimado, ao longo do tempo, as diferenças instituídas socialmente.
A pobreza atinge mais de 1/3 da população dessa região (apesar da tão propagada diminuição dos índices de miserabilidade), o que significa que existem aproximadamente 55 milhões de brasileiros na pobreza e abaixo da linha da pobreza, dos quais mais de 20 milhões são indigentes que estão abaixo da linha da miséria; a grande maioria está nessa região, em que não se pode esquecer que o tamanho da pobreza neste país está relacionado ao tamanho das desigualdades e da forma perversa de distribuição das riquezas entre seu povo. Nesse cenário, o lugar ocupado pelas políticas educacionais de jovens e adultos, entre as demais políticas educacionais, tem sido bastante limitado, sendo considerada uma educação de segunda classe, pois a escassez de recursos financeiros e materiais, as práticas compensatórias, assistencialistas, aligeiradas, mecanicistas e com resultados duvidosos têm marcado historicamente a trajetória da EJA em nosso país.
Ribas e Soares (2012) esclarecem que “essa situação tem sido agravada pelo acúmulo insuficiente, no campo da avaliação, no sentido da legitimação dos resultados de muitas experiências até hoje desenvolvidas”. Dessa forma, a trajetória da EJA em nosso país, ao longo do tempo, sugere que os jovens e adultos dessa modalidade de ensino estão condenados a uma espécie de castigo que significa a sua entrada no sistema escolar, a sua não permanência e, consequentemente, a sua expulsão do sistema via reprovação ou evasão escolar.
Os dados referentes à EJA no Brasil são contundentes ao mostrar a queda contínua no número de matrículas nessa modalidade. A maior parte das matrículas de EJA no Brasil, em todas as regiões, é para turmas presenciais, tanto no Ensino Fundamental como no Ensino Médio. A opção de EJA integrada à Educação Profissional ainda registra números bem pouco expressivos e distantes da meta do Plano Nacional de Educação 2014-2024.
Em todo o Nordeste, de acordo com os dados do MEC/INEP/DEED, a matrícula total na Educação de Jovens e Adultos no Ensino Fundamental para 2015 foi de 2.181.611 pessoas. Destas, 1.937.345, foram matriculadas na modalidade presencial; 154.205 foram matriculados na modalidade semipresencial; 67.371 foram matriculados na modalidade integrada à Educação Profissional presencial e 23 alunos foram matriculados na modalidade integrada à Educação a Distância.
Com relação à modalidade EJA no Ensino Médio, o número de matriculados totalizou 360.055 alunos em todo o Nordeste em 2015. Na modalidade presencial, foram 291.521. Na modalidade semipresencial, foram 38.931 alunos matriculados. Integrado à Educação Profissional presencial, chegou-se a 27.708 alunos. Para a modalidade integrada à Educação a Distância, foram matriculados 611 alunos (MEC/INEP/DEED).
De acordo com os dados do Anuário da Educação Básica (Editora Moderna/MEC, 2019), a meta do Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024) referente à Educação de Jovens e Adultos (EJA) difere das demais por sua especificidade, ao abordar particularmente as matrículas em cursos que integram a Educação Profissional. Talvez seja uma forma de apontar um caminho para essa modalidade de ensino, cujo total de matrículas, de acordo com os dados desse documento, vem caindo nos últimos anos em todas as regiões do Brasil, principalmente na Região Nordeste. Embora algumas experiências ligadas ao mundo do trabalho se destaquem no país, a opção da EJA integrada à Educação Profissional ainda registra números pouco expressivos, tanto no Ensino Fundamental quanto no Médio (Brasil, 2014).
Ainda de acordo com o documento, o número de matriculados na Educação de Jovens e Adultos (EJA) em todo o Brasil no ano de 2018 foi de 3.906.877 alunos. Destes, 2.561.013 estavam matriculados no Ensino Fundamental. Desse total, 18.622 estavam na EJA integrada à Educação Profissional Fundamental, o que representava, naquele ano 0,73% do total de alunos na modalidade e nível de ensino. Dos 2.561.013 alunos matriculados na EJA em 2018, 1.345.864 estavam na EJA do ensino Médio; desse total, 35.993 alunos estavam matriculados na EJA integrada à Educação Profissional de Nível Médio, representando 2,67% dos alunos matriculados na modalidade de ensino. A tabela a seguir representa o total de alunos matriculados na modalidade EJA na Região Nordeste, nos níveis Fundamental e Médio no ano de 2018, apresentado no Anuário da Educação Básica.
