Capacitação em diversidade e inclusão para professores da Educação Básica

Rômulo Jesuíno da Silva

Especialista em Docência (IFMG – Câmpus Arcos), trainee na Gerdau Ouro Branco

Jéssica Flávia dos Reis

Especialista em Docência (IFMG – Câmpus Arcos), microempreendedora

Paulo Willian Brunelli Viçosi

Mestre em Educação Agrícola (UFRRJ), docente do IFES

O Brasil é um dos países com maior índice de violência contra pessoas LGBTQIA+. De acordo com Bohrer (2022, p. 1), o “relatório do Observatório de Mortes e Violências contra LGBTQIA+ mostra que no ano passado 316 mortes foram registradas no país, ante 237 em 2020”. Esses números podem ser ainda maiores, diante da falta de registros mais detalhados sobre o assunto. Dentro das escolas, a ocorrência de bullying tem aumentado e um dos principais alvos são as pessoas LGBTQIA+, conforme afirma Silva (2021).

Diante disso, o professor precisa preparar-se para lidar com situações de preconceito e de violência, desde o ambiente da Educação Básica. Por meio de ferramentas tais como a mediação de conflitos, a comunicação não violenta e os conhecimentos relacionados às diversidades existentes dentro da sala de aula, conseguimos contribuir para a diminuição do bullying e, consequentemente, para a redução dos índices de violência do país.

Este artigo objetiva explanar sobre a capacitação em diversidade e inclusão LGBTQIA+ aos professores da Educação Básica. Para o alcance dessa meta, elencamos os seguintes objetivos específicos: conceituar termos pertinentes ao tema como ideologia do gênero, evidenciar a ocorrência de violência contra pessoas LGBTQIA+ para destacar a importância de tratar o assunto desde a infância e criar uma ementa de capacitação em diversidade e inclusão LGBTQIA+, com diferentes métodos de aprendizagem, incluindo também ferramentas de mediação de conflitos e divergências, além de competências socioemocionais que contribuam com a atuação dos professores no combate ao preconceito e ao bullying desde a Educação Infantil.

Justifica-se a temática escolhida devido às consequências para a vida adulta de crianças e adolescentes vítimas de bullying. O papel social do professor como educador é um diferencial a longo prazo, ensinando aos alunos o respeito e os apoiando na construção de uma sociedade mais pacífica e inclusiva.

O método selecionado para a elaboração da pesquisa foi a análise bibliográfica de textos científicos: “Quais disciplinas são importantes para um curso de capacitação em diversidade e inclusão LGBTQIA+?”. Um dos fatores determinantes para a escolha do tema foi a participação do autor no programa TODXS Embaixadorxs. Por meio de uma série de oficinas e treinamentos online, o curso evidencia a relevância da inclusão nos mais diferentes ambientes, entre eles, o escolar (Todxs, 2022).

A pesquisa foi dividida em sessões. No referencial teórico, alguns termos foram conceituados para o nivelamento sobre a temática escolhida. Já na sessão da metodologia, as etapas da pesquisa foram detalhadas, enquanto na sessão da análise dos resultados, o papel do docente foi descrito e a proposta da ementa de cursos de capacitação foi feita. Nas considerações finais, a conclusão sobre o estudo foi mostrada, inclusive com suas limitações, sendo seguida pelos agradecimentos.

Antes de discutir quais disciplinas podem estar contidas em um curso de capacitação para docentes da Educação Básica, conceituaremos alguns termos relevantes, ressaltando a relevância do tema.

A seguir, algumas definições foram evidenciadas, como a sigla LGBTQIA+, o termo bullying, aideologia de gênero, o nome social, a mediação de conflitos e a comunicação não violenta

LGBTQIA+

De acordo com a Organização Fundo Brasil (OFB, 2022), na sigla LGBTQIA+ há diferentes segmentos da população não heterossexual, conforme visto no Quadro 1.

Quadro 1: Significado da sigla LGBTQIA+

Sigla

Significado

L

Lésbicas: mulheres que sentem atração afetiva/sexual pelo mesmo gênero.

G

Gays: homens que sentem atração afetiva/sexual pelo mesmo gênero.

B

Bissexuais: homens e mulheres que sentem atração afetivo/sexual pelos gêneros masculino e feminino.

T

Transgênero: podem ser transgênero (homem ou mulher), travesti (identidade feminina) ou pessoa não binária.

