Estágio Supervisionado em Língua Portuguesa no Ensino Médio: um relato de experiência

Francisco Rangel dos Santos Sá Lima

Licenciado em Letras - Língua Portuguesa (Unilab), especialista em Retórica e Oratória em Língua Portuguesa (UniBF), mestrando em Ciências da Linguagem (UERN), professor de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental da rede municipal de Canindé/CE

Libânia Fernandes Cá

Licenciada em Letras - Língua Portuguesa (Unilab), especialista em Igualdade de Gênero (UMAR), mestranda em Estudos sobre as Mulheres (UNV)

Nayara Maranthya da Conceição Gurgel

Licenciada em Letras - Língua Espanhola, especialista em Estudos Literários e mestranda em Ciências da Linguagem (UERN)

Daniela Katêrine de Oliveira

Licenciada em Letras - Língua Portuguesa (UERN), especialista em Literatura e Ensino (IFRN), mestranda em Ciências da Linguagem (UERN), professora do Ensino Fundamental da rede privada de educação de Governador Dix-Sept Rosado/RN

Este texto tem o objetivo de compartilhar a nossa atuação como estagiários regentes na Escola de Ensino Fundamental e Médio Dr. Brunilo Jacó, sediada em Redenção/CE, da rede estadual de educação, na qual ministramos aulas durante os meses de maio e junho de 2017 para uma turma do 3º ano do Ensino Médio (turma Minas Gerais). A experiência na escola foi proporcionada pela disciplina de Estágio Supervisionado em Língua Portuguesa (Ensino Médio), ministrada pelo professor doutor Kennedy Nobre Cabral. Nossa atuação teve o objetivo de aplicar na prática os conhecimentos construídos ao longo do curso de Letras - Língua Portuguesa da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) e propiciar os subsídios necessários à prática pedagógica na disciplina de Língua Portuguesa na condição de futuros professores.

Acreditamos que este relato pode contribuir significativamente para a intervenção pedagógica nas disciplinas de Estágio Supervisionado em Língua Portuguesa (regência) de estudantes de licenciatura em Letras - Língua Portuguesa, uma vez que muitos têm dúvidas de como proceder nessa intervenção, bem como à escrita do próprio relatório final. A atuação relatada neste texto foi considerada bem-sucedida por parte do professor da disciplina e da professora regente supervisora; o relatório apresentado ao final da experiência obteve nota máxima. Em nossa intervenção, aliamos de forma sólida os conhecimentos teóricos e a prática docente, uma vez que essa etapa da formação em Letras (licenciatura) demanda muitas leituras e pesquisas, visando à seleção de metodologias didático-pedagógicas adequadas aos objetos de conhecimento a serem trabalhados e ao próprio domínio teórico desses objetos por parte dos professores em formação.

Dessa forma, além de ser importante estarem munidos de leituras que proporcionem os pressupostos teóricos que guiarão a atuação no geral, é mister que os estagiários apropriem-se de leituras específicas para cada conteúdo a ser mediado em sala de aula: é uma prática que exige constante pesquisa, pois, apesar da tendência da escola de seguir o currículo preestabelecido pelo livro didático, cabe aos estagiários a busca por complementações, acréscimos e esclarecimentos que somente é atingida em virtude das leituras direcionadas a objetivos específicos. O estagiário pode não ter escolha em relação ao que irá ensinar aos alunos, mas ele, na grande maioria das vezes, tem autonomia quanto à forma pela qual intervirá. Essa autonomia é obtida apenas por meio de embasamento teórico e metodológico.

Dito isto, este relato de experiência está organizado da seguinte maneira: na seção Contextualização de alguns aspectos pertinentes à escola e das condições preestabelecidas, discorremos sobre a estrutura, o perfil socioeconômico dos estudantes, os profissionais, o projeto político-pedagógico e sobre as condições preestabelecidas pela professora regente; em Pressupostos teóricos adotados na intervenção docente, discutimos acerca dos autores e respectivos conceitos e teorias nos quais nos embasamos para a nossa atuação como estagiários; na seção Relato das atividades desenvolvidas na intervenção, descrevemos as aulas para a turma de 3º ano do Ensino Médio, especificando os conteúdos ministrados, os textos utilizados, os autores aos quais recorremos para nosso embasamento, as atividades solicitadas, os recursos didáticos envolvidos e as metodologias utilizadas; por último, na seção Conclusão, apresentaremos considerações finais sobre a nossa atuação.

Contextualização de aspectos pertinentes à escola e de condições preestabelecidas

A unidade de ensino na qual estagiamos atendia, em 2017, a 711 alunos. Deles, 659 eram do Ensino Médio e 52 do EJA. A Escola de Ensino Fundamental e Médio Dr. Brunilo Jacó, localizada na zona urbana de Redenção/CE é uma escola pública de Ensino Fundamental e Médio mantida pelo Governo do Estado de Ceará, criada pelo Decreto nº 15.750, de 19 de janeiro de 1983, com denominação de escola de 2º grau.

 A unidade surgiu da necessidade de atender à demanda de Ensino Médio da região, garantindo o acesso ao ensino público. A clientela atendida a comportava não somente estudantes residentes em Redenção, mas também em municípios vizinhos, como Acarape e Guaiuba.

Esses alunos eram advindos, em sua maioria, de famílias das classes baixa e média-baixa, cuja renda oscilava entre um e três salários mínimos, boa parte deles residia na zona rural, dependendo de transporte escolar. Muitos trabalhavam, devido à necessidade de complementação da renda familiar. Alguns – uma minoria – já tinham filhos.

A escola tinha um quadro de 26 professores, de modo que o corpo docente era dividido por disciplinas vinculadas às áreas do conhecimento: Ciências da Natureza, Ciências da Matemática, Linguagens e Códigos e Ciências Humanas. Além disso, tinha auxiliares administrativos, auxiliares de serviços gerais e porteiros, totalizando cerca de 15 colaboradores.

Na escola havia nove salas de aula, todas bem iluminadas, com quadros brancos grandes, projetores de imagem instalados em cada uma delas; caso o professor solicitasse, por uma necessidade, a escola dispunha de duas TVs para subsidiar a ministração dos conteúdos. As salas possuíam, ainda, ares-condicionados e carteiras individuais.

