O ensino de Libras para surdos na Educação Infantil, no Ensino Fundamental e no Ensino Médio

Jonas Bento de Godoi

Mestrando em Educação (PPGE/Udesc)

Daniele Aparecida da Silva Lemos

Pós-graduanda em Tradução e Interpretação da Libras (Uniasselvi), licenciada em Pedagogia (UNIP)

Evelin Cristina Silva dos Santos

Graduada em Pedagogia, pós-graduada em Educação Especial (Claretiano - Rio Claro)

Mariana Maia Figueredo

Graduada em Educação Especial (UFSM), professora no atendimento educacional especializado na Secretaria da Educação do Estado do Rio Grande do Sul/RS

Inclusão, acessibilidade, respeito, diversidade – esses termos são os mais utilizados atualmente na área educacional. Mas a questão principal é se nos espaços escolares os alunos estão sendo recebidos de acordo com as suas especificidades.

A Constituição Federal (1988) prevê no seu Art. 206 alguns princípios educacionais; entre eles estão a igualdade de condições para os alunos terem acesso, permanência na escola e a garantia de padrão de qualidade; se a educação é direito de todos, os alunos público-alvo da Educação Especial – deficientes, com transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidade ou superdotação (Brasil,1996) – também precisam ser vistos para que permaneçam nas escolas e tenham um ensino de qualidade.

A lei que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional – LDBEN (Brasil, 1996) dispôs em seu texto a modalidade de Educação Bilíngue de Surdos, pela Lei nº 14.191; sabendo do histórico das lutas da comunidade surda, esse foi um marco muito importante, já que, de acordo com os dados apresentados pelo Instituto de Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 2010 havia no Brasil cerca de 10 milhões de cidadãos surdos, correspondendo a cerca de 5% da população nacional.

Na mesma pesquisa, foi verificado que, do total de cidadãos surdos, 32 mil estavam na faixa etária de 0 a 5 anos, ou seja, deveriam estar matriculados na Educação Infantil. Assim, neste trabalho atentaremos ao processo de ensino de Libras para surdos, visando à importância de considerar os avanços que, em virtude de legislações, já ocorreram, mas também refletindo nas didáticas propostas, em estratégias e currículos que as escolas estão adotando para favorecer efetivamente a aprendizagem significativa dos alunos surdos.

Este trabalho é um estudo de caráter exploratório, proporcionando uma análise de referências com o objetivo de construir hipóteses em relação ao processo de ensino de Libras para alunos surdos no que diz respeito à Educação Infantil, ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio.

A pesquisa bibliográfica ocorreu de acordo com materiais já publicados e disponibilizados, como livros, revistas e artigos citados gradativamente e referenciados neste trabalho.

O ensino de Libras para surdos

Em 2002, a Lei nº 10.436 reconheceu legalmente a Língua Brasileira de Sinais como forma de comunicação e expressão, abrangendo seu sistema linguístico e sua estrutura gramatical. Sendo assim, qualquer aluno surdo, independente da faixa etária, nível e/ou modalidade da educação, tem direito de aprender os conteúdos propostos na sua língua materna.

O Decreto nº 5.626/05 também agregou, estabelecendo a língua de sinais para o desenvolvimento de linguagem e na instrução das crianças surdas.

Educação Infantil

Os surdos, em sua maioria, têm apenas o modo de comunicação em comum; cada um traz consigo uma estrutura familiar, social, histórias, vivências etc. Então, os sujeitos variam de acordo com o contexto; de um lado, observamos as crianças surdas de pais surdos que desde muito cedo já recebem estímulos da língua de sinais, enquanto as ouvintes aprendem a falar as primeiras palavras no contexto familiar de forma oral-auditiva. Assim, os surdos aprendem os primeiros sinais, estabelecendo o início da comunicação visual-espacial.

Por outro lado, há os alunos filhos de pais ouvintes, pais que não conhecem a língua de sinais, não sabem como agir e veem como possibilidade criar gestos próprios para facilitar a comunicação com os filhos (Caldas, 2020).

