Educação Infantil sob a perspectiva da Base Nacional Comum Curricular

Jaqueline Demeterko

Graduanda em Pedagogia (FAP)

Gabriela da Silva Sacchelli

Doutoranda em Educação (UEL), docente no curso de Pedagogia da FAP

O presente trabalho de pesquisa analisa a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da Educação Infantil como documento normativo e norteador das práticas pedagógicas da primeira etapa da Educação Básica de todo o país e estabelece as aprendizagens essenciais e comuns para os alunos desenvolverem ao longo da trajetória escolar. O problema de pesquisa é direcionado à seguinte questão: como a organização curricular da Educação Infantil está estruturada no documento?

Para isso, objetivou-se compreender como aconteceu a Educação Infantil, desde o século XVI até a elaboração da BNCC no ano de 2018, apresentar o documento e seus principais objetivos, compreender o conceito de criança e detalhar suas orientações curriculares para a organização do ensino na Educação Infantil.

Para tanto, foi necessária a realização de uma pesquisa qualitativa na modalidade documental, buscando nas bases oficiais – especificamente a BNCC para a Educação Infantil e a pesquisa bibliográfica – e em materiais já elaborados e publicados, como livros e artigos científicos sobre a temática.

O trabalho está organizado em seções. A primeira apresenta os marcos históricos da desigualdade da Educação Infantil brasileira. A segunda, a construção política de infância na contemporaneidade; a última discorre sobre a BNCC e a estrutura da Educação Infantil em campos de experiência.

Marcos históricos da desigualdade da Educação Infantil brasileira

Os primeiros colonos que chegaram ao Brasil no século XVI impuseram o modelo de educação europeia aos nativos que aqui habitavam: “aprender uma língua e um código de escrita desconectados de sua cultura e amar um deus que não era o seu Deus foram princípios educativos impostos pelos jesuítas às crianças indígenas” é o que explicam Marques, Pegoraro e Silva (2019, p. 4).

A escravidão dos povos indígenas mais tarde somou-se à escravidão dos povos africanos. O grande crescimento populacional, as configurações de uma colonização violenta resultaram na miséria brasileira; com isso, muitas crianças abandonadas, imersas em condições de vidas precárias. A sociedade, preocupada com essa situação, acolhia as crianças em casas de misericórdia, chamadas de roda dos expostos, ou recorriam à adoção (Marques; Pegoraro; Silva, 2019).

Somente no final do século XIX surgiu a educação institucionalizada. Em 1875, o setor privado ofertava educação pré-escolar privada aos filhos da elite; em 1896, surgiu o primeiro jardim de infância público, elitizado, e em 1899 foram criadas instituições pré-escolares para crianças filhas de operários com maior poder aquisitivo (Souza, 2007).

Segundo a autora, em decorrência da industrialização, as mulheres foram inseridas no mercado de trabalho e precisavam de um local onde pudessem deixar seus filhos. Passaram, então, a reivindicar instituições que ofertassem educação e cuidado. Ela ainda relata que, de 1900 a 1920, foram criadas instituições infantis de caráter assistencialista, mas somente entre 1930 a 1970 nascem as primeiras instituições dedicadas à educação e cuidado. Nessa época educava-se para preparar as crianças para o desempenho na escola formal, para compensar a falta – já que havia a visão de que, por serem pobres, eram desprovidas de competências e habilidades, a fim de prepará-las para serem mão de obra produtiva. Os filhos da elite recebiam educação de melhor qualidade, com a finalidade de prepará-los para dirigir a sociedade e a exploração (Souza, 2007).

Construção política da infância na contemporaneidade

A Educação Infantil, em nível constitucional, foi abordada somente na Lei Maior de 1934, e enfoque na Constituição Federal de 1988. A educação de crianças de até cinco anos em creches e pré-escolas foi assegurado como direito, dever do Estado e da família; a partir da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996), a Educação Infantil passou a ser definida como a primeira etapa da Educação Básica, garantindo também a sua gratuidade.

