Era Vargas e a educação: um estudo do contexto histórico e político dos avanços educacionais da época

Aline Lima de Oliveira

Graduanda de Pedagogia (UFAM)

Danielle Rose Souza Cruz Melo

Graduanda de Pedagogia (UFAM)

Fábio Souza Correa Lima

Docente da UFAM

Rakel Fabianne Cantanhede da Silva

Graduanda de Pedagogia (UFAM)

Syangue Bardales Alves

Graduanda de Pedagogia (UFAM)

O presente artigo visa aprofundar os estudos sobre a gestão de Getúlio Dornelles Vargas como Presidente do Brasil (1930-1945), período também conhecido como Era Vargas. Trataremos dos principais eventos políticos, econômicos e, especialmente, dos principais impactos educacionais ocorridos nesse período. Para tanto, foi realizado estudo bibliográfico com embasamentos sólidos que sustentam a pesquisa em questão.

A importância desse tema se justifica na busca de compreender o período histórico e as mudanças que ocorreram na época, como o Pós–Revolução de 1930; as políticas educacionais adotadas no governo Vargas; e a criação de instituições que transformaram a educação brasileira. São eventos que ocorreram em diferentes contextos, devido ao seu longo processo de transformação. A Era Vargas compreende três períodos: o Governo Provisório (1930-1934), o Governo Constitucional (1934-1937) e o Estado Novo (1937-1945). Assim, mesmo se não considerarmos os anos de 1951 a 1954 (anos em que Vargas foi eleito e governou democraticamente), os quinze anos em atuou após a Revolução de 1930 já o tornam o presidente que mais tempo esteve no poder em todo o período republicano brasileiro. Para o historiador Francisco Teixeira (2000, p. 260), contudo, “A influência da Era Vargas [...] foi muito além desses quinze anos. Prolongou-se, na verdade, até bem depois do último mandato [...], que terminou com sua trágica morte pelo suicídio”.

Segundo Cotrim (2005), o Brasil, assim como outros países que dependiam de exportações, enfrentava um período de grave crise econômica no final dos anos 1920. O principal motivo dessa dificuldade foi a superprodução da indústria norte-americana, a queda do valor das ações da Bolsa de Nova York e a falência de empresas e vários bancos, eventos que levaram milhões de trabalhadores norte-americanos ao desemprego, impactando fortemente a cafeicultura e diversos setores da economia brasileira. Com a Revolução de 1930, Vargas implementou transformações significativas por meio de políticas públicas que visavam atender a nova configuração do país e do ser social brasileiro. O eixo político deveria sair do rural para o urbano, enquanto o eixo econômico deveria sair do agropecuário para o industrial.

Tantas e tão profundas mudanças enfrentariam muitas resistências. Ao assumir a presidência da República, Vargas tomou medidas para concentrar em suas mãos o controle político do país. Consequentemente, aos poucos, seu o governo revelou a sombra de uma política autoritária com a centralização administrativa do país. Por outro lado, reconstruiu os sistemas políticos, sociais e econômicos do Brasil mediante a inclusão de demandas direcionadas às políticas públicas de direitos trabalhistas que progrediram gradativamente, impulsionadas pelo aumento da oferta de vagas escolares e de um pensamento científico que florescia no âmbito urbano.

Contextualização histórico-política e social

A chamada Era Vargas foi um marco na história brasileira por ocasião das diversas alterações e modernizações realizadas no período. Os anos de rompimento com estruturas consideradas atrasadas e a visão de um país industrializado e moderno impactaram os campos social, político e econômico.

Entre a Proclamação da República e 1930, mantinha-se no país um verdadeiro revezamento entre presidentes que representavam ora as oligarquias paulistas, ora as mineiras. O Partido Republicano Paulista (PRP) e o Partido Republicano Mineiro (PRM), acordados em uma aliança política denominada "café com leite", basearam a economia brasileira no agrário-exportador, sem pretensões de modernização ou industrialização.