Em virtude desses dois públicos aos quais a língua de sinais é direcionada, o processo de ensino-aprendizagem na Educação Infantil tende a ser mais complexo, pois as crianças de pais não surdos ainda não possuem qualquer tipo de comunicação estabelecida, eles vão aprender efetivamente sobre a língua na escola, entender e se reconhecer como sujeito surdo e usuário da língua de sinais; por isso, o processo de aquisição de outros conhecimentos e desenvolvimento em outras áreas é mais demorado, enquanto os demais já ultrapassaram essa fase no convívio familiar e partiram para o contexto escolar com repertório linguístico.

De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Brasil, 2010), a criança é um

sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura.

Seguindo essa definição, é importante considerarmos como ocorre a interação dessa criança em práticas cotidianas, narração, dentre outras situações no espaço da Educação Infantil; ela não tem ainda uma língua definida e dificilmente sua comunicação clara. Conforme Caldas (2020), a criança surda se sente perdida só de entrar na escola ouvinte; não entende o que é ensinado, mas pode aprender em pouco tempo muitas coisas, começando pelo alfabeto e seguindo para aquisição de novos sinais; além disso o convívio com outras crianças surdas incentiva o estudo, brincadeiras e dramatizações, tudo em língua de sinais.

O professor surdo nessa etapa é muito importante, já que será a figura de maior referência para os pequenos educandos; é considerado modelo, deve ser solícito em mostrar aos alunos a cultura surda, contar histórias, mostrar vídeos de outras crianças surdas, enfim, usar diversas estratégias para auxiliar no desenvolvimento integral, como mediador para as informações do mundo; quanto mais precoce ocorrer esse contato, melhor para as crianças (Caldas, 2020).

É fundamental que esse professor trabalhe em parceria com o professor ouvinte, que por sua vez deve buscar conhecimentos específicos sobre a língua de sinais, a cultura e a identidade surda para entender quem é aquela criança que frequenta sua sala de aula e deve ter seus direitos de aprendizagens garantidos, como os demais. Se o professor se envolver com tais questões, ele provavelmente descobrirá as potencialidades do aluno e se reinventará para atingir os objetivos relacionados ao desenvolvimento daquele indivíduo.

Quando a escola recebe um aluno surdo na Educação Infantil, é importante que esteja preparada para garantir a aprendizagem do aluno sem que se perca a proposta de ludicidade requerida pela faixa etária, pois é por meio dela que as crianças aprendem de maneira prazerosa, envolvidos no próprio universo infantil, brincando e recebendo estímulos para lidar com emoções, compreender regras, memória, habilidades motoras etc. (Aguiar; Araújo, 2020).

A contação de histórias (podendo utilizar recursos como fantoches e dedoches), dramatizações, brincadeiras de imitação e faz de conta, que despertem interesse dos alunos surdos e ouvintes, podem ser um facilitador da interação entre alunos e professor surdo, alunos e alunos, surdos e ouvintes, por exemplo.

Ensino Fundamental

A entrada das crianças no Ensino Fundamental é entre 5 e 6 anos; nessa etapa, as escolas já possuem um currículo preestabelecido, com carga horária definida para cada disciplina; é o momento de o aluno perpassar as duas línguas, tendo a de sinais como primeira e o português escrito como segunda.

Magda Soares (2004), educadora brasileira e referência em alfabetização, aponta que a alfabetização e o letramento são indissociáveis, porque a alfabetização só tem sentido quando desenvolvida no contexto de práticas sociais de leitura e escrita.

Mas... na alfabetização de surdos é possível acontecer essa prática de leitura?

Sim, os alunos surdos também podem ser postos em contato com vários gêneros discursivos produzidos nas relações entre surdos, proporcionando a eles experiências significativas de aprendizado e inserção na cultura surda (Basso; Strobel; Masutti, 2009).

Para Quadros (2000), a leitura e a escrita precisam ter significado:

Aprender sobre a língua é uma consequência natural do processo de alfabetização. Os alunos passam a refletir sobre a língua, uma vez que textos podem expressar melhor ou pior a mesma informação. Ler e escrever são processos complexos que envolvem uma série de tipos de competências e experiências de vida que as crianças trazem. As competências gramatical e comunicativa das crianças são elementos fundamentais para o desenvolvimento de tais processos (Quadros, 2000, p. 53).