Segundo Marques, Pegoraro e Silva (2019, p. 18), a criação de uma base comum curricular nacional “está prevista na CF/1988 do Brasil, na LDB de 1996 e no PNE/2014, com a intenção de melhorar a qualidade da Educação Básica e amenizar fortes disparidades entre aquilo que é ensinado nos diferentes locais, estados e regiões brasileiras”. O Ministério da Educação (MEC), em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), elaboraram, com o apoio de diversas entidades representativas dos diferentes segmentos envolvidos com a Educação Básica, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), finalizada em 2018 e aprovada para entrar em vigência no começo do ano de 2020.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica, de modo a que tenham assegurados seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento, em conformidade com o que preceitua o Plano Nacional de Educação (PNE). Este documento normativo aplica-se exclusivamente à educação escolar, tal como a define o § 1º do Artigo 1º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/96), e está orientado pelos princípios éticos, políticos e estéticos que visam à formação humana integral e à construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva, como fundamentado nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCN) (Brasil, 2018, p. 5).

A BNCC é uma referência obrigatória de caráter complementar que abrange toda a Educação Básica pública e privada do país, contempla as aprendizagens essenciais e comuns que todo aluno tem o direito de desenvolver ao longo de seu trajeto na educação escolar (Brasil, 2018).

A base de aprendizagem proposta pelo documento é o desenvolvimento de dez competências que contemplem todas as dimensões do desenvolvimento humano: cognitivo, acadêmico, intelectual, físico, social, emocional e cultural. Ou seja, com a finalidade de desenvolver nos alunos conhecimentos, habilidades e valores que resultem na vivência de atitudes positivas no pleno exercício da cidadania, que os preparem para o mundo do trabalho e que contribuam para uma sociedade justa, democrática e inclusiva. A educação integral explícita nas dez competências também objetiva desenvolver nos alunos as potências necessárias para viver e contribuir na sociedade moderna do século XXI (Brasil, 2018).

Inicialmente, a BNCC retoma o conceito de Educação Infantil, resgatando a importância dessa etapa na formação da criança, considerando-a como sujeito ativo. É o que podemos observar quando concebe a criança como “ser que observa, questiona, levanta hipóteses, conclui, faz julgamentos e assimila valores e que constrói conhecimentos e se apropria do conhecimento sistematizado por meio da ação e nas interações com o mundo físico e social” (Brasil, 2018, p. 38). Portelinha et al. (2017) complementam dizendo que o documento compreende a criança como ser que produz cultura e constrói seu conhecimento.

A BNCC reconhece que as creches e pré-escolas devem acolher as vivências e os conhecimentos da criança e articulá-los em suas propostas pedagógicas; reconhece também que a instituição de Educação Infantil tem o objetivo de expandir e consolidar o universo de experiências, conhecimentos e habilidades, ofertando uma educação de caráter complementar à recebida na família (Brasil, 2018).

O documento considera que o brincar e o cuidar são fundamentais na Educação Infantil e afirma que os princípios que devem estruturar as práticas pedagógicas dessa etapa da educação são as interações e as brincadeiras, pois considera que as crianças aprendem e se desenvolvem quando interagem e brincam com os seus pares, o que já era previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (DCNEI), de 2009, ao assegurar que “as práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a brincadeira”. Em outras palavras, a BNCC (2018) aponta que

os eixos estruturantes das práticas pedagógicas dessa etapa da Educação Básica são as interações e a brincadeira, experiências nas quais as crianças podem construir e apropriar-se de conhecimentos por meio de suas ações e interações com seus pares e com os adultos, o que possibilita aprendizagens, desenvolvimento e socialização (Brasil, 2018, p. 37).

