A importância da contação de história na Educação Infantil
Vinícius Borovoy de Sant’Ana
Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, mestre em Ensino
Fabiana da Silva Correia
Professora de instituição particular, graduada em Pedagogia
O presente memorial tem como objetivo apresentar minhas experiências como discente no curso de Pedagogia da Fundação Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro (Cecierj) no polo de Paracambi, apresentando relatos de minhas aprendizagens sobre a importância da contação de histórias na Educação Infantil. Será dividido em três seções. Na seção 1, intitulada “O começo de um sonho”, haverá relatos da minha vida, da minha escolaridade e da escolha pela Pedagogia. Na seção 2, “A caminhada nas trilhas da Pedagogia”, abordo relatos da caminhada durante os períodos no curso de Pedagogia e situações enfrentadas nessa época. Na seção 3, ‘Realizando o sonho”, faço a narrativa da satisfação que foi ter alcançado a tão sonhada graduação após tantas batalhas.
O começo de um sonho
Todo amanhã se cria num ontem, através de um hoje [...]. Temos de saber o que fomos, para saber o que seremos
Paulo Freire
Ao iniciar este memorial meu coração se contrai pelo fato de colocar no papel com singelas palavras minhas experiências educacionais e de vida. Confesso sentir um misto de alegria, tristeza e gratidão ao lembrar de tantas histórias. Proponho ao leitor, leitura prazerosa e reflexiva da minha narrativa.
Nasci no Rio de Janeiro, na Baixada Fluminense. Filha de Vilma, mãe guerreira e espetacular, e de pai ausente. Conheço meu pai, mas tive pouco de sua presença em minha infância, porém tive uma ótima criação da minha mãe, que me deu todo carinho, atenção, educação e conselhos até o dia de hoje, sendo uma grande incentivadora do meu sucesso pessoal e educacional.
Comecei a vida escolar estudando com a professora Sônia. Eu tinha apenas cinco anos de idade e me recordo como se fosse hoje que ela usava a sala de sua casa para acolher e alfabetizar as crianças da vizinhança. Até hoje consigo visualizar as crianças sentadas em bancos ao redor de uma mesa enorme no meio da sala. Naquela época não existia pré-escola, então, era comum crianças aprenderem a ler e a escrever nas chamadas escolinhas de fundo de quintal. Lembro desses momentos como um tempo de muita afetividade entre a professora e seus alunos.
Aos seis anos de idade fui matriculada na Escola Municipal Washington Luiz, atualmente Escola Municipal Celita Rodrigues de Andrades (homenagem a uma antiga diretora que tive o prazer de conhecer). Conclui ali meu primeiro segmento do Ensino Fundamental. Essa foi a minha primeira experiência educacional em uma unidade escolar regulamentada e foi uma passagem marcante em minha vida.
No Colégio Estadual João Santos Souto fiz o segundo segmento do Ensino Fundamental, onde vivi grandes alegrias. Nessa época já ia para a escola sozinha, o que era o sonho de muitas crianças da minha idade. Nesta unidade escolar passei por um difícil conflito: o bullying. Isso marcou a vida das crianças durante os recreios. Lembro-me do fato de ter um professor para cada matéria e de criar certa confusão em minha cabeça. Porém, fui seguindo a vida escolar e, desde aquela época, já sabia que só a educação e a dedicação aos estudos poderiam me proporcionar um futuro melhor.
Continuei a estudar no Colégio Estadual João Santos Souto, fazendo o 1º e 2º anos do Ensino Médio. No ano de 1999, aos 16, me vi envolvida em um grande dilema por estar grávida do meu primeiro filho. A situação permeava minha mente de dúvidas e a inexperiência do momento me fizeram dar uma pausa nos estudos a fim de me dedicar à gravidez. Essa responsabilidade, que geralmente tem um peso maior para a mãe, acaba dificultando a sua trajetória acadêmica e profissional, conforme afirma Miller:
A experiência subjetiva de ser mãe, em contraste com as “imagens antecipadas” acerca da maternidade, pode lançar a vida de mulheres em uma temporária confusão. Quando esta experiência está associada às exigências acadêmicas, como podemos notar, a situação revela-se ainda mais complexa (Miller, 2005, p. 56).
