A formação do leitor na Educação Infantil na perspectiva de professoras
Letícia Macedo Farias Camacho
Pedagoga (UENF)
Luciana da Silva Almeida
Pedagoga, doutora em Cognição e Linguagem (UENF)
Na Educação Infantil, a escola tem o importante papel de introduzir a criança no universo da leitura e cabe ao professor, como modelo de construção da competência leitora, elaborar estratégias lúdicas que despertem tal interesse nos pequeninos. Aqui, entra a contação de histórias como valioso instrumento para esse estímulo.
Nesse contexto, torna-se necessário destacar a importância da contação de histórias na Educação Infantil como processo facilitador da aprendizagem capaz de desenvolver habilidades, aguçar a imaginação, auxiliar na resolução de problemas e ampliar a visão de mundo.
Sendo assim, na escola, cabe ao professor influenciar no gosto pela leitura, aproveitando as situações do cotidiano, mostrando o mundo da leitura de forma interessante, envolvendo-se e envolvendo as crianças nas histórias, oportunizando o acesso aos livros e, principalmente, construindo um vínculo afetivo com os alunos.
Dessa maneira, este trabalho busca respostas para a seguinte questão-problema: “De que forma os professores podem usar a contação de histórias para estimular as crianças da Educação Infantil a obterem o interesse pela leitura?”
Este tema é de grande relevância, pois visa mostrar aos futuros docentes e aos professores atuantes, assim como à comunidade escolar e à sociedade em geral, que a contação de histórias não é um mero passatempo, mas um instrumento pedagógico capaz de auxiliar a aprendizagem. Dessa forma, será oferecida uma reflexão para que compreendam essa prática como meio de incentivo à leitura.
Assim, tem-se como objetivo geral: compreender a contação de histórias como estímulo ao interesse pela leitura a partir das contribuições dos professores. Como objetivos específicos: esclarecer a importância da contação de histórias na Educação Infantil; apontar a contação de histórias como recurso pedagógico capaz de estimular as crianças da Educação Infantil a obterem o interesse pela leitura; relatar como a contação de histórias, mediada pelos professores, é capaz de contribuir para o interesse pela leitura; destacar algumas estratégias do professor/contador de histórias para alcançar o interesse pela leitura.
Compreendendo que a escola é o lugar certo para as crianças receberem o estímulo necessário à leitura e saber que os professores são profissionais prontos para influenciar nessa habilidade, foram pesquisados importantes posicionamentos e reflexões acerca da contação de histórias na Educação Infantil.
A importância da contação de histórias na Educação Infantil
A educação utiliza vários instrumentos que colaboram para a formação do sujeito e, na escola, onde existe a interação social diária, esses instrumentos são usados para estabelecer a comunicação visual, verbal ou escrita. Na Educação Infantil, a interação proporciona o compartilhamento de conhecimentos, auxiliando na formação de um sujeito crítico, cultural, histórico e social.
O ato de contar histórias é um desses instrumentos e facilita o processo de ensino-aprendizagem, pois incita o desenvolvimento das habilidades das crianças por meio do acesso à imaginação e do uso da palavra, contribuindo para serem boas ouvintes e falantes. Ele aproxima o mundo da fantasia do mundo real, garantindo experiências de vida. Sobre isso, salienta Rodrigues:
a contação de histórias é atividade própria de incentivo à imaginação e o trânsito entre o fictício e o real. Ao preparar uma história para ser contada, tomamos a experiência do narrador e de cada personagem como nossa e ampliamos nossa experiência vivencial por meio da narrativa do autor. Os fatos, as cenas e os contextos são do plano do imaginário, mas os sentimentos e as emoções transcendem a ficção e se materializam na vida real (Rodrigues, 2005, p. 4).
Antes mesmo de as crianças aprenderem a ler ou escrever, as histórias estão inseridas em suas vidas nas conversas, nas músicas, nas brincadeiras, no reconto de histórias familiares ou quando elas próprias narram um acontecimento. Assim, esses momentos devem ser aproveitados para provocar a oralidade, potencializar a fala e estimular a criança a reproduzir o comportamento do contador de histórias.