Q

Queer: transitam entre as noções de gênero, como é o caso das drag queens.

I

Intersexos: está entre o feminino e o masculino. As suas combinações biológicas e desenvolvimento corporal não se enquadram na norma binária.

A

Assexuais: não sentem atração sexual por outras pessoas, independente do gênero.

+

Outras denominações: outras identidades de gênero e orientações sexuais que não se encaixam no padrão cis-heteronormativo, mas que não aparecem em destaque antes do símbolo.

Fonte: Adaptado de OFB, 2022.

Bullying

Segundo Alves e Ferreira (2019, p. 82), “bullying é considerado uma ocorrência descrita com atos de violência física ou verbal, que acontece de maneira continua e proposital envolvendo um ou mais indivíduos”. Já para Buffara (2019, p. 1), bullying são as “violências físicas, verbais, morais e psicológicas praticadas por indivíduos, grupos ou instituições, e os discursos de ódio que violam princípios como igualdade, liberdade e dignidade”. Um local onde essas ocorrências vêm crescendo é no ambiente escolar:

A violência na escola ocorre de diversas maneiras, sendo presente na maioria das vezes durante a infância e adolescência. Nos dias atuais o bullying está cada vez mais explícito, ocorrendo muitas das vezes pelos professores, colegas de classe e figuras presente no ambiente educacional. Ele é representado na maioria das ocasiões de forma autoritária, sendo refletido nos relacionamentos interpessoais (Alves; Ferreira, 2019, p. 84).

Ainda sobre a escola, Soares e Monteiro (2019, p. 297) afirmam que “a falta de um diálogo acerca da diversidade sexual contribui para o silenciamento, invisibilidade e exclusão das pessoas que assumem padrões fora da matriz heterossexual, principalmente no ambiente escolar”. Diante disso, importa que o tema seja tratado nas salas de aula, desde o Ensino Básico.

Ideologia de gênero

Reis e Eggert (2017, p. 21) comentam que “é preciso promover uma ideologia de gênero em que o masculino e o feminino tenham condições de estar em pé de igualdade, inclusive para combater as violências”. Quanto a esse conceito, não é isso que se vê na prática, conforme argumentam Miskolci e Campana (2017, p. 725):

a ideologia de gênero é um instrumento político-discursivo de alienação com dimensões globais que busca estabelecer um modelo totalitário com a finalidade de impor uma nova antropologia a provocar a alteração das pautas morais e desembocar na destruição da sociedade.

No contexto escolar, “no debate ocorrido em torno do Plano Nacional de Educação, o termo “ideologia de gênero foi utilizado por quem defende posições tradicionais, reacionárias e até fundamentalistas em relação aos papéis de gênero do homem e da mulher” (Reis; Eggert, 2017, p. 17).  Diante disso, a ideologia do gênero, como é vista na prática, necessita ser combatida e substituída pelos direitos do público LGBTQIA+.

Direitos do público LGBTQIA+

Relacionamos no Quadro 2 alguns direitos do público LGBTQIA+, de acordo com Soares e Monteiro (2019) e a Editora Fórum (2022).

Quadro 2: Alguns direitos do público LGBTQIA+

Direito

Detalhamento

De nome social e identidade de gênero

Possibilidade de retificação do nome e do gênero de pessoas transgênero, independentemente de realização de cirurgia de transgenitalização ou qualquer outro procedimento médico.

De trabalho e educação

Conquistas de títulos acadêmicos e postos de trabalho por pessoas transexuais e travestis, manchete constante nas mídias; a inserção dessa discussão em livros didáticos, obras literárias e avaliações para ingresso nas universidades.

De combate à violência

Ampliação da legislação acerca da violência e desigualdade de gênero. A transfobia, juntamente com a homofobia, foi equiparada ao crime de racismo.

De união estável e casamento civil

Uniões estáveis e casamento no civil entre pessoas do mesmo sexo, em igualdade de condições em relação às uniões heterossexuais.

De cadeias

Presas transexuais femininas sejam transferidas para presídios femininos.

De doação de sangue

Limitação da doação de sangue por homens gays foi considerada inconstitucional.

Adoção de crianças

Reconhecida a possibilidade de adoção por casais homoafetivos, sem restrição de idade.

Fonte: Adaptado de Soares e Monteiro, 2019, e Editora Fórum, 2022.