Tabela 2: Matrícula total na EJA e na EJA integrada à Educação Profissional - 2018
2018 |
|||||||
Região Nordeste - Unidades da Federação |
Total EJA 1.419.273 |
Nível Fundamental |
Nível Médio |
||||
Total 1.014.763 |
Integrado à Educação Profissional 3.914 |
% Matrículas integradas à Educação Profissional 0,4% |
Total 404.510 |
Integrado à Educação Profissional 32.040 |
% Matrículas integradas à Educação Profissional 7,9% |
||
Maranhão |
164.450 |
137.126 |
140 |
0,1% |
27.324 |
676 |
2,5% |
Piauí |
184.671 |
144.604 |
25 |
0,0% |
38.067 |
5.031 |
13,2% |
Ceará |
168.244 |
101.306 |
268 |
0,3% |
66.938 |
6.470 |
9,7% |
Rio Grande do Norte |
65.822 |
47.833 |
206 |
0,4% |
17.989 |
382 |
2,1% |
Paraíba |
123.182 |
90.209 |
60 |
0,1% |
32.973 |
462 |
1,4% |
Pernambuco |
193.302 |
130.169 |
287 |
0,2% |
63.133 |
572 |
0,9% |
Alagoas |
118.156 |
93.602 |
2263 |
2,4% |
24.550 |
97 |
0,4% |
Sergipe |
42620 |
31.237 |
0 |
0,0% |
11.383 |
100 |
0,9% |
Bahia |
358.826 |
236.673 |
665 |
0,3% |
122.153 |
18.250 |
14,9% |
Fonte: MEC/INEP/DEED. Anuário Brasileiro da Educação Básica, 2019.
Nessa perspectiva, pode-se afirmar que o Brasil enfrenta enormes desafios com relação à educação da sua população jovem e adulta, pois, embora a taxa de analfabetismo seja frequentemente o dado que ganha mais visibilidade, os que são considerados analfabetos (incluindo os chamados analfabetos funcionais), somados aos que não concluíram o Ensino Fundamental, formam uma camada que atinge mais da metade da população acima de 15 anos de idade.
De acordo com esse documento (p. 85), a alfabetização da população de 15 anos ou mais, desafio vencido por muitas nações há um século, continua sendo o símbolo da pouca prioridade dada à oportunidade de democratização das oportunidades de acesso à educação no Brasil ao longo da história. Ainda que se leve em conta como critério de alfabetização a autodeclaração, medida pelo IBGE por meio do Censo e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), o Brasil ainda está longe da erradicação do analfabetismo absoluto.
No ritmo atual, “é possível supor que serão necessárias cerca de duas décadas para alcançar a meta estabelecida pelo PNE para 2024”. A situação é mais grave ao se assumir que o cidadão do século XXI precisa ter um domínio bem mais completo do idioma e de várias competências necessárias à sua inserção nesse mundo globalizado do que apenas a capacidade de ler e escrever o próprio nome.
Ainda de acordo com esse documento, a taxa média de alfabetização esconde graves disparidades internas. As taxas estão ainda abaixo de 85% nos estados da Região Nordeste; em Alagoas e no Maranhão estão os índices mais baixos do país. Esse quadro evidencia a necessidade de criar políticas para a Educação de Jovens e Adultos mais eficientes do que as implementadas nas últimas décadas. Essa camada, que representa a demanda potencial para a EJA, é superior ao número total de alunos atualmente atendidos no ensino básico regular.
O contexto dos alunos da EJA
Com relação ao público-alvo da Educação de Jovens e adultos, Di Pierro (2017) esclarece que são pessoas jovens, adultas e idosas pertencentes aos estratos sociais de baixa renda cujo direito à educação foi violado na infância ou na adolescência em virtude de preconceitos, de ausência ou distância de escolas, de trabalho precoce e frequência breve ou descontínua a instituições de ensino de má qualidade, onde não tiveram êxito na aprendizagem. Engloba também, segundo a autora, aquela parcela da juventude que teve acesso à escola na infância e adolescência, porém não logrou sucesso na aprendizagem, realizando percursos acidentados, marcados por reprovações e abandonos; esses jovens procuram alternativas de reinserção no sistema educativo e aceleração de estudos.
Por essas razões, de acordo com a autora, a Educação de Jovens e Adultos tem sido identificada, ao longo da história brasileira recente, com as campanhas de alfabetização, os programas acelerados de elevação de escolaridade e os exames de certificação de estudos básicos. Além disso, na cultura globalizada das sociedades contemporâneas, em que a informação, a comunicação e o conhecimento ocupam posição destacada, cabe à educação das pessoas jovens, adultas e idosas proporcionar oportunidades de atualização, qualificação, manejo de novas tecnologias e fruição cultural ao longo da vida, qualquer que seja o nível de escolaridade alcançado pelos indivíduos e comunidades.
