Jogo Batalha Naval Periódica: uma estratégia de ensino-aprendizagem no ensino de Ciências

Nathália de Souza Abreu

Mestre em Biologia Marinha (UFF), especialista em Ensino de Ciências (UFF), em Biologia Marinha e Oceanografia (Famath) e em Análises Clínicas e Toxicológicas (Unesa), docente da Prefeitura Municipal de Itaboraí e da Prefeitura Municipal de São Gonçalo

A utilização de jogos como estratégia de ensino-aprendizagem vem ocorrendo em muitas disciplinas como recurso para melhor compreensão de diversos temas. De acordo com Gonzaga et al. (2017), os jogos fazem parte de uma abordagem construtivista que permite a participação ativa do aluno na construção do conhecimento, bem como seu desenvolvimento intelectual e social.

Atividades com jogos no ensino de Ciências e conteúdos de Química no Ensino Fundamental têm sido utilizadas no intuito de propiciar um aprendizado significativo, mais interessante e prazeroso do ponto de vista dos alunos (Barros et al., 2019; Barbosa et al., 2020).

Dentre os conteúdos abordados no 9º ano do Ensino Fundamental, o estudo da tabela periódica é um dos assuntos relatados como de maior dificuldade. Por se tratar de um tema novo desse ano de escolaridade, gera dúvidas e anseios por parte dos alunos. Em geral, muitos acreditam ter que memorizar dados da tabela e acabam por não compreender as propriedades dos elementos, bem como sua localização (Godoi et al., 2010; Barbosa et al., 2020).

Considerando a importância dos jogos, foi desenvolvida a estratégia denominada Batalha Naval Periódica, baseada no jogo batalha naval, que surgiu como brincadeira no início do século XX, passou a ser comercializado nos EUA em 1931 e foi aprimorada para a versão em tabuleiro em 1967 (Ortega, 2012).

Este trabalho teve como objetivo a utilização do jogo Batalha Naval Periódica como estratégia para auxiliar no ensino-aprendizagem do conteúdo tabela periódica pelos alunos do 9º ano do Ensino Fundamental.

Estratégia do jogo

Foi utilizada a tabela periódica disponibilizada no site da Sociedade Brasileira de Química, que foi projetada no quadro branco da sala de aula. A tabela foi utilizada pelos alunos como o campo de jogo.

O formato e a quantidade dos navios seguiram o modelo proposto no jogo Batalha Naval disponível no site smartkids.com.br., com hidroaviões, cruzadores, submarinos, encouraçados e porta-aviões (Figura 1).

Figura 1: Modelo das embarcações baseadas no modelo proposto pelo site smartkids.com.br

Foram desenvolvidos “gabaritos” do jogo em folhas que tinham uma tabela periódica em branco, contendo apenas a numeração dos períodos e famílias. Os quadrados referentes às embarcações foram posicionados na tabela, com acesso exclusivo pelo docente. Nesse gabarito, embarcações foram representadas por quadrados de cores e quantidades distintas, sendo: hidroavião, roxo; cruzador, verde; submarino, laranja; encouraçado, azul; e porta-aviões, rosa (Figura 2).

Figura 2: Modelo do gabarito para uso docente

As embarcações foram desenhadas no quadro branco para que os alunos conhecessem previamente suas cores e posições, bem como a quantidade de cada embarcação presente na tabela periódica.

Descrição do jogo

Os alunos foram divididos em grupos de cinco pessoas; todos devem receber a tabela periódica previamente impressa para consulta durante a atividade.

Os grupos devem escolher a sua jogada utilizando como referência o número do período e família de acordo com a tabela periódica, de modo a encontrar as embarcações escondidas.

Cada grupo tem direito a uma jogada e, em caso de acerto, ganha uma jogada bônus. Cada acerto equivale a um ponto.

Durante a jogada, o grupo deve dizer qual elemento está posicionado no quadrado escolhido pela equipe, bem como quaisquer outras informações que o professor queira obter dos alunos, como símbolo do elemento, estado físico, família (metais alcalinos, alcalino-terrosos etc.), número atômico ou número de massa. A jogada só é validada após o grupo acertar a informação questionada pelo professor e previamente acordada com os alunos. Se os alunos desejarem jogar nas posições equivalentes aos lantanídeos ou actinídeos, devem dizer o nome da série e o número atômico do elemento da jogada. Por exemplo: “série dos lantanídeos, número atômico 63, Európio”.

Caso a equipe encontre uma embarcação, o quadrado será pintado na tabela projetada no quadro branco utilizando marcadores para quadro de cores específicas (azul, laranja, roxo, verde e rosa), conforme o modelo previamente desenhado no quadro. Caso a equipe tenha escolhido uma posição em que não estava nenhuma embarcação, é colocado um X de cor vermelha no local da jogada, sendo equivalente a “tiro na água”.