Segundo a BNCC,
na Educação Infantil, é importante promover experiência nas quais as crianças possam falar e ouvir, potencializando sua participação na cultura oral, pois é na escuta de histórias, na participação em conversas, nas descrições, nas narrativas elaboradas individualmente ou em grupo e nas implicações com as múltiplas linguagens que a criança se constitui ativamente como sujeito singular e pertencente a um grupo social (Brasil, 2018, p. 42).
Um dos papéis da contação de histórias é atiçar a curiosidade da criança, levando-a a se interessar pela leitura, a desenvolver a linguagem oral e escrita, além de contribuir para a construção do raciocínio lógico. Segundo Girardello (2003, p. 1), “garantir a riqueza da vivência narrativa nas creches e pré-escolas contribui para o desenvolvimento do pensamento lógico das crianças e também de sua imaginação”.
Girardello (1998) e Coelho (2008) concordam que as histórias são essenciais à imaginação a ponto de proporcionar o desenvolvimento pessoal de cada criança. Sem dúvida, elas ficam armazenadas na memória e se transformam em doces recordações, de onde, muitas vezes, são extraídas grandes lições que auxiliam na tomada de decisões.
Sem dúvida, a imaginação construída por meio da história desperta emoções e oferece oportunidade para que a criança se expresse e entenda melhor o que acontece ao seu redor. Para Coelho (2000, p. 84), “as histórias contribuem para que a criança entre em contato de maneira lúdica com diversas formas de sentir e ver o mundo, bem como, a ajuda a lidar com questões de aspectos emocionais, sociais, intelectuais, entre outras questões”.
Pode-se dizer, então, que a partir do contato com as histórias, as crianças são estimuladas a potencializarem suas habilidades, sendo também envolvidas no mundo da leitura. De acordo com Craidy e Kaercher,
se observarmos atentamente, veremos que é destas práticas, de ouvir e contar histórias, que surge a nossa relação com a leitura e a literatura. Portanto, quanto mais acentuarmos no dia-a-dia da Escola Infantil estes momentos, mais estaremos contribuindo para formar crianças que gostem de ler e vejam no livro, na leitura e na literatura uma fonte de prazer e divertimento (Craidy; Kaercher, 2001, p. 82).
Esses autores defendem a contação de histórias como uma prática lúdica importante para a Educação Infantil, como forma de estimular a imaginação e o raciocínio lógico, despertar e expressar as emoções, ampliar a visão de mundo e socializar-se, desenvolvendo a linguagem.
Tudo isso está em consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), a LDBEN, e com o Referencial Curricular Nacional (RCN), que estabelecem, respectivamente, que Educação Infantil é a primeira etapa da Educação Básica e que sua finalidade é o desenvolvimento integral da criança, em conjunto com a família.
Art. 29 - A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (Brasil, 1996, p. 25-26).
Como parte desse desenvolvimento integral encontra-se a socialização. A arte de contar histórias é uma ferramenta valiosa no processo educacional. Além de ser socialmente benéfica, quando os alunos se sentam em círculo, ouvem histórias, comentam e expressam opiniões, aprendem a ouvir mutuamente, aprendem a falar e a se expressar (Kraemer, 2008).
Ao se expressarem, as crianças compartilham experiências e se familiarizam com elas. Nesse ponto, Kraemer (2008) e Teixeira (2010) concordam, quando se trata da importância da atividade lúdica para oportunizar a expressão e a troca de informações.
Dessa forma, a criança pequena consegue se imaginar em determinada situação, aceita mais facilmente algo que a desagrade, aprende que existem soluções para os problemas e que são capazes de resolvê-los. Isso proporcionará o seu amadurecimento e contribuirá para se tornar um cidadão crítico. Sendo assim, é correto dizer que a contação de histórias é uma excelente ferramenta para o desenvolvimento cognitivo, físico, social e emocional das crianças e que a escola e as famílias devem ser parceiras para que esse desenvolvimento integral seja alcançado.
A influência do professor da Educação Infantil no prazer pela leitura com a contação de histórias
Para que uma história seja contada, é necessário que haja um narrador. Para isso, na escola, esse papel deve ser assumido pelo professor que, como mediador, pode envolver as crianças no mundo da imaginação. Seu empenho as levará ao encantamento que resultará na potencialização de conhecimentos e no prazer pela leitura.
