Olhares interdisciplinares sobre a História e as tecnologias a partir do filme "Blade Runner: o caçador de androides"

Amanda Tolomelli Brescia

Pedagoga, doutora em Educação (FaE/UFMG), professora do PPGE/UEMG

Aline Choucair Vaz

Historiadora, doutora em Educação (FaE/UFMG), professora do PPGE/UEMG

Marcelo Diniz Monteiro de Barros

Biólogo, doutor e pós-doutor em Ensino em Biociências e Saúde (IOC/Fiocruz), professor da Faculdade de Educação da UEMG e do Departamento de Ciências Biológicas da PUC-Minas, professor do Programa de Pós-Graduação em Ensino em Biociências e Saúde do IOC/Fiocruz

Blade Runner – o caçador de androides, título em português de um filme lançado no ano de 1982 pelo diretor Ridley Scott, é um filme livremente inspirado no livro lançado em 1968, Do Androids Dream of Electric Sleep? (em português, “Os androides sonham com ovelhas elétricas?”), do escritor estadunidense Philip K. Dick.

O filme é um clássico da ficção científica do cinema norte-americano que embalou a geração de várias pessoas que assistiram a ele. Depois de 41 anos de sua primeira exibição, muitas questões ainda são levantadas a respeito do longa-metragem, que tem possibilidade educativa contundente para reflexão nas escolas, principalmente se realizada com estudantes do Ensino Médio e em espaços de formação interdisciplinar.

O filme carrega uma história distópica de um caçador de androides que foi matador e foi policial, pressionado pelo chefe da polícia a perseguir e a capturar um grupo de androides que se rebelaram em outro planeta, numa colônia da Terra. O filme é apresentado no futuro, no ano de 2019, tendo como pano de fundo a cidade de Los Angeles.

No século XXI, o planeta Terra é um colonizador de outros planetas, trazendo escravos tecnológicos para trabalhar e explorar outros lugares conhecidos. Deckard, personagem do caçador de androides vivido pelo ator Harrison Ford, passa por um conflito angustiante, principalmente ao apaixonar-se por Rachael, personagem vivenciada pela atriz Mary Sean Young, androide que não sabe de sua situação “não humana” e cujas memórias são forjadas, advindas da sobrinha de seu desenvolvedor.

O filme relata o embate entre a humanidade e a tecnologia, assim como aborda questões relativas à memória sob uma perspectiva filosófica.

Os quatro androides que fugiram de suas colônias vêm em busca de mais tempo de vida, um capítulo à parte nesse cenário futurista. Roy (interpretado pelo ator Rutger Hauer) é o líder deles e o antagonista do filme; Leon (interpretado por Brion James), Pris (interpretada por Daryl Hannah) e Zhora (interpretada por Joanna Cassidy) buscam a vida “humana” em plenitude, mas sabem que correm contra o tempo, pois todos têm um período determinado de “vida”, já pré-calculado.

Deckard, o caçador de androides, consegue “remover” (palavra utilizada pela polícia do filme para substituir o termo “assassinar”) os replicantes (como eram reconhecidos os androides) com relativa facilidade, com exceção do último: o líder, Roy. A Terra é um planeta aparentemente decadente, escuro e sujo, cercado pela artificialidade, sempre sobre o “fio da navalha”, ou seja, entre a vida e a morte das personagens, inclusive a do próprio caçador de androides.