Em um ano de desequilíbrio dessas relações, durante as eleições realizadas em março de 1930, o candidato Júlio Prestes, representando as oligarquias paulistas, venceu o pleito para presidente da República. A eleição, no entanto, foi contestada pelo grupo opositor, que havia formado a Aliança Liberal. Mineiros, gaúchos e paraibanos alegaram fraude e não reconheceram a vitória de Júlio Prestes. A consequência dessa insatisfação foi o planejamento de uma revolta armada que ganhou ainda mais força com assassinato do candidato a vice-presidente de Getúlio Vargas, o paraibano João Pessoa.

A crise econômica mundial causada pela quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em 1929, a insatisfação militar com os sucessivos governos civis e a morte de João Pessoa serviram como estopim para a formação de uma junta governamental que desconsiderou as eleições e formou um novo governo. Esse movimento se efetivou em novembro de 1930, quando Júlio Prestes foi deposto e o poder foi passado a Getúlio, o que pôs fim à chamada República Velha e iniciou a Era Vargas.

Reorganizar a vida política e econômica do país era o objetivo do Governo Provisório. A anulação da Constituição de 1891, que até então vigorava; o fechamento do Congresso Nacional e a extinção dos partidos políticos foram medidas tomadas por Vargas, que passaria a governar por meio de decretos-lei, iniciando-se, assim, um processo de centralização de poder.

Vargas projeta-se como líder de uma revolução vitoriosa, a qual, a despeito de sua heterogeneidade ideológica e política, tinha uma bandeira reformista. Essa bandeira estava relacionada com a temática da justiça social, com a questão da igualdade e das liberdades políticas, com o desafio de suprimir as grandes disparidades sociais que marcavam a sociedade brasileira e eliminar as barreiras sociais que tolhiam o desenvolvimento da cidadania política. Tratava-se, enfim, de instaurar um novo padrão de relacionamento entre classes possuidoras e classes subalternas, de forma a atenuar a opressão excessiva então exercida pelas elites dominantes, impondo limites institucionais ao seu poder e expandindo os direitos civis e políticos para novos segmentos da sociedade (Diniz, 1999, p. 22).

Em 1930, o governo Vargas criou o Ministério da Educação e Saúde Pública. No ano seguinte, foi implantada a Reforma de Francisco Campos, que organizou o ensino secundário e o superior. Vale ressaltar também o Manifesto Brasileiro de 1932, considerado um fato histórico importante da Educação como um dos principais instrumentos difusores do movimento da Escola Nova no país (Ribeiro, 2011).

A escola renovada pretendia a incorporação de toda a população infantil. Serviria de base à disseminação de valores e normas sociais em sintonia com os apelos da nova sociedade moderna, a partir dos preceitos do trabalho produtivo e eficiente, da velocidade das transformações, da interiorização das normas de comportamentos otimizados em termos de tempos e movimentos e da valorização da perspectiva da Psicologia Experimental na compreensão “científica” do humano, tomado na dimensão individual (Vidal, 2000, p. 498).

Nesse sentido, uma nova fase revelava as “mudanças” no dinamismo escolar. O aluno antes passivo assumia o centro do processo educativo. Dessa forma, a Psicologia Experimental ganha força, dando suporte científico à Pedagogia, que produzia o falso discurso da escolarização das massas populares. No entanto, “estender para todo o território nacional as condições materiais e técnicas da escola das massas era o grande desafio que associava as largas dimensões do Brasil à sua diversidade cultural e populacional” (Vidal, 2000, p. 514).

Nesse período, foram criados alguns outros ministérios, como o do Trabalho, da Indústria e Comércio. Os investimentos em industrialização incentivaram o surgimento de uma nova classe social: o proletariado brasileiro. Assim, a imagem de Vargas passou a estar ligada ao trabalhismo, porque vários direitos foram concedidos aos trabalhadores, como férias e descanso remunerado, entre outros. Ao mesmo tempo que Vargas concedia esses direitos, obrigava os trabalhadores a se filiar a sindicatos reconhecidos pelo Estado brasileiro. Isso fez com que os sindicatos perdessem sua autonomia, uma vez que o Estado era quem, em última instância, decidia sobre greves, por exemplo. Contudo, o interessante é entender que essa nova classe social, moradora das cidades, necessitava cada vez mais de uma educação afinada com o novo trabalho na indústria. Cresciam, assim, as propostas de construção de mais escolas e melhoria na formação de professores, conforme veremos mais adiante.

