Residência Pedagógica: uma experiência que deu certo
Jefferson Nascimento de Brito
Licenciando em Educação do Campo com Ênfase em Matemática (UFRB)
Eliane Nascimento de Brito
Licencianda em Educação do Campo com Ênfase em Matemática (UFRB)
Este relato tem como base o período de regência escolar no Programa da Residência Pedagógica desenvolvido numa escola do Ensino Fundamental II no município de Ibipeba/BA. A pesquisa buscou compreender que elementos motivaram o processo de aprendizagem de estudantes do 8° ano acerca do conteúdo múltiplos e divisores de números inteiros.
Tivemos por objetivo geral analisar qual procedimento metodológico utilizado em sala de aula permitiu que os estudantes tivessem melhor compreensão da matéria selecionada. Os objetivos específicos foram: identificar a melhor motivação que facilitou a compreensão dos conteúdos e analisar maneiras que ajudaram os alunos a ter facilidade nesse processo de compreensão.
Destaca-se que o Programa de Residência Pedagógica é uma das ações que integram a Política Nacional de Formação de Professores, cujo objetivo é o aperfeiçoamento da formação prática nos cursos de licenciatura, promovendo a imersão do licenciando na escola de Educação Básica, a partir da segunda metade do curso. O programa se articula na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A residência possui carga horária de 440h, perpassando desde a experiência em sala de aula até a extensão dos ambientes escolares, a fim de proporcionar aprendizagens que agreguem conhecimento ao currículo. Este relato parte da experiência vivenciada no período de regência.
Todo processo formativo contribuiu para que essa fosse uma experiência valorosa na formação docente; nossa Residência Pedagógica foi desenvolvida de acordo com o edital de 2020, quando passamos por um cenário caótico promovido pela pandemia da covid-19. Nesse momento, tivemos que nos adaptar ao contexto. Devido à situação, a área de educação optou por realizar atividades em formato remoto; consequentemente, a regência ocorreu dessa forma durante o estágio.
O conteúdo de múltiplos e divisores com números inteiros, quando trabalhado com a turma, chamou bastante atenção por conta da dificuldade dos estudantes do 8° ano em diferenciar ou efetuar cálculos desse conteúdo, embora no início da RP constasse, em diagnóstico, a problemática dos estudantes no trabalho com as quatro operações.
A aula a ser tratada no relato trouxe uma metodologia interessante, cujo intuito era fazer com que os estudantes fossem participativos e contribuíssem com questionamentos a respeito dos múltiplos e divisores e sua importância no processo de aprendizagem.
Desenvolvimento das atividades no Programa da Residência Pedagógica
O conteúdo de múltiplos e divisores é entendido como números naturais estendidos em um conjunto de números inteiros. Assim, quando nos referimos aos múltiplos e divisores, trabalhamos conjuntos numéricos que satisfazem algumas condições. O assunto é simples, mas pode gerar dúvidas e estranhamentos para quem está aprendendo.
Quando trabalhamos com a realidade dos estudantes, com o contexto no qual eles estão inseridos e de acordo com o diagnóstico realizado na escola, aponta-se a dificuldade que apresentam diante das quatro operações básicas da Matemática: adição, subtração, multiplicação e divisão.
Outro fator que colaborou para a carência em relação à Matemática, que ocorre normalmente dentro das escolas, foi a paralisação das aulas no período pandêmico de 2020, quando o setor da educação não estava preparado para atender às necessidades dos estudantes em formato virtual. Na realidade, muitos estudantes não tiveram acesso às aulas, e isso os prejudicou.
Considerando essas questões, traçamos estratégias e pensamos em metodologias que contribuíssem para intervir nessa carência de aprendizagem, buscando atender aos requisitos postos pelas competências da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Embora tenhamos trabalhado outros conteúdos utilizando métodos dialógicos, as aulas de múltiplos e divisores foi um diferencial, pois houve maior participação dos discentes e maior interesse deles em compreender o assunto, fator positivo que demonstrou que o trabalho realizado estava dando frutos.
O estudo dos múltiplos e divisores “favorece um estudo interdisciplinar envolvendo as dimensões culturais, sociais, políticas e psicológicas, além da econômica, sobre as questões do consumo, trabalho e dinheiro” (Brasil, 2018, p. 267). Ou seja, a Matemática permite trabalhar além do cálculo. Podemos trabalhar aspectos que dialogam com a realidade do educando, uma das especificações da Educação do Campo, práxis que, vivenciada na regência do estágio, só agregou à formação docente dos licenciandos.
Na análise realizada durante uma aula específica, apresentamos aos estudantes uma atividade a fim de que realizassem a leitura de questões e as interpretassem. Na sequência, eles deveriam explicar a compreensão que tiveram em relação ao exposto. O intuito da aula era fazer com que os estudantes trouxessem a sua percepção, as suas dúvidas e os pontos que mais chamavam a sua atenção. No início, mostraram-se receosos em explanar suas opiniões, possivelmente considerando o medo do erro. A questão do erro ainda precisa ser desconstruída, pois errar faz parte do processo de aprendizagem do educando e o professor não detém todo o saber.
