Utilização de fotografia e análise semiótica no ensino de Botânica: contribuições e limites da utilização da técnica com alunos do Ensino Fundamental
Anderson Persi Soares
Licenciado em Ciências Biológicas (Universidade do Grande ABC), mestrando em Educação (UFSCar - Câmpus Sorocaba), professor no município de Sorocaba/SP
Diante das frequentes dificuldades enfrentadas por alunos e professores no ensino de Botânica na Educação Básica, especialmente em relação ao entendimento real sobre importância, diferenças e semelhanças dos grupos vegetais, torna-se evidente a necessidade de inovar na abordagem e nas estratégias metodológicas dessa área das Ciências Naturais. De acordo com o currículo municipal de Sorocaba e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), os tipos de reprodução dos vegetais são temas essenciais para o 7º ano, período em que os alunos devem começar a formar concepções, ainda que alternativas, sobre a posição e a relevância dos vegetais no ecossistema.
Figueiredo, Coutinho e Amaral (2012) destacam que muitos professores de Ciências enfrentam desafios consideráveis ao ensinar conteúdos botânicos, que possuem peculiaridades e complexidades que os tornam notavelmente distintos de outras matérias. Essas complexidades podem ser transmitidas aos alunos, que acabam percebendo o conteúdo como maçante e desinteressante. A ênfase na formação dos professores, muitas vezes, reside na Zoologia, e essa inclinação é refletida em suas práticas pedagógicas, marginalizando o ensino de Botânica.
Embora o novo currículo federal não aborde diretamente o tema evolução, sua intrínseca ligação com a reprodução dessas espécies reforça a necessidade de abordagem diferenciada. Estratégias que vão além da linguagem verbal podem, assim, alcançar resultados promissores, mesmo quando abordam assuntos complexos com alunos jovens (Andrade; Massabni, 2011). Com base nessa perspectiva, este trabalho pretende investigar, através da lente semiótica e da utilização da fotografia, como esses mecanismos podem colaborar no processo de ensino-aprendizagem da Botânica no Ensino Fundamental, além de avaliar possíveis limitações que possam surgir durante o trabalho de campo.
A abordagem adotada para esta pesquisa é qualitativa, caracterizando-se mais precisamente como uma pesquisa-ação. Nesse contexto, o pesquisador atua como professor do público-alvo, promovendo um tipo de pesquisa social que é concebida e executada em estreita associação com uma ação ou resolução de um problema coletivo, no qual pesquisadores e participantes estão cooperativamente engajados.
Participantes da pesquisa
Nesta pesquisa, os participantes foram 122 alunos matriculados no 7º ano de uma escola pública municipal localizada no interior de São Paulo. As turmas pesquisadas possuíam aproximadamente 33 alunos e, apesar de a escola estar localizada em um bairro próximo ao centro da cidade, ela atendia à população de todas as regiões do município. Nessa etapa de escolarização, os estudantes possuíam entre 12 e 13 anos, sem grandes distorções idade/série.
Segundo o currículo municipal da cidade de Sorocaba, o ensino de Botânica está dividido durante todo o percurso do Ensino Fundamental. No entanto, o estudo mais específico sobre órgãos, reprodução e aspectos evolutivos dos vegetais está previsto para ocorrer durante o 7º ano, o que justifica a escolha dos alunos pesquisados para a realização do estudo. Essas informações contextualizam a pesquisa e fornecem informações importantes sobre o cenário educacional em que ela foi realizada.
Instrumentos de coleta de dados
Ao utilizar a pesquisa-ação, é natural que apareçam diversas formas de coleta de dados. No nosso caso, os dados serão coletados de acordo com as fases da pesquisa. Portanto, foi utilizada primeiramente a análise de dados produzidos pelos participantes da pesquisa (alunos) e a observação do trabalho. Ao final, foi aplicado e analisado um questionário em forma de mandala, no qual os participantes avaliaram a pesquisa e as ações realizadas.