Dessa forma, é necessário que o professor faça uma avaliação de seu aluno, do que ele já sabe, de seus conhecimentos, desejos e necessidades para mostrar o mundo da leitura de diversas formas, mas com leituras que lhe sejam interessantes e significativas, “porque para formar grandes leitores, leitor crítico não basta ensinar a ler. É preciso ensinar a gostar de ler [...] com prazer, isto é possível, e mais fácil do que parece” (Villardi, 1997, p. 2).
Quando o docente narra as histórias de forma dinâmica e cativante, ele contribui para que outras atividades sejam feitas com prazer no ambiente escolar, mas para ser construído um ambiente atrativo e de prazer, o professor deve estar atento a sua forma de falar, contribuindo para que a criança se concentre no que está sendo falado e se empolgue, desenvolvendo suas competências leitoras e imaginação.
Para que uma estória realmente prenda a atenção da criança, deve entretê-la e despertar sua curiosidade. Mas para enriquecer sua vida deve estimular-lhe a imaginação: ajudá-la a desenvolver seu intelecto e a tornar claras suas emoções: estar harmonizadas com suas ansiedades e aspirações; reconhecer plenamente suas dificuldades e ao mesmo tempo, sugerir soluções para os problemas que a perturbam. Resumindo, deve de uma só vez, relacionar-se com todos os aspectos de sua personalidade e isso sem nunca menosprezar a criança, buscando dar inteiro crédito a seus predicamentos e, simultaneamente, promovendo a confiança nela mesma e no seu futuro (Bettelheim, 1978, p. 20).
Quando a criança traz sua experiência e ela é incorporada à história contada, estreita os laços entre o mediador da contação e o aluno, cultivando a confiança em si e entre ambos. É nesse contexto que o docente vai somando o planejamento à sua criatividade para despertar o desejo pela leitura. Para Cavalcanti,
contar história é algo que caminha do simples para o complexo e que implica estabelecer vínculos e confiança com os ouvintes. Contar história é confirmar um compromisso que vem de longe e por isso, atividades relacionadas às contações de histórias devem ser desenvolvidas com muito critério (Cavalcanti, 2002, p. 83).
Por conseguinte, Baroukh (2012) e Souza (2004) concordam que o professor exerce papel relevante na capacidade leitora das crianças, porque ele serve de modelo para os leitores. Ele deve conhecer os gostos, adaptar o vocabulário, aproveitar as situações cotidianas da escola e criar outras, sendo um usuário da escrita diante delas, fazendo-as perceber o valor da comunicação e gerando motivação para ler e escrever, permitindo assim, as mais diversas formas de interpretação.
A história pode ser criada, reinventada, lida ou pode surgir sobre uma situação do dia a dia ou de uma obra de literatura. O importante é que ela influencie no desejo e na formação de futuros leitores, oportunizando experiências.
É possível perceber que o ato de contar histórias leva as crianças a viverem diferentes experiências que as tornam significativas e produzem a noção entre o real e o imaginário, tornando-as capazes de entender cada acontecimento narrado a seu tempo, reproduzindo-os verbalmente de maneira lógica, ou seja, com começo, meio e fim.
Um dos objetivos da aprendizagem, segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é “criar e contar histórias oralmente, com base em imagens ou temas sugeridos” (Brasil, 2021, p. 52). A BNCC também afirma que a criança aumenta seu vocabulário, melhora sua expressão e sua compreensão quando se comunica com as pessoas ao seu redor, apropriando-se da língua materna. O mesmo documento trata da importância da criança viver experiências que envolvam escuta e fala, para torná-la participativa e ativa como sujeito único, que pertence a um grupo social. Quando o professor conta uma história, ele dá a oportunidade para que a criança melhore a sua comunicação oral e também outras linguagens relacionadas a contextos diferentes que fazem parte da vida dela e estão ao seu redor.
Dessa maneira, contar uma história não é apenas inventar ou pegar um livro para ler, mas envolver-se de tal modo que contagie o ouvinte. Por isso, Sisto (2005, p. 23) diz: “o contador de história é também aquele que descobriu que brincar com as palavras é prazeroso”.
Infelizmente, no Brasil tem diversas pessoas que dizem não ter o hábito de ler e, devido à falta de incentivo ou recursos, muitas crianças chegam à Educação Infantil sem ter tido qualquer relação com os livros. Eis aqui a necessidade de inserção da literatura, desde cedo, na escola, permitindo o acesso de todos.