Uma das promessas feitas por Vargas ao assumir o Governo Provisório foi a convocação de uma Constituinte para a elaboração de uma nova carta magna para o país, além de eleição geral. Porém essa promessa não foi cumprida, provocando a Revolução Constitucionalista de 1932, com suas bases em São Paulo. Os revoltosos acusavam Vargas de ser ditador, de descumprir a promessa de elaborar uma constituição. Apesar de perderem a “guerra” contra o governo, os paulistas acabaram alcançando o que queriam, pois o Congresso foi reaberto para que uma nova constituição fosse elaborada.

Conforme apontamos, em 1930 foi criado o ministério da Educação e Saúde Pública como uma das primeiras ações do governo Vargas na área da educação. A ação demonstrava uma postura de quem entendia o papel da educação nas transformações que estavam por vir.

O primeiro ministro da Educação foi Francisco Campos, educador experiente, que já havia participado dos debates da época do movimento do otimismo pedagógico, que surgiu nos anos 1920 e trouxe transformações ao campo pedagógico com propostas que se atentavam às melhorias e à qualidade do ensino, que antes priorizava somente o avolumamento da rede educacional. Campos foi estrategicamente encarregado de estruturar a educação e executar os projetos que traziam como fim a modernização do país.

Em 1931, realizou uma série de mudanças que ficaram conhecidas como Reforma Francisco Campos. Criou o Conselho Nacional de Educação e estruturou o sistema educacional nacional, que determinou o currículo em séries e estabeleceu a obrigatoriedade da frequência. Regularizou também o Ensino Superior com o regime universitário, organizou o Ensino Secundário e o Comercial, além de reconhecer a profissão de contador no Brasil.

Graças à Reforma Francisco Campos, a educação finalmente se tornou questão nacional. A Reforma permitiu que o Ministério da Educação pudesse realizar direcionamentos e orientações aos estados para que eles pudessem organizar suas redes de acordo com as novas diretrizes. O Ensino Secundário, por exemplo, que trata da escolaridade entre o Ensino Primário e o Ensino Superior, passou a ter um período de sete anos e dois ciclos.

Intenta-se compreender a escolha e a disposição dos saberes e das habilidades fixadas pelos decretos elaborados pelo Ministério da Educação e Saúde Pública e oficializados pelo Governo Provisório. Numa perspectiva histórica, considera-se que se trata de um conjunto de normas que procuraram modernizar o Ensino Secundário brasileiro (Dallabrida, 2008, p. 186).

O Ensino Secundário foi dividido em duas fases; a primeira era oferecida a todos os estudantes, ofertando formação geral em um curso com duração de cinco anos, chamado “fundamental”. A segunda fase constituía-se por uma introdução preparatória para o Ensino Superior com duração de dois anos, chamada de “fase complementar”. Essa mudança trouxe por consequência uma estrutura mais complexa para o Ensino Secundário, aproximando o Brasil de experiências bem-sucedidas em países mais desenvolvidos.

Por outro lado, o aumento do número de anos no Ensino Secundário trouxe uma ideologia elitista que acabou se ajustando e privilegiando as famílias que podiam manter seus filhos na escola por mais tempo. O fato é que nem todos, naquela conjuntura de vida, podiam sustentar um estudo longo e teórico, que se diferenciava do curto e prático oferecido pelo Ensino Normal ou Técnico-Profissional. Outra determinação importante da Reforma de Francisco Campos foi a imposição, por meio de decreto, da obrigatoriedade da presença dos alunos em no mínimo três quartos das aulas. Caso essa regra não fosse cumprida, o estudante seria impedido de fazer os exames para sua aprovação.

Durante o ano letivo, os estudantes deveriam realizar “quatro provas escritas parciais” em cada disciplina e os exames finais – uma prova oral em cada disciplina, prestada perante uma banca examinadora constituída por dois professores do colégio e presidida pelo inspetor federal. Para os alunos que não conseguiam atingir a média estipulada, a Reforma Francisco Campos previa a realização de uma “segunda época de exames finais”. Dessa forma, os estudantes secundaristas eram submetidos a uma engrenagem examinatória em diferentes tempos ao longo do ano letivo que os incitava ao trabalho regular e progressivo. Esse sistema de avaliação permanente é diametralmente oposto ao regime de cursos preparatórios e de exames parcelados, pois, neste último sistema de ensino, o aluno apenas realizava um único exame terminal em cada disciplina (Dallabrida, 2008, p. 187).