Mediação de conflitos e competências socioemocionais

De acordo com Vieira, Felipe e Hammes (2022, p. 3), “a mediação de conflitos tem sido uma ferramenta muito usada para que através de um diálogo entre os envolvidos, seja produzido um acordo como um caráter resolutivo em algumas situações conflituosas”. Um ambiente onde essa ferramenta pode ser aplicada é o ambiente escolar. Para que a mediação de conflitos ocorra de forma efetiva, o docente deve ser capacitado para isso e possuir competências socioemocionais.

Para Marin et al. (2017, p. 92), “a competência socioemocional é um construto complexo, que compreende outros conceitos, como o de habilidades, estando relacionado aos conceitos de inteligência emocional e desenvolvimento socioemocional”. Diante disso, tal questão poderá ser tratada em uma capacitação para professores, conforme veremos nos resultados desta pesquisa.

Comunicação não violenta

A comunicação não violenta (CNV) “busca aprimorar os relacionamentos interpessoais, nos ligando às nossas necessidades e às dos outros, com a finalidade de falar sem machucar e ouvir sem se ofender. Trata-se de uma abordagem que pode ser aplicada a todos os níveis de comunicação, nos mais variados contextos” (Silva et al., 2020, p. 5), inclusive no escolar.

Para Ferreira (2019, p. 8), a CNV é uma ferramenta eficiente “para a promoção dos diálogos necessários ao tratamento dos pontos tensionais, resolução de conflitos e fortalecimento de posturas respeitosas e trato refinado na relação aluno professor”. Ou seja, ela pode ser utilizada por professores na mediação de conflitos, conceito já apresentado.

Dados estatísticos sobre o público LGBTQIA+

Os dados estatísticos apresentados neste capítulo ilustram a importância de se tratar da temática desde a Educação Básica, com o intuito de ensinar sobre inclusão e diversidade e, como consequência, reduzir os números da violência ocorrida com o público LGBTQIA+. Segundo a Pesquisa Nacional sobre Estudantes LGBTQIA+, “73% dos jovens entre 13 e 21 anos já foram vítimas de agressão verbal na escola em função de seu gênero ou sexualidade” (Saldanha, 2016 apud Torres; Silva, 2021, p. 194).

O relatório divulgado pelo Grupo Gay da Bahia informa que 329 LGBTQIA+ “tiveram morte violenta no Brasil, vítimas da homotransfobia, em 2019. Foram 297 homicídios e 32 suicídios. Isso equivale a uma morte a cada 26 horas” (Torres; Silva, 2021, p. 194). Outra pesquisa, baseada em informações do Sistema Único de Saúde (SUS), evidenciou que a cada hora um LGBTQIA+ é agredido. “Entre 2015 e 2017, data em que os dados foram analisados, 24.564 notificações de violências contra essa população foram registradas, o que resulta em uma média de mais de 22 notificações por dia” (Torres; Silva, 2021, p. 197). Esses e outros dados existentes, mas não mencionados nesta pesquisa, evidenciam o quanto esse assunto é urgente e necessário.

Metodologia

A metodologia escolhida para este estudo foi a pesquisa bibliográfica descritiva. A pesquisa bibliográfica “geralmente é o primeiro passo de qualquer pesquisa científica; procura explicar um problema a partir de referências já publicadas” (Oliveira, 2019, p. 14). Ela é descritiva, pois “visa observar, registrar, analisar, classificar e interpretar os dados sem interferência, sem manipulação do pesquisador” (Assis, 2018, p. 18). Para as análises teóricas dos capítulos do referencial, além dos resultados e das discussões, foram pesquisados textos e dados no Google Acadêmico e em outras fontes de informações científicas.

Alguns termos pesquisados foram: LGBTQIA+, bullying, capacitação em diversidade e inclusão. Como critérios de inclusão, buscou-se utilizar fontes de informações mais recentes, a partir de 2017, sendo que a pesquisa foi feita entre os meses de agosto e outubro de 2022. Também houve uma análise crítica do conteúdo das referências obtidas, como artigos, informações de sites governamentais, de editoras e ONGs, por exemplo, descartando os textos não pertinentes ao tema proposto.

Com enfoque na proposta da ementa para a capacitação docente, pesquisou-se sobre cursos já oferecidos relacionados à inclusão do público LGBTQIA+. Cabe ressaltar a dificuldade de encontrar a capacitação dessa temática direcionada a docentes do Ensino Básico, sendo que a maioria tratava da inclusão como um todo, abrangendo alunos com deficiências e de diferentes etnias.