Diante disso, reconhece-se a necessidade da presença constante da literatura infantil na escola, cabendo aos professores estabelecerem uma relação de prazer entre a criança e o livro, levando em conta o desenvolvimento da criança. Para isso, deve-se abrir um espaço para a expressão livre, apresentando a leitura de uma forma estimulante, despertando o interesse das crianças e tornando os livros tão acessíveis e prazerosos quanto os brinquedos (Brandão, 2009, p. 120).
Sendo assim, é interessante observar que, desde a Educação Infantil, é adequado o incentivo à leitura por meio dos livros, de revistas e histórias, como forma de desenvolvimento integral do indivíduo. Assim, as crianças podem participar ativamente do processo de construção do pensamento, por meio de seus questionamentos de uma forma prazerosa. Segundo o RCNEI,
nas sociedades letradas, as crianças, desde os primeiros meses, estão em permanente contato com a linguagem escrita. É por meio desse contato diversificado em seu ambiente social que as crianças descobrem o aspecto funcional da comunicação escrita, desenvolvendo interesse e curiosidade por essa linguagem. Diante do ambiente de letramento em que vivem, as crianças podem fazer, a partir de dois ou três anos de idade, uma série de perguntas como “o que está escrito aqui?”, “o que isto quer dizer?”, indicando sua reflexão sobre a função e significado da escrita, ao perceberem que ela representa algo (Brasil, 1998, p. 127).
Em seus estudos, Rizzoli (2005) afirma que as crianças são curiosas e estão sempre em busca de saber o porquê das coisas. Sendo assim, a história contribui para entrar no universo delas e oferecer uma resposta muito mais satisfatória do que uma resposta planejada de um adulto.
As narrativas históricas contadas pelos professores preparam as crianças para enfrentarem os problemas da vida, pois por meio delas entendem o (seu) mundo e fazem essa comparação do mundo da fantasia com o mundo real, usando isso em favor delas para construírem suas identidades. Ainda que não saibam ler, usam o texto narrado para aplicá-lo às suas necessidades.
Nesse contexto, evidencia-se que a contação de histórias é um recurso usado pelo professor para influenciar seus alunos ao prazer pela leitura, pois a contação consegue atrair a atenção, despertar a curiosidade, estimular a imaginação, desenvolver o intelecto, evidenciar as emoções, estabelecer vínculos e buscar soluções para os problemas.
Ao associar tudo isso à Literatura, oportunizando o acesso aos livros e mostrando que o imaginário pode ser escrito por meio de palavras, desperta-se o interesse e, consequentemente, o prazer da criança pela leitura.
Concepções de professores sobre a contação de histórias na Educação Infantil: questionários e análise de dados
A prática da contação de histórias permite que o professor atraia as crianças para um momento de interação entre o contador e o ouvinte e tanto o mundo imaginário, quanto a fantasia e a escuta atenta são trabalhados de acordo com as necessidades e os anseios infantis, contribuindo para estimular o gosto pela leitura. Para Coelho (2008),
a história alimenta a imaginação da criança há quem conte histórias para enfatizar mensagens, transmitir conhecimento, disciplinar até fazer uma espécie de chantagem – “se ficarem quietos, conto uma história”, “se isso”, “se aquilo”... quando o inverso que funciona. A história aquieta serena, prende atenção, informa socializa e educa. O compromisso do narrador é com a história, enquanto fonte de sofisticação de necessidades básicas das crianças. Se elas escutarem desde pequeninas, gostarão de livros vindo descobrir neles histórias como aquelas que lhes eram contadas (Coelho, 2008, p. 12).
Nessa perspectiva, a partir de entrevista realizada via WhatsApp, buscamos respostas a oito perguntas abertas de duas professoras de uma escola municipal situada na zona urbana de Itaperuna/RJ, onde trabalham exclusivamente com a Educação Infantil. O objetivo foi analisar a contação de histórias como instrumento pedagógico aplicado em sala de aula.
Como forma de preservar a identidade das professoras, elas serão aqui nomeadas professora 1 e professora 2, ambas do sexo feminino. A professora 1 tem 40 anos e é pós-graduada em Educação Infantil, lecionando no ciclo há 25 anos. A professora 2 tem 41 anos, possui o Ensino Médio e atua na Educação Infantil há 10 anos.