A mudança que trouxe a criação de dois ciclos, a frequência obrigatória e o sistema avaliativo estava vinculada à seriação anual das disciplinas que seriam proporcionadas nesses dois ciclos do Ensino Secundário. Para os cinco anos do fundamental eram oferecidas as disciplinas de Matemática, Português, Geografia, História da Civilização e Desenho, além de Ciências Físicas e Naturais, que eram ministradas na 1ª e na 2ª séries, e História Natural, Química e Física, que eram ministradas nas três últimas séries.

Entre as línguas estrangeiras, havia ainda destaque para o Francês, previsto nas quatro primeiras séries, diferente de Inglês, Alemão e Latim, estabelecidas em menos séries. A disciplina Música (canto orfeônico) era obrigatória nas três primeiras séries do curso fundamental (Dallabrida, 2008, p. 188).

Os cursos complementares ofereciam disciplinas específicas em suas duas séries, como Latim e Literatura, que preparavam o aluno para o ingresso no Ensino Superior em seus determinados cursos. Para Campos, o Ensino Secundário deveria ser, acima de tudo, de cunho formador, pois ele acreditava que só se aprende o que se pratica. Apesar de ser influenciado pelo Manifesto dos Pioneiros, era verdadeiramente católico e antiliberal. Assim, apesar dos avanços, ele colaborou para a reintrodução do ensino religioso nos currículos escolares.

A Reforma Francisco Campos estabeleceu um conjunto de mecanismos disciplinares, entre os quais o controle do tempo, o sequestro dos alunos no interior dos ginásios por meio da presença obrigatória, a seriação do conhecimento escolar em ciclos e séries anuais, um sistema detalhado e regular de avaliação discente e a reestruturação da inspeção federal, que procurava construir uma normalização nacionalizada do Ensino Secundário – como foi analisado acima. Essa cultura escolar tinha como escopo maior a produção da autorregulação entre os alunos, que deveria concorrer para a construção da sociedade capitalista e disciplinar que se consolidava, no Brasil, nos anos de 1930 (Dallabrida, 2008, p. 189).

A remodelação feita pelo Ministério da Educação e Saúde Pública quebrou o modelo de sistema de cursos preparatórios e de exames parcelados. O novo modelo procurou dominar a estrutura escolar, aplicando e colocando em prática a cultura de Ensino Secundário centralizada e nacionalizada. “Ela enfatizou a educação integral e a cultura disciplinar, que concorriam para a produção de um habitus burguês nos alunos de Ensino Secundário” (Dallabrida, 2008, p. 190). A Reforma Francisco Campos tinha o objetivo de reconstruir o Ensino Secundário e ajustá-lo ao novo modelo nacional, que permaneceu em vigor até o ano de 1960.

Em 1934, foi promulgada uma nova Constituição, a qual trazia o voto secreto, o voto feminino e os direitos trabalhistas para os trabalhadores da indústria, além da criação da Justiça Eleitoral. A educação ganhou um capítulo próprio, considerando um processo de organização nunca antes realizado, em que podemos destacar:

Art. 149 - A educação é direito de todos e deve ser ministrada pela família e pelos poderes públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana (Brasil, 1934).

O Governo Constitucional de Vargas foi o período no qual Getúlio Vargas foi eleito indiretamente para cumprir um mandato de quatro anos. Depois de quatro anos no poder, ele assumia um mandato sem direito à reeleição, segundo preconizava a nova Constituição de 1934. Nessa fase, a expectativa das pessoas era de que Vargas caminhasse para uma linha mais democrática. Segundo Diniz (1999, p. 23),

nesse momento, vem à tona a figura do chefe de um governo comprometido com um projeto liberal-democrático, respaldado pela Constituição de 1934, que, apesar de conter um capítulo de teor claramente intervencionista sobre a ordem econômica e social, consagrava os princípios liberais embutidos no movimento de 1930.