Cursos generalistas ou com outros enfoques não foram considerados. Os escolhidos, por mais que não fossem voltados diretamente para os docentes da Educação Básica, tratavam diretamente da inclusão LGBTQIA+ em diferentes ambientes, entre eles o educacional. O Quadro 3 ilustra os selecionados.

Quadro 3: Capacitações sobre a temática LGBTQIA+

Instituição

Ano

Nome da capacitação

Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac)

2018

Diversidades: gênero e sexualidade

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

2018

Notificação de Violência Motivada por LGBTfobia para profissionais da Saúde, Assistência Social e Educação

Secretaria Especial de Direitos Humanos da Prefeitura de Juiz de Fora (SEDH/PJF)

2021

Sensibilização e Capacitação para Atendimento à População LGBTQIA+

Núcleo de Políticas LGBT da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

2021

Sensibilização e Capacitação de Servidoras e Servidores sobre Diversidade Sexual e de Gênero

Universidade de São Paulo (USP)

2022

Diversidades e Inclusão Social em Direitos Humanos

Instituto Federal de Alagoas (IFAL)

2022

População LGBTQIA+: notas sobre saúde mental, assédio e preconceito

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

2022

Combate à Violência contra a Mulher e Respeito aos Direitos da População LGBTQIA+

Análise dos resultados

Antes de propor um curso voltado para docentes da Educação Básica, primeiramente discutiu-se o papel do professor na inclusão LGBTQIA+. Com isso, esta seção foi dividida em dois temas, sendo inicialmente detalhado o protagonismo do educador para melhorias sociais e, em seguida, a análise de uma ementa voltada para o curso de capacitação.

Protagonismo docente

Segundo Torres e Silva (2021, p. 200), “o papel do professor é, sobretudo, necessário para que a sala de aula não seja um ambiente reprodutor de preconceitos estereotipados pela sociedade, e sim um espaço de construção de igualdade e respeito”. Ainda Torres e Silva (2021, p. 201):

O docente, para ser um bom orientador e formador de valores precisa exercitar interiormente questões ligadas a gênero e sexualidade, livrando-se de preconceitos e tabus. Faz-se necessário que o professor tenha a devida preocupação em esclarecer e orientar os alunos de modo instrutivo e significativo.

Soares e Monteiro (2019, p. 287) afirmam que “inserir o tema em sala de aula depende quase que exclusivamente da disposição pessoal do/a professor/a em enfrentar todas as adversidades na afirmação dos direitos de igualdade”. Dessa forma “é fundamental que o educador foque em estratégias pedagógicas para discutir sobre a intolerância dentro de sala de aula, principalmente, visando problematizá-los” (Torres; Silva, 2021, p. 201). O docente necessita “oferecer espaços de escuta em que os discentes se sintam seguros para assumir sua sexualidade sem o medo de sofrer repressão, críticas e julgamentos” (Torres; Silva, 2021, p. 199).

Uma das propostas que possibilitam o professor acompanhar essas transformações é a formação continuada, que tem como objetivo possibilitar melhorias no processo ensino-aprendizagem, oferecendo acesso ao que há de mais novo na área, contribuindo com novas metodologias a fim de agregar e conceder mais suporte para seus alunos, proporcionando assim uma melhor atuação desse docente (Torres; Silva, 2021, p. 201).

Sobre a formação continuada, Soares e Monteiro (2019, p. 287) afirmam que o curso de capacitação sobre a temática LGBTQIA+ para professores, contribui “para ampliar a visão dos/as docentes acerca da construção sociocultural das identidades sexuais e de gênero”. Isso gera como consequência a inclusão de atividades sobre o tema no contexto escolar em diferentes níveis (Soares; Monteiro, 2019).

Proposta de ementa

Para propor uma ementa voltada para a capacitação de professores da rede básica de ensino com a temática da inclusão LGBTQIA+, além dos conceitos teóricos já apresentados, analisamos os conteúdos dos cursos escolhidos no Quadro 4.

Quadro 4: Principais assuntos das capacitações escolhidas

Nome da capacitação

Principais conteúdos

Diversidades: Gênero e sexualidade (Senac, 2018)

Definições sobre a temática; questões históricas; preconceito, violência e família; direitos.

Notificação de Violência Motivada por LGBTfobia para Profissionais da Saúde, Assistência Social e Educação (UFRGS, 2018)

Diversidade sexual e de gênero; violência ao público LGBTQIA+; notificação da violência.