Serão apresentadas as perguntas, os dados colhidos e a análise das informações. A primeira pergunta do questionário enfatiza se as professoras costumam ler ou contar histórias para suas turmas da Educação infantil. As respostas foram afirmativas e pode-se perceber que ambas entendem a influência que a história exerce sobre a aprendizagem, ao adotarem essa estratégia pedagógica em suas aulas.
A contação de histórias é uma estratégia pedagógica que pode favorecer de maneira significativa a prática docente na educação infantil e ensino fundamental. A escuta de histórias estimula a imaginação, educa, instrui, desenvolve habilidades cognitivas, dinamiza o processo de leitura e escrita, além de ser uma atividade interativa que potencializa a linguagem infantil (Souza; Bernardino, 2011, p. 237).
Sendo assim, a tarefa do professor é utilizar as histórias como forma de estímulo para o desenvolvimento integral de seus alunos. A segunda pergunta refere-se à visão pessoal das professoras sobre a importância da contação de histórias na Educação Infantil. As respostas foram as seguintes:
A contação de história desperta a curiosidade e o interesse pela oralidade, aumentando a vontade da criança de expressar e de comunicar seus pensamentos e sentimentos (Professora 1, 2022).
Oportuniza a criança expressar seus pensamentos e sentimentos, desperta a curiosidade e oralidade (Professora 2, 2022).
A professora 1 respondeu que ela desperta a curiosidade e o interesse pela oralidade, aumentando a vontade da criança em expressar seus pensamentos e sentimentos. A professora 2 respondeu de forma semelhante ao dizer que ela histórias dão a oportunidade da criança comunicar suas emoções e pensamentos, despertando a curiosidade e a oralidade.
Segundo Kraemer, “a arte de contar histórias é um valioso instrumento no processo educativo. Além de favorecer a socialização, quando os alunos sentam em roda, eles ouvem a história, comentam e opinam, aprendem a ouvir o outro falar, aprende a falar e expressar-se” (Kraemer, 2008, p.13).
Observou-se nas respostas das professoras, na visão de Kraemer e na BNCC (Brasil, 2018, p. 40), que as crianças da Educação Infantil conseguem escutar as histórias, imaginá-las e expressarem-se, quando o professor possibilita a elas essa experiência. Esse é um caminho traçado intencionalmente para que eles interajam entre si.
A terceira pergunta é sobre a frequência com que as professoras contam histórias em suas aulas. Tanto a professora 1 como a professora 2, contam histórias duas ou três vezes por semana. Levando-se em conta um total de cinco aulas semanais, as professoras utilizam com boa frequência o recurso e aplicam o que Abramovich (1997, p. 16) considera importante: quando a criança ouve muitas histórias, ela realiza a prática da escuta, aprende a ser leitor e a compreender o mundo.
Nesse ponto, Abramovich e Silva concordam sobre a importância de estimular a leitura nas crianças desde cedo.
Na Educação Infantil os docentes devem ser incentivadores do hábito da leitura. Para isso, contar ou ler histórias para as crianças desde pequenas será de grande importância para despertar nelas o gosto pela leitura e assim contribuir para o seu desenvolvimento e, consequentemente, refletir em uma melhor aprendizagem (Silva, 2019, p. 16).
A quarta pergunta se refere aos recursos utilizados para contar as histórias. As respostas foram:
Os recursos são variados: fantoches de tecido, de varas, desenhos, objetos e livros (Professora 1, 2022).
Fantoches, desenhos, livros (Professora 2, 2022).
A professora 1 utiliza fantoches de tecido, varas, desenhos, objetos e livros; a professora 2, recorre a fantoches, desenhos e livros.
As respostas são semelhantes, demonstrando que ambas as docentes usam diversos recursos para que o momento seja envolvente e prazeroso. É necessário sempre usar a criatividade para diversificar as formas de se contar as histórias.
Contar histórias é uma arte, certamente. E nem todo o professor nasce com o privilégio desse dom [...]. Entretanto, o uso de alguns recursos fará dele, se não o artista de dotes excepcionais, um mestre capaz de transmitir com segurança e entusiasmo um texto para os pequenos (Dinorah, 1995, p. 50).