Na película, o olhar a respeito do mundo é algo fundamental. Por meio da identidade ocular, se forma e se reproduzem memórias. Tolentino (1997, p. 120) destaca:

Desde a primeira cena, o filme duplica ou reduplica o papel do espectador: é uma história apresentada aos olhos deste espectador, através do olhar da câmera cinematográfica, que capta, reproduz e se fixa constantemente no olhar e/ou no olho de protagonistas, de figuras não-humanas, de cartazes, de imagens que imitam a forma do olho. E durante todo o desenrolar do filme podemos observar que os personagens são delineados a partir do olhar de alguém, seja de outro protagonista do filme, da própria câmera, como citamos, seja de nós próprios, os espectadores. A primeira cena mostra um enorme olho a dominar toda a tela, por duas vezes, enquanto uma Los Angeles do ano 2019 é mostrada em toda sua aridez e escuridão, como uma cidade pós-destruição atômica, pós-perda da camada de ozônio, pós-pós-moderna, pós-esperança de vida sadia e normal num centro urbano. Esse olho nos é mostrado como um aviso de que o que vai se desenrolar a partir daí depende do olhar de alguém. É um olho não localizado, cósmico.

Na verdade, esse é um olho que permeia a vida e a desordem instauradas naquele momento. Um olho que define quem vive e quem morre, pois o teste de verificação de humanidade se dá por meio de perguntas e pela análise do globo ocular. Por meio dos olhos, vê-se um mundo destituído de humanidade, destruído pelos próprios sujeitos que o habitam.

Público-alvo

Este artigo tem como público-alvo professores e professoras que queiram analisar o filme Blade Runner, sobretudo no Ensino Médio, numa perspectiva interdisciplinar entre a História e as Tecnologias. Também é um ótimo filme para pesquisas no Ensino Superior, pois traz uma análise direcionada à área da Educação e do ensino, com olhares substanciados para esse campo de conhecimento.

Possibilidades para o uso do filme na perspectiva educativa histórica 

Há pesquisadores preocupados, discutindo a relação da História com o Cinema. Não faremos aqui uma digressão em relação a esse assunto, mas entendemos que o Cinema tem se mostrado campo e espaço para produções de práticas educativas, inclusive escolares.

Com intencionalidades distintas, ele tem um viés mercadológico vinculado a um público que consome filmes e lazer. A partir da ideia de que o Cinema, de forma geral, com exceção dos filmes especializados, não é produzido especificamente para crianças, jovens e para a escola, cabe ao/à educador/a apropriar-se da discussão do filme, vinculando-o aos saberes e às concepções de uma área específica do conhecimento da qual queira tratar.

Morettin (2007) analisa o Cinema como objeto de estudo da História a partir dos anos de 1970 e dentro dos domínios da chamada História Nova. Desse modo, com base na perspectiva da cultura e da sociedade, o Cinema, como ficção, apresenta parte da sociedade, pois se inspira em práticas do real e nos seus respectivos campos de conhecimento.

Bittencourt (2004) sinaliza que as imagens cinematográficas demoraram a chegar à escola, pois ainda são pensadas somente como formas ilustrativas. Ao pensar em um filme como objeto histórico é necessário leitura atenta em relação ao “que é o filme – planos, temas – ao que não é filme – autor, produção, público, crítica, regime político” (Bittencourt, 2004, p. 374). Ainda os/as estudiosos/as do Cinema se atentam para a importância de três características fundamentais para a análise de filmes:

a) Os elementos que compõem o conteúdo, como roteiro, direção, fotografia, música e atuação dos atores;

b) O contexto social e político de produção, incluindo a censura e a própria indústria do Cinema;

c) A recepção do filme e a recepção da audiência, considerando a influência da crítica e a reação do público segundo idade, sexo, classe e universo de preocupações (Kornis, 1992, p. 248 apud Bittencourt, 2004, p. 375).

É preciso preparar os/as estudantes para uma leitura do filme para além da dimensão que estão acostumados/as pela lógica do lazer. Quando falamos a respeito da questão histórica, um filme deve ser pensado como um documento (ainda que ficcional) produzido em uma determinada época, evidenciando visões específicas de um mundo.

Uma atenção especial deve-se dar ao início da proposta. Antes de o filme começar, cuidar para não direcionar excessivamente o olhar do/a aluno/a. Embora seja importante atentar para questões a serem analisadas no filme, é fundamental não engessar a crítica que virá do/a estudante. Após a discussão na análise, o filme levantará outras possibilidades e dimensões no processo.