Portanto, como na Educação Infantil, também há estratégias no Ensino Fundamental para a aprendizagem da língua de sinais; para isso, é importante que as escolas criem condições motivadoras para desenvolver habilidades de sinalizações, é assim que os alunos vão conseguir criar suas próprias produções textuais, expressando os sinais de forma coerente e autônoma; a modalidade escrita é explorada de forma simultânea ou posteriormente (Basso; Strobel; Masutti, 2009).

O Estado de São Paulo, pensando em toda essa organização do ensino de surdos, por meio da pedagogia surda, visual e bilinguismo, elaborou um currículo semelhante à Base Nacional Comum Curricular; ele pode nortear as práticas dos professores no ensino de Libras como primeira língua (L1) e português escrito como segunda língua (L2) desde a Educação Infantil até o Ensino Médio; neste momento, se dá apenas nos anos iniciais do Ensino Fundamental, quando ocorre o processo de alfabetização.

No currículo de Língua Portuguesa para surdos o documento é organizado em cinco eixos estruturantes: prática de leitura de textos, produção sinalizada, prática de análise linguística, prática de produção de textos escritos e dimensão intercultural. Por sua vez o, curriculo de Libras para surdo abrange quatro eixos: uso da língua de sinais, identidade surda, prática de análise linguística e literatura surda.

Interessante seria se os professores fossem capazes de repensar suas práticas, mas também refletir sobre o quanto os alunos têm potencial para desenvolver habilidade em ambas as línguas, a depender da idade.

Pode ser mais bem compreendido analisando os Quadros 1 e 2:

  • O Quadro 1 faz referência a alguns eixos de aprendizagem e desenvolvimento de escolaridade concernentes ao ensino da Libras no ciclo de alfabetização;
  • O Quadro 2 faz referência a alguns eixos de aprendizagem e desenvolvimento de escolaridade concernentes ao ensino da Língua Portuguesa para Surdos, associado à Libras no ciclo de alfabetização.

Quadro 1: Ensino de Libras

Bases da exploração da visualidade

(EF01LS01) Consolidar aspectos pragmáticos do contato comunicativo – direcionamento da atenção e contato de olho (toque no ombro como forma de chamamento, antecipação do sinal antes de apresentar o objeto, piscar a luz) na interação com o professor e com os outros
estudantes.

(EF01LS02) Explorar as habilidades de percepção e discriminação visual por meio de imagem (detalhes em objetos, fotos, desenhos, identificação de diferenças entre figuras, jogos dos sete erros).

(EF01LS03) Explorar as habilidades de percepção e discriminação visual na identificação de traços da Libras com atividades de jogo da memória em língua de sinais e telefone sem fio adaptado para a realidade da criança surda.

(EF01LS04) Vivenciar o reconhecimento dos movimentos corporais por meio de brincadeiras regionais e da cultura surda (elefante, televisão sem fio, objetos, vivo/morto), músicas interpretadas, danças.

Compreensão e produção

(EF01LS05) Relatar fatos simples do cotidiano pessoal ou do grupo, com o apoio do professor.

(EF01LS06) Observar contação de histórias feita pelo professor ou pelo instrutor de Libras, em interação natural ou em registros de vídeo.

(EF01LS07) Observar a produção do discurso de procedimento em atividades desenvolvidas pelo professor e apresentadas em Libras.

(EF01LS08) Observar a produção do discurso descritivo em atividades desenvolvidas pelo professor e apresentadas em Libras.

(EF01LS09) Explorar, de forma adequada, as habilidades pragmáticas de manutenção de tópico e tomada de turno comunicativo em momentos de interação com o professor
e com os colegas.

(EF01LS10) Explorar a marcação de tempo explícita em relatos de vivências (final de semana, festa).

(EF01LS11) Observar o uso do sistema de pronominalização da Libras nos momentos de recontos de histórias ou de relatos de vivências.

(EF01LS12) Explorar o uso das expressões faciais e corporais da Libras em reconto de histórias.

(EF01LS13) Produzir vídeos se apresentando e apresentando seus colegas.

(EF01LS14) Explorar a ampliação de repertório a partir de notícias do cotidiano.

