Literatura periférica e produção textual no Ensino Médio: uma experiência no Pibid Letras da IFPA

Daniela da Costa Alves de Souza

Graduanda de Letras - Língua Portuguesa (IFPA – Câmpus Belém), bolsista no Programa Residência Pedagógica na Escola Luiz Nunes Direito

Evelin Lays Modesto Araujo

Graduanda de Letras - Língua Portuguesa (IFPA - Câmpus Belém)

Hirla Gouveia Sales

Graduanda de Letras - Língua Portuguesa (IFPA - Câmpus Belém)

Rhayanne Miranda Conceição

Bacharela em Administração (Uninassau), graduanda em Letras - Língua Portuguesa (IFPA - Câmpus Belém)

Victor Oígres da Silva Borges

Graduando de Letras - Língua Portuguesa (IFPA - Câmpus Belém), bolsista no Programa Residência Pedagógica na Escola Luiz Nunes Direito

O presente trabalho tem por finalidade apresentar as ações desenvolvidas no Projeto Literatura Periférica e Produção Textual no Ensino Médio: uma experiência no Pibid Letras, que faz parte do projeto maior do Pibid Letras do IFPA, Campus Belém. Relatamos as ações desenvolvidas em uma turma do 3° ano do Ensino Médio da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Deodoro de Mendonça, situada em um bairro central da cidade de Belém/PA. Em vista disso, conceituamos as características da literatura periférica e solicitamos aos alunos que produzissem contos originais voltados para os temas dessa literatura, como avaliação final da disciplina. Durante as aulas ministradas foi perceptível a falta de contato dos estudantes com o tema, tornando-se fundamental desenvolver atividades voltadas às práticas da leitura e da produção escrita, a fim de promover o ensino-aprendizagem da literatura periférica. Em consequência disso, disponibilizamos o material didático, permitindo que tivessem acesso ao texto literário, mobilizando-os à observação, à interpretação e à produção autônoma.

O contexto de pandemia foi outro fator agravante, visto que impediu o curso normal das aulas presenciais. Logo, ler uma obra literária numa interação face a face, em que os interlocutores poderiam monitorar as reações uns dos outros, ou seja, o professor poderia tentar uma leitura coletiva e crítica em grupo, não foi possível em 2020 ou em 2021. Os sujeitos envolvidos no processo educativo tiveram que buscar, às pressas, os recursos midiáticos disponíveis, pouco usados até então, para se adaptarem ao contexto de aulas à distância. Evidenciaram-se, assim, as dificuldades da escola nesse processo. No entanto, essa experiência no uso de ferramentas foi importante para uma reflexão sobre as práticas vigentes e uma melhor adaptação à continuidade das atividades, as quais ainda estão em constante processo de definição.

Em dezembro de 2021, com a liberação da Secretaria de Educação do Estado do Pará, a escola retornou às aulas presenciais; todavia, nosso contato com os alunos iniciou-se somente em janeiro. Foi nesse momento, então, que nossa sequência didática começou a ser desenvolvida em sala de aula. Este trabalho, portanto, representa, justamente, o desafio de proporcionar aos educandos do Ensino Médio, da escola supramencionada, uma aprendizagem significativa sobre a literatura, com prioridade à leitura de fruição e com obras literárias periféricas para um maior desenvolvimento das habilidades referentes à produção escrita, instigando-os especialmente às obras literárias periféricas, pois na interação com elas forma-se não só o aluno, mas também o ser pensante no meio social.

Referencial teórico

A literatura periférica (LP) é a expressão utilizada “para caracterizar a produção dos autores que vivenciam situações de marginalidade (social, editorial e jurídica) e estão trazendo para o campo literário os termos, os temas e o linguajar igualmente ‘marginais’” (Nascimento, 2006, p. 9), uma literatura de multivozes que precisam ser incluídas no acervo educacional.

A leitura de obras periféricas no ambiente escolar permite aos alunos desenvolver percepções sobre a contextualização da sua vida social e a produção literária, pois “não basta apenas saber ler e escrever, é preciso também fazer uso do ler e escrever, saber responder às exigências de leitura e de escrita que a sociedade faz continuamente – daí o recente surgimento do termo letramento” (Soares, 2014, p. 20).

O movimento da LP é necessário para que cada vez mais pessoas reconheçam e produzam conteúdo no intuito de dar visibilidade e agregar valor à sua manifestação, ainda vista nas sombras do cânone literário. Desse modo, “temos muito a proteger e a mostrar, temos nosso próprio vocabulário que é muito precioso, principalmente num país colonizado até os dias de hoje" (Ferrez, 2005, p. 11). A literatura possui influência significativa na formação do aluno, em seus aspectos cognitivos ou pessoais. Para que essa literatura seja utilizada com êxito em suas diversas esferas é essencial que o professor seja o guia do processo de leitura, estimulando a escrita por meio de comparações com situações cotidianas próximas à obra lida, pois “toda obra literária é, antes de mais nada , uma espécie de objeto, de objeto construído; e é grande o poder humanizador desta construção, enquanto construção” (Candido, 2011, p. 179).