Além disso, havia uma sala de multimeios, um laboratório de Ciências, banheiros masculinos e femininos, bem como banheiro adequado a alunos com deficiência ou mobilidade reduzida, com dependências e vias adequadas para esses alunos na estrutura física da escola. Havia ainda uma sala de orientação educacional, uma sala de direção, um almoxarifado, uma cantina, uma quadra poliesportiva, que também funcionava como auditório no caso de atividades e eventos de grande porte, e um laboratório de informática no qual os professores podiam dar aulas mediante reserva prévia.

O projeto político-pedagógico visava a um ensino de qualidade com a participação de todos, assentando-se numa perspectiva democrático-participativa, a qual pressupõe a participação, em tese, de toda a comunidade escolar na tomada de decisões. A escola, nesse entendimento, tem a missão de garantir um ensino que propicie o desenvolvimento de habilidades e competências necessárias para o exercício da vida profissional e para os desafios do mundo atual, compartilhando experiências e saberes entre os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, com o objetivo de exercer plenamente a cidadania. Dessa maneira, a escola afirmava os seguintes valores: gestão escolar democrática, respeito mútuo, igualdade e solidariedade.

Encerrando a explanação de alguns aspectos relacionados à escola, consideremos agora as condições que influenciaram nossa regência na turma de Ensino Médio. Para ministrar as aulas de Língua Portuguesa, tivemos de contemplar os conteúdos previstos pelo cronograma curricular do 3º ano, os quais eram norteados pelo livro didático de Língua Portuguesa adotado pela unidade de ensino, o volume 3 da coleção Português: Linguagens, organizada por Cereja & Magalhães (2013). Dessa forma, tivemos de conciliar nossas pesquisas, que tinham o objetivo de complementar e/ou suprir as informações fornecidas pelo livro didático (doravante LD) com o currículo estabelecido.

Pressupostos teóricos adotados na intervenção docente

Nas aulas de Língua Portuguesa, embora o professor possa se valer do livro didático, discordamos de que este deva ser o norteador da prática docente. Segundo Silva et al.,

a falsa democratização do ensino [...] ampliou inconsequentemente o quadro escolar e a solução encontrada diante do despreparo docente foi o acesso ao livro didático, quase na condição de substituto de cursos necessários, ou seja, como um manual que por si só ensinasse ao professor como ensinar e [...] que ensinasse ao aluno tudo que fosse possível. Ambos os agentes do processo educativo são transformados em meras máquinas reprodutoras, de sujeitos agentes ideais passam a ser sujeitos pacientes reais (Silva et al., 2010, p. 977).

Assim, a despeito das limitações, desvencilhamo-nos de uma postura meramente submissa e elegemos a pesquisa constante como preponderante no norteio de nossas aulas, por sermos agentes do processo educativo e não “meras máquinas reprodutoras”; afinal, se o LD por si só bastasse para propiciar a aprendizagem dos alunos, não seria necessária a existência de licenciaturas em Língua Portuguesa. Bons reprodutores do livro didático poderiam cumprir, sem formação docente alguma, os postos de professores de Língua Portuguesa.

No entanto, não desconsideramos o fato de que essa “falsa democratização do ensino”, que, em nível nacional, pressupõe o amplo acesso à Educação Básica, também acarreta, em nível escolar, a sobrecarga do trabalho docente. Com extensa carga horária semanal, devendo ministrar aulas para várias turmas de diferentes séries, o professor muitas vezes não tem tempo suficiente para planejar adequadamente suas aulas diante do quadro de demasiado trabalho (principalmente no caso da disciplina de Língua Portuguesa), que extrapola até mesmo a carga horária semanal que o docente deve cumprir. Nesse contexto, nós, estagiários, pudemos intervir no sentido de amenizar essa sobrecarga de trabalho docente à qual aludimos, devido ao nosso tempo livre dedicado ao planejamento de aulas, com o intuito de serem produtivas, para uma única turma.

Desse modo, além de pesquisarmos informações adicionais acerca dos conteúdos ministrados, valemo-nos de pressupostos teóricos que guiaram nossa prática, por meio dos quais consideramos certas concepções de língua e de gramática. Como assevera Antunes (2003), há por detrás de toda aula de Língua Portuguesa, embora inconscientemente, uma concepção, por parte do professor, de língua e de gramática.

De acordo com Travaglia (2009), ao fazer uso da língua, o indivíduo não somente exterioriza um pensamento ou transmite informações, mas realiza ações, age e atua sobre o interlocutor, o qual pode ser um ouvinte ou um leitor:

A linguagem é, pois, um lugar de interação humana, de interação comunicativa pela produção de efeitos de sentido entre interlocutores, em uma dada situação de comunicação e em um contexto sócio-histórico e ideológico. Os usuários da língua ou interlocutores interagem enquanto sujeitos que ocupam lugares sociais e “falam” e “ouvem” esses lugares de acordo com formações imaginárias (imagens) que a sociedade estabeleceu para tais lugares sociais (Travaglia, 2009, p. 23).

Como argumentam Cardoso e Cobucci (2014, p. 99), “é importante conceber a língua não como instrumento de comunicação, mas também como forma de interação social, pois só assim será gerado um novo sentido nas/das aulas de língua” (Cardoso; Cobucci, 2014, p. 99). Na esteira do entendimento de que a língua não é simplesmente um “sistema em potencial, em disponibilidade”, Antunes (2007) destaca que, além de ser a língua constituída por um léxico, o qual comporta o “vocabulário da língua” e uma gramática na qual residem as “regras para construir palavras e sentenças da língua”, “supõe um uso, supõe a atualização concreta – datada e situada em interações complexas que necessariamente compreendem: 3. A composição de textos – que inclui recursos de textualização; 4. Uma situação de interação – que inclui normas sociais de atuação” (Antunes, 2007, p. 41).