Faz-se importante destacar aqui o uso dos livros pelas duas professoras. Nenhuma criança se interessará em ler se nunca manusear um livro, sentir seu cheiro, sua textura, ver suas imagens ou tentar desvendar as palavras ali escritas. Sobre a importância desse objeto, afirmam Craidy e Kaecher:
somente iremos formar crianças que gostem de ler e tenham uma relação prazerosa com a Literatura se propiciarmos a elas, desde muito cedo, um contato frequente e agradável com o objeto livro e com o ato de ouvir e contar histórias, em primeiro lugar e após, com os conteúdos desse objeto, a história propriamente dita com seus textos e ilustrações (Craidy; Kaecher, 2001, p. 82).
Todos os recursos são essenciais para chamar a atenção das crianças e estimular o imaginário, porém, o envolvimento do professor/contador de histórias durante a narração é que faz a verdadeira diferença. Cabe a ele usar suas emoções, entonação de voz e gestos para “dar vida” à história e atingir o objetivo pretendido. Para Busatto,
se quisermos que a narrativa atinja toda a sua potencialidade devemos, sim, narrar com o coração, o que implica em estar internamente disponível para isso, doando o que temos de mais genuíno, e entregando-se a esta tarefa com prazer e boa vontade. Ao contar doamos nosso afeto, a nossa experiência de vida, abrimos o peito e compactuamos com o que o conto quer dizer. Por isso torna-se fundamental que haja uma identificação entre o narrador e o conto narrado (Busatto, 2003, p. 47).
Com certeza, a contação de histórias é uma arte que acompanha a aprendizagem e deve ser incentivada pelo professor na Educação Infantil para haver o despertamento do interesse pela leitura.
A quinta pergunta diz respeito ao relacionamento entre os conteúdos das aulas e as histórias. Elas responderam:
Sim, sempre busco contextualizar as histórias com os conteúdos das aulas (Professora 1, 2022).
Sim (Professora 2, 2022).
As duas professoras responderam que as histórias são contextualizadas conforme o conteúdo das aulas. Por meio das respostas é possível afirmar que as professoras planejam e constroem os planos de aula com responsabilidade, tendo um objetivo a ser alcançado no processo de ensino-aprendizagem.
Com certeza, quem conta história tem clareza do que pretende atingir. Se o objetivo é apenas lúdico, se é discutir determinada ideia ou tema, se é uma série de sentimentos e trazer informações, se é terapêutico, se pretende promover uma integração social e cultural. Para cada um há procedimentos e encaminhamentos, embora se saiba que quem conta um conto aumenta um ponto, uma exclamação e uma boca aberta diante da possibilidade de se construir um mundo melhor povoado de história (Sisto, 2005, p. 33).
Quando as histórias se relacionam com o conteúdo, elas permitem que as crianças tenham melhor compreensão sobre assuntos mais complexos e tornam as aulas mais interessantes, produtivas e prazerosas.
A sexta pergunta indaga quais os tipos de histórias os alunos mais se interessam. As respostas foram as mesmas para ambas as professoras, destacando-se os contos e as fábulas.
Abramovich (1997, p. 168) afirma ser possível desenvolver o conhecimento estimulando o imaginário das crianças por meio dos contos e das fábulas, o que lhes dá a oportunidade de recontar as histórias e separar o imaginário do real.
Os contos e as fábulas aguçam a imaginação das crianças e tornam o momento da história interessante, sendo um meio usado para a expressão do pensamento, dos sentimentos, da criatividade e da oralidade.
A sétima pergunta se refere à contribuição da contação de histórias para os alunos da Educação Infantil.
Estimula a imaginação, a oralidade e a escrita. A contação de histórias faz a criança “sonhar”, despertando o senso crítico e o interesse pela leitura mesmo que de imagens (Professora 1, 2022).
Despertando o senso crítico, interesse pela leitura (mesmo que de imagens), é um passaporte para a escrita, faz a criança “sonhar” (Professora 2, 2022).
A professora 1 respondeu que contribui para estimular a imaginação, a oralidade e a escrita. A contação de histórias faz a criança “sonhar”, despertando o senso crítico e o interesse pela leitura, mesmo quando a história é imagética.
As histórias infantis aproximam ficção e realidade pela imaginação, por isso, elas são uma rica oportunidade para estimular a oralidade e incentivar a leitura, sendo notória a melhoria do vocabulário entre as crianças da Educação Infantil.