Napolitano (2006) enuncia o filme para o ensino de História como uma “pluralidade de canais”. Mesmo diante de suas possíveis manipulações ou questões de ordem ficcional, “o que um filme diz e como o diz?” é importante. A História que analisa as sociedades no passado e sua verossimilhança traz amplas discussões no que se refere aos sentidos de versões históricas e imagens que os indivíduos produzem de si e dos tempos.

O conceito da memória é um conceito fundamental num longa-metragem no que diz respeito à História. A memória pode ser pensada, de acordo com Nora, como “o que fica do passado no vivido dos grupos, ou o que os grupos fizeram do passado” (Nora, 1978, p. 112). Em Blade Runner, os/as replicantes correm em busca de mais vida. Suas vidas só têm sentido pela memória por eles produzida da própria existência. As memórias de um período curto de vida, ainda que extremamente significativo, entoam a busca dos replicantes pelo conhecimento a respeito de como poderiam ampliar o tempo de vida que têm, junto à empresa que os criou (The Tyrell Corporation).

Ricoeur (2007) reconhece que a memória é a matéria-prima da História. Os/as historiadores/as reconstroem memórias coletivas para interpretar o passado. Analisar as memórias dos replicantes em Blade Runner é considerar que elas produzem identidades aos sujeitos, lhes proporcionando um grau de humanidade. Rachael é um desses exemplos. As memórias forjadas em suas memórias, conforme as memórias da sobrinha de Eldon Tyrell, interpretado pelo ator Joe Turkel, produz vida e sentido à existência da personagem. Os documentos, as fotos e as histórias nela implantadas (que são de outra pessoa), dão à personagem a vida. Questiona-se, então: mas afinal, quem não é humano? Se ali todos têm memória, todos possuem uma vida e uma identidade construídas. A personagem Roy, líder dos replicantes, é categórico no momento de sua morte ao enfatizar a força e o valor da memória aos indivíduos:

Eu vi coisas que vocês não imaginariam. Naves de ataque em chamas ao largo de Órion. Eu vi raios-c brilharem na escuridão próximos ao Portal de Tannhäuser. Todos esses momentos se perderão no tempo, como lágrimas na chuva. Hora de morrer (Blade Runner – o caçador de androides, momentos finais, 1982. Ator: Rutger Hauer).

Figura 1: Roy se despedindo do mundo

Fonte: roy-batty-c3baltima-cena.jpg (wordpress.com). Acesso em: 23 set. 2023.

A fala final de Roy infere um livro a abrir e ler.  Na chuva e com lágrimas nos olhos, ele se despede do mundo, mostrando alto grau de humanidade. Deckard, o caçador de androides, se surpreende com Roy. Quantas histórias Roy poderia contar, mas se perdiam com a sua morte? Quanto de humano Roy teria para contar a respeito de suas próprias memórias?

Além de um debate se referindo às memórias individuais e coletivas como ponto significativo no ensino da História, o filme ainda pode gerar reflexões importantes a respeito da sociedade da década de 1980, imprimindo e considerando o mundo em um futuro distópico, em 2019. Como a Coca-Cola, a China e as grandes marcas dominavam um mundo artificial e tecnológico, com objetos, animais e humanos produzidos em laboratórios, pensar o filme é tratar do tempo futuro, não especificamente do ano de 2019, testificando como  aqueles que o produziram viam o futuro, o ser humano e a sua sobrevivência na Terra. À época, ainda não havia Internet, celular ou inteligência artificial (IA), mas o filme inquiria as tecnologias hoje presentes no mundo e nas relações entre os sujeitos.