Análise das produções dos estudantes
Este método de avaliação se caracteriza como uma técnica exploratória, comumente empregada na coleta de dados em pesquisas de natureza qualitativa, conforme elucidam Lüdke e André (1986). Neste estudo específico, a análise será aplicada não a documentos, mas aos trabalhos produzidos pelos próprios indivíduos envolvidos na pesquisa.
Na fase inicial, conduziu-se uma análise minuciosa dos relatórios descritivos elaborados pelos alunos, nos quais eles expressaram suas percepções acerca das imagens fornecidas pelo docente investigador. Em uma etapa mais avançada do estudo, os participantes relataram as circunstâncias por trás de suas próprias fotografias. O pesquisador coletou e avaliou atentamente todos esses materiais.
Os resultados provenientes dessas duas fases de análise, somados às respostas dos alunos durante as aulas dialogadas, à produção fotográfica realizada pelos participantes e às avaliações que fizeram sobre o trabalho desenvolvido, permitiram traçar um panorama da evolução do entendimento dos estudantes em relação à Botânica básica, desde o início até o término do estudo. Além disso, foi possível compreender suas opiniões sobre a relevância do uso de fotografias para o aprendizado. Com isso, observou-se a possibilidade de identificar transformações e encontrar similaridades nos dados coletados em distintos momentos do estudo, destacando a evolução contínua do processo de aprendizado ao longo do tempo.
Diário de bordo
A observação ocorreu concomitantemente às atividades do estudo e foi documentada com um registro diário (ou diário de bordo). Essa metodologia de coleta de dados mostrou-se essencial para a avaliação da aula teórica dialógica, conduzida sob a forma de debate. Nesse cenário, foi possível recolher as contribuições verbais dos participantes da pesquisa.
O diário de bordo utilizado nesta pesquisa, além de ser uma ferramenta efetiva para o registro sistemático de informações, também permitiu ao pesquisador principal uma abordagem mais reflexiva e crítica sobre a sua própria prática educativa e a identificação de eventuais pontos de melhoria na metodologia utilizada. Por meio da reflexão sobre suas próprias ações e as dos alunos, o pesquisador pode ajustar as atividades e intervenções, tornando-as mais adequadas e efetivas para os estudantes.
Ademais, é importante destacar que o uso do diário de bordo permitiu coletar dados qualitativos ricos e detalhados sobre o processo de aprendizagem dos alunos, como suas reações emocionais e cognitivas em relação aos conteúdos de Botânica e ao uso da fotografia como recurso pedagógico. Esses dados, combinados com outras formas de coleta de dados, como entrevistas e questionários, permitiram uma análise mais completa e aprofundada dos resultados da pesquisa, fornecendo subsídios para uma avaliação mais precisa.
Questionário
O questionário é uma técnica amplamente utilizada em pesquisas para obter informações necessárias para alcançar determinada finalidade (Lüdke; André, 1986). Na presente pesquisa, esse método foi utilizado para obter informações sobre a percepção dos participantes em relação ao estudo realizado. O questionário permitiu avaliar de que forma a pesquisa atingiu seus objetivos iniciais e coletar informações claras e objetivas sobre o nível de satisfação, participação e entendimento dos alunos em relação ao estudo realizado.
Optou-se pelo formato de mandala devido à sua capacidade de melhorar a atenção concentrada dos adolescentes em sala de aula, especialmente em desenhos aplicados (Dibo, 2007), tornando-se uma ferramenta que permite avaliar o impacto da pesquisa e das ações realizadas junto aos participantes. Nesse tipo de questionário, os participantes respondem a perguntas dispostas em forma de um círculo dividido em setores, o que permite visualizar as respostas de forma mais clara e organizada.
