Ideias sobre formação inicial e continuada de professores
Adielle Rodrigues da Silva
Doutora em Genética e Biologia Molecular, especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional, licenciada em Pedagogia e Biologia
O desenvolvimento de pesquisas sobre a formação inicial e continuada do professor é de suma importância, uma vez que a partir delas é possível realizar uma reflexão de como está ocorrendo a preparação do futuro docente para atuar em sala de aula, evidenciando o respeito à realidade que o rodeia e o uso de metodologias adequadas que garantam um ensino de qualidade e, além disso, analisar como os professores já atuantes são incentivados e preparados para continuarem na profissão.
Na maioria das vezes, a formação inicial do professor acontece por meio dos conhecimentos teóricos em sala de aula e da observação e participação durante os estágios em sala de aula, enquanto a formação continuada passa pela experiência da prática e de alguns cursos de capacitação, que influenciam a metodologia adotada pelo professor no processo de ensino-aprendizagem. O professor do século XXI necessita deixar de ser simples repassador de informações para ser um aprendiz ativo e participativo junto com os alunos, dinamizando suas aulas e construindo conhecimentos com valores (Costa; Azevedo, 2019).
Não faz sentido o professor se limitar à função de reproduzir apenas o conhecimento e a cultura que outros criaram. É preciso ser um profissional que busque a construção de novos conhecimentos (Gadotti, 2003). Diante disso, tornam-se relevantes as reflexões a respeito da temática deste estudo para a educação, já que está relacionada ao processo de ensino-aprendizagem, em que um professor bem formado irá colaborar para um ensino mais prazeroso e proporcionar uma aprendizagem mais satisfatória.
O desenvolvimento desta análise sobre a formação do docente contribui com o desenvolvimento de novas pesquisas que serão realizadas nessa área. Isso fortalecerá os cursos de formação de professores por meio de anotações sobre os pontos que devem ser aprimorados para promover a preparação dos profissionais para que sejam capazes de trabalhar de forma contextualizada e interdisciplinar para a formação de alunos participativos na sociedade.
Sobre isso, Pimenta et al. (2017) verificaram insuficiência na formação de professores polivalentes dos cursos de Pedagogia do Estado de São Paulo, visto que para isso devem ser bem estabelecidos nesse processo os diferentes saberes que compõem a base comum do currículo nacional da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental, os meios de ensiná-los e a identificação de quem são os alunos da escola, em especial os da escola pública, que convivem com questões que afligem a sociedade brasileira. A formação dos pedagogos investigados se mostrou frágil, generalizada e deficiente.
O objetivo deste trabalho é identificar como ocorre a formação inicial e a continuada do professor no Brasil e sua importância para a prática docente. Para isso, empregaram-se a pesquisa bibliográfica de revisão e a análise reflexiva, com a finalidade de selecionar estudos já publicados sobre formação inicial e continuada do professor para compreender como estão sendo capacitados os futuros docentes e a habilitação deles em exercício. O trabalho está sustentado na legislação brasileira de Educação e em referenciais de autores que orientaram o desenvolvimento deste estudo.
Desenvolvimento
A formação inicial do profissional e a sua formação continuada se refletirão na sua atuação na escola, que é ao mesmo tempo uma tarefa desafiadora e cativante, que abrange a realização de diversas atividades, que vão desde sua participação no projeto político-pedagógico (PPP) com suas tomadas de decisões até a sua prática de ensino em sala de aula.
Nesse sentido, a reflexão sobre a formação do professor pode auxiliar na compreensão de como deve acontecer esse processo e quais as suas contribuições para uma educação de melhor qualidade. É preciso esforço para compreender o trabalho docente, pois envolve as inquietações das escolas que as acompanham em seu percurso histórico-social, já que toda prática é constituída de fatores históricos, sua origem e influências, a depender das condições de cada instituição.