Possibilidades para o uso do filme na perspectiva das tecnologias e da Educação 

Na primeira tomada do filme é exibida em um plano geral, aberto em uma grande angular, uma fictícia cidade de Los Angeles do ano de 2019. Há carros voando e cruzando o céu e grandes torres pegando fogo em um ambiente com pouca iluminação natural e muita tecnologia. A começar pelos meios de transporte, todos voam e apresentam, em seu interior, vastos painéis de controle. Percebe-se que a sociedade ali projetada não é uma sociedade na qual vivemos atualmente, pós-2019, mas uma sociedade distópica, precária e com muito sofrimento.

A apresentação imagética do filme mostra um “importante sistema produtor de significados na composição da narrativa fílmica: a iluminação” (Duarte, 2002, p. 19), percebido como um ambiente escuro, chuvoso (possivelmente uma chuva ácida) e sujo, pois o lixo está presente em quase todas as cenas.

Tal apresentação imagética nos faz refletir a respeito do tipo de futuro representado pela sociedade de 1982 para 2019. Uma sociedade altamente tecnológica, porém sem qualidade de vida para os seres que a habitam, com intensa degradação (ou extermínio) da natureza, tendo as relações entre homens e máquinas se confundido. Nesse mundo era sempre necessário “testar” para diferenciar quem era um replicante e quem era um humano. Tal teste era realizado considerando a reação emocional que, teoricamente, não estaria desenvolvida no replicante. O esperado era que se o sujeito testado fosse humano, o mesmo demonstraria alguma reação emocional com as situações descritas, enquanto o replicante não seria capaz de demonstrar empatia ou qualquer outra reação emocional às situações descritas durante o teste.

Utilizamos a palavra teoricamente devido às dúvidas levantadas na questão. Será que realmente o replicante, compreendido por este trabalho como elemento dos primórdios da Inteligência Artificial, não era capaz de aprender ou simular uma reação emocional? Rachael, a replicante que não se via como replicante, não foi capaz de se apaixonar por Deckard? Para essas questões não temos respostas prontas ou comprovadas no filme, mas as sugerimos como propostas a serem debatidas pelos professores/as no Ensino Médio junto a seus alunos.

O termo inteligência artificial (IA) (e a ideia por trás do termo) foi criado em 1956, por J. McCarthy, tendo como principal objetivo dotar as máquinas de conhecimentos e observando o conceito de inteligência como a capacidade de aprender a resolver problemas do mundo real por meio de algoritmos (Russel; Norvig, 2013). Assim, podemos avançar na discussão de que se a principal forma de identificação dos replicantes estava relacionada à ausência de reação emocional, eles poderiam aprender, ou seja, poderiam desenvolver uma solução para os “problemas humanos” e, mais uma vez, serem confundidos com um ser humano. Não obstante, cabe lembrar que a IA está em constante aprimoramento, em frequente autoaprendizagem e em permanente autodesenvolvimento.

Avançando um pouco mais na discussão, há alguns estudos e análises que consideram inclusive a possibilidade de Deckard ser um replicante, como pode ser verificado pelo seu olhar na cena ilustrada na Figura 2, na qual sua pupila aparece brilhante como a de Rachel, comprovando, em ambos os casos, uma não humanidade.

Figura 2: Rachael e Deckard

Fonte: Blade Runner (1982): análise e significados do filme. Acesso em: 23 set. 2023.

Outros indícios de que Deckard era provavelmente um replicante perpassam o fato de que quando indagado por Rachael se ele já havia aplicado o teste nele mesmo, ela não obteve resposta.

A empatia apresentada pelas personagens Rachael e Deckard é evidente, bem como o fato de Deckard ter sonhado com a imagem de um unicórnio e, posteriormente, a imagem de um origami, em forma de unicórnio, ter aparecido em sua casa. O romance vivenciado por eles se torna óbvio na trama a partir do momento que Rachael percebe que Deckard está correndo risco de morte, pois ela salva a vida do amado quando “retira” Leon com um tiro, demonstrando seus sentimentos.