Figura 1: Mandala empregada na avaliação da percepção dos estudantes sobre o estudo
Análise dos dados
A análise de dados é um dos passos mais importantes em qualquer estudo ou pesquisa, pois é nesse momento que as informações coletadas são interpretadas e transformadas em conhecimento relevante. Trata-se de um processo que envolve a organização, o processamento e a interpretação de dados, com o objetivo de identificar padrões, tendências, relações e insights que possam ser úteis para a tomada de decisão.
Utilização da fotografia para coleta de dados
A fotografia, com suas raízes datadas de mais de dois séculos atrás, tem se transformado em mais do que um mero meio de capturar momentos. Seu nome, "foto + grafia", denota um registro em forma de desenho utilizando luz e sombra; essa arte tem evoluído como ferramenta profissional multidisciplinar (Faria; Cunha, 2016).
O poder de questionamento por meio da fotografia
Ao acionar o obturador, o fotógrafo não apenas captura uma imagem, mas convida à reflexão e à análise, instigando o poder de questionamento. Essa qualidade é vital para o estudo das Ciências Naturais, aplicável tanto a adultos quanto a crianças. A fotografia é a expressão congelada de uma realidade subjetiva, o registro visível de algo que de outra forma permaneceria imperceptível (Monteiro, 2004).
Fotografia na educação
Com o passar do tempo, a fotografia tem sido identificada como um parceiro educacional sofisticado e complexo em várias áreas de ensino. Sendo uma linguagem não verbal, ela é capaz de atrair a atenção e potencializar a compreensão dos alunos em diversos temas. Sua capacidade de representar informações qualificadas que são inacessíveis por outros meios fortalece sua posição como ferramenta essencial na educação (Borges; Aranha; Sabino, 2010).
Ferramenta didática nas ciências
Na área de ciências, a fotografia se torna ainda mais relevante. A observação, a identificação de problemas, a formulação de hipóteses e conclusões podem ser intensificadas com o uso de uma câmera. Facilmente acessível, ela promove uma participação mais ativa dos estudantes no processo educacional (Faria; Cunha, 2016).
A conexão com a Semiótica
Essa integração da fotografia com a educação não se limita apenas a um instrumento de ensino; ela se relaciona com a Semiótica – o estudo das formas de linguagem em suas representações (Noth, 2003). A fotografia codifica informações e, junto com a Semiótica, cria uma relação intrincada, ambas lidando com a representação e a interpretação de signos (Tacca, 2005). As fotografias, portanto, podem ser classificadas como:
➔ Ícones: representam visualmente o objeto, mantendo semelhança direta.
➔ Índices: indicam uma relação direta ou traço real do objeto no signo, como uma árvore coberta de neve indicando o inverno.
➔ Símbolos: adquirem significado mediante convenções culturais ou sociais, como uma bandeira representando uma nação.
A semiótica peirciana emerge como ferramenta valiosa, fornecendo estrutura para desvendar os múltiplos níveis de significado em uma única imagem. Considerando os aspectos icônicos, indicativos e simbólicos, alcança-se uma compreensão mais rica e complexa da realidade representada.
A fotografia, em sua essência multifacetada, tornou-se um instrumento inestimável na educação, na ciência e na representação da realidade. Ela não apenas documenta como também questiona, educa e interpreta, abrindo caminho para novas dimensões de compreensão e aprendizado. Na integração com a Semiótica, a fotografia revela suas camadas mais profundas, permitindo uma exploração mais completa do mundo em que vivemos. A utilização da fotografia na coleta de dados, portanto, não é apenas uma técnica, mas uma abordagem holística que fomenta a observação crítica, a reflexão e a construção do conhecimento.
Semiótica peirciana
Charles Sanders Peirce foi um filósofo, matemático e cientista estadunidense que nasceu em 10 de setembro de 1839 em Cambridge, Massachusetts, e faleceu em 19 de abril de 1914 em Milford, Pensilvânia. Peirce teve papel fundamental no desenvolvimento da Semiótica ou Teoria dos Signos, que causou grande impacto nas áreas da Comunicação e da Linguística, entre outras (Gois; Giordan, 2007).
