Do repolho ao coelho

Gustavo Aurélio Tomé Azuaga

Professor de Língua Portuguesa na rede estadual de educação de Mato Grosso do Sul

Marcos Vinicius Campelo Junior

Doutor em Ensino de Ciências (UFMS) e professor de Geografia na rede estadual de educação de Mato Grosso do Sul

Com interesse sobre o tema de como se processa o aprendizado e no compartilhamento de esclarecimentos que contribuam ao fazer pedagógico que busca investir na perspectiva dos estudantes, ou seja, de como eles aprendem, além de auxiliar os docentes para que retomem/mantenham a postura de aprendizes em relação a conhecimentos e atividades de naturezas diversas, para que todos se conscientizem de suas potencialidades e possibilidades de lograr os estudos aos quais se dedicam, justifica-se a escrita deste artigo.

Para tal ensejo, realizou-se pesquisa bibliográfica de obras diversas em que, se não especificamente, em alguma instância trazem elucidações, cada uma ao seu enfoque, de como as ações cognitivas, relações emocionais, atividades interativas e, sobretudo, a autognose contribuem para o aprendizado.

Assim, por meio desta escrita, discorre-se, sinteticamente, sobre o que foi pesquisado, bem como as reflexões decorrentes, a iniciar com a análise metafórica, a qual distende o prólogo.

Em uma balança, pré-requisitos contrapõem-se em peso a conhecimentos a serem (re)construídos. O balançar reflete o processo de aprendizagem, e o equilíbrio afere o aprendizado efetivado.

Equilibrar, nesse sentido, também é assimilação que, com pensamento em teorias piagetianas, permite traçar/recuperar a analogia metafórica do repolho e do coelho, em que, ao se discutir como se aprende, é possível refutar absolutismos teóricos, além de compreender diversas nuances que, se não pesam muito para qualquer dos lados da balança, são a própria regulagem do mecanismo. Piaget, ao ser indagado sobre contrastes e aceitabilidade de suas pesquisas e constatações em relação às teorias behavioristas — “trata-se de um arcabouço teórico da Ciência do Comportamento em que prega que reações/procedimentos são definidos por padronizações de respostas a estímulos” —, elucida, questionadoramente, que:

Se os behavioristas tivessem razão, um coelho que só comesse repolho (estímulo-S) terminaria por transformar-se em repolho (resposta-R); ora, o contrário é, justamente, o que ocorre: o repolho se transforma em coelho (assimilação) (Lima, 1980, p. 91).

Entende-se que Jean Piaget, por questões teóricas, de experimentações e de seus estudos em geral, chegou a conclusões diferentes sobre os processos de cognição e assimilação que os behavioristas, com suas concepções epistemológicas, obviamente, chegaram. Isso não significa que a preocupação deste texto é trazer algum convencimento a respeito de qual teorização é mais válida, e sim, nesta parte introdutória, ilustrar como um pensador importante que foi (é) Jean Piaget contribui justamente com reflexões e constatações a respeito dos mencionados processos de cognição e assimilação.

Ao considerar aprendizagem dentro de uma ótica educacional — algo muito natural, apesar de muito pouco aprofundado por alguns —, opta-se por unir as metáforas ao considerar a planta hortense e o próprio roedor sobre os pratos antagônicos do instrumento de aferição. Com isso, consegue-se e propõe-se com o texto que segue pormenorizar elementos e fatos constituintes do desafio de aprender e, na perspectiva docente, de mediar (encarado como ato de propiciar a aprendizagem).

Sobre quocientes de inteligência, hereditariedade e consolidação fenotípica

Não em ordem de importância, mas na impossibilidade de evitar a escolha de uma situação para começar as discussões, inicia-se a reflexão sobre a própria constituição da intelectualidade. Nesse aspecto, detém-se aqui na conscientização do que é e não é indicador de competência intelectual, quando se consideram a hereditariedade e os desempenhos em testes de quociente de inteligência (Q.I.).

Conforme apontam diversos estudiosos do tema:

Os indivíduos diferem um do outro em sua habilidade de compreender ideias complexas, adaptar-se eficazmente ao ambiente, aprender com a experiência, engajar-se em várias formas de raciocínio, superar obstáculos através do pensamento. Embora essas diferenças individuais possam ser substanciais, elas nunca são inteiramente consistentes: o desempenho intelectual de uma pessoa variará em diferentes ocasiões, em diferentes domínios como serão julgados por diferentes critérios [sic] (Neisser et al., 1996 apud Paro, 2006, p. 14-15).