Assim, a gramática, ao contrário da crença corrente, não é sinônimo de língua; pelo contrário, ela é parte constituinte da língua, sem a qual nenhum falante pode interagir por meio daquela: “a cada instância de utilização da língua se ativa a gramática e, portanto, a gramática (como organização da fala) se explicita a partir do uso linguístico” (Neves, 2008, p. 125).

Na prática da regência, em contrapartida, não nos foi possível fomentar uma atividade na qual houvesse uma situação real de interlocução a partir da qual trabalharíamos determinados recursos de textualização influenciados pelas suas respectivas normas, por causa da ausência de questões que cobrassem quaisquer produções de gêneros textuais.

No entanto, nossa concepção de gramática foi fundamental para despertar no aluno o entendimento de que ele conhece, sim, a gramática de sua língua. Desse modo, como estudante de Língua Portuguesa, ele poderá mobilizar diferentes gramáticas conforme forem as situações de interação, as quais, segundo Antunes (2007, p. 41), compreendem as “normas sociais de atuação”.

Essa concepção de gramática assenta-se também no entendimento de Neves (2008) sobre gramática, que pode ser compreendida como:

a. a gramática como um sistema de princípios que organiza as orações, sistema do qual têm posse todos os falantes nativos de uma dada língua, nada mais que aquela natural capacidade de produzir enunciados na língua materna que o falante aciona numa simples ligação entre cognição e linguagem; b. a gramática como a extensão da competência do falante à organização das palavras de interação, seja em textos continuados, seja em peças em coautoria (a produção de discurso na interlocução, a competência comunicativa) (Neves, 2008, p. 117).

O que vemos no contexto escolar é geralmente o entendimento de que manejar a gramática normativa é unicamente a forma correta pela qual podemos fazer uso da língua, concepção da qual discordamos. Entendida a gramática como “conjunto de regras” que o aluno já domina (Possenti, 1996), sabemos que ela se refere às “hipóteses sobre os conhecimentos que habilitam o falante a produzir frases ou sequências de palavras de maneira tal que essas frases e sequências são compreensíveis e reconhecidas como pertencendo a uma língua” (Possenti, 1996, p. 69).

No entanto, não se trata de abolir totalmente o ensino da gramática normativa, uma vez que a escola, segundo Neves (2008), tem, sim, o dever de atentar-se à “adequação social do produto linguístico de seus alunos, isto é, ela tem de garantir que seus alunos entendam que têm de adequar registros”, de modo que os discentes tenham “condições de mover-se nos diferentes padrões de tensão ou de frouxidão, em conformidade com as situações de produção” (Neves, 2008, p. 128).

A gramática normativa, entendida como o conjunto de regras que devem ser seguidas, por contemplar a norma padrão, a qual se aproxima mais das variedades linguísticas utilizadas por falantes socioeconomicamente favorecidos, deve ser trabalhada em sala de aula com o intuito de possibilitar a ascensão social de alunos advindos das camadas populares, principalmente no caso das escolas públicas. Como destacam os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, “aprende-se a valorizar determinada manifestação porque socialmente ela representa o poder econômico e simbólico de certos grupos sociais que autorizam a sua legitimidade” (Brasil, 2000, p. 7).

Concordamos que o professor de Português deve considerar a gramática internalizada dos seus alunos, a partir da qual apresentaria outra gramática desconhecida por eles. Segundo Borges Neto (2013), o ensino de Língua Portuguesa, assim como em disciplinas como Biologia, Química e Física, pode, sim, promover uma “iniciação científica”, a qual pressupõe o estudo não somente das nomenclaturas, “desnaturalizando” o ensino de língua, mas também o desenvolvimento de levantamento de hipóteses, de testagem e de avaliação: “Não há, então, nenhuma razão plausível para que os estudos gramaticais sejam excluídos do ensino de Português, desde que colocados em seu devido lugar e orientados para fins adequados” (Borges Neto, 2013, p. 70, grifo do autor).

A naturalização do ensino de gramática à qual Borges Neto (2013) se refere diz respeito à apresentação da gramática tradicional como descrição explícita da própria língua:

O que estou chamando de naturalização é o processo de tomar como objeto o que é uma teoria. Ou seja, no caso, o processo pelo qual as noções teóricas dos gramáticos da Antiguidade Clássica deixam de ser consideradas partes de uma teoria sobre a língua e passam a ser parte da própria língua. Por exemplo, as noções como substantivo, pronome, artigo, flexão, sujeito, concordância deixam de ser entidades teóricas, identificadas nas línguas por uma teoria particular, e passam a ser entidades do mundo, isto é, passam a ser “coisas” que existem nas línguas. Como parte do objeto – e não de determinada teoria –, essas noções raramente são discutidas. E, quando são discutidas pelos linguistas, é só para tornar mais precisa a sua definição ou para fazer pequenos ajustes no papel que exercem nas teorias (Borges Neto, 2013, p. 72).

Desse modo, não nos sendo possível fugir das nomenclaturas, uma vez que elas são cobradas pela escola e pelo livro didático, norteador – infelizmente – da prática docente, atuamos nas aulas de modo explicar as funções e os sentidos implicados pelas regras estudadas – sempre considerando os contextos nos quais são exigidas –, descrevendo-as por meio de explicações por vezes exaustivas.

Amparados em Possenti (1996), sabemos que é mister que o aluno seja proficiente no domínio do maior número possível de regras, conforme “as exigências e convenções dessas circunstâncias”. Sem termos o objetivo de ensinar uma variedade em substituição à já dominada pelo aluno, trabalhamos no sentido de “criar condições para que os alunos aprendam também as variedades que não conhecem ou com as quais não têm familiaridade, aí incluída, claro, a que é peculiar de uma cultura mais ‘elaborada’” (Possenti, 1996, p. 83).

Segundo esse autor, o docente pode trabalhar com os três tipos de gramática descritos por ele: a gramática internalizada, entendida como o conjunto de regras que o falante domina; a gramática descritiva, o conjunto de regras que são seguidas; e gramática normativa, entendida como conjunto de regras que devem ser seguidas (Possenti, 1996). Assim, em nossa prática docente na condição de estagiários, mobilizamos em nossas atividades esses três tipos de gramáticas, partindo, na medida do possível, da gramática internalizada à normativa.

