Em liberdade elas correm

Debora Cristina da Silva Cruz Conceição

Professora do Colégio Pedro II, mestra em Educação (UFF)

Em 2020, o mundo foi assolado pela pandemia do novo coronavírus. Um vírus desconhecido até então. De repente, todos trancados em casa. Por toda parte, muito medo do contágio pelo vírus. As incertezas eram muitas. O medo... Perguntas inúmeras circundavam as mentes de todos, e a minha mente de professora pensava também nas infâncias das crianças com as quais eu trabalhava e nas crianças do mundo...

O ano virou! É fevereiro de 2021. A cidade do Rio de Janeiro normalmente estaria em festa nessa época do ano, mas ainda segue com muitas notícias de pessoas trabalhando remotamente de suas casas, de famílias inteiras desempregadas, de relatos de fome e medo, de falta de leitos nos hospitais. Penso em que fios de esperanças posso me agarrar. Em que acreditar? A notícia de uma vacina talvez tenha trazido num primeiro momento essa esperança, mas a falta de interesse por sua compra e distribuição no Brasil, por parte do Governo Federal, hoje vem carregada de incertezas.

É difícil recomeçar, e isso vem acontecendo todos os dias! Porém, ao voltar meus pensamentos e olhos para elas, creio que algo de positivo possa novamente brotar em mim. “Elas” são as crianças! Crianças que, em meio a tudo que estamos vivendo, encontram um refúgio natural em suas brincadeiras. Vejo cenas que me fazem sorrir, que me fazem sonhar e, por isso, hoje, quero falar das crianças do meu bairro, da minha rua. Fiquei em isolamento por muitos meses, mas pareciam anos. Não via as crianças nas ruas, no prédio, nem as ouvia nos apartamentos...

Mas hoje foi diferente! É terça à tarde e as crianças correm. Estão de férias! Estão de férias? Talvez férias para seus corpos e mentes que viveram por quase um ano presos em cubículos e em histórias diversas. Corpos, mentes e histórias presas por um vírus. Mas hoje elas correm! Parecem sorrir para a liberdade! Correm sendo liberdade!

O vírus ainda está por aí, por aqui, em todo o mundo, e ainda aprendemos sobre ele todos os dias. O medo ainda nos toma, mas, mesmo assim, essas crianças correm.

Hoje, elas podem correr não para fugir do tiro ou da violência dentro de suas casas. Elas correm com os amigos. São corpos negros infantes e brincantes... e eles correm!

Da minha janela, ouço gargalhadas, ouço os combinados do pique, ouço os chinelos batendo no chão. Vejo as meninas enfeitadas desde os chinelos coloridos até os brilhos nos laços nas cabeças. Vejo os meninos com seus chinelos de heróis (assim me parecem pelas cores azul e vermelha que lembram personagens como Homem-Aranha, Super-Homem, Capitão América). As roupas deles parecem conjuntos quase da mesma cor, e alguns estão sem blusa. Livres e felizes, esses corpos negros infantes correm. Cada um do seu jeito, seu sorriso, seus sorrisos! Corram! Corram livres, crianças! Faço uma prece para que não parem de seguir felizes e livres, com seus pés no chão e sorrisos de alegria.

O vírus ainda está por aí! Por aqui? Pelo mundo... mas que possamos correr na direção da alegria como essas crianças. Que possamos seguir esperançosos, potentes, ardentes! Unidos hoje por um isolamento e libertos no futuro para caminhar e correr como as crianças que vi hoje: correr em liberdade.

Publicado em 27 de fevereiro de 2024

Como citar este artigo (ABNT)

CONCEIÇÃO, Debora Cristina da Silva Cruz. Em liberdade elas correm. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 6, 27 de fevereiro de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/6/em-liberdade-elas-correm

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