O filme projeta uma sociedade que não existiu no ano de 2019. Uma sociedade tecnológica onde tudo é artificial, inclusive os animais que a habitam, não trazendo quaisquer vantagens à população, pois durante todo o filme é possível ver que nos outdoors das cidades são veiculados convites para que as pessoas saiam do planeta para habitar lugares melhores, fora dali.

Como já dito, a luz do sol não se faz presente na grande maioria dos cenários do filme. Quando há elementos naturais eles servem para gerar incômodo, como na cena em que Deckard aplica o teste em Rachael. O  controle da luz do sol é realizado artificialmente e fica a cargo do Dr. Eldon Tyrell, dono da Corporação Tyrell e criador da tecnologia de bioengenharia que produz os replicantes. Dr. Tyrell reduz a luz ambiente, demonstrando controle de tudo. Até o sol é monitorado por ele. Importa ressaltar que a luz dourada que perpassa as cenas em que Tyrell aparece, nos remete ao divino, a alguém (ou algo) que tem o poder de criar e de destruir. Mas o criador é exterminado por uma de suas criaturas, o replicante Roy, que o mata com crueldade.

Percebe-se que a tecnologia está sempre muito presente durante todo o filme. Em contrapartida, tudo o que seria natural, até o fato de ter amigos, foi perdido  e está sendo substituído pela tecnologia produzida pelos humanos.

Os animais, como a cobra utilizada pela dançarina Zhora, ou a coruja que compõe as cenas que se passam na casa do Dr. Tyrell são máquinas construídas, assim como os amigos de J. F. Sebastian (a personagem vivenciada por William Sanderson), geneticista da Corporação Tyrell, que produz seus próprios amigos. Essa personagem transparece a solidão em que vive, em um apartamento enorme, num prédio abandonado, tendo como companhia esses “amigos” produzidos com a finalidade de lhe dar boa noite, fazendo companhia à mesa. Em uma cena emblemática, Sebastian conversa com Pris e Roy e lhes informa que não foi para a colônia, porque não passou no exame médico. Ele sofre de uma doença que lhe causa envelhecimento precoce. Assim, entende-se que apenas seres perfeitos podem ocupar as colônias fora da Terra. A Terra ficou, então, somente para o lixo e para os menos capacitados ou “imperfeitos” de acordo com a percepção do sistema.

Elencamos alguns protótipos tecnológicos que são apresentados no filme considerados em nossa realidade atual:

1 - A videochamada, por exemplo, feita por Rachael e Deckard, com extrema qualidade de conexão (quando ele está no bar em que Zhora se apresenta). A tecnologia de videochamada foi utilizada pela primeira vez no ano de 1920, entre o chefe das telecomunicações AT&T e o ex-presidente norte-americano, Herbert Hoover, mas foi popularizada apenas a partir do surgimento do Skype, no ano de 2003, sendo atualmente utilizada inclusive por meio do aplicativo WhatsApp, presente em quase todos os smartphones do mundo (Chan, 2019).

Figura 3: Videochamada entre Deckard e Rachael

Fonte: Blade Runner: 7 previsões para 2019 que o filme acertou, errou ou se antecipou. Acesso em: 23 set. 2023.

2 - As assistentes virtuais pessoais representam outro protótipo tecnológico que vem ganhando força na nossa atual sociedade, com a presença de Siris, Alexas e Google Assistente. Elas nos auxiliam em tarefas simples do dia a dia. Em 1982, ainda não eram uma realidade social. Deckard as utiliza por comando de voz para se apresentar ao entrar em sua casa, bem como as utiliza em um cartão para abrir a porta de sua residência. Tecnologias atualmente utilizadas em hotéis de todo o mundo, hoje. Importa ressaltar que embora a automação das residências (chamada de Domótica) seja uma realidade ainda distante dos consumidores populares, elas já existem para abertura de portas, utilizando leitores biométricos.