Na realidade, o que se viu foi exatamente o contrário, e a política brasileira acabou ficando marcada por gradativa radicalização. Nesse momento, dois ideais primordiais se evidenciam: de um lado o fascismo, com preceitos político-sociais totalitários introduzidos por Mussolini e representado pela Ação Integralista Brasileira (AIB); e o democrático, ideal difundido pela Aliança Nacional Libertadora (ANL), favorável à Reforma Agrária, além da revolução pela luta de classes.

A ANL, sob as orientações do seu presidente de honra, Luiz Carlos Prestes, promoveu em 1935 uma tentativa de golpe contra o governo de Getúlio Vargas que ficou conhecida como Intentona Comunista. No entanto, devido às falhas nas articulações e na adesão de outros estados, o movimento fracassou totalmente, sendo facilmente controlado pelo governo. O evento, no entanto, foi usado como pretexto de que o governo deveria agir para evitar uma nova tentativa de golpe comunista. Assim, em 1937, Getúlio Vargas promoveu um autogolpe, iniciando a ditadura do Estado Novo.

Em cadeia de rádio nacional, Getúlio Vargas anunciou o Estado Novo, uma ditadura (1937-1945) criada para manter afastada a “ameaça comunista”. Vargas impôs também uma nova Constituição, conhecida como “Polaca”, por ter sido inspirada na Constituição da Polônia, de tendência marcadamente fascista. Iniciava-se assim um período de ditadura no Estado brasileiro, no qual, de acordo com Diniz (1999, p. 23),

domina a cena o Vargas identificado com o ideário autoritário. Cabe ressaltar, aliás, que os grandes ideólogos do autoritarismo tiveram o seu apogeu nessa fase. Lembremos Oliveira Viana, Francisco Campos e Azevedo Amaral, expoentes do pensamento autoritário, cujas ideias lançaram os fundamentos de uma série de mudanças político-institucionais que viriam a concretizar-se plenamente com o Vargas do período estado-novista.

Além do apoio dos militares, Getúlio Vargas também contou com o apoio de grande parte da sociedade, justificando suas ações com propagandas anticomunistas. A partir de 1937, novos alvos foram atingidos pelo governo, entre eles os meios de comunicação – com a censura –, reprimindo também as atividades políticas, perseguindo e prendendo inimigos.

No entanto, com o intuito de assumir uma postura mais “amistosa”, Vargas deu continuidade às políticas trabalhistas, criando a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), publicando o Código Penal e o Código de Processo Penal. Também foi responsável pela concepção da Carteira de Trabalho, da Justiça do Trabalho, do salário mínimo e do descanso semanal remunerado.

Na política externa, o principal acontecimento foi a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Ainda que Vargas “flertasse” com o fascismo, a postura do Brasil era de neutralidade até 1942. Porém, após a pressão do governo norte-americano e de um acordo que deu acesso ao Brasil à tecnologia nuclear, o Brasil cedeu e acabou declarando guerra à Alemanha e à Itália em 1942.

É possível dizer que “a nova constituição dedicou bem menos espaço à educação do que a anterior, mas o suficiente para incluí-la em seu quadro estratégico com vistas a equacionar a questão social e combater a subversão ideológica” (Shiroma; Moraes; Evangelista, 2011, p. 22, grifos dos autores). Foram geradas várias discussões sobre um ensino para as classes mais desfavorecidas, incluindo o modelo que visava descobrir uma tendência vocacional e profissional dessas classes, com o apoio de sindicatos.

Os anos iniciais do novo formato de governo autoritário, o Estado Novo, trouxeram consigo limitações da liberdade civil, o que ocasionou redução das discussões de concepções educacionais. Com efeito, as propostas educacionais de modernização estancaram, embora a indústria crescente ainda precisasse de mão de obra qualificada. Somente em 1942 foi anunciada uma nova reformulação da política educacional durante o Estado Novo.

Da parte do governo, nenhuma movimentação significativa na definição de políticas para a educação se anunciou até 1942, quando o então ministro da Educação e Saúde Pública, Gustavo Capanema, implementou uma série de reformas que tomaram o nome de Leis Orgânicas do Ensino, que flexibilizaram e ampliaram as reformas de Campos; as leis orgânicas foram complementadas por Raul Leitão da Cunha, que o sucedeu no ministério após o término do Estado Novo em 1945 (Shiroma; Moraes; Evangelista, 2011, p. 23).