Além disso, Peirce foi pioneiro na aplicação da Semiótica a campos como a Lógica, a Matemática e a Ciência. Sua Teoria dos Signos permitiu uma compreensão mais profunda e sofisticada das relações entre as representações e a realidade, possibilitando avanços importantes no desenvolvimento dessas áreas do conhecimento (Gois; Giordan, 2007).
A construção de conceitos de signos relacionados a qualquer tipo de estudo, sem restringir a Semiótica a uma área específica, foi também um avanço feito por Peirce. Segundo ele, o signo é responsável pela representação, pois é percebido como algo que representa alguma coisa para alguém, produzindo um signo equivalente ou talvez mais desenvolvido na pessoa. Para haver representação, é necessário que haja um interpretante, pois, de acordo com a Semiótica peirciana, ao representar um objeto, o signo produz algo na mente do interpretante que pode ser um novo signo ou um quase signo. Esse processo de mediação é uma característica principal dos signos, que estão posicionados entre o sujeito e o mundo, organizando atividades de produção material e simbólica e estruturando o pensamento (Wartha; Rezende, 2011).
O signo é a união de três entidades: objeto, representante e interpretante. Essa relação triádica, segundo Peirce, é o que constitui um signo perfeito, e sua união difere de acordo com a relação entre as entidades constituintes (Almeida; Guimarães, 2007).
Figura 2: Relação triádica do signo, segundo C. S. Peirce
Fonte: Migliari; Nojima, 2010.
A fenomenologia proposta por Peirce considera a apreensão e a tradução de qualquer fenômeno em três modalidades: primeiridade (qualidade), secundidade (reação) e terceiridade (mediação). A primeiridade é a categoria que confere à experiência sua qualidade distintiva, frescor, originalidade irrepetível e liberdade. A secundidade é aquilo que confere à experiência seu caráter factual, de luta e confronto, razão ou lei. A terceiridade refere-se à dimensão em que se dá a interpretação do fenômeno ou signo (Santaella, 1983).
Na primeiridade, as sensações percebidas são denominadas quali-signos e relacionam-se com seus referentes como ícones; nessa condição, o percebido é um fenômeno fundamentalmente interno à mente.
A secundidade é marcada pela consciência dos estímulos que propiciaram as sensações, implicando o reconhecimento de elementos da realidade externa, cuja existência resiste à vontade da mente, sendo denominados como sin-signos, apresentando-se como índices da realidade dos referentes.
A terceiridade abriga os fenômenos tipicamente simbólicos, nos quais as sensações são interpretadas como legi-signos e relacionadas como símbolo de seus referentes. Há uma interposição interpretativa entre a consciência e a coisa que foi percebida, promovendo a mediação entre essa consciência e os fenômenos. Os símbolos são mediadores com os quais representamos e interpretamos o mundo (Teixeira; Matos; Perassi, 2011, p. 105).
A relação triádica mencionada forma o nonágono semiótico, também conhecido como Caixa de Peirce, que é uma ferramenta prática e eficiente para analisar e compreender qualquer tipo de fenômeno ou objeto, permitindo a identificação das diferentes dimensões envolvidas e facilitando a síntese e a generalização dos resultados. Além disso, a Caixa de Peirce pode ser utilizada em diferentes áreas do conhecimento, como a Comunicação, a Filosofia, a Ciência e a Tecnologia.
Quadro 1: Caixa de Peirce
Fonte: Gomes Junior, 2022.
Conforme Wartha e Rezende (2011), a Caixa de Peirce pode ser aplicada no ensino de Ciências, permitindo a avaliação da eficácia da metodologia de ensino e proporcionando uma compreensão mais profunda e ampla do fenômeno em estudo. A compreensão das diferentes modalidades de fenomenologia pode ajudar a identificar as nuances e complexidades dos conceitos científicos, permitindo que os alunos desenvolvam uma compreensão mais completa e sofisticada da ciência.
