Experiências no estágio curricular em Geografia: desenvolvimento de oficina pedagógica para criação de jogos com alunos do Ensino Médio

Marcelo Henrique de Queiros Silva

Mestrando em Ensino (UERN), graduado em Geografia (UERN)

O momento de realização do estágio curricular supervisionado nos cursos de licenciatura se configura como parte essencial do processo de formação e desenvolvimento da prática docente, visto que a partir da inserção dos graduandos no ambiente escolar acontece a articulação entre os saberes teórico-metodológicos estabelecidos no contexto da universidade e as práticas de ensino a serem desenvolvidas nas salas de aulas (Souza Neto; Sarti; Benites, 2016).

Nesse sentido, a realização do estágio curricular supervisionado visa oferecer aos professores em formação oportunidades de experiências reais que os remetam à prática docente e a todo o processo de ensino-aprendizagem no qual estão inseridos. Dessa forma, o estágio permite o desenvolvimento de competências e habilidades necessárias para o exercício da profissão pelos graduandos, aprimorando os seus próprios conhecimentos (Costa; Fernandez; Bezerra, 2018).

Além disso, de acordo com Carvalho (2012), a atuação dos graduandos no cenário escolar em estágio supervisionado pode proporcionar a superação de perspectivas simplistas da realidade educacional. Há aspectos do cotidiano nas práticas de ensino, assim como nas próprias relações sociais estabelecidas, que podem ser inteiramente vivenciados pelos estagiários, proporcionando não apenas a compreensão dos desafios do processo de ensino-aprendizagem, mas também das diversas possibilidades existentes.

Em consonância com a discussão, ao refletir especificamente a respeito do ensino de Geografia, Policarpo (2018) destaca que o estágio supervisionado apresenta o potencial de novas discussões, reflexões e práticas pedagógicas em meio às transformações da sociedade, havendo a oportunidade de desenvolvimento de um processo educacional ativo, a fim de formar cidadãos no cenário escolar.

Nesse contexto, o componente Estágio Curricular Supervisionado do curso de licenciatura em Geografia da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, no câmpus avançado de Pau dos Ferros, traz uma carga horária específica para a organização de oficinas pedagógicas com temáticas livres pelos estagiários nas escolas receptoras.

Segundo Paviani e Fontana (2009), as oficinas pedagógicas são caracterizadas como espaços de integração entre a teórica e a prática em sala de aula, se estabelecendo como uma forma de construir o conhecimento escolar por meio da integração dos sujeitos que compõem a realidade educacional, apresentando como base a ação e a reflexão dos alunos, juntamente com o professor.

O presente trabalho tem como objetivo relatar as experiências de estágio supervisionado vivenciadas a partir da organização de oficinas pedagógicas na disciplina de Geografia com os alunos da 2ª série do Ensino Médio da Escola Estadual Professor Manoel Herculano, no município de São Francisco do Oeste/RN.

A escolha da criação de jogos como temática base para o desenvolvimento das oficinas pedagógicas em sala de aula se justifica pelas reflexões em torno das novas demandas da educação do século XXI. Segundo Mosé (2013), a escola apresenta em seu espaço uma função primordial de incluir o aluno de forma direta nas metodologias de ensino, fazendo com que ele possa ser considerado como indivíduo no próprio processo de formação e de aprendizagem.

Nesse sentido, para Kishimoto (2011), apesar de serem percebidos na contemporaneidade como formas descompromissadas e de caráter meramente recreativo, os jogos podem desempenhar papel significativo na formação dos indivíduos e na transferência de saber. Para Kiya (2014), os jogos oferecem um espaço no qual os alunos podem experimentar e interagir de forma lúdica com as atividades propostas, possibilitando o engajamento, o desenvolvimento do pensamento crítico e a resolução de problemas no cenário da sala de aula.

Metodologia

Visando o estabelecimento de uma adequada aplicação das oficinas no contexto educacional, o percurso metodológico de organização das oficinas pedagógicas de criação de jogos na Escola Estadual Professor Manoel Herculano se deu a partir da realização das três etapas sugeridas por Ribeiro e Silva (2021): a organização das ideias, a realização da oficina e a avaliação.

A primeira etapa se refere ao momento inicial de apresentação e definição dos objetivos das oficinas com os membros participantes, bem como os conceitos a serem abordados e as diretrizes gerais para o desenvolvimento das atividades propostas.

A segunda etapa diz respeito ao processo de criação propriamente dito, consistindo na realização dos encontros com a turma para a confecção dos produtos planejados na etapa anterior. Nesse momento, o professor ou ministrante da oficina fornece suporte para os alunos, esclarecendo dúvidas e estimulando o trabalho coletivo.

Por fim, a etapa da avaliação contempla as reflexões advindas do processo de ensino observado durante todo o percurso de desenvolvimento e aplicação das oficinas pedagógicas, ponderando suas contribuições e aprendizagens no contexto em que foi aplicada.