Comunicação e interação

(EF01LS15) Realizar apresentação pessoal com nome próprio, sinal e idade com o auxílio do professor.

(EF01LS16) Participar de momentos de diálogos para o compartilhamento de vivências, compartilhamento de repertório cultural e de emoções com os interlocutores.

(EF01LS17) Usar a Libras na interação social e lúdica na sala de aula, de forma autônoma, de acordo com as condições e tempo de contato com a língua.

(EF01LS18) Explorar a consciência de si e do outro nas interações sociais entre surdos e ouvintes.

(EF01LS19) Conhecer as saudações e cumprimentos na Libras e fazer uso nas relações com os interlocutores adultos e com os outros estudantes.

(EF01LS20) Explorar as funções da linguagem para iniciar, manter e concluir uma conversa (função fática) e para transmitir uma informação de forma direta (função referencial).

Fonte: Currículo da Cidade – Língua Brasileira de Sinais (Libras), São Paulo, 2019, p. 114.

Quadro 2: Ensino de Língua Portuguesa

Literatura surda

(EF01LPS11) Compreender que a produção literária nas línguas orais é diferente da produção literária nas línguas de sinais.

(EF01LPS12) Conhecer histórias infantis da literatura surda e contos da cultura surda.

Estratégias de leitura

(EF01LPS13) Explorar as ilustrações de histórias com o respectivo texto em rodas de leitura livres e/ou direcionadas.

(EF01LPS14) Mobilizar o repertório para antecipar os elementos de uma narrativa.

(EF01LPS15) Localizar palavras e/ou trechos em textos produzidos ou conhecidos.

(EF01LPS16) Explorar diferentes gêneros textuais escritos e reconhecer visualmente sua estrutura (bilhete, lista, receita, calendário e agenda do dia).

(EF01LPS17) Recuperar informações explícitas no texto com apoio do professor.

(EF01LPS18) Explorar os sentidos das palavras-chave do texto, mantendo a compreensão geral das informações.

(EF01LPS19) Realizar antecipações diante de um tema apresentado.

(EF01LPS20) Utilizar diferentes estratégias de leitura para alcançar os sentidos de novos textos propostos.

(EF01LPS21) Estabelecer relação entre o conteúdo temático do texto lido e conhecimentos prévios.

Procedimentos de leitura

(EF01LPS22) Ler textos utilizando ilustrações e/ou imagens.

(EF01LPS23) Levantar as ideias principais do texto para organizá-las em sequência lógica.

(EF01LPS24) Reconhecer o nome escrito por meio da datilologia em diversas situações (sinalizado pelo professor, em placas nas mesas).

(EF01LPS25) Participar de contações de histórias em Libras visualizando o texto no momento da leitura.

(EF01LPS26) Observar a possibilidade de uso da escrita como uma das expressões da língua e da linguagem.

Comportamentos de leitura

(EF01LPS27) Ampliar comportamentos de leitura, acompanhando a leitura do professor.

(EF01LPS28) Escolher livros em rodas de leitura orientando-se por diferentes critérios e informações: objetivos de leitura ou gosto pessoal, autores e/ou ilustradores preferidos, indicação de outros leitores, projeto editorial, capa, título, ilustrações, quarta capa etc.

(EF01LPS29) Conhecer e frequentar diferentes espaços de leitura dentro e fora do contexto escolar (sala de leitura, bibliotecas, espaços de leitura da comunidade em geral, centros culturais e eventos literários, entre outros).

(EF01LPS30) Observar a produção sinalizada do professor de textos literários diversos (contos tradicionais, contos da comunidade surda, lendas, poemas, fábulas) e textos informativos (manchetes, notícias).

(EF01LPS31) Acompanhar a produção sinalizada/leitura do professor de textos literários diversos, como contos de fadas, lendas, acumulativos, contos maravilhosos, modernos e populares — garantindo a diversidade de culturas, identificando a especificidade de sua organização interna.

(EF01LPS32) Acompanhar a produção sinalizada/leitura do professor de textos da esfera jornalística (manchete, notícias) que abordem a temática das diferentes representações sociais de modo a refletir e respeitar a diversidade cultural e social.