Relato das atividades desenvolvidas na intervenção docente

Nesta seção descrevemos as atividades desenvolvidas durante a prática do Estágio Supervisionado direcionadas à turma Minas Gerais, do 3º ano do Ensino Médio, na Escola de Ensino Fundamental e Médio Dr. Brunilo Jacó, sediada em Redenção/CE, pertencente à rede estadual. Cada subseção, iniciada com o plano de aula utilizado, se refere a um dos dez dias de regência em sala de aula, que ocorreu de 3 de maio a 23 de junho de 2017. Após os planos de aula, são apresentados de forma detalhada conceitos, teorias e autores nos quais nos embasamos de forma específica para cada conteúdo ministrado, os exercícios trabalhados e as metodologias e os recursos utilizados. As aulas ocorreram às quartas e às sextas-feiras do turno matutino, totalizando quatro horas/aula semanais. Para melhor acordamos a forma pela qual ministramos as aulas, encontramo-nos uma vez por semana, às tardes das terças-feiras, com a professora titular da turma em questão, a senhora A., acrescendo à nossa carga horária 2 a 3 horas semanais.

Primeiro dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 3 de maio de 2017. Horário de início: 7h. Horário de término: 8h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Conhecer as características das vanguardas europeias.

Conteúdo: Pinturas de artistas modernistas (apêndice 1); Manifesto Futurista, de Filippo Tomasio Marinetti, constante no livro didático.

Estratégia: Por meio da apresentação das pinturas modernistas, elencando suas características, pretende-se fazer assimilar as características de suas correntes modernistas correspondentes. Com a leitura do Manifesto Futurista como arremate, sistematizar-se-ão as características gerais das vanguardas europeias, que tinham como prisma a inovação na linguagem.

Material: Slides; lousa; livro didático.

Avaliação/Observação: Após a aula, solicitar-se-á a resolução em casa do exercício da página 45 do livro didático.

Embasando-nos em Solé (1998), procedemos a essa aula de leitura de pinturas representantes das vanguardas europeias e do Manifesto Futurista, de Marinetti, atentando-nos à ativação dos conhecimentos prévios dos estudantes acerca dos textos verbais e não verbais em questão. Segundo a autora,

para o leitor poder compreender, o texto em si deve deixar compreender e o leitor deve possuir conhecimentos adequados para elaborar uma interpretação sobre ele. [...] Ao nos referirmos ao “conhecimento prévio adequado” ou relevante do leitor, não estamos referindo ao fato de ele “saber” o conteúdo do texto, mas ao de que entre este e seus conhecimentos exista uma distância ótima que permita o processo de atribuição de significados que caracteriza a compreensão (Solé, 1998, p. 71).

Dessa forma, antes de discutirmos as características das obras em questão, chamamos a atenção para informações prévias pertinentes ao entendimento delas. Por exemplo, antes de fomentarmos uma análise acerca do quadro O grito, de Edvard Munch (1893), chamamos a atenção para o que se entende acerca das expressões faciais do protagonista: elas demonstram desespero, agonia, pânico? Além disso, as cores escolhidas para a composição do quadro, nas quais se inclui um vermelho marcante, simbolizam a associação da obra a uma espécie de profecia, por parte do artista, do episódio que viria a marcar o início do século XX: a Primeira Guerra Mundial. Após cada obra de arte apresentada, eram feitas considerações sobre os aspectos cuja importância era imprescindível à compreensão.

Após os slides sobre as vanguardas europeias, com a leitura do Manifesto Futurista, situamos previamente os alunos em relação a essa corrente, de modo que a leitura fosse facilitada, ao elencar as principais características dos futuristas. Esse momento de leitura se associou a uma reflexão sobre as figuras de linguagem presentes no texto, de modo a introduzir neles a noção de efeitos de sentido. Durante a leitura, fomentamos, vale ressaltar, a ativação, por meio de perguntas, dos conhecimentos prévios imprescindíveis à compreensão.

Ao final da aula, a pedido, em planejamento anterior, da professora titular, solicitamos aos alunos a resolução da atividade presente no livro didático.

Segundo dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 5 de maio de 2017. Horário de início: 8h40min. Horário de término: 10h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Corrigir a atividade sobre o futurismo; conhecer as características da primeira geração modernista no Brasil.

Conteúdo: Manifesto da Poesia Pau Brasil (1924), de Oswald de Andrade.

Estratégia: Após a leitura do Manifesto da Poesia Pau Brasil, proceder-se-á à elucidação dos princípios da poesia modernista no Brasil.

Material: Lousa; cópias do Manifesto da Poesia Pau Brasil.

Avaliação/Observação: Nesta aula, será exercitada a habilidade de escuta/audição por parte da turma.

Atividade para casa: Resolução da atividade sobre o poema Os sapos, de Manuel Bandeira, constante no livro didático, página 54.

Iniciamos a aula com a correção da atividade sobre o futurismo, presente na página 44 do livro didático. A pedido da professora da turma, a correção não pôde ser delongada, de modo que nos detivemos na exposição das respostas sugeridas pelo livro didático, tecendo breves comentários. Para tal, durante essa aula, a professora nos emprestou seu livro didático, o qual continha as respostas sugeridas.

Em seguida, procedemos à leitura do Manifesto da Poesia Pau Brasil (1924), de Oswald de Andrade, o principal assunto da aula em questão. A partir dessa leitura, pudemos sistematizar as principais características da primeira geração modernista. Pudemos perceber que, além de definir novos princípios para a poesia, Oswald também pretendia “realizar uma revisão cultural do Brasil, através da valorização do elemento primitivo” (Schwartz, 1995, p. 165).

Fomentamos, ainda, uma discussão sobre o conceito de antropofagia na literatura modernista. Embora não tenha sido discutido no Manifesto da Poesia Pau Brasil, é notável a proposta do movimento antropofágico, a assimilação das “qualidades do inimigo estrangeiro, para fundi-las às nacionais” (Schwartz, 1995, p. 165). Segundo Nejar (2011, p. 331),

seus Manifestos Pau Brasil e A utopia antropofágica registram posições de vanguarda. E desfraldou a Antropofagia: metáfora, diagnóstico e ao mesmo tempo terapêutica, com aforismos impetuosos contra a prepotência dos dogmas. Sua origem etimológica emana da cerimônia guerreira de imolação do adversário corajoso, depois da luta, pelos tupis. Forma de absorver o valor do inimigo.