No ensino de Ciências, a primeiridade pode ocorrer quando um estudante tem o primeiro contato com uma figura ou gráfico sem referência a alguma coisa, percebendo apenas o traçado registrado como tal, seja na lousa ou no livro. Nesse caso, há apenas uma primeira impressão. Se, após esse primeiro momento, o estudante relacionar a figura a um objeto científico, ocorrerá a secundidade. Caso o estudante relacione a figura a um objeto visto ou algo já estudado, ele entrará na terceiridade. Nessa dimensão, seu olhar estará carregado de interpretação, busca por explicações, análises e generalizações, permitindo que interprete o fenômeno em questão (Wartha; Rezende, 2011).
Com base na análise das categorias fenomenológicas de Peirce (primeiridade, secundidade e terceiridade), é possível avaliar a eficácia da metodologia de ensino proposta para o ensino de Ciências. Ao comparar as análises pré e pós-aula, pode-se identificar se os alunos foram capazes de relacionar as fotografias apresentadas a conceitos científicos e fazer análises e generalizações sobre o fenômeno em questão. Além disso, a utilização dessa proposta pode proporcionar uma compreensão mais profunda e ampla do fenômeno em estudo, permitindo que os alunos desenvolvam uma compreensão mais completa e sofisticada da ciência.
Nesse sentido, as análises das descrições dos alunos participantes com base em mostra de fotografias serão comparadas e classificadas de acordo com as categorias fenomenológicas de Peirce (primeiridade, secundidade e terceiridade). Essa análise permitirá compreender como a metodologia de ensino proposta pode levar os estudantes a pensar de forma mais elaborada sobre o objeto de estudo, que no nosso caso é o estudo sobre plantas.
Resultados e discussões: 1ª etapa
Pela análise das 200 citações feitas pelos alunos ao se referirem aos seres vivos, foi observado que apenas dez menções foram feitas a plantas, enquanto a maioria esmagadora estava relacionada a animais. Esse padrão ilustra um fenômeno conhecido na Botânica como “cegueira botânica”, em que o indivíduo encontra dificuldades em reconhecer ou identificar plantas, mesmo quando elas estão claramente presentes.
A cegueira botânica pode ser atribuída a diversos fatores, como falta de interesse ou conhecimento sobre vegetais ou a ausência das habilidades cognitivas necessárias para identificá-los. Entretanto, como afirmado por Salatino e Buckeridge (2016), esse não é um estado permanente e pode ser superado com treinamento adequado, incluindo a exposição a diversos tipos de plantas e o emprego de métodos específicos de identificação.
Os resultados dessa primeira etapa realçam a importância de ações educativas e de conscientização voltadas para a Botânica, capazes de aumentar o reconhecimento, o conhecimento e a valorização das plantas e da biodiversidade em geral. Não se trata de um desafio insuperável, mas de uma oportunidade para enriquecer o ensino e a compreensão dos alunos. A prática pesquisada neste artigo representa uma abordagem promissora nesse sentido, propondo um caminho para combater a cegueira botânica e fortalecer a conexão dos estudantes com o mundo vegetal.
Resultados e discussões: 2ª etapa
Durante a segunda etapa, os alunos analisaram um conjunto de dezesseis fotografias, respondendo à pergunta central: "o que vocês estão vendo?". O estudo dessas respostas, mediante as categorias semióticas de Peirce, revelou insights importantes sobre a percepção e a compreensão dos estudantes.
Grande parte das respostas estava concentrada na "primeiridade", em que o enfoque foi nos aspectos primários e estéticos da imagem, como a sensação visual. Outros tentaram descrever o objeto na fotografia, mesmo sem uma compreensão clara, resultando em "secundidade" equivocada ou não equivocada.
No entanto, houve um aumento notável na "terceiridade" na fotografia que retratava polinização, indicando uma compreensão mais técnica das plantas. Ainda assim, esse detalhamento técnico permaneceu vago e insuficiente.
