Sobre a chuva e o choro: apontamentos poético-científicos

Fabricio Moraes Pereira

Mestre em Saúde, Ambiente e Sociedade na Amazônia (UFPA), técnico em Assuntos Educacionais da UFPA

A Poesia como manifestação de Arte

A poesia é entendida como uma forma de expressão artística que integra diversos aspectos que as linguagens, de modo geral, podem oferecer, ainda que suscite subjetividades que podem ser de difícil acesso semântico nos termos culturais individuais e coletivos.

Há uma grande variedade de tipos de poesia e poemas. No entanto, inicialmente, há uma tendência à busca por rimas (sejam elas pobres ou ricas) na construção de um texto poético, apesar das diversas estruturas e estilos existentes. Com a modernidade, surgiram diferentes formas de alcançar esses objetivos, como por meio da internet ou até mesmo utilizando inteligência artificial (questão que não se pretende debater neste trabalho).

Nos processos de ensino-aprendizagem, o contato com a poesia pode ocorrer de várias formas e contextos, seja através da leitura de textos, da apreciação de imagens, declamações ou escutas. Como ressalta Duarte (2023), tanto a leitura quanto a análise de poemas, poesias e outras formas de criação artística estimulam a reflexão, a interpretação e o pensamento crítico dos estudantes.

A Poesia como manifestação de ciência

Vincular a poesia apenas à arte é uma visão reducionista, especialmente em relação aos princípios filosóficos, estéticos e epistemológicos da ciência. É importante reconhecer que os primórdios da poesia abrangem avanços técnicos, tecnológicos e científicos, em conjunto com elementos artísticos, semióticos e historiográficos, conforme aponta Masi (2023).

Segundo Lima, Ramos e Piassi (2020, p. 17, e215986),

a aprendizagem, por sua vez, articula aspectos cognitivos e afetivos, que estão orientados para os objetos de ensino e para a realidade. A defesa do uso articulado entre a Ciência e a Arte para atividades educativas está pautada nas múltiplas dimensões que podem ser estabelecidas entre a cognição e o afeto, fato que pode contribuir para o posicionamento crítico diante da realidade e a ciência, além da apropriação de novas ferramentas culturais.

No contexto da Escola Básica, a ciência é frequentemente pautada em experimentos metodológicos. Os modelos, ensaios e experiências, quando realizados, são bem parametrizados, o que limita a abertura para a criatividade dos alunos.

No Ensino Superior, o pensamento científico tende a ser conservador estruturalmente, valorizando a forma sobre o conteúdo em uma linguagem metódica e normatizada, o que impacta a forma como lidamos e enxergamos as produções acadêmicas (Moraes; Castro, 2018), resultando em artigos engessados em padrões formulescos.

A Poesia como integração

É possível integrar Arte e Ciência? Estão esses campos tão distantes um do outro?

Partindo dessas questões norteadoras, pode-se inferir que a integração é possível e, de certa forma, está intimamente ligada, considerando o caráter de inovação, originalidade e inventividade que ambos possuem.

No entanto, é importante destacar que nem toda experiência, nem toda vivência nesses campos podem ser convertidas em produções desse tipo, devido à necessidade de interpretar entrelinhas, subtextos, metáforas e subjetividades que permeiam o campo da cultura. Os conhecimentos prévios, neste contexto, podem (e devem) influenciar as reflexões subsequentes ao se deparar com uma obra na conjuntura integrada proposta, respeitando a autonomia do sujeito (Freire, 1996).

No âmbito educacional, é salutar que essas produções, para além de textuais, possam alcançar os estudantes e também tocar seus íntimos interpretativos e criativos, promovendo a formação necessária para tal.

Por fim, apresenta-se o poema intitulado Sobre a chuva e o choro, de minha autoria, que versa superficialmente o ciclo da água, para análise e interpretação de quem se deparar com a obra.

Sobre a chuva e o choro

Energia ardente, as moléculas, agita
Movimento arritmado, descompassado
Em leveza essencial, lado a lado
Perscruta o firmamento, vaporiza
Em aparente calmaria, não recompondo
Vejo-me na mais complexa Entropia
Partículas sólidas avizinham em sonho
Precipito (em invólucro, condensaria?)
Abstrações, desígnios, concepções seguem
O pensar, o querer, nada mais importa
A insanidade, altiva, bate à porta
Peso molecular ascende, lágrimas caem

(Fabricio Moraes Pereira, 21 de janeiro de 2020).

Considerações finais

Não é objetivo desta comunicação detalhar cada verso do poema apresentado, mas permitir que o leitor (e, a partir da leitura, o interlocutor) reflita sobre suas nuances, tanto em relação aos conceitos explícitos sobre o ciclo da água quanto às subjetividades da psiquê, sentimentos e emoções evocadas pelas metáforas e rimas presentes.

Portanto, pretende-se que este trabalho possa inspirar outras produções na perspectiva da arte, do letramento e da ciência de forma integrada, com o propósito de tornar os processos educacionais cada vez mais transcendentais às amarras implícitas ou explicitamente impostas pelas concepções cartesianas de ciência.

Referências

DUARTE, Luciano. Utilizando a poesia na educação de crianças e jovens: uma ferramenta facilitadora. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 23, nº 35, 12 set. 2023.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

LIMA, G. S.; RAMOS, J. E. F.; PIASSI, L. P. C. Ciência, poesia, filosofia: diálogos críticos da teoria à sala de aula. Educação em Revista, v. 36, p. e215986, 2020.

MASI, G. V. L. Dísticos heroicos e “poemas científicos”: questões de forma e conteúdo na tradução literária. Revista de Literatura, História e Memória, Cascavel, v. 19, nº 33, p. 82-103, jul. 2023.

MORAES, A. C.; CASTRO, F. M. F. M. Por uma estetização da escrita acadêmica: poemas, cartas e diários envoltos em intenções pedagógicas. Revista Brasileira de Educação, v. 23, p. e230091, 2018.

Publicado em 22 de outubro de 2024

Como citar este artigo (ABNT)

PEREIRA, Fabricio Moraes. Sobre a chuva e o choro: apontamentos poético-científicos. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 39, 22 de outubro de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/39/sobre-a-chuva-e-o-choro-apontamentos-poetico-cientificos

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