Sensibilização e Capacitação para Atendimento à População LGBTQIA+ (SEDH/PJF, 2021)

Identidade de gênero; orientação sexual e afetiva; cultura, direitos e Políticas Públicas para LGBTQIA+; serviço de acolhimento aos usuários LGBTQIA+.

Sensibilização e Capacitação de Servidoras e Servidores sobre Diversidade Sexual e de Gênero (UFPE, 2021)

Uso do nome social e demais direitos do público LGBTQIA+. Noções sobre corporalidade, identidade de gênero, expressão de gênero, orientação sexual/afetiva, incentivo ao respeito, combate à discriminação e laicidade.

Diversidades e Inclusão Social em Direitos Humanos (USP, 2022)

O módulo IV do curso fala exclusivamente da diversidade sexual, algumas temáticas tratadas são: promoção da igualdade; conceitos e histórico; violência ao público LGBTQIA+; ações governamentais e direitos; participação política.

População LGBTQIA+: notas sobre saúde mental, assédio e preconceito (IFAL, 2022)

Combate à homofobia para a construção de uma sociedade livre de preconceitos e igualitária, independente do gênero sexual.

Combate à Violência Contra a Mulher e Respeito aos Direitos da População LGBTQIA+ (UFSC, 2022)

Responsabilidade social e institucional, inclusão e direitos humanos nas universidades; injustiça e a desigualdade social sistêmica, multidimensional; conceitos; múltiplas formas de discriminação; violências de gênero; ações afirmativas e as diversidades.

Comparando os conteúdos, observa-se que mais de uma capacitação mencionou os conceitos relacionados à temática, sendo a uma disciplina necessária também para os docentes, para o nivelamento dos conceitos básicos. Outro tema recorrente foi direitos do público LGBTQIA+, necessário em um curso para professores, principalmente por ser um assunto aplicado no ambiente escolar, assim como o nome social, por exemplo (Soares; Monteiro, 2019). Ainda de maneira convergente, mais de um curso mencionou a questão da violência, o que é igualmente válido para uma capacitação para docentes, principalmente por mostrar a importância de se tratar o tema nas escolas.

Com enfoque na ação docente, seu protagonismo necessita ser destacado, sendo uma disciplina proposta como forma de encorajar o professor quanto ao tema desafiador (Torres; Silva, 2021). Outro conteúdo focado no público docente é o bullying, sobre o qual o educador aprenderá modos e ferramentas de intervenção para o enfrentamento do preconceito com os alunos LGBTQIA+. Entre esses recursos, temos a comunicação não violenta e o uso das competências socioemocionais (Marin et al., 2017).

Finalizada a teoria do curso proposto, incluímos ações práticas para serem executadas em sala de aula. Com isso, uma disciplina será composta por diferentes planos de aula com a temática LGBTQIA+, servindo de referência para os docentes participantes que podem livremente adaptá-los para suas turmas.

Para a finalização do curso, o professor deverá obrigatoriamente ministrar alguma aula sobre a inclusão LGBTQIA+, escolhendo como base alguma disciplina sobre atividades práticas ou criar sua própria metodologia. Essa exigência garante que algum assunto teórico abordado no curso seja efetivamente repassado aos alunos, com o intuito de formar mais que bons estudantes nas disciplinas básicas, mas pessoas de bem para a sociedade.

Diante das análises, foi criada a ementa apresentada no Quadro 5. Cabe destacar que não foi mencionada a carga horária para cada disciplina, visto que a proposta pode ser adaptada para diferentes tipos de capacitação. Dessa forma, caso se escolha criar um curso de especialização, por exemplo, ele terá uma carga horária maior em cada tema se comparada à carga de um curso de extensão. A forma de apresentação também pode variar, tendo aulas presenciais, virtuais síncronas ou assíncronas e híbridas.

Quadro 5: Ementa mínima proposta

Tipos de capacitação

Temas a serem ministrados

Curso de extensão; curso de formação inicial e continuada (FIC); curso de especialização;

seminários.

Conceitos sobre a temática LGBTQIA+.

Direitos e ações governamentais para o público LGBTQIA+.

Violência ao público LGBTQIA+: realidade brasileira.

Protagonismo docente: papel social na mudança da comunidade.

Mediação de conflitos no combate ao bullying.