Nessa perspectiva, é que Haddad (2017, p. 142) indica que
a persistência de enormes contingentes de pessoas jovens e adultas analfabetas ou com baixa escolaridade não pode ser analisada de maneira isolada, mas sim como mais um indicador da desigualdade no Brasil e da falta de acesso aos direitos básicos de cidadania, portanto, como causa e consequência da pobreza e da exclusão social.
Segundo o autor, quando se toma a EJA do ponto de vista de seus potenciais educandos, verifica-se que essas são justamente aquelas pessoas que as estatísticas alocam entre as mais pobres e desprovidas de direitos. E que a importância de investir na Educação de Jovens e Adultos reside no reconhecimento dessas pessoas como sujeitos de um direito universal que, em virtude das desigualdades apontadas, lhes foi negado no passado e lhes é dificultado no presente. Nesse sentido, segundo o autor, a EJA deve ser reconhecida não apenas como um processo de ensino-aprendizagem de leitura, escrita, operações matemáticas e outros conhecimentos acumulados pela humanidade que deveriam ter sido apropriados no passado, mas também como parte de um processo que se dá ao longo de toda a vida e que visa garantir possibilidades de desenvolvimento pessoal e coletivo.
Os dados da PNAD divulgados pelo IBGE mostram que a taxa de população analfabeta com mais de quinze anos teve leve variação para cima, passando de 8,6% em 2011 para 8,7% em 2012. Os dados do analfabetismo no Brasil preocupam mais em análises recortadas, como, por exemplo, na Região Nordeste: um em cada quatro homens com mais de 25 anos é analfabeto.
Isso significa que quase 25% da população masculina economicamente ativa dessa região não sabe escrever um bilhete, não consegue pegar um ônibus sozinho nem pode ler uma receita de medicamento. São pessoas impossibilitadas de participar do desenvolvimento econômico da região.
Os movimentos de educação de adultos dos anos 1960 até os dias atuais
A alfabetização de jovens e adultos na década de 1960 foi composta de vários movimentos que visavam à educação e à cultura popular. Entre eles se destacam (Brasil, 1998, p. 33):
- MEB – Movimento de Educação de Base
- MCP – Movimento de Cultura Popular
- CPC – Centro de Cultura Popular
- Ceplar – Campanha de Educação Popular.
O MEB surgiu como iniciativa da Igreja Católica. Em 1961, foi criado pelo Decreto nº 50.370, de 21 de março, assinado pelo presidente Jânio Quadros. Tratava-se de um movimento dirigido pela CNBB, mas cujas concepção e execução foram confiadas a leigos (Saviani, 2014, p. 316). A alfabetização de adultos seria realizada por meio da rede de emissoras católicas, cuja área de atuação seria nos Estados de Minas Gerais e nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, atuando principalmente no interior delas regiões, locais caracterizados pelos grandes índices de subdesenvolvimento.
A desestruturação do MEB iniciou-se durante os primeiros meses de 1964. Nessa época, alguns dos seus livros foram confiscados e classificados como de teor comunista. Em 1966, o programa encerrou-se em alguns estados devido à pressão do governo militar; voltaram a funcionar depois dos anos de 1970, com prioridade para as Regiões Norte e Nordeste do país, por seus elevados índices de analfabetismo de adultos.
O Movimento de Cultura Popular (MPC) teve origem em maio de 1960. Era um movimento ligado à Prefeitura de Recife. Tinha o apoio do governo de Miguel Arraes e de Paulo Freire, então diretor da Divisão de Pesquisa e Coordenador do Projeto de Educação de Adultos do MPC. Utilizava os Centros de Cultura e o Círculo de Cultura para alfabetizar, por meio de grupos de debate.
Os grupos de debates, segundo Cristiane Costa Brasil com base nas reflexões de Paiva (1983), serviam para elucidar as situações-problema. Nesses grupos eram utilizados materiais que auxiliavam a visualização dos problemas. Os materiais empregados possuíam temas da realidade brasileira os quais os grupos analisavam. Na primeira turma, segundo essa autora, havia cinco alunos. Deles, dois desistiram, e os três que continuaram, no trigésimo dia, já escreviam textos simples e liam pequenos textos de jornais. Sua área de atuação se restringiu ao Recife e ao Rio Grande do Norte. O grupo teve sua extinção em 1964, pois os militares consideraram o programa uma ameaça aos seus objetivos, extinguindo-o, prendendo e exilando alguns dos seus integrantes.