Quando todas as embarcações tiverem sido afundadas, vence a equipe que tiver feito mais pontos.

Aplicação do jogo

O jogo foi aplicado em três turmas de 9º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública de Itaboraí/RJ, fazendo um total de 70 alunos participantes no dia da aplicação (Figuras 3 e 4).

Figura 3: Alunos procurando informações em suas tabelas periódicas

Figura 4: Marcação das jogadas na tabela periódica no quadro. Os quadrados coloridos correspondem às embarcações encontradas

O jogo foi aplicado separadamente, por turma. Para cada uma, foram realizadas duas rodadas da atividade, com duração total de dois tempos de 50min de aula (Figuras 5 e 6).

Figura 5: Tabela projetada no quadro

Figura 6 : Participação da turma durante o jogo

Avaliação do jogo

Foi elaborado e aplicado um questionário avaliativo visando avaliar a impressão dos alunos quanto a: aplicabilidade da atividade, compreensão das regras do jogo, compreensão dos conteúdos de tabela periódica pré e pós-jogo, contribuição do jogo no ensino-aprendizagem do tema, satisfação quanto à participação na atividade, bem como opinião sobre utilização de jogos como estratégia de ensino-aprendizagem, além de avaliar pontos positivos e negativos da estratégia.

Resultados e discussão

Os alunos participaram ativamente do jogo proposto, interagindo com os colegas de equipe, dialogando, traçando estratégias e trocando informações durante a atividade. A participação efetiva refletiu a motivação e o interesse dos alunos pela atividade proposta. A motivação dos alunos é considerada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais como essencial para a construção do conhecimento (Brasil, 1998). Ainda segundo os PCN, o interesse do aluno pelo tema abordado é fator de suma importância para alcançar aprendizagem significativa (Brasil, 1998).

Analisando os dados dos questionários, observou-se que 88,57% dos alunos participantes recomendariam o jogo a um amigo ou colega para melhor compreensão do tema tabela periódica (Figura 7).

Dos alunos, 32,86% classificaram a atividade como muito boa, enquanto 31,43% classificaram como excelente; 28,57% classificaram como boa. Apenas 4,29% e 2,86% classificaram, respectivamente como muito ruim e ruim (Figura 8).

Figura 7: Respostas dos alunos quanto à recomendação do jogo

Figura 8: Respostas dos alunos quanto à classificação da atividade

Dos participantes, 35,71% afirmaram ter compreensão muito boa quanto às regras do jogo, enquanto 31,43% julgaram ter sido boa e 24,29% relataram ter sido excelente. Das demais respostas, 4,29% classificaram como ruim; 2,86% como ruim e 1,43% não responderam (Figura 9).

Figura 9: Respostas dos alunos em relação à compreensão das regras do jogo

Com relação ao nível de compreensão do tema antes da atividade, a maioria dos alunos afirmava ter conhecimento bom (42,86%), excelente (21,43%) e muito bom (20%) sobre a tabela periódica. Apenas 8,57% e 7,14% dos alunos afirmaram ter conhecimento ruim ou muito ruim sobre o tema, respectivamente.

Uma parcela de 34,29% dos alunos afirmou no pós-jogo ter conhecimento bom acerca do tema, mas a quantidade de alunos que afirmaram ter conhecimento muito bom e excelente aumentou em relação ao resultado pré-jogo, perfazendo 30% e 24,29% dos alunos, respectivamente. A quantidade de alunos que afirmaram ter conhecimento ruim e muito ruim reduziu-se para 5,71% cada (Figura 10).

A maioria dos alunos afirmou estar muito satisfeita com a aplicação da atividade, chegando a 45,71% das respostas, enquanto 27,14% afirmaram estar satisfeitos e 20% ficaram neutros (Figura 11).

Os alunos relataram que a atividade foi importante para a compreensão do tema: 60% relataram que a atividade contribuiu totalmente para a compreensão, enquanto 35,71% afirmaram ter contribuído parcialmente (Figura 12). Tais resultados corroboram a importância do jogo na compreensão da tabela periódica.

Dos alunos, 95,71% afirmaram que atividades diferenciadas devem ser utilizadas como estratégia de ensino-aprendizagem durante as aulas (Figura 13).

Figura 10: Respostas dos alunos em relação à compreensão do tema tabela periódica nos momentos pré e pós-jogo

Figura 11: Grau de satisfação dos alunos com a atividade

Figura 12: Opinião dos alunos quanto à contribuição da atividade para a compreensão do tema tabela periódica

Figura 13: Opinião dos alunos sobre a implementação de atividades com jogos como estratégia de ensino-aprendizagem

Como pontos positivos, os alunos relataram ideias como: “coletividade”, “faz a aula ficar legal”, “união da turma”, “atividade agradável”, “aprender mais”, “é melhor do que fazer dever”, “entender melhor a tabela periódica”, “se divertir aprendendo algo”, “dar mais dinâmica à matéria”, “me divertir com meus amigos em sala de aula”, “participação”, entre outros.