A análise demonstra que, mesmo sendo um conteúdo programático desde o 2º ano do Ensino Fundamental, os alunos do 7º ano ainda chegam com conhecimento limitado sobre as características e os grupos principais dos vegetais. Esse fato ressalta a observação, recorrente na literatura, de que o ensino de Botânica permanece distante e pouco acessível na vida desses estudantes. Essa desconexão sugere a necessidade de revisitar e revitalizar as abordagens de ensino, tornando a Botânica mais tangível e significativa para os alunos.
Considere, por exemplo, a Figura 3, que retrata a análise da fotografia 11 da pesquisa, na qual é apresentada uma cyca, pertencente ao grupo das gimnospermas (plantas que têm sementes sem frutos). Essas plantas são amplamente cultivadas em nosso país, mas a maioria dos participantes não conseguiu associá-las a um grupo vegetal específico. Além disso, não puderam comparar seu estróbilo (centro da imagem) com uma pinha, tampouco entender sua função. Nessa análise inicial dos estudantes, tanto a primeiridade quanto a secundidade foram encontradas em abundância, refletindo falta de reconhecimento e compreensão profunda da planta em questão.
Figura 3: Cycas (Fotografia 11)
Fonte: Pixabay, 2023.
Figura 4: Categorização das análises efetuadas pelos estudantes da fotografia 11
A aluna IBP deu uma resposta que reflete a primeiridade:
Me lembra a entrada de um condomínio de rico e também limpeza (Aluna IBP).
A secundidade equivocada está presente na resposta do aluno JM:
Milho que dá no meio de uma folha de palmeira muito grande e embaixo um monte de terra e uma porta. Imagem bonita (Aluno JM).
Uma resposta mostra a secundidade não equivocada:
É uma árvore pequena verde com uma estrutura amarela no meio (Aluno GR).
A terceiridade é apresentada na resposta do aluno PHB:
Vejo uma planta que no centro possui uma pinha amarela. Embaixo dela há estruturas normais de plantas (Aluno PHB).
Resultados e discussões: 3ª etapa
Utilizando um diário de bordo, registramos as aulas sobre Botânica em quatro turmas do 7º ano. A dinâmica consistiu em reapresentar as fotografias da etapa anterior e discutir as observações que mais apareceram nas análises dos estudantes. Com base nisso, o pesquisador principal introduziu informações e imagens adicionais que complementavam o conteúdo previamente apresentado.
Essa abordagem, denominada "aula teórica dialógica", utilizou as fotografias como ponto de partida e conseguiu captar a atenção dos alunos. Ela encorajou-os a participar e a reconhecer como suas análises iniciais poderiam estar equivocadas. Esse processo de descoberta tornou a aula mais envolvente e interessante para os estudantes.
Pesquisas, como o estudo de Leite (2010), destacam a importância de uma abordagem educacional mais dinâmica e envolvente, que valorize as opiniões e experiências dos alunos, para criar um ambiente mais propício ao aprendizado.
Como resultado, observamos uma participação mais ativa em comparação com as aulas conduzidas por métodos tradicionais; a inibição de qualquer indisciplina (embora a escola raramente enfrente problemas nesse aspecto); reações entusiásticas ao aprenderem coisas novas; e uma iniciativa notável por parte dos próprios alunos em trazer materiais relacionados ao tema, como flores, sementes e pinhas, entre outros.
Resultados e discussões: 4ª etapa
A integração de exercícios práticos, como estudos de campo, experimentos, visitas e observações, é essencial para o aprendizado nas Ciências. Esses métodos, aplicáveis tanto dentro como fora da sala de aula, tornam o aprendizado mais tangível. Andrade e Massabni (2011) ressaltam a importância dessas abordagens na formação de uma mentalidade científica, auxiliando na compreensão dos princípios naturais e suas ramificações socioambientais.