Possivelmente, a lei que mais evidenciou a alta necessidade de pessoas no sistema industrial foi o Decreto nº 4.073, de 30 de janeiro de 1942, que criou o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) (Shiroma; Moraes; Evangelista, 2011, p. 23). Essa lei tinha como objetivo capacitar e introduzir jovens nos princípios industriais para sua formação para a indústria; desse modo, o ensino industrial seria organizado para todo o Brasil.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, as lutas pela redemocratização ganharam força. Vargas foi obrigado a dar indulto a presos políticos e a constituir eleições gerais. Ainda em 1945, o palácio presidencial foi cercado pelos militares, que intimaram Vargas a renunciar. Assim, a Era Vargas chegava ao seu fim, dando espaço para a chamada Quarta República, também conhecida como Intervalo Democrático (1946-1964). Vale ressaltar, porém, que esse não foi o “fim” de Getúlio Vargas, que, além de eleger o candidato que apoiou em 1946 (Eurico Gaspar Dutra), ainda retornou à Presidência do Brasil por meio do voto popular em 1951.

A Escola Nova

O movimento escolanovista surgiu na Europa e se expandiu para outros continentes, com educadores que questionavam os modelos do ensino tradicional, considerando-o não funcional para os novos tempos de modernidade. Por isso mesmo, a Escola Nova surgiu com novos formatos educacionais que abordavam um ensino democrático, colocando as crianças no centro do processo de aprendizagem. Para isso, foram usadas novas práticas pedagógicas, que atribuíam uma dinâmica que incentiva as relações escolares entre os alunos e professores, incentivando o aluno à pesquisa e integrando-o ao meio social.

No Brasil, o movimento escolanovista ganhou força durante os anos 1920 e 1930, apesar da resistência do grupo de educadores tradicionalistas, identificados com o catolicismo. Com um discurso transformador e modernizador, buscando reformular as escolas e seus métodos, aos poucos os escolanovistas se aproximaram do governo Vargas e conseguiram a hegemonia necessária para implementar seu projeto a partir do início dos anos 1930.

No ano de 1932, um grupo de 26 educadores propôs, em um documento com o título “A Reconstrução Educacional no Brasil: ao povo e ao governo”, diretrizes para uma política de educação baseada em princípios que fariam uma reforma no sistema educacional brasileiro. Esse manifesto teve origem no início do Governo Provisório de Vargas. Vendo a oportunidade de mudanças no ensino nacional, a Associação Brasileira de Educação (ABE) tratou de possíveis mudanças que deveriam ser consideradas pelo novo governo em um Congresso em Niterói. Foi a partir desse evento que nasceu a ideia de criar um manifesto que expusesse suas opiniões e propostas. Redigido por Fernando de Azevedo e assinado por educadores como Anísio Teixeira, Cecília Meireles, Lourenço Filho, Heitor Lira, Carneiro Leão e Almeida Júnior, entre outros, o manifesto dirigia-se ao governo e ao povo brasileiro com propostas direcionadas à educação. Um trecho do texto diz:

Se depois de 43 anos de regime republicano se der um balanço ao estado atual da educação pública, no Brasil, se verificará que, dissociadas sempre as reformas econômicas e educacionais, que era indispensável entrelaçar e encadear, dirigindo-as no mesmo sentido, todos os nossos esforços, sem unidade de plano e sem espírito de continuidade, não lograram ainda criar um sistema de organização escolar à altura das necessidades modernas e das necessidades do país (Inep, 1984, p. 407).

O objetivo era organizar o sistema educacional para que acompanhasse a modernização que acontecia no país. Os autores almejavam um ensino gratuito, misto, laico e obrigatório em escolas públicas, que oferecesse e garantisse educação comum para todos sem privilégios e de forma igualitária.

A defesa da laicidade está relacionada a uma luta travada contra o ensino religioso, predominante no Brasil em boa parte das escolas existentes, pelo respeito à personalidade que se forma dentro da escola, longe de confrontos religiosos e desrespeito pela presença ou não de crenças. Segundo o Manifesto, a gratuidade é dependente da obrigatoriedade, pois o Estado não pode tornar o ensino obrigatório e igual para todos se este não for gratuito e atender a todos os níveis econômicos e sociais presentes na nação (Marinho, 2006, s/p).