Vários fatores interagem na composição dos desafios à formação de professores, cuja análise revela a complexidade da questão. De um lado, temos a expansão da oferta de Educação Básica e os esforços de inclusão social, com a cobertura de segmentos sociais até recentemente pouco representados no atendimento escolar oferecido nas diversas regiões do país, provocando a demanda por um maior contingente de professores em todos os níveis do processo de escolarização. De outro, as urgências colocadas pelas transformações sociais que atingem os diversos âmbitos da atividade humana e penetram os muros da escola, pressionando por concepções e práticas educativas que possam contribuir significativamente para a construção de uma sociedade mais justa, democrática e moderna. No quadro de fundo, um país com grandes heterogeneidades regionais e locais e, hoje, com uma legislação que estabelece a formação em nível superior como condição de exercício do magistério, num cenário em que a qualidade do Ensino Superior também está posta em questão (Gatti; Barreto, 2009, p. 12).
Alguns estudiosos evidenciaram a contribuição da formação continuada para a melhoria da qualidade do ensino, destacando que a prática pedagógica deve ser fundamentada em uma teoria a fim de que não ocorra apenas transmissão de informação e treinamentos, mas sim construção real do conhecimento (Back; Teixeira, 2019). Dessa forma, conhecer a tendência progressista de Dewey, a construtivista de Piaget e a libertadora de Freire orientará o trabalho do professor, preparando-o para que seja mais responsável pela aprendizagem do aluno.
A abordagem de pensamento reflexivo de John Dewey para praticar o pensar e o refletir como estratégias de ensino foi desenvolvida com o objetivo de estudar o processo de ensino-aprendizagem envolvendo o pensamento analítico na resolução de problemas.
Na teoria da investigação de Dewey (1959), o pensamento e o sentimento decorrente da ação estão associados e, para o desenvolvimento do pensamento reflexivo, são cinco passos:
- Identificação da dúvida que se quer investigar, qual é a inquietação;
- Elaboração do problema, selecionando os fatos e as consequências;
- Construção da hipótese para buscar as possíveis soluções, requerendo análise dos fatos;
- Relação com o raciocínio da análise dos fatos, ampliando o conhecimento; e
- Comprovação ou rejeição da hipótese, produzindo o resultado.
Segundo o autor, não há sequência dos passos ou distinção entre eles. Assim, a contribuição da abordagem de Dewey no desenvolvimento da prática do professor é a autoaprendizagem de alunos e professores, que resulta da observação e de atitudes.
Quanto à aquisição de conhecimentos, destaca-se a abordagem construtivista de Jean Piaget, que se baseia no desenvolvimento da inteligência por meio da adaptação a novas situações desafiadoras, que proporciona a construção de novos conhecimentos mediante o aprimoramento das competências. De acordo com ele, assimilar um objeto a um esquema é dar significações que permitem fazer inferências. Sendo assim, a abordagem de Piaget auxilia os professores na sua prática de ensino, sugerindo a realização de atividades didaticamente significativas (Piaget, 1976).
A proposta apresentada por Paulo Freire é de um trabalho educativo voltado à igualdade e à educação dialogada, com uma abordagem libertadora que promove a participação de todos, em que alunos e professores têm voz e se educam em conjunto.
O grande problema que se coloca ao educador de opção democrática é como trabalhar no sentido de fazer possível que a necessidade do limite seja assumida eticamente pela liberdade. Quanto mais criticamente a liberdade assuma o limite necessário, tanto mais autoridade tem ela, eticamente falando, para continuar lutando em seu nome (Freire, 2015, p. 103).
A formação docente deve estar organizada de forma significativa e consistente; nela a aquisição de conhecimentos teóricos é essencial para nortear as práticas educacionais. A relação entre teoria e prática passa a ser fundamental nesse processo de formação docente, sendo transformadora e capaz de preparar os alunos para um futuro promissor (Back; Teixeira, 2019).
Diante do que foi exposto sobre a importância de referenciais teóricos para a formação do professor como forma de proporcionar melhor qualidade de ensino, percebe-se a necessidade de conhecer um pouco da história da Educação, em especial da formação dos professores. De acordo com Ferreira (2016), nos primeiros séculos da história do Brasil o governo não demonstrava comprometimento por atender as massas na escola pública e não estava preocupado com a formação de professores, a carreira e o salário. Isso justifica as dificuldades vivenciadas atualmente pela falta de professores em determinadas áreas ou excesso em outras, devido à falta de gestão pública e de planejamento estratégico da política voltada para a formação do docente.