A partir daquele momento difícil e emblemático, embarquei na árdua tarefa de ser mãe de família, assim como dona de casa no auge da adolescência, porém continuei com o sonho de terminar meus estudos.
No ano de 2002, nascia o meu segundo filho, agora uma menina chamada Bárbara, e em 2005, minha terceira filha veio ao mundo, Débora. Concluir meus estudos era um sonho que precisava continuar guardado, não sendo possível o retorno naquele momento.
As responsabilidades com a casa e as crianças eram enormes, ao mesmo tempo eu sentia um grande prazer em poder me dedicar totalmente à criação deles. Quando as crianças completaram a idade escolar, pude acompanhá-los à escola. Assim, enquanto caminhávamos até lá, acendia em mim a chama da educação e a vontade de retomar os estudos.
Em 2007, retornei ao cenário escolar para cursar o 2° ano do Ensino Médio – Formação de Professores, o Normal. O magistério seria a melhor opção, pois “ser professora” me dava uma nova perspectiva de vida. Além dos cuidados com as crianças e com a casa, eu me via totalmente envolvida com o magistério e as questões educacionais. Contudo, a vida se tornava um pouco mais complicada. A convivência com amigos de turma, os trabalhos escolares e os estágios me deram forças para continuar na luta. Dessa época, destaco as aulas das professoras Eliana Rosa, de Artes, e Eliana Melo, de Conhecimentos Didáticos Pedagógicos em Educação Infantil. A última, fez com que eu me apaixonasse pela Educação Infantil.
O ano de conclusão do Ensino Médio foi de grande emoção e a formatura em 2009 foi linda. Naquele momento, a sensação de gratidão invadiu meu coração. Logo em 2010 comecei a trabalhar com oficinas educacionais na escola do município de Japeri, no estado do Rio de Janeiro, um projeto intitulado Mais Educação. Essa foi a minha primeira experiência em sala de aula.
Durante o ano de 2014, a vida me deu uma rasteira. Separei-me do meu esposo, tendo que me afastar do trabalho na educação para trabalhar em uma fábrica de costura, onde eu recebia um salário maior. Agora, além de mãe, eu era a chefe da família, como parte das mulheres brasileiras vivem hoje em dia. Esses desafios enfrentados pelas mulheres são ressaltados por Gomes:
Muitos problemas foram e ainda são enfrentados pelas mulheres na inserção no mercado de trabalho. Entre eles, vale ressaltar os salários menores em relação ao dos homens, a dupla jornada com o princípio de que a vida doméstica é trabalho feminino, falta de voz nos espaços de decisão, entre outras coisas (Gomes, 2005, p. 6).
O grau escolar que eu possuía até aqui era pouco para mim. Com os filhos crescidos e tudo em seu devido lugar, ardia em meu coração a vontade de me graduar. Nesse caso, eu seria a primeira pessoa da minha família a concluir um curso superior.
A vontade de me tornar pedagoga, para atender especialmente à Educação Infantil, crescia dentro de mim, incentivando-me a procurar meios para a conclusão do Ensino Superior.
Caminhando nas trilhas da Pedagogia
Para cursar uma faculdade, a opção era o ensino a distância. Ele cabia para a minha realidade, pois eu precisava trabalhar para cuidar da minha família.
Conheci o Consórcio Cederj por meio de uma amiga do trabalho. No ano de 2015, a fim de me preparar para a prova do vestibular, comecei o cursinho pré-vestibular oferecido pela mesma instituição. Ter feito o cursinho me ajudou bastante nos estudos e na conquista da vaga na universidade pública. Nesse momento, começo a trilhar os caminhos da Pedagogia, buscando da melhor forma uma prática educacional libertadora.
A educação como prática de liberdade, ao contrário daquela que é a prática da dominação, implica a negação do homem abstrato, isolado, solto, desligado do mundo, assim também a negação do mundo como uma realidade ausente dos homens (Freire, 1999, p. 40).