O processo de desenvolvimento da oficina pedagógica: da proposta inicial às suas contribuições em sala de aula

A primeira atividade referente à organização da oficina pedagógica com os alunos do Ensino Médio foi a apresentação do conceito de oficina no contexto educacional (Figura 1), bem como seus objetivos teóricos e práticos estabelecidos no próprio projeto pedagógico de estágio supervisionado do curso na UERN/CAPF.

Figura 1: Apresentação dos objetivos da oficina para a turma

Figura 2: Arte criada para divulgação da proposta didática

Buscou-se, nesse primeiro contato, verificar as experiências prévias que a turma possuía com relação ao desenvolvimento das oficinas pedagógicas. Nesse sentido, questionados se já haviam participado de alguma atividade semelhante às oficinas, os alunos relataram que haviam ouvido falar no conceito, mas nunca haviam tido oportunidade de participar de uma oficina anteriormente. Dessa forma, aquela seria a primeira vez vivenciando tal proposta metodológica na prática.

Com base nesse diálogo, adentrando a temática específica da oficina pedagógica, foram expostas diversas proposições relativas à concepção de jogos a serem criados pelos estudantes e dos conteúdos da Geografia que poderiam ser abordados por eles, abrangendo modalidades como jogos de tabuleiro e de memória (Figura 3). Além disso, foram apresentadas sugestões de materiais acessíveis que poderiam ser utilizados durante o processo de confecção dos produtos, como tampinhas, papelão e cartolina.

Figura 3: Propostas de jogos apresentados para a turma

Figura 4: Jogos propostos

Como último tópico de discussão, acordou-se com a turma a não indicação de um tema específico da Geografia a ser abordado pelos jogos que seriam criados. Dessa forma, foi permitido que os alunos tivessem a liberdade para escolher um assunto de seu próprio interesse, desde que estivesse relacionado às discussões abrangidas pela Geografia.

A escolha de não limitar a um tema ou conteúdo para a prática das oficinas foi ao encontro das reflexões de Candau et al. (1995). As oficinas devem ser um espaço de construção coletiva de conhecimento, fundamentado na análise mútua da realidade e na troca de experiências de todos os seus integrantes, assegurando uma aprendizagem ativa e autônoma.

A partir das orientações iniciais, os alunos se dividiram em equipes compostas por três alunos, a fim de estabelecer as primeiras discussões em seus respectivos grupos acerca dos jogos que iriam desenvolver e dos materiais que seriam utilizados.

Após a conclusão da etapa inicial de planejamento e orientação teórica para a realização da oficina pedagógica com os estudantes, juntamente com a definição dos jogos e temas geográficos a serem explorados por cada equipe, deu-se início, nas aulas seguintes, à segunda etapa do percurso proposto, por meio dos momentos práticos de produção em sala de aula com a turma.

Figura 5: Criação dos produtos da oficina em sala de aula

Figura 6: Alunos desenvolvendo seus jogos em equipes

Essa transição para a prática despertou entusiasmo nos alunos, que demonstraram altas expectativas em relação aos temas a serem abordados e aos produtos que eles próprios criariam, reforçando a reflexão sobre a capacidade de envolvimento dos atores em sala de aula por meio da aplicação de atividades didáticas ativas e práticas no processo de ensino-aprendizagem (Mosé, 2013).

Nesse sentido, os jogos escolhidos para serem desenvolvidos pelos alunos foram os de tabuleiro, de cartas com perguntas e respostas e de memória, abordando conteúdos referentes aos modelos de industrialização e países desenvolvidos e em desenvolvimento, temas que haviam sido explorados anteriormente pelo professor nas aulas de Geografia.

Seguindo as orientações iniciais, os alunos utilizaram materiais como tampinhas de garrafa, cartolinas, papéis e papelões para a confecção dos jogos. A etapa de criação dos produtos foi desenvolvida em quatro aulas que ocorreram durante duas semanas, culminando na entrega dos produtos finais.

Após a finalização da etapa de confecções, os alunos tiveram a oportunidade de apresentar o resultado final de seus produtos, demonstrando o funcionamento dos jogos elaborados e a abordagem dos temas geográficos. Todos os jogos produzidos conseguiram efetivamente relacionar os temas selecionados de Geografia aos objetivos dos jogos propostos. Por exemplo, os jogos de tabuleiro (Figura 7) empregavam questões sobre as características do processo de industrialização, enquanto o jogo da memória (Figura 8) utilizava bandeiras para relacionar os países que eram classificados como desenvolvidos ou em desenvolvimento.