Nas últimas décadas, a formação de professores vem ganhando destaque nas discussões políticas e nos meios acadêmicos. Além disso, em 1948, foi criada pela Organização das Nações Unidas a Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) com a finalidade de contribuir para o desenvolvimento da região; aí já se mostrava preocupação com o ensino.
Na realidade brasileira, a Constituição Federal de 1988 garante o direito de todos à educação, porém não efetiva o direito de formar profissionais capacitados para essa tarefa (Brasil, 1988). Dessa forma, a legislação mostra a relevância da Educação no que se refere à igualdade entre todos, porém não destaca a necessidade de haver profissionais qualificados para desempenhar essa tarefa no sistema educacional, mostrando a falta de recursos em investimentos na profissionalização para promover uma educação de qualidade.
A Lei nº 9.394, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), de 20 de dezembro de 1996, estabelece:
Art. 62. A formação de docentes para atuar na Educação Básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura plena, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na Educação Infantil e nos cinco primeiros anos do Ensino Fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade normal (Brasil, 2017, em redação dada pela Lei nº 13.415/17).
A LDBEN orienta que os professores devem possuir especialização adequada para atendimento especializado e inclusão de alunos especiais nas classes. Além disso, trata da realização de programas de capacitação que devem ser oferecidos a todos os professores em exercício, utilizando também para isso os recursos da educação a distância (Brasil, 2017, em redação dada pela Lei nº 13.415/17).
Em 2002, houve uma orientação da formação dos profissionais do magistério da Educação Básica por meio das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, com o oferecimento de nível superior, curso de licenciatura de graduação plena, que foi organizado de forma legal na formação inicial de professores. Nos anos seguintes, apenas alguns cursos desenvolveram diretrizes próprias. Em 2004, o Ministério da Educação (MEC) implantou a Rede Nacional de Formação Continuada, com o objetivo de organizar os programas e os gestores, porém avançou pouco. Em 2006, foram estabelecidas as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, concluindo uma série de diretrizes que foram instituídas para todas as licenciaturas.
Para garantir a formação do professor, o MEC criou o Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica, instituído pelo Decreto nº 6.755/09, destinado aos docentes de escolas públicas estaduais e municipais que estão em exercício sem formação adequada à LDBEN, daí a oferta de cursos superiores públicos gratuitos e de qualidade (Brasil, 2009).
Em relação à legislação brasileira, Gadotti (2003) comenta que, apesar de a formação continuada do professor ser um direito, para que isso ocorra é preciso que haja determinadas condições e exigências. Belletati e Domingues (2020) explicam que a formação continuada deve ser considerada um diálogo entre as disciplinas a ser ministradas e os conteúdos do currículo, realizando um trabalho interdisciplinar em que a prática pedagógica e a pesquisa estejam associadas para garantir a formação integral.
É inegável intensificar a formação inicial e a continuada do docente, principalmente nas políticas voltadas à inserção do professor, de assessoria e de capacitação para o exercício. Além disso, deve-se promover políticas com a finalidade de permitir avançar na carreira por meio da valorização do profissional, reconhecendo seu desempenho e criando melhores condições de trabalho que favoreça o ensino. Dessa forma, nota-se a necessidade de investimentos na formação do professor, tanto inicial quanto na continuada, como forma de proporcionar uma prática que seja admirável pela sua importância e por ser exercida com respeito, com condições adequadas para que o processo de ensino-aprendizagem seja satisfatório.
Nesse sentido, os cursos de licenciatura que formam futuros professores devem ser capazes de garantir uma formação de qualidade para seus graduandos, fornecendo um embasamento teórico que os estimule a seguir na profissão e atividades práticas para que possam adquirir experiências. Para Pimenta et al. (2017), nos cursos de Pedagogia o principal objetivo é a formação de docentes responsáveis que observem a sua realidade e busquem associar o conhecimento construído na universidade com as modificações necessárias que ocorrem dentro da escola e que despertam o interesse e o sentimento dos educandos para atuar de forma crítica na sociedade, nos aspectos social e político nos quais estão inseridos.