Segundo Alfredo Bosi (2006, p. 381), é por meio de Oswald que devemos analisar de forma crítica “o legado do modernismo paulista, pois foi ele quem assimilou com naturalidade os traços conflitantes de uma inteligência burguesa em crise nos anos que precederam e seguiram de perto os abalos de 1929/1930”. Assim, chamamos a atenção para essa assimilação.

Destarte, amparados por esses teóricos, nos debruçamos sobre o manifesto de Oswald no intuito de sistematizar as principais características da primeira geração do modernismo brasileiro, o qual tinha como objetivo uma radical renovação artística por meio da linguagem.

Como Oswald valoriza a liberdade linguística, o uso de formas condenadas pela mentalidade bacharelesca, que supervalorizava a imitação dos moldes de língua do colonizador, fomentamos uma reflexão acerca da variação linguística e da admissibilidade, para fins de atingimento de efeitos de sentido, de formas fora do padrão no texto literário.

Como tarefa para casa, solicitamos a resolução, a pedido da professora da turma, do exercício sobre o poema Os sapos, de Manuel Bandeira, constante na página 54 do livro didático.

Terceiro dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 10 de maio de 2017. Horário de início: 7h. Horário de término: 8h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Corrigir a atividade sobre o poema Os sapos, de Bandeira; revisar as características do modernismo brasileiro (primeira geração); explorar as figuras de linguagem presentes no poema.

Conteúdo: Poemas Os sapos e Desencanto, de Manuel Bandeira.

Estratégia: Por meio da correção da atividade sobre o poema de Bandeira, aproveitaremos a ocasião para revisar as características da primeira geração modernista, uma vez que o poema traz consigo importantes informações que podem ser sistematizadas.

Material: Lousa; livro didático.

Avaliação/Observação: Atividade para casa: pesquisa acerca do poema Desencanto, de Bandeira.

Antes de iniciarmos a correção da atividade, escrevemos, na lousa, o poema Desencanto, de Manuel Bandeira (1993) e solicitamos que os alunos o copiassem em seus cadernos, a fim de que, ao final da aula, procedêssemos à leitura coletiva e discussão dele.

Em seguida, nos dedicamos à leitura do poema Os sapos, de Bandeira (1993). A cada parágrafo, tecemos comentários acerca do poema, fazendo associações com as próprias características da primeira geração modernista. Vale ressaltar que, a todo momento, fizemos perguntas aos alunos acerca do sentido de determinadas expressões presentes no poema, a fim de despertar-lhes o entendimento de suas figuras de linguagem.

Mostramos que, na primeira estrofe do poema, a imagem de sapos inflados por conta de verem a luz sugere uma alusão à postura arrogante dos escritores parnasianos, os quais gozavam de prestígio no período em questão. Da terceira à quinta estrofes, por exemplo, lançamos a reflexão de que as falas dos sapos se vangloriando de sua arte refletem o contraste entre os modernistas e os princípios de arte tida como erudita no parnasianismo, criando um efeito de ridicularização. Na última estrofe, o sapo de menor “prestígio” dentre os sapos, a saber: o cururu, acaba encerrando o poema como uma grande ironia que consiste em associá-lo ao poeta dito modernista. Vale ressaltar que todas as palavras desconhecidas no poema tiveram seus significados expostos por parte dos estagiários regentes.

Nessa aula, não nos foi possível tecer comentários acerca do poema Desencanto em função de o tempo ter sido ocupado em leitura e discussão do poema Os sapos, cujo texto constava na atividade cobrada para casa na aula anterior. Solicitamos, como atividade para casa, uma análise do poema Desencanto.

Quarto dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 5 de maio de 2017. Horário de início: 8h40min. Horário de término: 10h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Conhecer as orações subordinadas substantivas e as noções de valência.

Conteúdo: Cartazes, de cunho normativo, sistematizadores das orações subordinadas substantivas.

Estratégia: Por meio da confecção de cartazes, procederemos à sistematização das orações subordinadas substantivas, valendo-nos das noções de valência.

Material: Cartolinas; lousa.

Avaliação/Observação: Atividade para casa: exercícios das páginas 58 a 63.

Para ministramos essa aula sobre orações subordinadas substantivas, chamamos a atenção, primeiramente, para as distinções entre uma frase, uma oração e um período. Em seguida, recapitulamos noções de período simples. Munindo-nos dos estudos acerca da gramática de valências, a qual toma como nuclear um elemento oracional e demonstra como os demais elementos se dispõem em torno dele mediante relações de dependência, como nos mostra Borba (1996), lançamos a reflexão acerca de que os itens lexicais da língua têm valor absoluto ou relativo. Dessa maneira, trouxemos outra perspectiva em relação à noção tradicional de transitividade.

Muitas vezes, numa postura naturalizada do ensino de gramática normativa, como constata Borges Neto (2013), o professor simplesmente poderia dizer que existem na língua verbos intransitivos, transitivos diretos e indiretos, e bitransitivos, listando-os. Esses tipos de verbos seriam “coisas da língua”. Pelo contrário; ao apresentarmos, por meio dos cartazes, determinados tipos de orações subordinadas substantivas, explicamos que elas satisfazem exigências de outras orações, sem as quais o seu sentido estaria incompleto. Por sua vez, assim como nomes projetam argumentos em nível oracional, temos orações que ocupam o preenchimento dessas “casas vazias”.

Percebemos que a introdução do assunto por meio da explicação desse pressuposto teórico oportunizou melhor entendimento, por parte dos alunos, da função das orações subordinadas substantivas, as quais, atuando como substantivo, complementam o sentido de um elemento da chamada oração principal pela gramática normativa. Dessa forma, fomentamos um melhor entendimento acerca da noção de transitividade expressa pela tradição. Não nos foi possível, devido ao tempo, explicar todos os cartazes; faltaram ser explicados os cartazes sobre as orações subordinadas subjetivas e predicativas.