Por não conseguir frequentar presencialmente uma sala de aula, o Cederj se tornou a melhor opção educacional, pois compreende instituições de ensino superior de qualidade, cujo objetivo é garantir educação em vários polos no Estado do Rio de Janeiro.
Ao ingressar no Ensino Superior, a alegria inundava meu ser. Agora, eu fazia parte de uma das instituições mais prestigiadas do Rio de Janeiro, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Confesso que entender a plataforma de estudos a distância, a princípio, foi complicado, mas aos poucos fui me familiarizando. Vir de uma família onde a maioria possui pouco estudo e ingressar no ensino superior foi algo muito gratificante.
Destaco nesses anos, cursando Pedagogia, as amizades que fiz e fazem parte da minha vida. Tutores maravilhosos e quanto aprendizado adquirido! As reuniões e os piqueniques na grama do polo em Paracambi em dias de provas foram e serão sempre inesquecíveis.
Os caminhos percorridos até aqui foram cheios de alegrias, satisfações, conhecimentos e, porque não dizer, de um pouco de frustração diante das dificuldades em relação a compreensão de algumas matérias. Apesar de o Cederj operar em um sistema EaD, há materiais que exigem a presença física do cursista, como no caso das disciplinas de Informática Instrumental e Seminários de Práticas Educativas. Quanto aos Seminários, destaco o Seminário 1, cujo tema foi Brincadeiras Infantis. Nele, podemos voltar a ser crianças!
Com o meu apego pela Educação Infantil, também destaco o seminário sobre teatro, pois sei o quanto o lúdico faz parte do universo infantil, cativando as crianças e lhes proporcionando um ambiente de aprendizado único e alegre.
O Cederj oferece tutorias presenciais e a distância, uma rede de apoio em que o aluno é compreendido, sanando suas dúvidas com professores dedicados e atenciosos, além de oferecer todo o material de estudos por meio da plataforma digital. O aluno também tem acesso ao material pedagógico impresso de forma totalmente gratuita.
Sinto-me imensamente alegre pela trajetória percorrida nos caminhos da Pedagogia. Os momentos de aprendizagens, de confraternizações com a turma e as conquistas nesse curso maravilhoso farão parte da minha vida para sempre.
No ano de 2018, sofri mais uma grande rasteira da vida. Perdi meu filho de 18 anos de idade em umas das formas mais brutais que existe, durante uma operação policial no bairro em que morávamos. Meu mundo caiu e continuar os estudos naquele momento não era possível. Lembro-me de ter reprovado todas as matérias do primeiro semestre daquele ano, pois não tinha forças para abrir a plataforma de estudos. Foram momentos de muita dor.
No segundo período resolvi trancar a faculdade, ainda não tinha condições para continuar e durante esse período recebi todo o carinho da minha família e amigos. No ano de 2019, retornei aos estudos vagarosamente, com isso tive forças para superar momentos tão dolorosos e continuar a minha caminhada na Pedagogia.
Realizando o sonho
É com imensa alegria, gratidão e orgulho que escrevo o memorial de conclusão do curso de Pedagogia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Após vencer tantas barreiras, confesso que passei por momentos em que o sentimento de fracasso tentava inundar o meu coração. Confesso, ainda, que muitas vezes esse sentimento foi maior que a vontade de seguir. Poder contar com o amparo familiar e os conselhos dos amigos me fez mais forte no processo dos estudos.
A formação superior se torna, hoje, uma realidade. Ao longo deste novo projeto de vida fui adicionando à minha formação profissional, novos termos, novas situações e olhares que me fizeram enxergar um novo mundo, mundo que emergiu de tal forma que eu não poderia imaginar a minha vida sem as situações passadas. A Pedagogia me fez perceber a necessidade de um olhar especial para a Educação Infantil. Perceber as necessidades da Educação Infantil também foi um dos incentivos para a minha busca dessa linda graduação. Durante os estágios, percebi o quanto um profissional bem-preparado pode somar à vida das crianças.