3 - A fotografia também consideramos, aqui, um protótipo tecnológico. No filme, ela deixa de ser estática, exatamente como a que temos acesso hoje em nossos potentes smartphones. Nesse caso, a fotografia possibilita um visualizador ultra tecnológico que “anda” pelo espaço fotografado, aproximando detalhes, ampliando a imagem, sem perder a qualidade, e exibindo por inteiro cenas que estavam aparecendo basicamente apenas em um pequeno pedaço. É possível localizar na fotografia elementos e objetos que não apareciam anteriormente, como Deckard faz ao conseguir chegar à imagem de Zhora dormindo em uma fotografia encontrada no quarto de Leon.

Por fim, apontamos a iluminação no filme como elemento tecnológico importante que, por muitas vezes, se apresenta como feixe de luz, direcionado ao interior das casas, dando a impressão de que as personagens são controladas e vigiadas, assim como no livro de George Orwell, 1984, a partir do olho do Grande Irmão.

Considerações finais

Analisar memória e História a partir de Blade Runner é uma excelente oportunidade de se pensar a respeito de como as memórias fundamentais criaram a humanidade dentro dos sujeitos. Com as memórias “implantadas” nos/as replicantes e a partir de uma vivência real, eles desenvolvem um desejo de viver próprio, com emoções. O espectador passa a torcer para que eles vivam mais. Assim, entendemos que sem a memória não há como construir História, pois ela é fundamental para a constituição das identidades.

Esse filme oportuniza uma “aula” a respeito das relações entre tecnologia e humanidade. Blade Runner “previu” o tipo de tecnologia digital a que teríamos acesso em grande parte do mundo atualmente. Falar da sua democratização é uma necessidade, diante do fato dela ainda não estar em todos os lugares do planeta. Desse modo, o filme também nos adverte em relação à sua ação no nosso mundo e na vida dos seres humanos.

Referências

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2004.

BLADE RUNNER – o caçador de androides. Direção: Ridley Scott. Produção: Michael Deeley. Intérpretes: Harrison Ford; Rutger Hauer; Sean Young; Edward Ward; James Olmos e outros. Roteiro: Hampton Fancher e David Peoples. Música: Vangelis. EUA, 1982. 1 Blu-ray (118min). Cor. Lançamento por Warner Home Video, 2012.

CHAN, Szu Ping. Blade Runner: 7 previsões para 2019 que o filme acertou, errou ou se antecipou. BBC News Brasil, 4 nov. 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-50290816. Acesso em: 18 set. 2023.

DICK, Philip K. Androides sonham com ovelhas elétricas? São Paulo: Aleph, 2014.

DUARTE, Rosália. Cinema & educação: refletindo sobre cinema e educação. 3ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

MORETTIN, Eduardo. O cinema como fonte histórica na obra de Marc Ferro. In: CAPELATO, Maria Helena et al. História e Cinema. São Paulo: Alameda, 2007.

NAPOLITANO, Marcos. A História depois do papel. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.). Fontes históricas. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2006.

NORA, P. Mémoire collective. In: LE GOFF, J. et alli (org.). La nouvelle histoire. Paris: Retz, 1978.

ORWELL, George. 1984. São Paulo: IBEP, 2003.

RUSSEL, Stuart; NORVIG, Peter. Inteligência artificial: uma abordagem moderna. 3ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Ed. Unicamp, 2007.

TOLENTINO, Magda Velloso Fernandes de. Blade Runner: a eterna busca e/ou a busca do eterno. Fragmentos, Florianópolis, v. 7, n° 1, 1997.

Publicado em 15 de outubro de 2024

Como citar este artigo (ABNT)

BRESCIA, Amanda Tolomelli; VAZ, Aline Choucair; BARROS, Marcelo Diniz Monteiro de. Olhares interdisciplinares sobre a História e as Tecnologias a partir do filme "Blade Runner: o caçador de androides". Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 38, 15 de outubro de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/38/olhares-interdisciplinares-sobre-a-historia-e-as-tecnologias-a-partir-do-filme-blade-runner-o-cacador-de-androides

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