Experiências no ensino de Astronomia nas aulas de Ciências para alunos dos anos finais do Ensino Fundamental

A Astronomia é considerada uma área de estudos científicos, dedicada à busca pelo entendimento do universo. Esse campo envolve pesquisas sobre origem e composição do universo, descobertas de novos astros celestes, como galáxias, planetas e estrelas, a possibilidade de outras formas de vida e a evolução do universo como um todo. Para esse fim, são necessários conhecimentos de outras áreas de estudo, como Física, Química, Matemática e Biologia, entre outras áreas do conhecimento (Sanzovo; Balestra, 2019).

Na Educação Básica, os estudos sobre Astronomia foram contemplados no componente curricular de Ciências para o Ensino Fundamental - Anos Finais e nos componentes curriculares de Química, Física e Biologia para o Ensino Médio; nesse caso, cada componente curricular aborda os aspectos específicos de seus conhecimentos dentro da temática de Astronomia.

No componente curricular de Ciências (que é o de interesse neste trabalho), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é dividida em: unidade temática, objetos do conhecimento e habilidades que devem ser contempladas. A unidade temática denominada Terra e Universo abrange, para o 6º e o 7º anos, objetos de conhecimento voltados para os fenômenos terrestres; para o 8º e o 9º anos, são objetos relacionados aos conhecimentos do universo (Brasil, 2018).

Usualmente, os professores que lecionam Ciências na Educação Básica possuem formação em licenciatura em Ciências Biológicas, mais conhecida como Biologia. O ponto de atenção e preocupação está na matriz curricular dos cursos de Biologia; as disciplinas destacam-se para a área de estudo dos seres vivos, genética e evolução, entre outras áreas biológicas, mas em poucos cursos encontra-se a disciplina Astronomia como obrigatória; em grande maioria deles é oferecida como disciplina optativa no contraturno do curso; por esse motivo, não é garantido que todos os professores formados terão o conhecimento científico necessário para o trabalho nas escolas.

Outro ponto importante é que a BNCC está disposta como currículo integrado, nos objetos de conhecimento de Ciências é perceptível a presença de outros componentes curriculares, como Geografia e História. Segundo Lopes e Macedo (2011), o currículo integrado pode tornar superficiais os conhecimentos específicos de cada área, e isso acarreta a perda da particularidade existente em cada área do conhecimento.

A disposição dessa integralidade das áreas do conhecimento não garante que nas escolas elas serão trabalhadas de maneira interdisciplinar. Nesse ponto, é importante ressaltar que exista uma articulação entre as áreas para que os estudantes consigam relacionar os conhecimentos e desenvolver sua aprendizagem, mas a superficialidade pode ser um trajeto errôneo na formação dos estudantes.

Neste momento apontam-se três observações que podem dificultar o trabalho dos professores e a aprendizagem dos estudantes. Primeiro, a falta de formação e conhecimento na área de Astronomia nos cursos de licenciatura, o que ocasiona insegurança e desconforto no momento de ensinar tal conteúdo; segundo, a elaboração do currículo; e neste ponto destaca-se: elaborado por quem e para quem? A terceira e última observação é a disposição integrada dos objetos de conhecimento.

Com base nesses apontamentos, este trabalho tem como objetivo demonstrar a experiência de uma professora de Ciências licenciada em Ciências Biológicas que lecionou Astronomia para os alunos do 9º ano. Todas essas observações foram realizadas por minha própria experiência acadêmica e profissional, percebida e sentida tanto em minha formação como nos momentos em sala de aula.

A dificuldade e o desconforto compartilho com outros colegas de profissão para lecionar tal conteúdo; no entanto, reitero o meu compromisso ético e profissional na formação dos estudantes, por isso busquei caminhos de tornar o momento de aprendizagem significativo, profundo e integrado às outras áreas de conhecimento. Foram necessárias a busca por uma formação continuada sobre o tema e a associação com práticas pedagógicas que tornassem os estudantes ativos na construção de sua aprendizagem.

As metodologias ativas no processo de construção de uma aprendizagem significativa

O desenvolvimento das habilidades contempladas na unidade temática Terra e Universo do 9º ano se deu com a utilização de metodologias ativas de ensino-aprendizagem. Para Moran (2018, p. 1), a aprendizagem

é mais significativa quando motivamos os alunos intimamente, quando eles acham sentido nas atividades que propomos, quando consultamos suas motivações profundas, quando se engajam em projetos em que trazem contribuições, quando há diálogo sobre as atividades e a forma de realizá-las.