A Educação Infantil constitui a base da educação, mas é necessário lançar mão de artifícios para compor o ensino-aprendizagem dessa parcela de estudantes. Nessa conjuntura, elejo, como um excelente recurso, a contação de histórias. O professor que usa desse artifício na condução da aprendizagem, sabe o quanto de benefício pode trazer à educação da criança, pois ela contribui para o desenvolvimento do aluno em seus aspectos social, cognitivo e afetivo, reforçando as interações educativas e de aprendizagem. Como diz Coelho (1998, p. 4), “a história é um alimento à imaginação da criança, é preciso ser dosada conforme sua estrutura cerebral".
O desenvolvimento infantil se dá em um processo criado pela própria criança, a partir das interações que ela vivência. Sendo assim, a Literatura Infantil na contação de histórias é uma atividade interativa e pedagógica, mediada pelo educador que contribui para esse desenvolvimento integral. Abramovich (1977, p. 16) ressalta que “é importante para a formação de qualquer criança ouvir muitas histórias, escutá-las e o início da aprendizagem para ser um leitor e ter um caminho, absolutamente infinito de descobertas e de compreensão do mundo”. Ressalto que o momento que estou vivendo é útil e essencial para a condução de uma Educação Básica de qualidade. Alegro-me em dizer que na formação superior os momentos vividos no polo de Paracambi, me fizeram especial. O sonho de me tornar pedagoga vai deixando a casa do sonho para ser real.
Considerações finais
Se alguém me perguntar como cheguei até aqui, respondo que foram momentos de muita luta e coragem, porém é por meio do estudo que conseguimos alcançar nossos objetivos. Hoje tenho a sensação de dever cumprido, realização, satisfação e orgulho. O sentimento de felicidade me invadiu ao ver o momento da minha sonhada graduação chegar. Com graças e louvores a Deus que digo que me tornei uma mediadora do ensino!
Diante de toda experiência no curso de Pedagogia, ofertado pela UERJ em parceria com o Cederj, pude fazer uma linda reflexão sobre os ensinos ali obtidos e discorrer com clareza sobre a importância da Educação Básica. Para tal, lançamos mão do recurso da contação de histórias para proporcionar uma experiência educativa e de qualidade às crianças. Em todo esse tempo, realizei trocas de experiências ótimas com professores, gestores de escolas e amigos de turma. Sem dúvidas, o melhor de tudo foi reconhecer um saldo positivo de conhecimento e aprendizado.
Concluo o curso de Pedagogia na UERJ com a certeza de que ele me transformou em um novo ser humano: uma educadora. Na vida, somos aquilo que escolhemos ser, aproveitando as oportunidades que a vida nos oferece. Eu escolhi a Pedagogia e, com certeza, meu aprendizado não ficará por aqui. Continuarei na busca de novos conhecimentos a fim de contribuir com a sociedade escolar da melhor forma, construindo uma Educação Infantil respeitosa e grandiosa, assim como se dá no imaginário infantil.
Referências
ABRAMOVICH, Fanny. Literatura infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione, 1997.
COELHO, Betty. Contar histórias: uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 1999.
FARIA, Maria Alice. Como usar a literatura infantil em sala de aula. São Paulo: Contexto, 2010.
FREIRE, Paulo. A educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra,1999.
GOMES, Almirava Ferraz. O outro no trabalho: mulher e gestão. Revista de Gestão USP, São Paulo, v. 12, n° 3, p. 1-9, jul./set. 2005.
MILLER, Tina. Making sense of motherhood. New York: Cambridge University Press, 2005.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2002.
Publicado em 26 de setembro de 2023
Como citar este artigo (ABNT)
SANT'ANA, Vinícius Borovoy; CORREIA, Fabiana da Silva. A importância da contação de história na Educação Infantil. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 37, 26 de setembro de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/37/a-importancia-da-contacao-de-historia-na-educacao-infantil
Novidades por e-mail
Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing
Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário
Deixe seu comentárioEste artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.