Praticando a Lei nº 11.645/08: o uso da lenda das Cataratas do Iguaçu em contexto interdisciplinar

Ricardo Ferreira Vale

Doutorando em Educação (UFOP)

Gracielle Teodora da Costa Pinto Coelho

Doutora em Agronomia (UFLA)

Denise Cássia da Silva Barbosa de Freitas

Especialista em Coordenação Pedagógica (UFOP)

A Lei nº 11.645/08 alterou a Lei nº 10.639/03, incluindo a obrigatoriedade do ensino da História e da Cultura Indígena nas escolas brasileiras, promulgada em março de 2008 e entrando em vigor em junho desse mesmo ano.

De acordo com a Lei nº 11.645/08, as instituições de ensino devem incluir nos currículos oficiais da rede de ensino, a temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena". A lei se aplica às disciplinas e aos níveis de ensino, desde a Educação Infantil até o Ensino Superior. A inclusão dessas temáticas no currículo escolar tem por objetivo contribuir no combate ao racismo, à discriminação e à exclusão social, além de valorizar a diversidade étnico-cultural brasileira, promovendo o antirracismo na prática.

Buscando contemplar a lei mencionada, propomos uma atividade interdisciplinar para 31 alunos/as do 7°ano de uma escola pública na cidade de Sete Lagoas/ MG. O objetivo dessa atividade foi promover uma abordagem integrada e multidisciplinar do conhecimento, permitindo que os/as alunos/as desenvolvessem habilidades em relacionar os conceitos e as ideias de diferentes áreas para obterem uma compreensão mais ampla e aprofundada da temática proposta.

As atividades interdisciplinares podem ser realizadas de diferentes formas, como por projetos, pesquisas, debates ou outras. Podem ainda ser desenvolvidas em diferentes níveis de ensino e em diversas áreas: Ciências, Artes, História e Geografia, entre outras. Segundo o Instituto de Desenvolvimento Educacional do Alto Uruguai (2019), esse tipo de atividade “é uma maneira de possibilitar a formulação de um saber que deve ser cada vez mais valorizado no processo de ensino-aprendizado”.

Uma das vantagens das atividades interdisciplinares é proporcionar uma visão mais completa e complexa do conhecimento, permitindo uma abordagem relacional entre diferentes áreas. Além disso, incentivam o trabalho em equipe, a criatividade e a participação ativa dos alunos no processo de ensino-aprendizagem. No entanto é importante que as atividades interdisciplinares sejam planejadas com cuidado e que as diferentes disciplinas envolvidas estejam integradas de forma coerente e significativa. Isso exige uma boa comunicação e cooperação entre os/as professores/as e uma abordagem pedagógica que leve em conta as especificidades de cada conteúdo e a interação entre eles.

Percursos metodológicos

O desenvolvimento da atividade escolhida ocorreu em quatro aulas de 50 minutos, contemplando as disciplinas de Ciências, Língua Portuguesa e Geografia. 

1ª Aula

Momento 1: A atividade foi iniciada com um questionamento acerca da borda dourada na moeda brasileira de R$1,00. Os/as alunos/as relataram não conhecer o motivo dessa cunhagem. Posteriormente, foram informados de que a arte na borda da moeda é um desenho típico da cultura indígena. Dando sequência à 1ª aula.

Figura 1: Apreciação do desenho típico indígena na moeda brasileira de R$ 1,00

Fonte: Acervo particular. 

Momento 2: Foi apresentada aos/as alunos/as uma tabela mostrando o tamanho da população indígena brasileira desde o ano 1500. Os/as alunos/as foram sensibilizados/as acerca da redução desses povos.

Figura 2: Tabela da população indígena

Fonte: Revista Ciência Hoje das Crianças.

Momento 3: Foi entregue uma fotocópia do texto “De mãos dadas com os povos originários”. Posteriormente, houve leitura coletiva do texto. Durante a leitura, os/as alunos/as foram questionados sobre: a) Origem dos povos que gritaram “terra à vista”, b) Sobre quem seriam os indivíduos que avistaram a chegada dos navegadores, c) A estimativa da população indígena no ano de 1500, d) Onde podemos observar as heranças dos povos indígenas; e e) Se conheciam pessoalmente algum/a indígena e ou aldeia.

Figura 3: Texto digitalizado e entregue aos/as alunos/as

Fonte: Revista Ciência Hoje das Crianças.

2ª Aula:

Momento 1: Vídeo apresentando as Cataratas do Iguaçu, seguido da sua localização. Nesse momento foi disponibilizado um mapa físico para que localizassem a cidade onde se encontram as Cataratas do Iguaçu.

Figura 4:  Localização no mapa da cidade de Foz do Iguaçu

Fonte: Acervo particular.