Planos de aula e atividades acadêmicas sobre LGBTQIA+.

Trabalho de conclusão de curso: aplicação prática.

Considerações finais

Diante da pesquisa feita é possível considerar a importância do tema para o meio escolar, porém que se amplia para a sociedade como um todo. O problema de pesquisa foi respondido, ao investigar quais são as disciplinas as quais podem fazer parte da ementa de uma capacitação voltada para professores da educação básica, atingindo assim ao objetivo geral. Os objetivos específicos foram igualmente alcançados, ao conceituar diferentes termos relevantes ao tema como a sigla LGBTQIA+, por exemplo.

Também se evidenciaram algumas estatísticas quanto à violência com o público LGBTQIA+; um dos dados mostraram que mais de 70% desses jovens já sofreram algum tipo de violência, o que ilustra o quanto o preconceito é ainda presente. Por fim, ao verificar uma possível ementa para capacitação docente, foi visto que há conteúdos comuns em diferentes cursos já existentes sobre diversidade e inclusão LGBTQIA+ sendo eles relevantes também para os professores da educação básica e, por isso, incluídos na ementa proposta.

Outras disciplinas voltadas para o docente foram acrescentadas à ementa, pois elas podem facilitar no enfrentamento da violência do e bullying, visto que o professor é sujeito ativo na sociedade, que ao ser capacitado para educar sobre inclusão, pode ser protagonista na comunidade. Sendo a principal contribuição deste estudo, a ementa proposta poderá ser utilizada por instituições de ensino, como maneira prática de incluir o tema nas aulas da educação básica.

Uma limitação do estudo foi a impossibilidade de criar os conteúdos de cada disciplina proposta e oferecer a capacitação, visto que o pesquisador não trabalha atualmente em instituição de ensino. Diante disso, uma possibilidade de novos estudos é a criação desses conteúdos e efetivar a capacitação, verificando a opinião dos professores sobre a ementa e quanto ao curso oferecido no geral.

Referências

ALVES, G. L; FERREIRA, R. M. O bullying no ambiente escolar. Revista Saúde e Meio Ambiente – RESMA, Três Lagoas, v. 9, n° 3, p. 82-96, ago./dez. 2019.

ASSIS, M. C. Metodologia do trabalho científico. João Pessoa: Editora Universitária UFPB, 2018.

BOHRER, L. Brasil é o país que mais mata pessoas LGBTQIA+ no mundo pelo quarto ano consecutivo. Rede Brasil Atual [online], São Paulo, 12 de maio de 2022. Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/brasil-e-o-pais-que-mais-mata-pessoas-lgbtqia-no-mundo-pelo-quarto-ano-consecutivo/. Acesso em: 09 out. 2022.

BUFFARA, J. M. M. Conceitos sobre gênero e diversidade: um desafio para a sociedade e o direito. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 30, n° 1, p. 1-4, 2022.

EDITORA FÓRUM. 7 Direitos LGBTQIA+ para conhecer e respeitar. Fórum [online], Belo Horizonte, 21 jun. 2022. Disponível em: https://www.editoraforum.com.br/notícias/7-direitos-lgbtqia-para-conhecer-e-respeitar/. Acesso em: 08 out. 2022.

FERREIRA, L. L. O. O uso da comunicação não violenta como possibilidade de intervenção nas relações interpessoais entre os estudantes. 2019. 46f. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização) – Curso de Formação de Educadores para a Educação Básica, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2019.

INSTITUTO FEDERAL DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DE ALAGOAS (IFAL). Comitê Nacional de Saúde e Qualidade de Vida dos IFs debate. Notícias. Orgulho LGBTQIA+. Maceió, 06 de junho de 2022. Disponível em: https://www2.ifal.edu.br/noticias/comite-nacional-de-saude-e-qualidade-de-vida-dos-ifs-debate-orgulho-lgbtqia. Acesso em: 06 out. 2022.

JUIZ DE FORA (Prefeitura). Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH/PJF). SEDH oferece capacitação para atendimento à população LGBTQIA+. Juiz de Fora, 4 de agosto de 2021. Disponível em:  https://www.pjf.mg.gov.br/noticias/view.php?modo=link2&idnoticia2=71866. Acesso em: 04 out. 2022.

MARIN, A. H. et al. Competência socioemocional: conceitos e instrumentos associados. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, v. 13, n° 2, p. 92-103, 2017.