Os conteúdos que envolvem Astronomia são recebidos com bastante entusiasmo e empolgação pelos estudantes, pois é um tema que desperta a curiosidade de entender e compreender o universo que habitamos, que é um campo bastante desenvolvido em filmes, séries, histórias em quadrinhos e livros que compõem o saber cultural dos estudantes. Quando Moran (2018) fala da aprendizagem significativa, é válido contemplar e aflorar ainda mais esse interesse dos estudantes sobre o tema mediante atividades de eles que participem de forma ativa, colaborativa e reflexiva.

As metodologias ativas podem ser aliadas nesse processo de construção da aprendizagem, caracterizadas por práticas pedagógicas que estimulam a participação do estudante, que por sua vez ocupa a centralidade da construção da aprendizagem. Alguns exemplos dessas metodologias são a gamificação, que é caracterizada pela aprendizagem por meio de jogos, a rotação por estações, na qual o estudante caminha por elas e realiza as atividades propostas em cada estação, entre outras metodologias ativas.

Nesse processo, o papel do professor é

mais o de curador e de orientador. Curador, que escolhe o que é relevante entre tanta informação disponível e ajuda que os alunos encontrem sentido no mosaico de materiais e atividades disponíveis. Curador, no sentido também de cuidador: ele cuida de cada um, dá apoio, acolhe, estimula, valoriza, orienta e inspira. Orienta a classe, os grupos e a cada aluno (Moran, 2015, p. 24).

Dessa forma, o professor não é visto mais como o detentor do conhecimento e o estudante como uma caixa onde os conteúdos serão depositados; o docente é um mediador que guia o estudante em seu processo. Conforme Paulo Freire (2016), a educação é bancária na medida em que o estudante não possui tempo e espaço de ser ouvido, de participar reflexiva e criticamente, de enxergar o seu mundo e ser acolhido por ele na escola.

Metodologia

Partindo dessas concepções acerca da utilização das metodologias ativas para a constituição de um espaço colaborativo de aprendizagem entre estudante e professora, este trabalho desenvolveu algumas metodologias ativas para a contemplação das habilidades essenciais do Currículo Paulista. O desenvolvimento de tais metodologias ocorreu em três turmas de 9º ano durante um bimestre do ano letivo de 2022 em uma escola participante do Programa de Ensino Integral (PEI) da rede pública estadual de São Paulo.

Quadro 1: Habilidades essenciais de Ciências para o 9º ano na unidade temática Terra e Universo

O Quadro 1 demonstra as habilidades que foram desenvolvidas com os estudantes; adiante será relatada a forma como cada uma delas foi utilizada através das metodologias ativas de ensino e aprendizagem.

• Habilidade EF09CI14: nessa habilidade foi desenvolvida a metodologia denominada gamificação; os estudantes participaram de um caça-tesouro astronômico que envolvia perguntas e respostas acerca da composição do Sistema Solar. Para atingir o objetivo de aprendizagem da aula, os estudantes foram desafiados a trabalhar em equipe e buscar as informações adequadas para a elaboração das questões e respostas que formaram o caça-tesouro. Nessa atividade, desenvolveu-se o protagonismo do estudante na busca por informações e a cooperatividade do trabalho em equipe para atingir o objetivo final.
• Habilidade EF09CI15: nessa habilidade foi desenvolvida a metodologia da sala de aula invertida; para tal, os estudantes foram divididos em grupos e receberam o nome de alguma civilização antiga para a busca de informações acerca da sua forma de leitura do céu, como a egípcia e a chinesa, entre outras. Posteriormente, os estudantes foram convidados a relatar suas pesquisas aos colegas; nesse momento a professora agregou novas informações e contribuições sobre as pesquisas.
• Habilidade EF09CI16: nessa habilidade foi desenvolvida a metodologia da aprendizagem baseada em problemas; os estudantes deparam-se com um texto que relata a notícia do aparecimento de luzes suspeitas e não identificadas no céu noturno do Rio Grande do Sul em novembro de 2022. Após a leitura, a sala foi dividida em três grupos; um deles era a favor da existência de vida terrestre, outro grupo era contra, e o terceiro era a comunidade científica que decidiu quais argumentos foram mais contemplativos acerca da existência de vida fora da Terra. Para isso, foi necessário que os estudantes buscassem em fontes confiáveis argumentos que subsidiassem suas opiniões no debate. Dessa forma, os estudantes trabalharam o respeito a opiniões, a busca por fontes científicas e a dialogicidade.
• Habilidade EF09CI20*: nessa habilidade foi desenvolvida a metodologia de estudo de caso. Os estudantes, em um primeiro momento, assistiram ao filme Interestelar, e foi solicitado que atentassem para as tecnologias presentes no filme, como viagens no tempo, espaçonaves, inteligência artificial e os trajes dos astronautas; posteriormente, os estudantes e a professora dialogaram sobre o futuro da ciência espacial e a possibilidade real de conseguir realizar a viagem intergaláctica demonstrada no filme. Nessa atividade, os estudantes refletiram sobre o futuro de nossa espécie, os cuidados que precisamos ter para as futuras gerações e a fomentação pela pesquisa científica para que um dia as viagens espaciais longínquas sejam possíveis.
• Habilidade EF09CI17: nessa habilidade foi desenvolvida a metodologia de rotação por estações; em cada uma das estações foi disponibilizado um texto acerca de uma das fases de vida de uma estrela; em grupo, os estudantes precisaram ler o texto e ao final elaborar um mapa mental que contemplasse todas as fases evolutivas de uma estrela. Cada estação possuía um tempo cronometrado, então os estudantes precisaram de organização, concentração e foco para atingir o objetivo final que era a construção do mapa mental.