Como atividade para casa, a professora da turma indicou a resolução dos exercícios da página 58 a 63 do livro didático.

Quinto dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 24 de maio de 2017. Horário de início: 8h40min. Horário de término: 10h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Corrigir os exercícios das páginas 58 a 60 do livro didático.

Conteúdo: Tirinha de Níquel Náusea; letra da canção Eu sei que vou te amar, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes; cartum de Nilson; letra de música Wave, de Tom Jobim.

Estratégia: Valendo-nos dos cartazes afixados na aula anterior, bem como de pesquisas, explicaremos as respostas sugeridas pelo livro didático da professora da turma.

Material: Livro didático; cartolinas; lousa.

Nessa aula, não tivemos tempo para outra coisa a não ser corrigir os exercícios solicitados pela professora da turma na aula anterior, os quais, vale ressaltar, não foram todos corrigidos nesta aula, por conta de terem surgido, ao longo da correção, muitas dúvidas por parte dos alunos.

Dessa forma, corrigimos os exercícios somente das páginas 58 a 60, fazendo associação com os cartazes afixados na aula anterior. Os restantes, a pedido da professora da turma, foram corrigidos em aula posterior à continuação da explicação dos cartazes sobre orações subordinadas substantivas, os quais tratavam das subjetivas e as predicativas.

Na atividade trabalhada, revisamos as orações subordinadas substantivas objetivas diretas, bem como a função da conjunção integrante que. Vale ressaltar que, a todo momento, fizemos alusões às noções do período simples, no intuito de facilitar a compreensão por parte dos alunos. Além disso, elegemos o verbo como núcleo em torno do qual gravitam os demais elementos de uma oração. Nessa aula, a noção de transitividade tradicional associada à noção de valência colaborou para um ensino mais produtivo. Assim, além de Borba (1996), nos valemos de Batista (2011), para revisar os sentidos e as funções das orações subordinadas. Segundo o autor,

nossa competência linguística nos permite reconhecer que as sentenças de uma língua são formadas por dois tipos de itens lexicais: (a) aqueles que fazem determinadas exigências (sintáticas e semânticas), impondo a presença de outros itens (pertencentes a categorias específicas); (b) aqueles que satisfazem exigências de determinadas categorias (Batista, 2011, p. 97).

Sexto dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 26 de maio de 2017. Horário de início: 8h40min. Horário de término: 10h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Explicar cartazes sobre orações subordinadas predicativas e subjetivas; introduzir as orações substantivas reduzidas; revisar as orações já estudadas.

Conteúdo: Cartazes, de cunho normativo, acerca das orações subjetivas e predicativas.

Estratégia: Por meio dos cartazes, levantar-se-á a distinção entre os dois tipos de orações subordinadas substantivas: predicativas e subjetivas.

Material: Cartazes; lousa.

Seguindo a proposta de Possenti (1996), ministramos essa aula aparentemente normativa valendo-nos, no entanto, não somente do conceito de gramática normativa, mas também dos conceitos de gramática internalizada e descritiva. De acordo com o autor, essa proposta consiste em trabalhar as três gramáticas invertendo a ordem de prioridade, “privilegiando a gramática internalizada, em seguida, a descritiva e, por último, a normativa” (Possenti, 1996, p. 87-88).

Dessa forma, antes de explicarmos as distinções entre as duas orações, valemo-nos de exemplos dos próprios alunos para demonstrar que eles já dominam a utilização dos dois tipos de orações em questão. No entanto, a sistematização dessas orações é fundamental para que, em um texto, possamos ter noção de que a não completude de um termo pode resultar em bloqueio na interação, principalmente em se tratando de um texto escrito.

Procedemos, em seguida, às explicações sobre os dois tipos de oração, dando muitos exemplos orais e escritos na lousa, por meio de análises, valendo-nos, também, dos cartazes afixados. Revisamos, ao término das explicações sobre as predicativas e subjetivas, as orações já trabalhadas com os alunos e introduzimos as orações subordinadas reduzidas, por meio de apontamentos, seguidos de exemplos, dos verbos em suas formas nominais: infinitivo, gerúndio e particípio.

Sétimo dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 31 de maio de 2017. Horário de início: 7h. Horário de término: 8h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Corrigir os exercícios das páginas 61 a 63.

Conteúdo: Texto jornalístico É verdade que a vitória-régia suporta o peso de um ser humano?, de Sônia Osman; Poema da necessidade, de Carlos Drummond de Andrade.

Estratégia: Recorrendo aos textos presentes no livro didático, procederemos à correção dos exercícios propostos, fazendo associação com os cartazes.

Material: Livro didático; cartazes; lousa.

Nessa aula, detivemo-nos apenas na resolução dos exercícios solicitados pela professora da turma, tecendo explicações sobre as respostas propostas pelo livro didático, bem como munindo-nos de nossas anotações.

As questões sugeridas pelo material didático, em sua maioria, desconsideraram a compreensão dos textos que deveriam ser unidades do ensino, mas somente cobraram deles a identificação das orações trabalhadas: subjetivas e predicativas.

Dessa forma, na correção, detivemo-nos principalmente na explicação dos efeitos de sentido provocados pelo uso dessas orações, o que foi possível por meio das questões 3 a 5.

Oitavo dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 7 de junho de 2017. Horário de início: 7h40min. Horário de término: 8h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Elucidar as características do primeiro modernismo português; analisar os heterônimos e o ortônimo de Fernando Pessoa; explorar as figuras de linguagem.

Conteúdo: Poemas Poema em linha reta, de Álvaro de Campos; XX, de Alberto Caeiro; Não a ti, Cristo, odeio ou te não quero, deRicardo Reis; Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia, de Alberto Caeiro; Isto, de Fernando Pessoa.

Estratégia: Por meio da divisão da sala em equipes, distribuiremos os poemas sem os nomes dos autores, de modo que os alunos identifiquem sua autoria com base nas explicações dadas anteriormente.

Material: Poemas impressos; lousa.