 Considerando os eixos estruturantes das práticas pedagógicas, que são a interação, a brincadeira e as dez competências, que objetivam desenvolver na criança conhecimentos, habilidades, valores e atitudes, a BNCC afirma seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento que asseguram as condições para que as crianças aprendam e desempenhem papel ativo juntamente com os seus pares. São eles: conviver, brincar, participar, expressar, explorar e conhecer-se. Segundo a Base, os direitos devem ser vivenciados em conjunto com os seus pares e adultos de todas as idades, na escola ou fora dela, no seio da sua família ou na comunidade (Brasil, 2018).

A BNCC ressalta que o processo de ensino-aprendizagem das crianças deve ser natural, espontâneo e intencional e que “parte do trabalho do educador é refletir, selecionar, organizar, planejar, mediar e monitorar o conjunto das práticas e interações, garantindo a pluralidade de situações que promovam o desenvolvimento pleno das crianças” (Brasil, 2018, p. 39).

A Base Nacional Comum Curricular e a estrutura da Educação Infantil em campos de experiência

A organização curricular da Educação Infantil na BNCC está estruturada em cinco campos de experiência que devem acolher as experiências e os saberes das crianças adquiridos em sua vida cotidiana e entrelaçá-los aos conhecimentos do patrimônio cultural. Estão englobados e articulados aos saberes e conhecimentos essenciais e comuns próprios da Educação Infantil, bem como às competências gerais e aos seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento.

Os campos de experiências são: O eu, o outro e o nós; Corpo, gestos e movimentos; Traços, sons, cores e formas; Escuta, fala, pensamento e imaginação; e Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações. A escola, deve criar condições que convidem e provoquem as crianças a ter experiências nos seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento por meio dos campos de experiência, o que significa dizer que os campos de experiência vão possibilitar que as crianças tenham experiências nos seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento (Brasil, 2018).

Na BNCC, no que se refere à Educação Infantil, as aprendizagens essenciais e comuns constituem-se de objetivos de aprendizagem e desenvolvimento. O documento divide as crianças de 0 a 5 anos e 11 meses em grupos etários e estabelece quais os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento cada um deve desenvolver, reconhecendo que cada grupo tem especificidades e não podem ser considerados de forma rígida, pois há diferenças de ritmo na aprendizagem e no desenvolvimento das crianças.

Em linhas gerais, a Base reconhece a criança como sujeito ativo, produtor de cultura e construtor do seu conhecimento (Portelinha et al., 2017), sendo capaz de construir sentidos e atribuir significados a si mesma e ao mundo ao seu redor. A escola deve organizar seus documentos curriculares, propostas e ações pedagógicas com intencionalidade, na medida em que garantam aprendizagens e desenvolvimentos nos cincos campos de experiência, possibilitando que a criança aprenda nos seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento (Brasil, 2018).

A interação com o outro se dá por meio das pluralidades de situações – que certamente devem envolver a brincadeira, geram aprendizagens, proporcionam desenvolvimento; o desenvolvimento, segundo Alves (2019), é fruto das experiências vivenciadas. Além disso, conforme descrevem Pasqualini e Eidt (2016), não acontece de maneira biologicamente natural e espontâneo, mas é compreendida como um processo histórico-cultural, condicionado essencialmente pela experiência sociocultural do indivíduo, ou seja, a criança aprende o que vivencia, seu desenvolvimento depende da qualidade das mediações.

Alves (2019, p. 81) ainda destaca que “antes a lógica estava no conteúdo. Hoje ela está nas práticas sociais”. Por isso, é de extrema importância na Educação Infantil envolver totalmente a criança, a fim de mobilizar no sujeito ações de exploração de diversas situações, buscando garantir o desenvolvimento psíquico infantil. Diante dessa nova lógica, foram elaborados os campos de experiência na relação experiência-aprendizagem-desenvolvimento (Brasil, 2018).