MISKOLCI, R.; CAMPANA, M. Ideologia de gênero: notas para a genealogia de um pânico moral contemporâneo. Revista Sociedade e Estado, v. 32, n° 3, p. 725-747, set./dez. 2017.

ORGANIZAÇÃO FUNDO BRASIL (OFB). Significado da sigla LGBTQIA+. Fundo Brasil [online], São Paulo, 2022. Disponível em: https://www.fundobrasil.org.br/. Acesso em: 05 out. 2022.

OLIVEIRA, S. V. W. B. Tipos de pesquisa. São Paulo: USP, 2019.

REIS, T.; EGGERT, E. Ideologia de gênero: uma falácia construída sobre os planos de educação brasileiros. Educ. Soc., Campinas, v. 38, n° 138, p. 9-26, jan./mar. 2017.

SERVIÇO NACIONAL DO COMÉRCIO (SENAC). Diversidades: gênero e sexualidade. São Paulo: Senac, 2018. Disponível em: https://www.cursosead.sp.senac.br/diversidade_genero_ sexualidade/. Acesso em: 03 out. 2022.

SILVA, L. N. S. et al. Guia prático para a comunicação não violenta. Teresina: MPPI, 2020.

SILVA, V. C. O lugar de jovens trans na escola: os percursos e experiências trans na escola. 2021. 160f. Dissertação (Mestrado em Ciências da Educação) - Universidade do Porto, Porto, 2021.

SOARES, Z. P.; MONTEIRO, S. S. Formação de professores/as em gênero e sexualidade: possibilidades e desafios. Educar em Revista, Curitiba, v. 35, n° 73, p. 287-305, jan./fev. 2019.

TODXS. Por um Brasil inclusivo e livre da discriminação. Todxs [online], São Paulo, 2022. Disponível em: https://www.todxs.org/. Acesso em: 07 out. 2022.

TORRES, M. S.; SILVA, S. A. R. Práticas inclusivas para a população LGBTQIA+: uma abordagem necessária nas escolas. In: GUIMARÃES, A. L. Saúde e tecnologias educacionais: dilemas e desafios de um futuro presente. Rio de Janeiro: Epitaya, 2021. p. 193-204.

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP). Diversidades e inclusão social em direitos humanos – Módulo IV. Diversidade sexual. São Paulo, 2022. Disponível em: https://cursos extensao.usp.br/course/view.php?id=3029&section=4. Acesso em: 15 ago. 2022.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO (UFPE). Núcleo de Políticas LGBT oferece curso de sensibilização e capacitação sobre diversidade sexual e de gênero, Recife, 03 de fevereiro de 2021. Disponível em: https://www.ufpe.br/agencia/noticias/-/asset_publisher/dlhi8nsrz4hK/content/nucleo-de-politicas-lgbt-oferece-curso-de-sensibilizacao-e-capacitacao-sobre-diversidade-sexual-e-de-genero/40615. Acesso em: 01 out. 2022.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL (UFRGS). Violência contra a população LGBT é tema de capacitação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 09 de maio de 2018. Disponível em:  http://www.ufrgs.br/ufrgs/noticias/violencia-contra-a-populacao-lgbt-e-tema-de-capacitacao. Acesso em: 02 out. 2022.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA (UFSC). Inscrições abertas para curso combate à violência contra a mulher e respeito aos direitos da população LGBTQIA+. Florianópolis, 31 de agosto de 2022. Disponível em: https://capacitacao.ufsc.br/inscricoes-combate-violencia/. Acesso em: 30 set. 2022.

VIEIRA, M. A.; FELIPE, M.; HAMMES, L. J. Mediação de conflitos no espaço escolar. Revista Latino-Americana de Estudos Científicos - Relaec, v. 3, n° 13, p. 1-21, jan./fev., 2022.

Agradecimentos

Agradeço aos idealizadores do programa TODXS Embaixadorxs, pelos ensinamentos repassados, os quais geraram o desejo de aprofundar o tema da inclusão LGBTQIA+ nos diferentes meios.

Publicado em 22 de agosto de 2023

Como citar este artigo (ABNT)

SILVA, Rômulo Jesuíno da; REIS, Jéssica Flávia dos; VIÇOSI, Paulo Willian Brunelli. Capacitação em diversidade e inclusão para professores da Educação Básica. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 32, 22 de agosto de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/28/capacitacao-em-diversidade-e-inclusao-para-professores-da-educacao-basica

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.