Vale ressaltar que na aula anterior, do dia 5 de junho, fomos coadjuvantes na regência: detivemo-nos apenas em tecer alguns comentários, quando nos era possível, acerca das características dos heterônimos de Pessoa, por meio dos indícios presentes nos poemas. No entanto, quem deu a aula foi a professora regente. Dessa forma, os alunos já haviam sido introduzidos ao assunto.

Para essa aula, dividimos a sala em equipes, de modo que cada equipe se debruçou sobre a leitura silenciosa, com o fito de identificar o heterônimo ou ortônimo de somente um dos poemas selecionados para a aula em questão, os quais foram entregues aos alunos sem seus respectivos títulos. Segundo Collins e Smith (1980 apud Solé, 1998), na “etapa de leitura silenciosa, na qual os alunos realizam sozinhos as atividades”, eles podem “dotar-se de objetivos de leitura, prever, formular hipóteses, detectar e compensar falhas de compreensão etc.” (Collins; Smith, 1980 apud Solé, 1998, p. 77).

Dessa maneira, os alunos sentiram-se agentes na atividade de leitura, por ela apresentar objetivo bem definido. Após o tempo dedicado à leitura silenciosa, efetuamos a leitura dos poemas, comentando as marcas que nos permitem compreendê-los, nossas hipóteses, e apontando os indicadores nos quais nos baseamos para verificá-las. Além disso, comentamos possíveis “falhas de compreensão e os mecanismos que utilizamos para resolvê-las...” (Solé, 1998, p. 75-76).

Por exemplo, no Poema em linha reta, de Álvaro de Campos (Pessoa, 2006), chamamos a atenção para a presença dos adjetivos: ao se apresentar como porco, vil, sujo, ridículo, absurdo, mesquinho, arrogante etc., o eu lírico põe-se à margem da sociedade, demonstrando seu descontentamento com a hipocrisia das pessoas. Chamamos a atenção também para o título do poema, o qual é uma ironia: o título, ao representar a vida do eu lírico, é irônico no sentido de que, por ser a vida sinuosa, repleta de altos e baixos, caso ela fosse traçada graficamente, seria qualquer coisa, menos uma linha reta. No mais, enfatizamos o caráter crítico e de denúncia do poema, correspondendo, assim, ao irreverente heterônimo de pessoa: Álvaro de Campos.

Em XX, de Alberto Caeiro (Pessoa, 2006), destacamos a grande comparação presente no poema: o eu lírico compara o rio de sua aldeia ao famigerado Rio Tejo, revelando a visão de mundo de seu heterônimo: o simples rio de sua aldeia é tido como “livre e maior” porque a ele não são conferidos os valores da sociedade; pelo contrário, o rio de sua aldeia, ao contrário do Tejo, reflete apenas as características que lhe são inerentes. Além disso, apontamos as marcas textuais presentes no poema que sinalizam a busca do objetivismo característico de Caeiro, bem como sua ânsia por privilegiar o presente. Os demais poemas foram lidos e comentados considerando as figuras de linguagem presentes e as marcas textuais indicadoras das características de seus heterônimos correspondentes, mas sem declarar a autoria.

Após nossos comentários sobre os poemas, os alunos procederam a uma última leitura silenciosa, em equipes, a fim de concluir a tarefa de identificação das autorias dos poemas. Após alguns minutos, solicitamos que as equipes se manifestassem e dissessem o porquê de suas respostas. Este momento foi muito produtivo, pois todas as equipes acertaram a autoria dos poemas.

Nono dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 21 de junho de 2017. Horário de início:7h. Horário de término: 8h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Revisar o primeiro modernismo português; analisar as figuras de linguagem presentes nos poemas de Mário de Sá-Carneiro; analisar o uso de certos tempos verbais presentes no poema Quase, de Mário de Sá-Carneiro.

Conteúdo: Poemas Quase e Dispersão, de Mário de Sá-Carneiro.

Estratégia: Por meio da distribuição e análise de poemas impressos, fomentaremos uma visão crítica acerca dos poemas cotejados.

Material: Poema impresso; livro didático; lousa.

Avaliação/Observação: Atividade para casa: exercício da página 76.

Após as nossas considerações, por meio de anotações na lousa e explicações acerca do primeiro modernismo português, distribuímos o poema impresso Quase, de Sá-Carneiro (1995), chamando a atenção para as figuras de linguagem presentes nele. O poema Dispersão, por sua vez, estava publicado no livro didático.

Em seguida, procedemos à leitura e à explicação dos poemas. Em relação ao poema Dispersão (Sá-Carneiro, 1995), por exemplo, discutimos a presença de metáforas que simbolizam a ignorância do eu lírico em relação a si mesmo constantes na primeira estrofe e no decorrer do poema, bem como da comparação existente na sétima estrofe, a qual denota permanente insatisfação consigo próprio. Na sétima estofe, por exemplo, vemos a presença de uma metáfora que associa uma ave ao próprio poeta: ao buscar a concretização do objetivo, aproximando-se do ideal, a “ave” fecha as asas. Na décima primeira e na décima segunda estrofes, percebemos a presença de jogos antitéticos simbolizadores da “dispersão” do eu lírico, bem como de seus conflitos existenciais.

Em relação ao poema Quase, além das figuras de linguagem, destacamos o título do poema: o que ele nos suscita? Ouvimos as considerações dos alunos e, em seguida, comentamos que esse advérbio, com o sentido de incompletude presente nele, não é ingenuamente o título do poema; pelo contrário, ele sugere muito sobre seu conteúdo.

No poema, vemos, em sua primeira estrofe, a presença do verbo ser no pretérito imperfeito usado com o sentido de condicional (futuro do pretérito): um recurso estilístico utilizado pelo poeta para sugerir a possibilidade de consecução do ideal no momento presente.

Para concluir, a professora da turma avisou que seria ela quem corrigiria, posteriormente, o exercício passado para casa e que, na próxima aula, já deveríamos iniciar o conteúdo sobre orações subordinadas adjetivas.

Décimo dia de regência

Plano de aula elaborado

Dia 23 de junho de 2017. Horário de início: 7h. Horário de término: 8h40min. Número de horas/aula: 2 h/a.