Figura 7: Parte de um dos jogos de tabuleiro elaborados pela turma

Figura 8: Jogo da memória elaborado pelos alunos

Nesse sentido, avaliando o percurso de realização da oficina pedagógica, desde a etapa de planejamento inicial até o processo de confecção dos produtos, foi possível evidenciar o aumento da interação e do engajamento dos alunos nas discussões propostas durante as aulas de Geografia, permitindo uma reflexão integrativa e prática dos conteúdos teóricos da disciplina com o próprio mundo da vida dos alunos. Para Mutschele e Gonsales Filho (1998) fazer com que o educador desenvolva um ensino voltado às realidades de vida é uma das mais relevantes contribuições da aplicação de oficinas pedagógicas no contexto escolar.

Além disso, corroborando Kishimoto (2011), observamos na prática a capacidade dos jogos de colaborarem para a transferência de saber entre as equipes de alunos, seja o saber formal, por meio das discussões a respeito dos conteúdos de Geografia que seriam abordados, ou os saberes informais, a partir das técnicas usadas no processo de confecção dos produtos.

Dessa forma, a criação de um espaço de reflexão para os estudantes, no qual lhes foi concedida a oportunidade de planejar a abordagem dos conceitos geográficos por meio da elaboração de seus próprios jogos, promoveu o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa, caracterizada de acordo com Moran (2018) pela motivação e pelo engajamento dos próprios alunos nas atividades a serem realizadas.

Conclusão

Ao possibilitar que os alunos participassem ativamente da criação de jogos e da manipulação de materiais relacionados à Geografia, a organização da oficina pedagógica com os alunos do Ensino Médio da Escola Estadual Professor Manoel Herculano, no estágio curricular supervisionado, proporcionou um processo de ensino-aprendizagem ativo e reflexivo.

Dessa forma, a operacionalização da oficina permitiu o engajamento dos estudantes ao longo de todo o percurso realizado, desde as etapas iniciais de planejamento até a execução prática, colaborando para o estabelecimento de uma aprendizagem significativa dos conteúdos geográficos abordados e para a superação de modelos de aulas nos quais os alunos são apenas espectadores passivos dos conteúdos teóricos.

Referências

CANDAU, V. M. et al. Oficinas pedagógicas de direitos humanos. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1995.

CARVALHO, A. M. P. de. Os estágios no curso de licenciatura. São Paulo: Cengage Learning, 2012.

COSTA, C. L.; FERNANDEZ, S. B. S.; BEZERRA, A. M. C. A importância do estágio de regência no processo formativo docente: um relato de experiência. V CONEDU. Anais... Campina Grande: Realize, 2018. p. 1-10. Disponível em: https://editorarealize.com.br/artigo/visualizar/45917. Acesso em: 5 jun. 2024.

KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a Educação. 14ª ed. São Paulo: Cortez, 2011.

KIYA, M. C. S. Os desafios da escola pública paranaense na perspectiva do professor PDE. Cadernos PDE, Ponta Grossa, v. 2, 2014.

MORAN, J. Metodologias ativas para uma aprendizagem mais profunda. In: BACICH, L.; MORAN, J. (org.). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018.

MOSÉ, V. A escola e os desafios contemporâneos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.

MUTSCHELE, M. S.; GONSALES FILHO, J. C. Oficinas pedagógicas: a arte e a magia do fazer na escola. 5ª ed. São Paulo: Loyola, 1998.

PAVIANI, N. M. S.; FONTANA, N. M. Oficinas pedagógicas: relato de uma experiência. Conjectura, v. 14, n° 2, p. 77-88, 2009. Disponível em: http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/conjectura/article/view/16/15. Acesso em: 4 jun. 2023.

POLICARPO, M. A. Práticas e experiências na formação de um professor no estágio supervisionado da licenciatura em Geografia. Revista de Ensino de Geografia, Uberlândia, v. 16, n° 9, p. 211-225, jan. 2018. Disponível em: http://www.revistaensinogeografia.ig.ufu.br/N16/Rel3-v9-n16-revista-ensino-geografia-Policarpo.pdf. Acesso em: 19 jun. 2023.

RIBEIRO, F. da C.; SILVA, S. dos S. Uma cartilha para estruturação de oficina pedagógica. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, p. 4-40, 2021. Disponível em: https://periodicorease.pro.br/rease/article/view/918. Acesso em: 8 jun. 2023.

SOUZA NETO, S. de; SARTI, F. M.; BENITES, L. C. Entre o ofício de aluno e o habitus de professor: os desafios do estágio supervisionado no processo de iniciação à docência. Movimento, v. 22, n° 1, p. 311-324, 2016. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/Movimento/article/view/49700. Acesso em: 10 jun. 2023.

Publicado em 20 de agosto de 2024

Como citar este artigo (ABNT)

SILVA, Marcelo Henrique de Queiros. Experiências no estágio curricular em Geografia: desenvolvimento de oficina pedagógica para criação de jogos com alunos do Ensino Médio. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 30, 20 de agosto de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/30/experiencias-no-estagio-curricular-em-geografia-desenvolvimento-de-oficina-pedagogica-para-criacao-de-jogos-com-alunos-do-ensino-medio

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