Genética em Jogo: recurso didático para o aprendizado de conceitos básicos de Genética
Adielle Rodrigues da Silva
Doutora em Genética e Biologia Molecular (UESC)
Muitos estudantes do Ensino Médio apresentam dificuldades relacionadas à fixação de alguns conceitos básicos de Genética e Estatística, que são a base para compreender as Leis de Mendel, a hereditariedade, os tipos de herança e a genética de populações. Algumas vezes os estudantes entendem o que foi abordado na sala de aula, mas não conseguem associar tais conhecimentos a uma aplicação prática na vida e de aperfeiçoamento profissional.
Os cálculos, cruzamentos e probabilidades envolvidos em Genética leva os estudantes a considerar como difícil, criando dessa forma um obstáculo na tarefa de fazer correspondência entre genótipo e fenótipo, distinguir características qualitativas e características quantitativas e identificar os tipos de ação gênica aditiva e dominância, dentre outros (Araújo et al., 2018). O ensino de Genética deve ser trabalhado de maneira significativa pelos docentes, uma vez que permite várias relações interdisciplinares (Rezende; Gomes, 2018).
Ressaltando a importância do ensino-aprendizagem em Genética e Biologia Evolutiva, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) aponta Vida e Evolução como uma das três unidades temáticas do componente de Ciências no Ensino Fundamental e Vida, Terra e Cosmos como uma das duas unidades temáticas para a área das Ciências da Natureza e suas tecnologias no Ensino Médio, apresentando habilidades que permitem a compreensão gradativa de conceitos biológicos desde os anos iniciais até o Ensino Médio (Brasil, 2017).
Interdisciplinaridade
A Genética possui várias subáreas; em virtude disso, há necessidade que o aluno possua conhecimentos básicos em determinadas áreas, como Biologia Celular, Citogenética e Matemática (Araújo et al., 2018), pois o ensino de Genética permite várias relações interdisciplinares, sendo necessário que os alunos compreendam as estruturas celulares, suas organelas e suas moléculas e consigam correlacionar as suas funções aos mecanismos de hereditariedade (Rezende; Gomes, 2018).
A Genética é um campo de estudo que abrange questões educacionais, médicas, tecnológicas e científicas. Um exemplo é a variedade de aplicações do conhecimento que a biotecnologia tem, como na Medicina, na indústria e na agricultura. Sendo assim, a divulgação de termos específicos da Genética pela mídia, bem como o conhecimento sobre estrutura da molécula de DNA, manipulação gênica, mutação, cariótipo, recombinação genética, transcrição e tradução, entre outros temas, tornou-se necessário na formação do pensamento crítico do estudante (Reis et al., 2021).
Nesse sentido, torna-se importante contextualizar os conceitos de básicos de Genética com temas atuais da sociedade que geram polêmicas quanto aos avanços de pesquisas científicas na área, considerando a utilização de organismos geneticamente modificados (OGM), especialmente os transgênicos e células-tronco, dentre outros. A utilização de jogos didáticos favorece o ensino-aprendizagem em sala de aula para a construção do conhecimento escolar que permita uma discussão sobre sua aplicação na ciência e sociedade. Sobre isso, a BNCC aponta a habilidade “(EM13CNT304) – Analisar e debater situações controversas sobre a aplicação de conhecimentos da área de Ciências da Natureza (tais como tecnologias do DNA, tratamentos com células-tronco, produção de armamentos, formas de controle de pragas, entre outros –, com base em argumentos consistentes, éticos e responsáveis, distinguindo diferentes pontos de vista”.
Atualmente, é frequente os estudantes concluírem o Ensino Médio com pouca noção sobre o estudo e análise de características quantitativas, uma vez que não se apropriam adequadamente de conceitos básicos de como os genes são transmitidos. Vale ressaltar que alguns conceitos básicos de Genética e Estatística são entendidos pelos estudantes, porém, na maioria das vezes, eles não conseguem associar à prática, pois facilmente compreendem a definição sem pensar como tal informação pode ser aplicada no cotidiano para entender as características que são transmitidas aos organismos, quais podem ser dominantes ou recessivas, a diferença entre indivíduos homozigoto e heterozigoto para determinada característica.
Para isso, é preciso compreender que as características quantitativas são de herança poligênica (controladas por vários genes), ao contrário das características qualitativas, que são monogênicas (controladas por poucos genes). Além disso, a determinação da herdabilidade de uma característica quantitativa pode ser no sentido amplo, sendo a relação da variância genética pela variância fenotípica, como pode ser no sentido restrito, variância aditiva pela variância fenotípica, sendo que a ação gênica aditiva tem maior importância para o melhoramento genético vegetal.
Portanto, é necessário que o professor de Genética reoriente sua prática pedagógica, avaliando a forma como alguns conteúdos serão abordados em sala de aula e quais estratégias serão empregadas para esse fim; desse modo, poderá construir uma aprendizagem mais efetiva (Silva; Cabral; Castro, 2019).