Portanto, em sala de aula, o professor valoriza muito a linguagem interrogativa, sobretudo como forma de incentivar o diálogo permanente com o aluno, factor reconhecido como essencial para qualquer tipo de aprendizagem escolar. (...). Não podemos esquecer que, antes da criança aprender a ler e a escrever, tem de dominar os seus próprios conhecimentos linguísticos, através da fala, tende a aprender a escutar e a ser escutado, mas sobre tudo, tem de descobrir que tem coisas interessantes para dizer (Albuquerque, 2000, p. 27-28).
Não basta simplesmente contar histórias, é preciso inserir as crianças no conto, torná-las participativas, lhes estimulando para a linguagem oral, um pré-requisito para o interesse pela leitura e pela escrita.
A professora 2 diz que desperta o senso crítico e o interesse pela leitura (mesmo que de imagens), passaporte para a escrita, fazendo a criança “sonhar”. De acordo com Dohme (2003, p. 3),
ler ou estimular a leitura para a criança é como plantar uma semente em terreno fértil. A leitura estimula o desenvolvimento do senso crítico e do raciocínio logico, faz com que a criança acredite mais em si mesma e tenha mais imaginação e criatividade. Assim, a leitura contribui para a formação de cidadãos conscientes, sonhadores e, principalmente, realizadores.
A criança incentivada a interagir nas histórias, desenvolve a capacidade de pensar por si mesma, a compartilhar seus pensamentos, a aprender a respeitar as diferenças, a entender que a imaginação pode ser transformada em palavras e a se interessar pela leitura e pela escrita.
A oitava pergunta é sobre a participação dos alunos durante a contação de histórias.
As crianças são muito participativas, demonstrando muito interesse em descobrir o que vai acontecer na história, principalmente o final (Professora 1, 2022).
Ativa, com muito interesse em descobrir o final da história, sujeitos formadores de opiniões (Professora 2, 2022).
A professora 1 diz que as crianças são muito participativas, demonstrando interesse em descobrir o que vai acontecer na história, principalmente no final. Semelhantemente, a professora 2 responde que a participação é ativa, com muito interesse em descobrir o final da história.
Quando o professor consegue dar significado à história contada, a criança se envolve ativamente, porque reconhece seu contexto de vida na história contada, buscando, assim, compreender-se e compreender o mundo à sua volta. Dessa maneira, o interesse em participar desse processo de (auto) conhecimento é despertado.
Segundo Abramovich (1997, p. 37),
chegaram ao seu coração e à sua mente, na medida exata de seu entendimento, de sua capacidade emocional, porque continham esse elemento que a fascinava, despertava o seu interesse e curiosidade, isto é, o encantamento, o fantástico, o maravilhoso, o faz de conta.
Sendo assim, o professor deve buscar histórias que despertem o interesse das crianças da Educação Infantil e as possibilitem participar tanto da construção do conhecimento quanto do desfecho final, a fim de que reflitam sobre ela e dela retirem ensinamento para a vida.
Conclusão
A importância deste trabalho se dá a partir do entendimento de que a contação de histórias é uma forma produtiva e divertida de educar na Educação Infantil, auxiliando o docente na organização de suas atividades pedagógicas para propósitos significativos relacionados à leitura.
Nessa perspectiva, trabalhar a contação de histórias na Educação Infantil é essencial, pois nesse processo as crianças não serão apenas ouvintes, mas participantes do ensino-aprendizagem. Esse exercício gerará resultados positivos no seu desenvolvimento integral.
Ficou esclarecido que a contação de histórias facilita o processo de ensino-aprendizagem por meio do acesso à imaginação, estimulando a fala, o raciocínio lógico, a expressão, os aspectos sociais, emocionais e intelectuais de incentivo à leitura. Por isso, apontamos a contação como recurso capaz de estimular o interesse pelos estudos e pela vida, tratando a aprendizagem de modo diferente, mais interativa e prazerosa.
Além disso, relatamos que o professor que apresenta a leitura de diferentes formas, ou seja, de maneiras interessantes e significativas, aproveitando as situações do dia a dia e servindo como modelo de leitor para as crianças, consegue mediar as histórias para criar maior vínculo com seus alunos. Para isso, destacam-se estratégias como pesquisas sobre o interesse das crianças, o uso de diferentes recursos, a entonação de voz e o preparo do local.