Como pontos negativos os alunos citaram: “competitividade”, “não ganhar o jogo”, “ter pouco tempo para jogar”, “deveria ter mais vezes”, “depender da sorte para achar os navios”, “difícil de entender”.

De acordo com Penteado e Kovaliczn (s/d), existem evidências de que o professor precisa ser criativo em sala de aula, conquistando a atenção do aluno, permitindo a presença do diálogo durante as aulas e melhorando a qualidade do ensino. No presente trabalho, a abordagem do conteúdo tabela periódica de maneira diferenciada permitiu melhor compreensão do tema por parte dos alunos.

Os resultados demonstraram que, além de atingir o objetivo proposto com relação à compreensão do tema, o jogo possibilitou trabalhar e abordar relações interpessoais entre alunos e entre alunos e professor.

Conclusões

O uso de jogos traz benefícios para o aprendizado significativo dos alunos e para o desenvolvimento de relações interpessoais aluno-aluno e aluno-professor, posturas e ações com seus colegas de turma.

Foi notória a satisfação dos alunos ao participar da atividade, principalmente no contexto do retorno às atividades exclusivamente presenciais. Foi perceptível o resgate das interações entre os alunos e o uso de estratégias diferenciadas dentro de sala de aula para promoção de aprendizagem significativa.

O jogo demonstrou ter sido uma importante estratégia auxiliar no aprendizado dos conteúdos relacionados à tabela periódica, tendo sido útil no estudo acerca do tema, promovendo maior interesse dos alunos pelo conteúdo abordado.

A dinâmica do jogo contribuiu também para o trabalho coletivo, para a construção de conhecimento sem memorização do conteúdo, além da criação de um ambiente mais afetivo entre os alunos.

O jogo Batalha Naval Periódica também pode ser utilizado de outras formas, como jogos em duplas ou trios ou com materiais impressos no lugar da tabela projetada; pode ainda ser adaptado à realidade de outras escolas. É uma atividade facilmente adaptável pelos professores que queiram aplicá-la em sala de aula.

Referências

BARBOSA, L. R.; LUDUVICO, I.; SANTOS, L. J. A Batalha dos Elementos auxiliando no ensino de Química. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 20, nº 19, 26 de maio de 2020. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/19/a-batalha-dos-elementos-auxiliando-no-ensino-de-quimica.

BARROS, M. G. F. B.; MIRANDA, J. C.; COSTA, R. C. Uso de jogos didáticos no processo de ensino-aprendizagem. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 19, nº 23, 1 de outubro de 2019. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/19/23/uso-de-jogos-didaticos-no-processo-ensino-aprendizagem.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais – terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental: Ciências Naturais. Brasília: MEC/SEF, 1998.

GODOI, T. A.; OLIVEIRA, H. P. M.; CODOGNOTO, L. Tabela periódica - um super trunfo para alunos do Ensino Fundamental e Médio. Química Nova na Escola, v. 1, nº 32, p. 22-25, 2010.

GONZAGA, G. R.; MIRANDA, J. C. M.; FERREIRA, M. L.; COSTA, R. C.; FREITAS, C. C. C. F.; FARIA, A. C. O. Jogos didáticos para o ensino de Ciências. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 17, nº 7, 4 de abril de 2017. Disponível em: https://https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/17/7/jogos-didticos-para-o-ensino-de-cincias. Acesso em: 6 jun. 2022.

ORTEGA, R. Como surgiu o jogo Batalha Naval? Revista Superinteressante online. 2012. Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/como-surgiu-o-jogo-batalha-naval/. Acesso em: 6 jun. 2022.

PENTEADO, R. M. R.; KOVALICZN, R. A. Importância de materiais de laboratório no ensino de Ciências. Curitiba, s/d. Disponível em: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/22-4.pdf. Acesso em: 20 jun. 2014.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE QUÍMICA. Tabela periódica. s/d. Disponível em http://boletim.sbq.org.br/noticias/2022/n3678.php.

Publicado em 07 de março de 2023

Como citar este artigo (ABNT)

ABREU, Nathália de Souza. Jogo Batalha Naval Periódica: uma estratégia de ensino-aprendizagem no ensino de Ciências. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 8, 7 de março de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/8/jogo-batalha-naval-periodica-uma-estrategia-de-ensino-aprendizagem-no-ensino-de-ciencias

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