Metodologia

Cotidianamente, a relação entre aluno e professor tem se tornado mais desafiadora, uma vez que a leitura autônoma está mais distante da realidade dos alunos. Dessa forma, Geraldi (1984) defende que o aluno deve ter uma leitura prazerosa, longe do único objetivo de interpretar para um professor, mas sim, interpretar para si mesmo. Além disso, o autor também reitera que a produção textual dos alunos não pode ter, como único objetivo, uma correção e devolução inconsistentes, pois essa prática não estimula a formação de novos leitores e escritores.

Partindo dessa perspectiva, o método, por sua vez, contempla a necessidade de aplicabilidade para o estímulo a uma leitura e uma escrita autônomas. Em virtude disso, a prática também incentiva o desenvolvimento da capacidade criativa. A proposta insiste que os alunos tenham, ainda, breves noções a respeito dos gêneros literários.

Em vista disso, foi necessária a realização de uma sequência didática dividida em quatro fases:

  1. fase de sensibilização do conteúdo;
  2. fase de aprofundamento do estudo acerca do tema;
  3. fase de sistematização para dar início à produção textual; e
  4. fase de socialização dos resultados das produções.

A primeira aula teve como objetivo a sensibilização sobre a LP, quando foi apresentada a conceituação desse eixo literário, uma vez que poucos possuem o conhecimento das características de tais obras contemporâneas. Em seguida, distribuiu-se o material com o conteúdo referente ao processo histórico de vida e obra dos autores mais conhecidos para uma leitura conjunta. Logo, fez-se a leitura do conto Vagalumes do Aurá,do autor periférico Preto Michel, nascido em Salinópolis/PA, cantor de rap e escritor, que mescla a cultura periférica de Belém e da Amazônia. Sua trajetória se inicia trabalhando em projetos sociais das comunidades da região metropolitana. A leitura de Preto teve por objetivo final realizar um exercício de interpretação textual para verificar qual era o nível de leitura daquele grupo de alunos. Após a leitura, uma das questões sugere um exercício de prática textual. Os alunos fazem uma leitura, mudando o final do conto, cuja finalidade, após familiarização com a proposta, é criar uma história na qual eles são os próprios autores, tendo como base uma obra original.

A segunda aula contou com o uso de equipamento multimídia de slide para facilitar o entendimento do conteúdo aos alunos. A aula teve como objetivo o aprofundamento nos gêneros narrativos. Com isso, desenvolveu-se uma aula teórica sobre os gêneros e seus subgêneros, na qual foram apresentadas as respectivas estruturas: do romance, do conto, da crônica e da fábula.

A terceira aula aconteceu via WhatsApp, com a exposição do conteúdo a ser desenvolvido na sequência didática. A aula visava centralizar o conteúdo sobre subgêneros da narrativa, em específico sobre a estrutura textual do conto. Nesse ritmo, foram explorados os elementos da narrativa inseridos no conto, como tempo, espaço, narrador, personagens, entre outros, a fim de que os estudantes se aprofundassem. No momento final da aula, apresentou-se a proposta da atividade final, que consistia em produzir um conto de, no máximo, duas laudas sobre os temas abordados na Literatura Periférica, ou seja, envolvendo os temas: meio ambiente, escola, violência e/ou vulnerabilidade social.

Resultados

De acordo com Marconi e Lakato (2010), população é um conjunto de pessoas que possuem pelo menos uma característica em comum. A população deste estudo compreende os alunos do 3° ano do Ensino Médio da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Deodoro de Mendonça. A turma selecionada é composta por 40 alunos. Os resultados deste estudo foram obtidos de acordo com a interação dos alunos com:

  1. Postagens do conteúdo de Literatura no Instagram;
  2. Aulas ministradas via WhatsApp e seus exercícios no Google Forms;
  3. Aulas ministradas via Google Meet;
  4. Exercícios sobre o conteúdo de literatura periférica;
  5. Produção textual de um conto sobre algum tema afim à literatura periférica.

No perfil do Instagram, o número de alunos que seguiam a página oficial do projeto era de um quarto do número total de alunos da turma. As maiores interações com os conteúdos publicados estavam nas curtidas. Os conteúdos postados no perfil foram, na ordem, "Trovadorismo”, “Humanismo”, “Gêneros Literários”, “Classicismo” e “Quinhentismo”. O conteúdo com mais interação foi “Gêneros Literários”. “Quinhentismo” foi o que suscitou menos interação.