A presença nos currículos de disciplinas de “fundamentos” e disciplinas voltadas ao exercício profissional do professor leva a supor que as primeiras teriam a função de prover ao futuro professor os elementos teóricos da profissão e as segundas, os de formação para as demandas da prática docente na escola e na sala de aula. No entanto, um ligeiro olhar sobre as ementas permite concluir que é muito tênue a relação das disciplinas de “fundamentos” com as práticas, enquanto as disciplinas referentes à formação profissional, em boa parte, não recorrem aos “fundamentos” e, frequentemente, elas próprias passam a impressão de que “ficam na teoria”, desdenhando o “que” e o “como” ensinar (Libâneo, 2010, p. 566).
Tozetto, Martinez e Kailer (2020) ressaltam que, nos cursos de formação de professores, a realidade não é tratada nas discussões; assim, o conhecimento fica desvinculado na escola pública, havendo falta de temáticas que abrangem o futuro docente na sua integridade, a exemplo dos aspectos culturais que são desprezados na sua formação inicial.
Para compreender como deve ocorrer o processo de formação do professor, é preciso identificar o papel do docente, que, segundo Saviani (2007), na tendência tradicional que enfatiza a teoria, que evidencia o professor como detentor dos conhecimentos e cuja responsabilidade é ensinar aos alunos por meio de procedimentos adequados. A tendência do construtivismo é renovadora, com destaque para a prática, em que o aluno é aquele que aprende na atividade prática.
Em vista dos argumentos apresentados, torna-se fundamental rever os métodos utilizados no sistema de ensino, já que muitas vezes eles se mantêm em seu estado tradicional não de acordo com o novo mundo em que novas metodologias e o suporte das tecnologias facilitam o acesso às informações, sendo preciso uma nova forma de trabalhar que potencialize o processo de ensino-aprendizagem (Costa; Azevedo, 2019).
Considerações finais
Diante do exposto, são muitos os desafios para garantir a formação inicial e continuada dos professores na atual realidade nacional, a começar pela legislação sobre a temática, que deve assegurar as conquistas até então alcançadas por meio de regulamentações, buscando estratégias e metodologias que fortaleçam a formação do professor, sendo capazes de satisfazer as necessidades e aspirações dos alunos e professores.
O desenvolvimento de diretrizes, planos e programas mostra o esforço realizado visando à melhoria da qualidade da educação e evidencia que alguns docentes já foram beneficiados com tais medidas implantadas pelo governo, mas revela ainda que faltam mais investimentos voltados à valorização, à carreira e aos salários desses profissionais e de políticas significativas para acompanhar a eficácia na realidade.
Observa-se que a formação inicial do professor para atuar na Educação Básica foi estabelecida de forma unificada por meio do nível superior oferecido em universidades para os docentes da Educação Infantil e diferentes áreas do Ensino Fundamental. Dessa forma, espera-se que o processo de formação seja aprimorado e que pesquisas sejam desenvolvidas para solucionar os problemas enfrentados na área educacional.
O conjunto de ações criado para garantir a formação dos professores, tanto a inicial quanto a continuada, por meio de cursos de licenciatura para graduandos sem outra formação na área de Educação e de nível superior para docentes em exercício que não atendem à LDBEN é importante para fortalecer o processo de ensino. Porém também é preciso haver políticas voltadas à carreira do docente, promovendo a inserção de assessoria e capacitação dos profissionais e valorização do professor com investimentos visando melhores condições de trabalho.
Sendo assim, os resultados desta pesquisa auxiliarão na construção de novos conhecimentos sobre a formação docente por meio da análise de estudos que abrangem a Legislação Brasileira e o enfoque de pesquisadores sobre estratégias a serem adotadas para aprimorar a prática de ensino, tornando o trabalho do professor em sala de aula mais estimável.
Referências
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Publicado em 05 de março de 2024
Como citar este artigo (ABNT)
SILVA, Adielle Rodrigues da. Ideias sobre formação inicial e continuada de professores. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 24, nº 7, 5 de março de 2024. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/24/7/ideias-sobre-formacao-inicial-e-continuada-de-professores
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