As habilidades contemplam a participação ativa dos estudantes. Ainda acerca da palavra ativa:

A ênfase na palavra ativa precisa sempre estar associada à aprendizagem reflexiva, para tornar visíveis os processos, os conhecimentos e as competências do que estamos aprendendo com cada atividade. Ensinar e aprender tornam-se fascinantes quando se convertem em processos de pesquisa constantes, de questionamento, de criação, de experimentação, de reflexão e de compartilhamento crescentes, em áreas de conhecimento mais amplas e em níveis cada vez mais profundos (Bacich; Moran, 2018, p. 39).

Como demonstrado no relato do desenvolvimento de cada habilidade, foi necessário o desdobramento de diversas competências. E é na criação e propiciação desse espaço educativo colaborativo, ativo, instigante que a aprendizagem é efetivamente percebida e sentida pelos estudantes e pela professora.

Considerações finais

Conclui-se que mediante a utilização das metodologias ativas de aprendizagem os estudantes demonstraram participação efetiva durante o desenvolvimento das aulas. Alguns estudantes explanaram a sua empolgação, como uma estudante que disse que “com essas atividades a aula passa muito rápido”; outra estudante relatou “por que não são sempre assim as aulas?”. Além da empolgação demonstrada verbalmente, os estudantes obtiveram excelentes resultados nas avaliações individuais da disciplina.

Contudo, ainda é necessária a revisão de algumas constatações já descritas neste texto; concordo com a abrangência do tema no componente curricular de Ciências, como proposto pela BNCC e pelo Currículo Paulista, pois, como mencionado, existe aceitação elevada dos estudantes e a relevância da aprendizagem desse conteúdo para noções acerca do mundo em que vivemos. No entanto, é necessário que a formação dos futuros professores contemple de maneira adequada esse conteúdo, para que possuam subsídio e domínio do conhecimento; com segurança sobre o assunto, é ainda mais tangível a elaboração de metodologias que tornem o processo de aprendizagem ativo. Para os professores que estão formados e lecionando, é importante o oferecimento adequado de formações continuadas – não formações rasas e superficiais, mas que abordem a temática de maneira profunda e rica.

Referências

BACICH, Lilian; MORAN, José (org.). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 62ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2016.

LOPES, Alice Casimiro; MACEDO, Elizabeth. Teorias de currículo. São Paulo: Cortez, 2011.

MORAN, J. M. Mudando a educação com metodologias ativas. In: Convergências Midiáticas, Educação e Cidadania: aproximações jovens. 2015. Coleção Mídias Contemporâneas. Disponível em: http://www2.eca.usp.br/moran/wpcontent/uploads/2013/12/mudando_moran.pdf.

MORAN, J. Metodologias ativas para uma aprendizagem mais profunda. In: BACICH, L.; MORAN, J. (org.). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018.

TREVISAN SANZOVO, Daniel; BALESTRA, Jayne Mateus. A Astronomia presente no ensino de Ciências numa sala de aula. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 19, nº 17, 20 de agosto de 2019. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/19/17/a-astronomia-presente-no-ensino-de-ciencias-numa-sala-de-aula.