Objetivo: Distinguir as orações subordinadas adjetivas explicativas e restritivas.

Conteúdo: Textos explicativos.

Estratégia: Por meio da escrita de cartas improvisadas na lousa, iniciaremos a reflexão acerca dos diferentes sentidos das duas orações adjetivas em questão. Em seguida, com a distribuição de impressos explicativos, sistematizaremos as suas características.

Material: Textos didáticos impressos; lousa.

Iniciamos a aula relembrando o conceito de adjunto adnominal, imprescindível à introdução ao conteúdo proposto. Ao traçarmos a distinção, por meio dos exemplos, entre os dois tipos de oração em questão, chamamos a atenção para a presença ou não da virgulação, a qual é fundamental para a demarcação de uma oração explicativa ou restritiva; ressaltamos também a presença dos pronomes relativos, os quais se referem a um termo antecedente na chamada oração principal, que pode ser um substantivo ou um pronome.

Os alunos acharam interessante a reflexão acerca da distinção dessas orações, uma vez que, por meio do humor, lançamos mão de exemplos nos quais a intenção era demarcar uma explicativa, mas que, no entanto, não houve a sinalização das vírgulas, como, por exemplo, em “Meu namorado que mora em Brasília”.

Dessa forma, a todo momento chamamos a atenção para a virgulação, que, no caso da escrita, é necessária para a compreensão do sentido pretendido pelo produtor de um texto.

Conclusão

O estágio de regência em Língua Portuguesa no Ensino Médio nos possibilitou a experiência como docente, a qual é influenciada por vários fatores, dentre os quais se destacam as condições preestabelecidas pela escola em relação ao currículo previsto, a disposição dos estudantes em atentar-se às aulas e a consideração de suas dificuldades e necessidades.

 A dependência do material didático, embora tenha sido muitas vezes desagradável, possibilitou pensarmos maneiras pelas quais inovaríamos; afinal, mesmo com as prescrições dos exercícios contidos no livro didático, coube a nós decidir a forma pela qual explicaríamos esses exercícios. Ainda que os conteúdos também tenham sido prescritos pelo livro didático, assumimos uma postura de constante pesquisa, de modo a complementar as informações presentes no material.

Na nossa atuação, embora não tenha sido possível fomentar uma produção textual advinda de uma situação real de interação, tivemos o objetivo de realizar, amparando-nos em Borges Neto (2013), uma iniciação científica em torno da língua portuguesa. Não sendo possível esquivarmo-nos das nomenclaturas, ao lado de noções classificatórias e das explicações tradicionais, colocamos, na medida do possível, explicações científicas em torno do estudo da língua. Consideramos, a todo momento, a variação linguística, por a considerarmos “uma postura em relação à língua e à forma como ela precisa ser ensinada nas salas de aula (Cardoso; Cobucci, 2014, p. 99).

Desse modo, respeitamos as diversas maneiras de dizer uma mesma ideia em função dos diferentes contextos e suas respectivas normas sociais. Assim, embora tenhamos explicitado as regras da gramática normativa, não ignoramos o fato de que os alunos já dominam as regras de sua própria língua. Na escola, ao ter acesso à gramática normativa – cujas regras são apenas diferentes das variedades dominadas pelos estudantes –, ao aluno são apresentadas outras variedades, que serão acrescidas ao seu domínio da língua.

Com esse entendimento, não condenamos os usos considerados inaceitáveis pela gramática normativa; pelo contrário, tratamo-los como legítimos e dignos de respeito. A língua é, antes de tudo, parte constituinte de uma cultura cujos falantes têm uma realidade social particular. À medida que promovemos “o respeito a todas as variedades”, propiciamos “o ensino daquelas não dominadas por nossos alunos” (Cardoso; Cobucci, 2014, p. 107).

Aprendemos muito durante toda a regência e não ficamos totalmente à mercê do livro didático, como dito anteriormente. Pudemos fazer uma reflexão acerca de nossa postura como futuros professores, analisando nosso próprio potencial frente a situações que exigem maleabilidade e, ao mesmo tempo, controle. Reger uma turma de mais de 40 alunos não é fácil; muitas vezes, além de ministrarmos o conteúdo, devemos nos preocupar em prender a atenção dos estudantes. Da mesma forma que encontramos alunos de comportamento exemplar, havia alunos indisciplinados. Diante desse quadro, adotamos uma outra postura: não assumir uma relação autoritária.

Percebemos que a paciência e o desejo de contribuir com a formação dos estudantes podem ser maiores do que as resistências encontradas. O trato com educação, a sutileza na forma como chamar a atenção, as repreensões não constrangedoras, sem exposição de autores específicos, aos alunos que apresentavam comportamento indisciplinado, bem como o total controle psicológico em meio às adversidades, foram imprescindíveis à adesão da turma às nossas aulas. Por, em nenhum momento, termos perdido esse controle e o respeito para com os alunos, mesmo em situações de extrema resistência, pudemos ministrar satisfatoriamente os conteúdos. Com educação e calma, refletimos, em algum momento os alunos respondem positivamente aos nossos comandos, o que pôde ser constatado pela professora da turma, a senhora A.

Muito atuante em nossas aulas, aprendemos muito com A., que nos deu orientações muitas vezes em relação à didática docente nos planejamentos. Além disso, durante as nossas aulas, sempre que possível, ela contribuía com suas opiniões, de modo a favorecer o sucesso do processo de aprendizagem por parte dos alunos. Seu trato gentil e solícito para conosco, sempre conclamando os alunos à participação, muito corroborou para o sucesso de nossa regência.

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Publicado em 28 de fevereiro de 2023

Como citar este artigo (ABNT)

LIMA, Francisco Rangel dos Santos Sá; CÁ, Libânia Fernandes; GURGEL, Nayara Maranthya da Conceição; OLIVEIRA, Daniela Katêrine de. Estágio Supervisionado em Língua Portuguesa no Ensino Médio: um relato de experiência. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 7, 28 de fevereiro de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/7/estagio-supervisionado-em-lingua-portuguesa-no-ensino-medio-um-relato-de-experiencia

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