Como descreve a BNCC, os campos de experiência constituem um arranjo curricular que acolhe os saberes, as situações e as experiências da criança e os entrelaçam aos conhecimentos do patrimônio cultural, ou seja, o documento reconhece que as crianças são sujeitos históricos possuidores de conhecimentos adquiridos na vivência do seu cotidiano e que esses conhecimentos e saberes precisam ser ampliados, consolidados e inseridos como parte da cultura (Brasil, 2018).

Como dito anteriormente, tendo em vista a interação e a brincadeira, os campos de experiência estão englobados e articulados aos saberes e conhecimentos essenciais e comuns próprios da Educação Infantil, às competências gerais e ao direito de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se. Cabe à escola criar condições que convidem e provoquem as crianças a ter experiências nos seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento por meio dos campos de experiência.

Os campos estão inter-relacionados e são indissociáveis, cada um possui objetivos de aprendizagem e desenvolvimento que discorrem sobre o que se deseja desenvolver nas crianças ao longo da Educação Infantil; por serem integrados, eles podem estar presentes em uma mesma proposta pedagógica, conforme aponta o Movimento Pela Base (2019). Tais objetivos devem ser vivenciados por três grupos etários divididos entre creche e pré-escola. A creche compreende o grupo dos bebês de 0 a 1 ano e 6 meses; o grupo das crianças bem pequenas, de 1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses; a pré-escola é o grupo das crianças pequenas, de 4 anos a 5 anos e 11 meses (Brasil, 2018).

Quadro 1: Campos de experiência segundo a BNCC

Campo de experiência

Conceituações

O eu, o outro e o nós

Diz respeito às experiências relacionadas às interações sociais que permitem à criança construir seu próprio modo de ser, conhecer e respeitar o modo de ser do outro, desenvolver autonomia e senso de autocuidado. Para tal, é preciso criar condições que convidem a criança a ter contato com diferentes grupos sociais e culturais.

Corpo, gestos e movimentos

Menciona as experiências com as diferentes linguagens, em que a criança, com o corpo, os gestos e os movimentos explora, conhece, se relaciona, se expressa, comunica, brinca, experimenta emoções e sensações e aos poucos vai tomando consciência da sua corporeidade, dos seus limites e da sua liberdade. Para isso, na Educação Infantil ela necessita explorar e ocupar variados espaços com o corpo.

Traços, sons, cores e formas

Aborda as experiências com diferentes manifestações artísticas, culturais e científicas que permitem que a criança vivencie diversas formas de expressão e linguagem e, a partir dessas experiências, produza suas próprias manifestações, desenvolvendo senso crítico e estético, conhecendo a si mesma e tudo quanto estiver ao seu redor. Para isso, ela deve vivenciar, apreciar e produzir diversas manifestações.

Escuta, fala, pensamento e imaginação

Compreende as experiências que a criança deve vivenciar relacionadas à cultura oral, à leitura, à iniciação da compreensão e ao uso social da escrita como sistema de representação da língua. Para isso, elas devem desde cedo participar de experiências em que possam falar, ouvir, imaginar, manipular livros, escutar do professor leituras de literatura infantil e manifestar o início da escrita por meio de rabiscos e garatujas.

Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações

Compreende as experiências relacionadas ao mundo físico e social quanto aos espaços, tempos, fenômenos naturais, socioculturais e os mais variados conhecimentos matemáticos que a criança precisa desenvolver para ampliar seu conhecimento de mundo e utilizá-lo em suas vivências.

A BNCC (2018) também orienta sobre a transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental, estabelecendo estratégias de acolhimento e adaptação para os docentes e para as crianças, a fim de que a nova etapa seja construída sobre o que os educandos sabem e são capazes de fazer, de modo que as aprendizagens sejam continuadas, aprofundadas e ampliadas.

Como já dito, a BNCC é um documento norteador das práticas pedagógicas e “parte do trabalho do educador é refletir, selecionar, organizar, planejar, mediar e monitorar o conjunto das práticas e interações, garantindo a pluralidade de situações que promovam o desenvolvimento pleno das crianças” (Brasil, 2018, p. 39).