Jogos didáticos
A utilização de jogos é de grande importância para a formação dos estudantes. Nesse sentido, o ensino de Biologia deve propiciar ao aluno a capacidade de compreender conceitos, além de construir a habilidade de interpretá-los de forma crítica, podendo aplicar esses conhecimentos no seu convívio diário (Krasilchik, 2016).
É importante o uso de materiais didáticos que favoreçam a aprendizagem desses conceitos por meio de atividades educacionais diversificadas que estimulem e despertem o interesse dos estudantes pelo saber. Há diversos estudos que ratificam a contribuição significativa dos jogos no processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos de Biologia, como os de Soares et al. (2016) e Acrani et al. (2020), uma vez que o jogo, além de trabalhar a ludicidade, desenvolve competências e habilidades como trabalho em equipe, desenvolvimento do raciocínio lógico-matemático, concentração e liderança, entre outros (Bertocchi et al., 2016).
O presente trabalho demonstra como utilizar o material didático Genética em Jogo para fixar os conteúdos trabalhados em aulas anteriores sobre alelo, lócus e gene, caracteres qualitativos e caracteres quantitativos, dominante e recessivo, heterozigoto e homozigoto e herdabilidade, dentre outros.
Objetivos
O material didático Genética em Jogo tem como objetivo sensibilizar o estudante para o estudo dos princípios básicos da Genética, fornecendo a contextualização necessária para a compreensão do conhecimento escolar e da apropriação dos conhecimentos envolvidos. Essa atividade é uma ferramenta que pretende preparar o estudante para opinar frente a questões que envolvem a Ciência na sociedade, retirando-o da condição de espectador passivo.
Genética em Jogo é um jogo lúdico que favorece a aprendizagem significativa, promovendo uma participação mais prazerosa do estudante em sala de aula, abordando conceitos básicos da Genética importantes para a Biologia e para a vida atual. Sendo assim, o jogo busca trazer para o concreto os conceitos da Genética Básica levando o estudante a exercer sua cidadania.
Com o jogo, espera-se que o estudante:
- Entenda como ocorre a transmissão das características hereditárias;
- Compreenda que as características dominantes são segregadas por genes dominantes, enquanto as características recessivas são segregadas por genes recessivos;
- Demonstre os processos de divisão celular, a meiose e a mitose; e
- Compreenda a relação entre genótipo e fenótipo.
Metodologia
Genética em Jogo é composto por 30 cartas-pergunta; cada uma corresponde a uma questão; essas cartas estão disponíveis para impressão no Anexo, ao fim deste artigo. O professor deve ter a lista de questões e de respostas disponibilizada com antecedência, a fim de relacionar os conceitos básicos de Genética abordados no jogo e Ciência na sociedade.
O professor deve dividir a turma em grupos de alunos, preferencialmente de mesmo número, e solicitar que sentem em círculo para que todos possam visualizar as cartas que serão colocadas por cada jogador, preparando jogos suficientes para a classe jogar dividida em grupos.
A lista de questões e respostas do Genética em Jogo fica com o professor, que verificará se a resposta está correta. Para melhor uso do tempo disponível, o prazo de resposta pode ser livre ou combinar um período predeterminado, usando cronômetro.
É preciso explicar o jogo antes do início, embaralhar as cartas do Genética em Jogo e pedir que cada jogador pegue a mesma quantidade de cartas. Inicia o jogo o jogador que pegar a carta em que está escrito Genética em Jogo; em seguida, deve colocar a carta no centro e ler a pergunta que está ali. O jogador que estiver com a resposta deverá fazer da mesma forma, colocar a carta com a resposta próxima à pergunta e depois ler a pergunta que está na sua carta.
A cada pergunta lançada pode ser feita uma discussão a respeito da relação entre o conteúdo da pergunta e os temas da sociedade. O jogador que terminar todas as cartas primeiro será o vencedor. O jogo encerra quando todos os jogadores acabarem suas cartas.
Referências
ACRANI, S. et al. A utilização de jogos didáticos como estratégia de aprendizagem no ensino de Biologia. Brazilian Journal of Development, v. 6, nº 2, p. 7.930-7.935, 2016.
ARAÚJO, M. S. et al. A Genética no contexto de sala de aula: dificuldades e desafios em uma escola pública de Floriano/PI. Revista de Ensino de Ciências e Matemática (REnCiMa), v. 9, nº 1, p. 19-30, 2018.
BERTOCCHI, N. A. et al. Jogo da Velha Mendeliano: uma atividade lúdica para o ensino de Genética. Revista Brasileira Ensino de Ciência e Tecnologia, v. 9, nº 3, p. 1-15, 2016.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: Ensino Médio. Brasília, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/#medio.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf.
KRASILCHIK, M. Prática de Ensino de Biologia. 4ª ed. São Paulo: Edusp, 2016.