Segundo os pioneiros, a organização traria o domínio da evolução social, mudando toda a circunstância na qual a educação se encontrava, e traria uma nova percepção a respeito das competências burocráticas atribuídas ao educador. A causa principal dos problemas na educação, segundo os educadores (1984, p. 407), está “na falta, em quase todos os planos e iniciativas, da determinação dos fins de educação (aspecto filosófico e social) e da aplicação (aspecto técnico) dos métodos científicos aos problemas de educação”.

O discurso de modernização do Movimento da Escola Nova, portanto, vinha ao encontro da proposta de Vargas, de mudanças sociais, políticas e econômicas para o país. Era, contudo, uma mudança geral do ser social brasileiro.

A constituição do saber infantil se formou por meio da base de atividades individuais. A escola passou a ser responsável por ofertar, por meio de observação e experimentação, a possibilidade do aluno de construir o seu próprio conhecimento (Vidal, 2003). Dessa maneira, o aluno se tornaria o centro da aprendizagem, com auxílio da Psicologia Experimental à Pedagogia. Tal auxílio também proporcionou a abordagem, em debates, de temas como a escolarização das massas populares e a individualidade da criança nos processos educativos, sempre com foco na eficiência na construção do saber.

Para o mundo industrializado, dentro da visão modernizadora do governo, a escrita passou a ser fundamental para os indivíduos. O raciocínio daquele que escreve deveria ser acompanhado por sua escrita. Dessa maneira, houve um processo de transformação da escrita de maneira a deixá-la menos desenhada, menos rebuscada. Tratava-se de uma escrita que pudesse ser mais prática, rápida e de fácil leitura.

Uma das técnicas propostas foi a caligrafia muscular, que se baseia na concentração e controle da escrita. Nos anos de 1928 e 1929, foi desenvolvido o teste do ABC para auxiliar na pesquisa a respeito da aprendizagem da escrita. Dessa maneira, a escrita começou a abranger também o campo da economia, tornando-se algo ainda mais necessário ao indivíduo:

Essa preocupação econômica com a escrita, se pretendia atender as necessidades da sociedade moderna, respaldou-se no discurso da Psicologia Experimental, propondo o uso racional das capacidades do corpo, evitando o que Ferriere denominou de fadiga inútil (Vidal, 2003, p. 502, grifos do autor).

Além disso, a economia também se preocupava com a forma de ler dos indivíduos.

Com o ler harmonizavam-se as exigências da nova sociedade, uma vez que ler rápido e eficazmente, decifrando com velocidade os signos escritos, era, e continua sendo, uma das necessidades da sociedade moderna em que a apreensão pela geração da mensagem escrita torna-se a única maneira de lidar com a profusão de impressos em circulação e com a proliferação de escritas que demarcavam os usos nos universos sociais urbano e do trabalho; construir leitores, assim, para a escola das décadas de 20 e 30, produzir decifradores de uma cultura urbana cada vez mais associada às seguintes inscritos; de uma cultura do trabalho relacionada a informes e manuais e de cultura social caracterizada pela profusão de informações por jornais e rádios e pela exposição de imagens permitidas pelo cinema (Vidal, 2003, p. 502).

Com isso, não apenas a escrita, mas também as novas práticas de leitura se tornam eficientes para suprir as necessidades da sociedade perante a sua modernização. A criação de grupos de leitura dentro das escolas primárias acabou servindo de ferramenta de transmissão pelos educadores escolanovistas, visando agregar novos hábitos de eficiência na leitura na vida dos alunos. As mudanças foram tão profundas que reformularam a relações temporais, espaciais, materiais e sociais (Vidal, 2003).

As Ciências Naturais se tornaram disciplina do Ensino Primário e tomavam parte das práticas sociais dos brasileiros a partir dos anos 1920. Era uma “nova percepção entre Ciência Natural e educação. A construção de uma nação amálgama de brancos, negros e imigrantes colocava como desafio a regeneração social, que para os educadores escolanovistas só poderia ser atingida pela educação das massas” (Vidal, 2003, p. 512). Desse modo, as propostas da Escola Nova foram transformando o ensino-aprendizagem por meio das disciplinas escolares, que, por sua vez, tentavam seguir as transformações que aconteciam no mundo e na sociedade brasileira; no desenvolvimento da criança e nos meios econômicos, políticos e sociais, novas teorias e práticas abordavam a centralidade do aluno no processo educacional, tendo o professor como mediador.