Fonte: Currículo da Cidade – Língua Portuguesa para surdos, São Paulo, 2019, p. 107.

Ensino Médio

Na última etapa da Educação Básica, os alunos surdos do Ensino Médio que obtiveram apoio escolar, familiar e uma vida ativa nas outras etapas devem ser capazes de realizar o letramento visual, que, de acordo com Martins e Martins (2011), pode ser considerado como

o modo de experimentar as práticas culturais/sociais por meio da visão. Ler os acontecimentos, fazer parte da dinâmica da vida, aprendendo que há uma construção singular no corpo do surdo que o coloca em outra relação com as questões do cotidiano (Martins; Martins, 2011, p. 865).

Com essa definição retomamos a questão referente ao letramento citada no Ensino Fundamental; enquanto lá essa definição servia para inserir o aluno no contexto prático relacionado à escrita, aqui espera-se que o aluno seja capaz de tecer práticas sociais de leitura e escrita mais avançadas e complexas do que o processo de codificar e decodificar. Sendo assim, é importante que o educador crie estratégias de visualidade para o aluno, uma vez que a língua de sinais tem por característica processos de comunicação visual. Nesse processo de desenvolver nos alunos a espontaneidade por narrar histórias, o professor constrói uma ponte entre a língua de sinais e a língua portuguesa (Martins; Martins, 2011).

Quando o surdo atinge a autonomia na língua de sinais, consegue se tornar leitor em português sem muitas dificuldades e aprender outras disciplinas presentes ou não na sua grade curricular, como a American Sign Language (ASL).

Infelizmente, Pedroso e Dias (2007) apontam o fracasso escolar ao final do Ensino Fundamental II, após os alunos receberem um certificado de médias obtidas sem que tenham se preparado minimamente para alcançar conhecimentos que teriam potencial para alcançar. A justificativa desse resultado acontece pela ausência de uma língua em comum entre os alunos, e os surdos se queixam dessa desigualdade linguística.

Estudos das mesmas autoras indicaram que os professores se sentem despreparados para atuar com os alunos surdos em classes regulares e sentem que esse trabalho é solitário, pois não é só uma questão de incluí-los e ter os intérpretes é saber ensiná-los.

Considerando que na etapa do Ensino Médio há um professor para cada disciplina, dificilmente haverá uma didática para trabalhar com os alunos surdos na classe de ouvintes, mesmo que esse aluno seja fluente na língua de sinais. Em outras palavras, “o aluno surdo na sala de ouvinte incorpora jeito de ser do aluno ouvinte”, não recebe igualdade de ensino, é visto como os demais, sem ter uma proposta menos oralista (Pedroso; Dias, 2007).

Sabe-se também que nessa etapa os alunos estão se preparando para vestibulares, simulados para o Ensino Superior; as práticas pedagógicas abordam outra vertente; os professores não se atentam para os alunos usuários da língua de sinais para adquirir tais conteúdos; mesmo que o intérprete esteja para apoiar essa comunicação, as escolas não se organizam para uma proposta bilíngue, sem uma adequação envolvendo os níveis individuais.

Considerações finais

Após as análises de referências e documentos e a revisão de legislações, consideramos que o ensino de Libras para surdos na Educação Básica é uma temática com muitas possibilidades de discussão; são diversos indivíduos envolvidos no processo e em diferentes espaços.

Com a produção deste trabalho, verificamos que a Educação de Surdos está acontecendo com déficits na reflexão sobre a função real do papel da escola na vida dos alunos surdos, as práticas do cotidiano, com exceção da Educação Infantil, não acontecem de forma autônoma e natural (em que as crianças brincam e interagem de maneira espontânea); tudo faz parte do pedagógico, com interferências do professor surdo ou intérprete, porque a língua de sinais não é conhecida por todos no contexto da escola. Assim, acreditamos que, mais do que ensinar Libras para os alunos surdos, seria interessante estimular o uso da Libras pelos alunos ouvintes e a comunidade escolar onde os alunos usuários da língua de sinais estejam inseridos.