Nas aulas ministradas via WhatsApp, devido às barreiras impostas pela distância física, a confirmação da presença dos alunos era feita por meio de comentários que sinalizavam, por exemplo, um “Ok”, dentre outras expressões. Durante as aulas, percebeu-se somente 10% de interação da turma e, dessa interação, somente 5% estavam relacionadas ao conteúdo. A maioria dos comentários servia apenas para sinalizar a presença durante a aula.

As participações dos alunos da turma 301 via Google Meet contavam normalmente com a presença de 60% a 70% do grupo. Porém poucos alunos levantavam perguntas ou comentários. Alguns interagiam durante as aulas mostrando um conhecimento prévio sobre boa parte do conteúdo. Durante as atividades enviadas à turma pelo Google Forms, a metade do número de alunos realizava as atividades postadas.

Quando foram retomadas as aulas presenciais, o conteúdo ministrado fazia referência à literatura periférica. Durante os debates sobre o conteúdo, percebeu-se que os alunos não conheciam o movimento literário. Na resolução das atividades sobre o tema, os alunos se mostraram bem mais solícitos em responder aos exercícios. Nas questões de interpretação sobre o conto lido, eles conseguiram identificar o que as perguntas questionavam, o que não ocorreu em relação às questões que tratavam de classificações e conceitos dos tipos textuais e gêneros textuais. Isso abriu precedentes para uma futura elaboração de aulas sobre a estrutura dos textos solicitados, em eventuais propostas de produção textual.

A última atividade realizada foi uma proposta de produção textual com o gênero conto. Por meio de temas recorrentes da LP, os alunos produziram um conto para a nota da 4ª avaliação. Muitos alunos se propuseram a fazer a atividade, porém poucos contataram os professores do Pibid para sanar as dúvidas referentes à produção do texto. Após a entrega dos trabalhos, cada conto foi analisado de acordo com as orientações propostas, com pontuação máxima 7,0. Da turma de 40 alunos, pelo menos 30 entregaram a atividade. Durante a avaliação dos textos, percebeu-se que poucos foram os alunos que tiraram a nota máxima. No entanto, a maioria ficou com pontuação satisfatória para a atividade; 70% dos alunos tiraram pontuação entre 6,0 e 7,0, o que demonstra que as aulas ministradas foram eficientes, levando-se em consideração o conhecimento sobre literatura periférica e a produção de textos narrativos do gênero conto. Percebeu-se que as maiores dificuldades encontradas nos textos foram a construção de diálogos diretos e indiretos, o pouco desenvolvimento dos enredos e a ausência de algumas pontuações. Sobre a temática de literatura periférica, foi satisfatória a contextualização das temáticas presentes nos contos; racismo, violência doméstica, abandono de animais, perigo das drogas e violência policial foram os temas mais abordados. Os melhores contos ainda serão selecionados para a última fase, quando haverá a socialização dos resultados produzidos.

Considerações finais

Tendo em vista os aspectos apresentados neste texto, temos como objetivo desenvolver atividades voltadas à prática de leitura e da produção escrita para alunos do 3° ano do Ensino Médio da Escola Estadual Deodoro de Mendonça. Para tanto, foram disponibilizados textos para a prática da leitura, produções textuais e questões interpretativas. Pela observação dos aspectos analisados, esperamos que os alunos tenham absorvido um conhecimento básico dos conteúdos abordados, mesmo com o tempo reduzido para a realização da proposta.

Referências

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.

BARROS, Aidil Jesus da Silveira; LEHFELD, Neide Aparecida de Souza. Fundamentos de metodologia científica. 2ª ed. São Paulo: Pearson Makron Books, 2000.

CANDIDO, A. O direito à literatura. In: CANDIDO, A. Vários escritos. 5ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2011. p. 169-191.

FERRÉZ (org.). Literatura marginal: talentos da escrita periférica. Rio de Janeiro: Agir, 2005.

GERALDI, João Wanderley et al. (org.). O texto na sala de aula. 3ª ed. Cascavel: Assoeste, 1984.

LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Técnicas de pesquisa: planejamento e execução de pesquisas, amostras e técnicas de pesquisa, elaboração, análise e interpretação de dados. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2010.

NASCIMENTO, Érica Peçanha do. 'Literatura marginal': os escritores da periferia entram em cena. Dissertação (Mestrado), Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 3ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2014.

Publicado em 07 de março de 2023

Como citar este artigo (ABNT)

SOUZA, Daniela da Costa Alves de; ARAUJO, Evelin Lays Modesto; SALES, Hirla Gouveia; CONCEIÇÃO, Rhayanne Miranda; BORGES, Victor Oígres da Silva. Literatura periférica e produção textual no Ensino Médio: uma experiência no Pibid Letras da UFPA. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 8, 7 de março de 2023. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/23/8/literatura-periferica-e-producao-textual-no-ensino-medio-uma-experiencia-no-pibid-letras-da-ifpa

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.