Nesse sentido, Marsiglia e Martins (2016) descrevem que, na Educação Infantil, o trabalho pedagógico deve ser organizado com clareza e, para isso, é necessário planejar o ensino por etapas, definindo objetivos, estabelecendo conteúdos, recursos, espaço-tempo, bem como compreender a dinâmica criança-entorno social e as características do seu período de desenvolvimento. As autoras ainda salientam que planejar o trabalho pedagógico é indispensável para uma educação escolar de qualidade, “rica em possibilidades e intervenções que possibilitem aos indivíduos a apropriação da cultura em suas formas mais desenvolvidas

Resultados e discussões

Como a BNCC é relativamente nova e desperta muitos questionamentos nos educadores, foi realizada uma pesquisa bibliográfica e documental com o objetivo de investigar como a organização curricular na Educação Infantil está estruturada no documento; compreender como aconteceu a educação das crianças desde o século XVI até a sua elaboração no ano de 2018; apresentar a Base e seus principais objetivos; compreender o conceito de criança e detalhar suas orientações curriculares para a organização do ensino na Educação Infantil.

Segundo Marques, Pegoraro e Silva (2019), os primeiros europeus que chegaram ao Brasil impuseram uma educação completamente desconectada da realidade das crianças indígenas, africanas e afrodescendentes; o grande crescimento populacional e a miséria fizeram com que muitas crianças fossem abandonas ou vivessem em condições de vidas precárias. Souza (2007) descreve que somente no século XIX surgiu a educação institucionalizada pelo setor privado para os filhos da elite e para os filhos dos operários com maior poder aquisitivo.

Ainda segundo esse autor, em decorrência da industrialização, muitas mulheres adentraram o mercado de trabalho e passaram a reivindicar instituições que ofertassem educação e cuidado. Nessa época, os filhos dos operários recebiam uma educação diferente dos filhos da elite. Paula (2004) descreve que, durante muito tempo, a infância inexistia ou era restrita a escassos momentos; a criança era vista como “vir a ser”, “tábula rasa”, “adulto em miniatura”; no decorrer dos anos, foi surgindo um sentimento pela infância, a qual foi ressignificada.

Constataram-se muitas conquistas na Educação Infantil. A educação de crianças de até cinco anos em creches e pré-escolas foi assegurada como direito, dever do Estado e da família, e a partir da aprovação da LDBEN nº 9.394/96 passou a ser definida como a primeira etapa da Educação Básica.

A criação de uma Base Nacional Comum Curricular, conforme apontam Marques, Pegoraro e Silva (2019), já era prevista na Constituição Federal de 1988, na LDBEN de 1996 e no PNE de 2014, a fim de melhorar a qualidade da Educação Básica e amenizar as grandes diferenças entre aquilo que é ensinado nos diferentes locais, estados e regiões brasileiras. Assim sendo, o Ministério da Educação elaborou a BNCC, a qual foi finalizada em 2018 e aprovada para entrar e vigência em 2020.

Verificou-se também que a BNCC é um documento direcionado a toda a Educação Básica pública e privada do país, sendo uma referência obrigatória de caráter complementar, que define as aprendizagens essenciais e comuns que todo aluno deve desenvolver ao longo do seu percurso na Educação Básica, de modo que sejam assegurados os seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento.

O documento afirma que “parte do trabalho do educador é refletir, selecionar, organizar, planejar, mediar e monitorar o conjunto das práticas e interações, garantindo a pluralidade de situações que promovam o desenvolvimento pleno das crianças” (Brasil, 2018, p. 39).

O Movimento pela Base (2019) aponta que os campos de experiência estão inter-relacionados e são indissociáveis, ou seja, podem estar presentes em uma mesma proposta pedagógica; cada um possui objetivos de aprendizagem e desenvolvimento que discorrem sobre o que se deseja desenvolver nas crianças ao longo da Educação Infantil.