Momento 2: Leitura coletiva do livro paradidático A lenda das cataratas.

Figura 5: Capa do livro utilizado

3ª e 4ª Aulas:

Momento 1: Apresentação do gênero textual história em quadrinhos (HQ). Nessa aula foram apresentados os estilos que caracterizam as HQ (o tempo e o local indicados pela imagem, a possibilidade de apresentar quadrinhos com legendas, o diálogo em balões, o uso de onomatopeias e uso da linguagem informal). 

Momento 2: Confecção das HQ

Figura 6: O processo de confecção de uma HQ

Fonte: Acervo particular.

Momento 3: Socialização das HQ confeccionadas. Nesse momento, os/as alunos/as as apresentaram à turma.

Figura 7: HQ produzida por um grupo de alunos

Fonte: Acervo pessoal.

Resultados e considerações finais

Apresentar a História e Cultura indígena ainda é algo incipiente na prática docente brasileira. Isso foi observado neste projeto, uma vez que 80,6% dos/as alunos/as participantes relataram desconhecer os povos indígenas brasileiros. É um fato alarmante, uma vez que a Lei nº 11.645/08 está vigente desde 2008, ou seja, há 15 anos. A lei segue diretamente relacionada à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, mas a vemos como um contraponto dos resultados observados dentro do ambiente escolar.

Um total de 31 alunos/as participaram da atividade Praticando a Lei nº 11.645/08: o Uso da Lenda das Cataratas do Iguaçu em um Contexto Interdisciplinar, que trouxe por objetivo apresentar a História e Cultura indígena, por meio de uma visão e uma prática interdisciplinar, com a contextualização de vivência diária, apresentada inicialmente com o auxílio da identificação da borda da moeda de R$ 1,00, seguida do vídeo. Além disso, foi proposta a atividade de reconhecimento de área com o mapa da região de Foz do Iguaçu, em um momento descontraído. Os/as alunos/as foram convidados/as a participar da socialização em uma proposta prática e criativa, que transcende o conhecimento específico no desenvolvimento de suas habilidades e competências, na construção de uma HQ.

Os resultados mostraram que, de um total de 31 alunos/as, 25 alunos/as não conheciam indígenas, o que representou 80,6% da população amostral. Desses, seis alunos/as (ou 19,4% da população amostral) relataram já terem tido algum contato com áreas dispostas no mapa que os ligavam à História e/ou à cultura indígena, além de se identificarem como descendentes desses povos. Foi possível compartilhar falas marcantes como:

“Minha bisavó é indígena”.

“Meu bisavô era indígena”.

“Eu conheço os indígenas lá de Porto Seguro”.

“De Porto Seguro”, no caminho (fazendo manifestação e nas aldeias).

Dados como esses demonstram a importância de ações e atividades na escola que atendam à Lei nº 11.645/08 na sua aplicação. Há de se considerar que em um total de 80,6% dos/as alunos/as desconhecem pessoas de origem indígena, demonstrando que a presença dessa população na nação brasileira traz um impacto relevante, como demonstrado na tabela disposta no corpo do texto, valorizando ações positivas para a manutenção dos povos indígenas.

Atividades como a proposta neste relato são de suma importância, pois geram conhecimento, reconhecimento, pertencimento e valorização dos povos originários.

Referências

BRASIL. Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm

INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL DO ALTO URUGUAI. Atividades interdisciplinares. Disponível em:  https://www.getulio.ideau.com.br/noticia/atividades-interdisciplinares/#:~:text=A%20interdisciplinaridade%20%C3%A9%20forma%20de,com%20outras%20%C3%A1reas%20de%20conhecimento. Acesso em: 4 maio 2023.

INSTITUTO CIÊNCIA HOJE. História. Ciência Hoje das Crianças, Rio de Janeiro, ano 36, nº 342, abr. 2023. Disponível em: http://cienciahoje.org.br/instituto/historia. Acesso em: 25 abr. 2023.

VIEIRA, André Ribas; VIEIRA, Melissa de Souza Ferreira R. Lenda das Cataratas. Foz do Iguaçu: Bilíngue, 2019.

Publicado em 07 de novembro de 2023

Como citar este artigo (ABNT)

VALE, Ricardo Ferreira; COELHO, Gracielle Teodora da Costa Pinto; FREITAS, Denise Cássia da Silva Barbosa de. Praticando a Lei nº 11.645/08: o uso da lenda das Cataratas do Iguaçu em contexto interdisciplinar. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 43, 7 de novembro de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/43/praticando-a-lei-n-1164508-o-uso-da-lenda-das-cataratas-do-iguacu-em-contexto-interdisciplinar

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