A partir desses argumentos, incentivando-os a pensar e a questionar, a aula se tornou mais dinâmica e os estudantes ganharam confiança. Assim, começaram a se posicionar de forma relevante. Dentre as perguntas trabalhadas, constam: “O que vocês conhecem sobre múltiplos e divisores?”; “Em qual cenário podemos usar os múltiplos e divisores?”; “Para que devo aprender isso?”; “Vocês conseguem dizer quais são os seis primeiros múltiplos de 2?” e “Por que o número 33 é divisor de 3?”, entre outros questionamentos.
Para trazer as respostas dadas por eles, utilizamos pseudônimos a fim de não expor os estudantes, mantendo a sua integridade e a ética profissional. A primeira resposta veio de João, ao dizer: “Não sei pra que aprender isso, mas sei que é muito importante e se nós não aprende fica difícil de compreender o assunto de Matemática”.
A resposta de João, mesmo singela, conseguiu chamar os presentes para participar da discussão. É válido ressaltar que não traremos aqui todas as respostas ou as participações, mas destacamos os pontos mais relevantes que reforçam o tema deste relato.
Joana afirma: “Acho que a Matemática é muito importante […] ela está no nosso dia a dia e, respondendo à pergunta, precisamos multiplicar o dois pelos seis primeiros números inteiros”.
Nota-se que Joana compreende a importância da Matemática para o cotidiano. Temos diferentes percepções de como os estudantes veem a Matemática e como esse processo de aprendizagem se desenvolve na formação e no seu posicionamento crítico.
Esses processos de aprendizagem são potencialmente ricos para o desenvolvimento de competências fundamentais para o letramento matemático (raciocínio, representação, comunicação e argumentação) e para o desenvolvimento do pensamento computacional (Brasil, 2018, p. 264).
Corroborando essa citação (que está na BNCC), a Educação Matemática hoje trabalha nos mais diversos campos, principalmente na construção de uma Matemática crítica e diversificada, atendendo e respeitando outras formas.
Dando sequência na análise das contribuições dos estudantes, Maria afirma: “Precisamos aprender multiplicação para saber divisão e precisamos disso pra fazer conta a todo momento… E se a gente não aprender múltiplos e divisores fica complicado de fazer outros exercícios que envolvem o conteúdo”.
Maria mostra preocupação em aprender, pois a Matemática depende do aprendizado de uma sequência de conteúdos. Um conteúdo está ligado a outro e se não aprendemos o conteúdo inicial, temos maior dificuldade em acompanhar os demais que serão trabalhados em seguida.
Nessa aula, tivemos muitas contribuições. Após a explicação do assunto pela docente, percebemos que a motivação dos estudantes facilitou a compreensão dos conteúdos ‘múltiplos e divisores dos números inteiros’. A metodologia utilizada contribuiu para isso, com a forma como as aulas foram conduzidas: com a contextualização dos espaços de vivência dos educandos e os campos nos quais poderiam utilizar a Matemática em seu cotidiano.
Considerações finais
Em síntese, a vivência do estágio, assim como a sua posterior análise, contribuiu para que a experiência desse certo. Esse processo favoreceu a formação tanto das docentes como dos estudantes. Foi possível dialogar com o que aprendemos, durante esse período do curso, relacionando as concepções estudadas nas aulas e os princípios da Educação do Campo, intensificando o questionamento em turma, a fim de aprender com os estudantes.
O resultado desses encontros foi a compreensão dos educandos dos assuntos múltiplos e divisores. Observamos a participação ativa dos alunos durante as aulas remotas e o desenvolvimento de seu posicionamento crítico, diante da Matemática. Entendemos que essas experiências são ricas para a formação de um professor, pois fortalecem a certeza de que se está na direção certa. Assim, lembramos da afirmação de Paulo Freire (2000, p. 67): “Se a educação sozinha, não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”.
Referências
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1998.
COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR (CAPES). Programa de Residência Pedagógica. Brasília, 2013. Disponível em: https://www.gov.br/capes/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/educacao-basica/programa-residencia-pedagogica. Acesso em: 11 mar. 2022.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. Apres. Ana Maria Araújo Freire.São Paulo: Editora Unesp, 2000.
JUSTULIN, Andresa M.; VIEIRA, Larissa N. Um estudo sobre múltiplos e divisores por meio de problemas com alunos do 6°ano do Ensino Fundamental. Ensino da Matemática em Debate, v. 8, n° 1, p. 139-160, 2021. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/emd/article/view/51186. Acesso em: 14 mar. 2022.
MARQUES, J. Residência Pedagógica 05/06/2021. YouTube, 2021. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ddPq0C_vLn. Acesso em: 25 fev. 2022.
Publicado em 12 de novembro de 2024
Como citar este artigo (ABNT)
BRITO, Jefferson Nascimento de; BRITO, Eliane Nascimento de. Residência Pedagógica: uma experiência que deu certo. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 42, 12 de novembro de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/42/residencia-pedagogica-uma-experiencia-que-deu-certo
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