No estudo aqui apresentado, os alunos foram organizados em 39 grupos, cada um responsável por produzir e apresentar uma fotografia de uma planta selecionada. Essa apresentação foi mais do que uma mera exibição; incluiu explicação do motivo da seleção e processo interativo de identificação, utilizando aplicativos móveis. Isso exigiu um esforço colaborativo dentro de cada grupo, promovendo estudos individuais e coletivos.
Os resultados foram promissores: todos os grupos completaram a tarefa, mostrando nível de engajamento superior ao habitual em atividades anteriores. A diversidade do reino vegetal foi representada, apesar de algumas categorias terem sido menos frequentes.
A análise das fotografias revelou conexão com os conceitos semióticos de primeiridade, secundidade e terceiridade, conforme proposto por Peirce. A estética das flores enfatizou a primeiridade, refletindo as impressões e sentimentos iniciais. Por outro lado, a terceiridade foi manifestada na influência clara das aulas teóricas na pesquisa e entendimento dos alunos, demonstrando uma relação mais profunda e conceitual com o material estudado.
No entanto, também surgiram desafios. Alguns grupos fizeram fotos apressadas, a despeito do tempo disponível. Essa questão reflete necessidade de estímulo adicional para certos alunos, um desafio familiar a educadores que trabalham com adolescentes. Por outro lado, alguns resultados foram notáveis, como a imagem feita pelas estudantes que realizaram um corte histológico em uma flor para fotografar o ovário. Essa imagem conectou de forma clara a atividade prática com os aspectos discutidos na aula teórica dialógica, enfatizando a relevância desses métodos práticos no processo de aprendizagem.
Figura 5: Fotografia produzida e apresentada pelo grupo 17
Fonte: Grupo 17.
Resultados e discussões: 5ª etapa
A etapa conclusiva de nosso estudo foi caracterizada pela avaliação dos alunos em relação à abordagem pedagógica centrada na fotografia. Implementamos um questionário singular, composto por uma mandala com oito perguntas criteriosamente formuladas. Cada pergunta ofereceu três alternativas para representar o desempenho: "acima da expectativa", "dentro da expectativa" ou "abaixo da expectativa". Em determinadas questões, traduzimos essas categorias de maneira mais coloquial, como "ótimo", "bom" e "ruim" ou "acima do esperado", "dentro do esperado" e "abaixo do esperado". Em todos os casos, fizemos um esforço consciente para assegurar que os termos fossem claros para os alunos.
Esse questionário foi aplicado às quatro turmas, e 120 alunos contribuíram para essa fase do projeto. O resultado revelou um destaque positivo nas respostas para todas as oito questões (ilustradas na Figura 1). Como sugerido na literatura, a satisfação com uma metodologia de ensino pode ser moldada por aspectos como idade, perfil cognitivo e contexto cultural, e essa satisfação, por sua vez, pode influenciar a percepção do aluno sobre sua própria aprendizagem (Fleming, 1995). Assim, quando um aluno se sente satisfeito com uma abordagem educacional, é provável que ele alcance uma compreensão mais rica, fomentando, em última instância, a sua motivação para aprender.
Para a eficácia da pesquisa-ação, duas dimensões são cruciais: a primeira é a participação ativa e o engajamento dos alunos com a proposta; a segunda é o prazer em colaborar com a pesquisa. Em ambos os aspectos, a resposta foi altamente positiva. O Quadro 2 traz os dados.