No Ensino Infantil, o professor surdo é a peça central para esses alunos; mesmo sendo a faixa etária mais complexa pela ausência de comunicação, é o momento em que surdos e ouvintes partilham as atividades práticas. No Ensino Fundamental e no Médio, pode se pensar no professor e intérprete, porém vimos que há divergências linguísticas e o espaço oralizado se sobressai em relação ao sinalizado.

Por fim, consideramos ressaltar que neste trabalho não nos baseamos em metodologias de ensino desenvolvidas em escolas bilíngues ou escolas polo para surdos, mas em escolas regulares de ensino; seria interessante o desenvolvimento de documentos que procurassem nortear o trabalho das escolas brasileiras que possuem matrículas de alunos surdos.

Referências

AGUIAR, Elizonete Pereira; ARAÚJO, Aline Cássia Silva Araújo. O ensino da Libras na Educação Infantil: uma proposta lúdica para crianças surdas e ouvintes. Id on Line Rev. Mult. Psic., 2020.

BASSO, Idavania Maria de Souza; STROBEL, Karin Lilian; MASUTTI, Mara. Metodologia de ensino de Libras – L1. Florianópolis: UFSC, 2009.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituição compilado.htm. Acesso em: 25 jan. 2023.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996.  Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm. Acesso em: 25 jan. 2023.

BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências. Brasília, 2002. Disponível em:  https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%2010.436%2C%20DE%2024%20DE%20ABRIL%20DE%202002.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20a%20L%C3%ADngua%20Brasileira,Art. Acesso em: 25 jan. 2023.

BRASIL. Lei nº 14.191, de agosto de 2021. Dispõe sobre a modalidade de Educação Bilíngue de Surdos. Brasília, 2021. Disponível em:  https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2021/Lei/L14191.htm#art2. Acesso em: 25 jan. 2023.

BRASIL. Decreto nº 5.626, de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o Art. 18 da Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Brasília, 2005. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2005/decreto/d5626.htm#:~:text=DECRETO%20N%C2%BA%205.626%2C%20DE%2022,19%20de%20dezembro%20de%202000. Acesso em: 25 jan. 2023.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC, 2010.

CALDAS, Ana Luiza Paganelli. Pedagogia da infância surda: um sonho possível. Revista Sinalizar, Porto Alegre, 2020.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo Brasileiro de 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2012.

MARTINS, V. R.; MARTINS, L. Experiências de letramento visual na constituição da Libras e do português por alunos surdos numa escola regular. I SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA, Uberlândia. Anais... Uberlândia: Edufu, 2011. v. 1, p. 859-867. Disponível em: http://www.ileel.ufu.br/anaisdosielp/wp-content/uploads/ 2014/06/volume_1_artigo_093.pdf. Acesso em: 13 abr. 2020.

PEDROSO, Cristina Cinto Araújo; DIAS, Tárcia Regina da Silveira. O professor fluente em Libras atuando como intérprete de um aluno surdo no Ensino Médio da escola pública. Revista do Programa de Pós-Graduação em Educação, Ribeirão Preto, nº 8, p 111-128, 2007.

QUADROS, Ronice Muller. Alfabetização e o ensino da Língua de Sinais. Textura, Canoas, nº 3, p. 53-62, 2000.

SÃO PAULO (Prefeitura). Secretaria Municipal de Educação. Currículo da cidade – Língua Portuguesa para Surdos. São Paulo: SME, 2019. Disponível em: https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2019/10/cc-lingua-portuguesa-para-surdos.pdf. Acesso em: 23 jan. 2023.

SÃO PAULO (Prefeitura). Secretaria Municipal de Educação. Currículo da Cidade – Língua Brasileira de Sinais (Libras). São Paulo: SME, 2019.

SOARES, Magda. Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Belo Horizonte: Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita, 2004.

Publicado em 11 de junho de 2024

Como citar este artigo (ABNT)

GODOI, Jonas Bento; LEMOS, Daniele Aparecida da Silva; SANTOS, Evelin Cristina Silva dos; FIGUEREDO, Mariana Maia. O ensino de Libras para surdos na Educação Infantil, no Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 20, 11 de junho de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/20/o-ensino-de-libras-para-surdos-na-educacao-infantil-no-ensino-fundamental-e-no-ensino-medio

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.