REIS, A. H. de O. et al. Sorte na Genética: atividade educacional de suporte ao ensino-aprendizagem no Ensino Médio. Revista Educação Pública, v. 21, nº 28, 27 de julho de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/28/sorte-na-genetica-atividade-educacional-de-suporte-ao-ensino-aprendizagem-no-ensino-medio.
REZENDE, L. P.; GOMES, S. C. S. Uso de modelos didáticos no ensino de Genética: estratégias metodológicas para o aprendizado. Revista de Educação, Ciências e Matemática, v. 8, nº 2, 2018. Disponível em: http://publicacoes.unigranrio.edu.br/index.php/recm/article/view/4447. Acesso em: 29 maio 2020.
SILVA, C. C.; CABRAL, H. M. M.; CASTRO, P. M. Investigando os obstáculos da aprendizagem de Genética Básica em alunos do Ensino Médio. Educação Temática Digital, v. 21, nº 3, p. 718-737, 2019.
SOARES, V. F. et al. A relevância dos jogos didáticos como ferramenta para auxílio do processo de ensino-aprendizagem de Biologia. Diversitas Journal, v. 1, nº 1, p. 64-67, 2016.
Vale a pena ler também: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/14/atividades-ludicas-no-processo-de-ensino-e-aprendizagem-dos-conceitos-de-genetica.
Anexo
Perguntas |
Respostas |
Formas alternativas de um mesmo gene que ocupam o mesmo lócus em cromossomos homólogos? |
Alelo |
Caracteres controlados por vários genes e/ou sujeitos a elevada influência ambiental? |
Caracteres quantitativos |
Como ocorre a distribuição dos caracteres quantitativos? |
Contínua |
Quais são os caracteres governados por poucos genes, que apresentam variáveis discretas? |
Caracteres qualitativos |
Como se chamam os cruzamentos que se dão entre indivíduos aparentados? |
Endogamia |
Quais os tipos de ação gênica? |
Aditiva, dominante e epistática ou de interação |
Dividindo a variância genética pela variância fenotípica, o que se obtém? |
Herdabilidade no sentido amplo |
Como se chama a herança que os caracteres quantitativos apresentam? |
Herança complexa |
Qual o alelo que somente se expressa em homozigose? |
Recessivo |
Como é a distribuição dos caracteres qualitativos? |
Descontínua |
Qual é a herança que os caracteres qualitativos apresentam? |
Herança simples |
Subtraindo a variância ambiental da variância fenotípica, o que se obtém? |
Variância genética |
Qual a ação gênica em que a expressão fenotípica do heterozigoto supera a de ambos os homozigotos? |
Sobredominância |
Qual a denominação usada para a variação em torno da média? |
Desvio padrão |
O que se obtém dividindo a variância aditiva pela variância fenotípica? |
Herdabilidade no sentido restrito |
Qual a representação gráfica das relações de parentesco entre indivíduos? |
Heredograma |
Qual o nome dado quando o indivíduo apresenta dois alelos diferentes de um mesmo gene? |
Heterozigoto |
Qual é o alelo que se expressa em condição homozigótica e em condição heterozigótica? |
Dominante |
Como se chama o conjunto de genes do indivíduo? |
Genótipo |
Qual o nome do conjunto de indivíduos idênticos que têm homozigose em todos os lócus? |
Linhagens |
Como é chamada a posição específica em que cada gene é encontrado em um cromossomo? |
Lócus |
Qual o processo de divisão celular em que uma célula origina duas células idênticas? |
Mitose |
Como é chamado quando o indivíduo apresenta dois alelos iguais de um mesmo gene? |
Homozigoto |
Qual o nome da constituição cromossômica de um indivíduo? |
Cariótipo |
Qual o efeito em que o valor genotípico do heterozigoto é igual ao de um dos homozigotos? |
Efeito de dominância |
Como são denominadas as características do indivíduo que são resultado da expressão do genótipo e da ação do ambiente? |
Fenótipo |
Qual é o princípio do equilíbrio gênico, se nenhum fator evolutivo ocorrer? |
Equilíbrio de Hardy-Werinberg |
Como se chama a interação gênica na qual genes de um par de alelos inibem a manifestação de outros genes? |
Epistasia |
Qual o nome da divisão celular em que uma célula diploide (2n) origina quatro células haploides (n)? |
Meiose |
Como se denominam as sequências específicas de nucleotídeos no DNA – unidade fundamental da hereditariedade? |
Gene |
Publicado em 30 de janeiro de 2024
Como citar este artigo (ABNT)
SILVA, Adielle Rodrigues da. Genética em Jogo: recurso didático para o aprendizado de conceitos básicos de Genética. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 3, 30 de janeiro de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/3/genetica-em-jogo-recurso-didatico-para-o-aprendizado-de-conceitos-basicos-de-genetica
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