A partir dos dados coletados na pesquisa de campo, constatou-se que as professoras usam a contação de histórias como instrumento pedagógico, conferindo importância ao uso de recursos para envolver as crianças no universo imaginário e estimular a interação, imaginação, criatividade, oralidade, expressão, interesse pela leitura e o senso crítico.
Diante do exposto, o trabalho mostra de que forma a contação de histórias pode e deve ser usada como prática pedagógica de estímulo na Educação Infantil, contribuindo para formar futuros leitores por intermédio de uma aprendizagem prazerosa e interativa, que proporcione experiências de linguagem e vivências significativas às crianças.
Referências
ABRAMOVICH, F. Literatura infantil: gostosuras e bobices. 4ª ed. São Paulo: Scipione, 1997.
ALBUQUERQUE, Fátima. A hora do conto. Lisboa: Teorema, 2000.
BAROUKH, Josca Ailine. Interações: com olhos de ler. São Paulo: Blucher, 2012.
BETTELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos contos de fadas. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
BRANDÃO, Soraya Maria Barros de Almeida (org.). Ser criança: repensando o lugar da criança na Educação Infantil. Campina Grande: Eduepb, 2009.
BRASIL. Lei nº 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 5ª ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Edições, 2010.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular – BNCC. Brasília, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/download-da-bncc. Acesso em: 09 set. 2022.
BRASIL. Ministério da Educação. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BUSATTO, Cléo. Contar e encantar: pequenos segredos da narrativa. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 2003.
CAVALCANTI, Joana. Caminhos da literatura infantil e juventude: dinâmicas e vivências na ação pedagógica. São Paulo: Paulus, 2002.
COELHO, Betty. Contar histórias: uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 2008.
COELHO, N. N. A literatura infantil: história, teoria, análise. 3ª ed. São Paulo: Quíron, 1984.
CRAIDY, Carmem; KAERCHER, Gládis. Educação Infantil: pra que te quero? Porto Alegre: Artmed, 2001.
DINORAH, M. O livro infantil e a formação do leitor. Petrópolis: Vozes, 1995.
DOHME, V. Além do encantamento: como as histórias podem ser um instrumento de aprendizagem. São Paulo: Fundação Educar DPaschoal, 2003.
GIRARDELLO, G. Televisão e imaginação infantil: histórias da Costa da Lagoa. 1998. Tese (Doutorado em Ciências da Comunicação) - Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003.
KRAEMER, Maria Luiza. História e o lúdico encantam as crianças. São Paulo: Autores Associados, 2008.
RIZZOLI, Maria Cristina. Leitura com letras e sem letras na Educação Infantil no norte da Itália. In: FARIA, Ana Lúcia; MELLO, Suely (org.). Linguagens infantis: outras formas de leitura. São Paulo: Autores Associados, 2005.
RODRIGUES, Edvânia Braz Teixeira. Cultura, arte e contação de histórias. Goiânia: Gwaya, 2005.
SILVA, Josimária Fernandes da. A contribuição da leitura de histórias infantis no processo ensino aprendizagem. João Pessoa: Edufpb, 2019.
SISTO, Celso. Textos e pretextos sobre a arte de contar histórias. 2ª ed. Curitiba: Positivo, 2005. (Série Práticas Educativas).
SOUZA, João Francisco de. E a educação: quê?? A educação da sociedade e/ou a sociedade da educação. Recife: Bagaço, 2004.
SOUZA, Linete Oliveira de; BERNARDINO, Andreza Dalla. A contação de histórias como estratégia pedagógica na Educação Infantil e no Ensino Fundamental. Revista Educere et Educare, v. 6, jul./ dez. 2011.
TEIXEIRA, S. R. O. Jogos, brinquedos, brincadeiras e brinquedoteca: implicações no processo de aprendizagem e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Wak, 2010.
VILLARDI, Raquel. Ensinando a gostar de ler: formando leitores para a vida inteira. Rio de Janeiro: Qualilymark, 1997.
Publicado em 05 de março de 2024
Como citar este artigo (ABNT)
CAMACHO, Letícia Macedo Farias; ALMEIDA, Luciana da Silva. A formação do leitor na Educação Infantil na perspectiva de professoras. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 7, 5 de março de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/7/a-formacao-do-leitor-na-educacao-infantil-na-perspectiva-de-professoras
Novidades por e-mail
Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing
Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário
Deixe seu comentárioEste artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.