Cada um dos cinco campos de experiência contempla objetivos de aprendizagem e desenvolvimento que discorrem sobre o que se deseja desenvolver nas crianças ao longo de seu percurso na Educação Infantil e devem acolher as experiências e saberes das crianças adquiridos em sua vida cotidiana e entrelaçá-los aos conhecimentos do patrimônio cultural; estão englobados e articulados às competências gerais, à interação e à brincadeira e ao direito de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se.

A BNCC foi elaborada com a intenção de melhorar a qualidade da educação brasileira e ofertar um ensino mais significativo e contextualizado. Mas a sua elaboração e sua aprovação ainda não são suficientes. É necessário que o documento seja estudado e explorado pelos educadores para que eles entendam seu propósito, sua organização curricular e suas orientações para a aplicabilidade nas práticas pedagógicas.

A Base precisa ser de fato interpretada e inserida nas vivências escolares, a fim de ofertar uma educação integral, significativa e próxima da realidade dos estudantes, para então superar modelos educacionais ainda deficientes e mudar a realidade da educação brasileira. Esses são princípios fundamentais sobre os quais todo educador deve refletir e dos quais se apropriar ao organizar seu planejamento escolar e atuar frente à Educação Básica Brasileira.

Considerações finais

Mediante os estudos realizados neste trabalho podemos compreender que a organização curricular na Educação Infantil está estruturada na BNCC por meio dos cinco campos de experiência, que possuem objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, os quais abrangem as competências gerais, a interação e a brincadeira, além dos seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento da criança. A escola deve organizar o ensino, a fim de garantir que as crianças vivenciem experiências de aprendizagem e desenvolvimento, garantindo o direito de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se.

O presente estudo busca contribuir para a ampliação e a consolidação de novas aprendizagens para o auxílio dos professores que muitas vezes se sentem perdidos em entender como a organização curricular na Educação Infantil está estruturada na BNCC.

Durante a pesquisa, novos horizontes foram visualizados com questionamentos ainda a serem explorados, os quais poderão ser respondidos em pesquisas futuras, com vistas a investigar, por exemplo, as especificidades e quais atividades podem ser desenvolvidas em cada campo de experiência.

Esta pesquisa que me oportunizou novas aprendizagens, abriu caminhos e me permitiu explorar esse documento tão esperado que é a BNCC. Sinto-me realizada em saber que ela reconhece a criança como sujeito ativo e protagonista da sua história, afirma direitos e desenvolve uma estrutura para a organização do ensino nas creches e pré-escolas de todo o país.

Espero que a sua elaboração contribua para a qualidade da educação; afinal, o documento mostrou que existe um repertório de possibilidades de ensino que devem ser exploradas com o objetivo de desenvolver uma educação integral e de qualidade; espero também que as conquistas educacionais não parem por aqui, mas que tenhamos documentos, novas perspectivas e novos universos a desvendar.

Referências

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MARSIGLIA, A. C. G.; MARTINS, L. M. Planejamento pedagógico à luz da pedagogia histórico-crítica. In: BAURU. Secretaria Municipal de Educação. Proposta pedagógica para a Educação Infantil do Sistema Municipal de Ensino de Bauru. Bauru: Secretaria Municipal de Educação, 2016. p. 575-584. Disponível em: https://www2.bauru.sp.gov.br/arquivos/arquivos_site/sec_educacao/proposta_pedagogica_educacao_infantil.pdf. Acesso em: 18 nov. 2020.

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Publicado em 06 de fevereiro de 2024

Como citar este artigo (ABNT)

DEMETERKO, Jaqueline; SACCHELLI, Gabriela da Silva. Educação Infantil sob a perspectiva da Base Nacional Comum Curricular. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 4, 6 de fevereiro de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/4/educacao-infantil-sob-a-perspectiva-da-base-nacional-comum-curricular

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