O Centro de Cultura Popular (CPC), fundado pela União Nacional dos Estudantes (UNE), envolvia artistas e intelectuais da época. Tinha como objetivo levar a cultura às classes mais desfavorecidas da sociedade. Utilizava peças teatrais para que o povo adquirisse cultura.
Saviani (2014), baseado nas reflexões de Fávero (2016, p. 4), esclarece que, diferentemente do CPC e MPC, o MEB “logrou intensa participação no meio rural, inclusive dando apoio decisivo à sindicalização rural”; foi o único movimento que “sobreviveu ao golpe militar e à repressão dos anos seguintes, devido a ser exclusivamente um movimento da Igreja”. Em 1963, foi criado o Departamento de Alfabetização de Adultos, onde seriam utilizados materiais como livros de literatura no ensino. Foi extinto em 1964, quando, em decorrência do Golpe Militar, suas instalações foram incendiadas para evitar o contato com as classes populares.
A Campanha de Educação Popular (Ceplar) teve origem na Paraíba em 1961. Foi criada pelo Governo Estadual. Tinha como método pioneiro a utilização em larga escala do método Paulo Freire; empregava como material central a realidade brasileira, principalmente a realidade nordestina e paraibana. Utilizava teatros populares e círculos de cultura, que eram pensados como escolas de conscientização. Tinha como objetivo o processo de conscientização da realidade. À supervisão cabia o gerenciamento de mensagens a serem difundidas e debatidas nos grupos. Sua extinção ocorreu com a instauração do Golpe Militar.
Outros movimentos e campanhas merecem ser citados, principalmente depois da Ditadura Militar, com a redemocratização do país. São programas como: Alfabetização Solidária (de 1997 até hoje), que surgiu em janeiro de 1997, no governo de Fernando Henrique Cardoso, tendo como meta a alfabetização de jovens e adultos nas Regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste. O PAS é dividido em módulos que duram seis meses. Durante o segundo semestre de 2002, o PAS passou a se chamar Alfasol e ser uma organização não governamental (ONG). O programa continua atuando na alfabetização de jovens e adultos.
Em janeiro de 2003, foi criado o Programa Brasil Alfabetizado, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que tinha como proposta e ambição a erradicação do analfabetismo no Brasil. A Secretaria Extraordinária de Erradicação do Analfabetismo – SEEA foi encarregada de organizar e coordenar o programa, cujo objetivo não é somente a alfabetização, mas também a inclusão social de pessoas analfabetas.
Considerações finais
A Educação de Jovens e Adultos, pela sua especificidade, deve ser pensada de forma diferente das outras modalidades educacionais, porque envolve sujeitos que, nas últimas décadas, tiveram o acesso garantido, mas não a possibilidade da permanência na escola em decorrência de vários fatores, como econômicos, sociais, políticos e culturais que interferem direta ou indiretamente no progresso do processo educacional. É importante ressignificar o lugar “simbólico” desses alunos, ajudá-los a superar o rótulo de fracassados e retomar com eles sua posição de sujeitos no processo educativo; ouvir esses jovens e conhecer suas histórias é importante para que se possa ver com outros olhos essa realidade, desmistificar ideias preconcebidas e rótulos que frequentemente são dirigidos a eles, “naturalizando” esse espaço como um local de alunos fracassados, atrasados, inferiores, identificados como jovens que não lograram concluir seus estudos nos padrões definidos pela escola regular.
Pelo exposto, percebe-se que o grande problema ocorrido com os programas de alfabetização de adultos em nosso país é a falta de continuidade, pois, como se pode perceber, os vários programas de erradicação do analfabetismo na Região Nordeste têm assumido a faceta de campanhas; como na medicina se faz campanha de erradicação de certas doenças, na Educação de Jovens e Adultos também se percebe essa ilusão de que através de campanhas se pode “erradicar essa chaga na educação brasileira”; os vários programas de erradicação do analfabetismo neste país são extintos quando mudam os governantes, e tudo isso por motivos políticos.
Referências
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Publicado em 09 de maio de 2023
Como citar este artigo (ABNT)
GOMES, Manoel Messias. A Educação de Jovens e Adultos no Brasil e o contexto social dos alunos dessa modalidade. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 17, 9 de maio de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/17/a-educacao-de-jovens-e-adultos-no-brasil-e-o-contexto-social-dos-alunos-dessa-modalidade
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