Considerações finais

Ao analisarmos esse período histórico, podemos concluir que o Brasil em 1930, mesmo depois de mais de quatro décadas de regime republicano, ainda era uma realidade abstrata para a maioria dos brasileiros. “O império, ao se desmoronar, deixou insolúveis os dois maiores problemas nacionais: a organização do trabalho livre e o da educação” (Ribeiro, 2001, p. 89) e a chamada República Velha (1889-1930) não conseguiu mudar essa situação.

É possível examinar os primeiros passos do Estado que emergiu a partir da Revolução de 1930; apesar de não ter organizado politicamente a sociedade. No entanto, conclui-se que, embora Vargas mediasse forças heterogêneas que possibilitaram sua chegada ao poder, não se curva às elites, que se empenham em manifestar o seu papel repressor, sobretudo das classes operárias, fazendo com que a questão social continuasse a ser “a relação de explorador e explorado", como mostra a dinâmica no decorrer da história, reforçando assim a política de marginalização pura realizada pelas velhas classes dominantes, que não tinham mais condições de se sustentar, em meio às turbulências econômicas advindas da crise do café e aos impactos da própria crise mundial de 1929.

Getúlio Vargas chegou à presidência e se tornou uma das personalidades políticas nacionais de maior expressão desde a Proclamação da República até hoje. Suas ações são referências importantes, como estudos científicos e debates das análises políticas, sociais, econômicas e educacionais. Palavras como “nacionalismo, populismo, estatização econômica, autoritarismo, paternalismo político, legislação trabalhista, controle ou liberdade sindical, políticas educacionais são vistas como algumas das características fundamentais que constituíram a Era Vargas” (Cotrim, 2005).

No Manifesto dos Pioneiros (1932), a educação foi apontada como o mais importante dos problemas nacionais; “é impossível desenvolver as forças econômicas ou de produção sem o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e à iniciativa, que são os fatores fundamentais do acréscimo de riqueza de uma sociedade”.

São palavras refletidas nas críticas à Pedagogia Tradicional, que chegava ao fim, conforme escreveu Dermeval Saviani (1999, p. 6): “Para superar a situação de opressão, própria do Antigo Regime”, dava-se a efetivação da teoria da Escola Nova, que, com todos os seus problemas de ainda ser uma educação elitista, mantinha a crença no poder da escola e sua função, como possibilidade de equalização social.

Assim, ao terminarmos, vale ressaltar que as teorias educacionais são divididas em dois grupos: as críticas e não críticas. Com esse entendimento, apesar dos avanços ocasionados com a Escola Nova, não podemos deixar de apontar seu caráter de reprodução social e cultural estabelecido no contexto escolar. A filosofia da Escola Nova tinha um caráter democratizador absolutamente limitado, constando como marca registrada das estratégias educacionais de Vargas, sendo usada por um governo autoritário em prol de se manter no poder.

Reiteramos, por fim, que a educação deve servir ao Estado, e o Estado, por sua vez, deve servir ao povo, preparando-o não apenas para o mundo do trabalho, mas também para uma vida plena de conhecimentos para a liberdade de viver sem ter que servir a outrem.

Referências

BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934. Rio de Janeiro, 1934. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm. Acesso em: 24 fev. 2023.

COTRIM, Gilberto Vieira. História Global, Brasil e Geral - volume único. São Paulo: Saraiva, 2005.

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Publicado em 10 de outubro de 2023

Como citar este artigo (ABNT)

OLIVEIRA, Aline Lima de; MELO, Danielle Rose Souza Cruz; LIMA, Fábio Souza Correa; SILVA, Rakel Fabianne Cantanhede da; ALVES, Syangue Bardales. Era Vargas e a educação: um estudo do contexto histórico e político dos avanços educacionais da época. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 39, 10 de outubro de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/39/era-vargas-e-a-educacao-um-estudo-do-contexto-historico-e-politico-dos-avancos-educacionais-da-epoca

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