Quadro 2: Resumo da percepção dos alunos em relação ao estudo com base na fotografia
Aspectos avaliados | Descrição | Quantidade de alunos | Percentual |
Apreensão de novos conhecimentos | Abaixo do esperado | 0 | 0% |
Dentro do esperado | 18 | 15% | |
Acima do esperado | 102 | 85% | |
Interação com os colegas durante as atividades | Abaixo do esperado | 10 | 8,33% |
Dentro do esperado | 36 | 33% | |
Acima do esperado | 74 | 61,66% | |
Satisfação na realização das atividades | Pequena | 1 | 0,83% |
Média | 24 | 20% | |
Grande | 95 | 79,16% | |
Tempo de realização do estudo | Inadequado | 4 | 3,33% |
Poderia ser maior | 24 | 20% | |
Adequado | 92 | 76,66% | |
Utilidade da fotografia como material didático | Pequeno | 3 | 2,50% |
Bom | 11 | 9,16% | |
Ótimo | 106 | 88,33% | |
Ajuda da atividade prática no estudo realizado | Indiferente | 0 | 0% |
Bom | 24 | 20% | |
Ótimo | 96 | 80% | |
Participação e envolvimento com a proposta | Abaixo do esperado | 0 | 0% |
Dentro do esperado | 22 | 18,33% | |
Acima do esperado | 98 | 91,66% | |
Compreensão das atividades propostas | Abaixo da expectativa | 1 | 0,83% |
Dentro da expectativa | 18 | 15% | |
Acima da expectativa | 101 | 84,16% |
Considerações finais
A pesquisa realizada neste estudo, enquadrada no contexto do projeto de mestrado, demonstrou a significativa relevância da aplicação prática e visual na aprendizagem, particularmente na área de Ciências. A implementação de métodos inovadores de ensino, como o estudo baseado na fotografia, foi profundamente enriquecida pela integração de uma análise semiótica, utilizando os conceitos de primeiridade, secundidade e terceiridade, conforme delineado por Peirce.
Essa abordagem semiótica trouxe uma dimensão adicional à pesquisa, permitindo uma exploração mais profunda das percepções e interações dos alunos com o material didático. Ela ofereceu uma lente através da qual a complexidade da aprendizagem poderia ser observada, interpretada e compreendida, revelando como símbolos, significados e relações se manifestam no processo educacional.
A resposta positiva dos alunos, refletida nas avaliações e na participação ativa, reitera a eficácia dessa abordagem pedagógica e semiótica. Ela não apenas atendeu como muitas vezes superou as expectativas, incentivando os alunos a se engajarem mais profundamente na matéria. Isso foi corroborado pelos resultados quantitativos apresentados, em que grande maioria dos alunos relatou apreensão de novos conhecimentos acima do esperado e satisfação elevada com as atividades realizadas.
No entanto, o estudo também revelou algumas áreas que podem necessitar de atenção e ajustes. Algumas fotografias foram tiradas apressadamente, o que indica necessidade de mais orientação e talvez de mais recursos para incentivar todos os alunos a se envolverem plenamente nas atividades práticas.
A aplicação desse método inovador contribui para uma compreensão aprimorada dos processos de ensino e aprendizagem, abrindo caminhos para futuras investigações e aplicações práticas em diferentes contextos educacionais.
Finalmente, este trabalho não apenas adiciona valor ao campo da Educação Científica, mas também serve como plataforma sólida para a dissertação de mestrado em andamento. A combinação da metodologia prática com a análise semiótica contribuiu para uma abordagem mais holística, destacando a importância de integrar diversas disciplinas na educação. As descobertas e os insights gerados contribuirão significativamente para a conclusão da dissertação, oferecendo uma perspectiva nova e enriquecedora que pode ser explorada em pesquisas futuras.
Este artigo representa um passo crucial na jornada acadêmica, trazendo à luz a importância vital da análise semiótica na integração de métodos práticos e teóricos na sala de aula e a necessidade constante de inovação e adaptação na educação para atender às diversas necessidades e preferências dos alunos.
Referências
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Publicado em 13 de agosto de 2024
Como citar este artigo (ABNT)
SOARES, Anderson Persi. Utilização de fotografia e análise semiótica no ensino de Botânica: contribuições e limites da utilização da técnica com alunos do Ensino Fundamental. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 29, 13 de agosto de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/29/utilizacao-de-fotografia-e-analise-semiotica-no-ensino-de-botanica-contribuicoes-e-limites-da-utilizacao-da-tecnica-com-alunos-do-ensino-fundamental
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