Assim, é possível aferir — com limitações pela não linearidade do que é mensurável — uma capacidade de aprendizagem, em boa dose genética, dos indivíduos, de realizar abstrações, perceber problemas e raciocinar criativamente; porém tudo isso, por si só, não garante que o aprendiz (aquele que se dispõe ao aprendizado, ou é desafiado a ele) tenha desempenho nas aprendizagens propostas ou mesmo impostas. Até mesmo porque

Tal como é medido pelos diferentes testes de inteligência, o Q.I. é uma interpretação ou uma classificação de um resultado global de um teste em relação com as normas impostas por um grupo, quanto à idade, nível socioeconômico e sexo. [...] O quociente intelectual mede a capacidade funcional do momento, não necessariamente seu potencial futuro. Não é em si mesmo indicador da origem genética (inato) ou ambiental das habilidades a que se refere [sic] (Paro, 2006, p. 41).

Desse modo, percebe-se como fragilidade analítica tentar classificar ou rotular o potencial inteligível ou de raciocínio conforme o seu desempenho em uma avaliação de teste de quociente de inteligência, pois, conforme é possível observar na citação, esse tipo de teste é apenas aferição de capacidade funcional momentânea, logo serem consideráveis possibilidades de progresso.

Ainda em observância ao que foi citado, deixa-se claro que o enquadramento dos indivíduos em uma escala de padrão de quociente de inteligência não é devido, ou não é o que mais importa, para referendar a relevância de herança genética.

Maturana e Varela (1995), sobre noção de informação genética, esclarecem ainda que

é muito frequente ouvirmos dizer que os genes constituem a "informação" que especifica um ser vivo. Isso é um erro por duas razões fundamentais. Primeiro, porque confunde o fenômeno da hereditariedade com o mecanismo de réplica de certos componentes celulares (os DNAs), de grande estabilidade transgeracional. Segundo, porque dizer que o DNA contém o necessário para especificar um ser vivo tira esses componentes (parte da rede autopoiética) de sua inter-relação com o restante da rede. É a rede de interações em sua totalidade que constitui e especifica as características da célula, não um de seus componentes. É certo que modificações nos genes trazem consequências dramáticas para a estrutura de uma célula. O erro está em confundir participação essencial com responsabilidade única. Com o mesmo argumento, poder-se-ia dizer que a constituição política de um país determina sua história. Um evidente absurdo: a constituição política é um componente essencial da história, mas não contém a "informação" que a especifica (Maturana; Varela, 1995, p. 107).

Com o exposto, em casos de indivíduos sem nenhuma anomalia cerebral, compreende-se não haver uma limitação da inteligência ou potenciais de Q.I. devido à hereditariedade genética.

Inclusive, como os autores exemplificaram, para além das análises estritamente biológicas, em contexto escolar, na promoção de diálogos com os pais e responsáveis e os próprios estudantes rotineiramente, é possível evidenciar que ser inteligente não é algo estático ou dom agraciado, mas que se desenvolve mediante o ensino-aprendizado constante, sendo momentos pedagógicos de construção do conhecimento. Assim, para chegar ao progresso intelectual, os estudantes devem não apenas “estar prontos” e ser capazes de aprender, mas, para além disso, ter oportunidades apropriadas de aprendizagem (Smith; Strick, 2001).

Sobre os aspectos emocionais da aprendizagem e estratégias motivacionais

Devem-se os fatos de êxito ou insucesso de aprendizagem a outras variáveis que compõem o processo em análise, como as de natureza sobretudo emocional e social, ambas intensamente interligadas. Portanto, ao apresentar as considerações sobre essas variáveis, elas são mencionadas ou entendidas como motivações, o que remete a talvez uma nova conceituação:

A motivação é entendida como um conjunto de fatores ou como um processo que leva, instiga ou provoca uma escolha, iniciando um comportamento que está direcionado a um objeto. Ela possibilita um repertório variado de opções ao aluno, dotando-o de recursos ideais, que tornarão possíveis escolhas autênticas e promoverão resultados altamente satisfatórios, pois potencializa o nível de interesse e de compreensão, que são os fatores geradores de uma aprendizagem plena. Nesse sentido, os alunos curiosos e excitados adquirem os recursos necessários para direcionar ações no sentido de superar os desafios apresentados. Essa superação, por sua vez, depende de um conjunto de fatores, mas, no campo motivacional, implicará compreender a variabilidade do nível e da qualidade da motivação aplicada a determinada situação (Bzuneck, 2004 apud Engelmann, 2010, p. 14).

Ao ponderar sobre o que é fator motivador, no caso ao aprendizado dos sujeitos estudantes, é interessante distinguir, em alguma medida, motivações intrínsecas (ou internas) de motivações extrínsecas (ou externas).

Quanto às motivações intrínsecas, sugere-se a priori que cada leitor realize uma concentração de suas experiências pessoais de aprendizado para refletir a intensidade que se dedicou a aprender aquilo que era matéria de seu interesse, inobstante a uma imposição ou necessidade imediata de uso do conhecimento a ser adquirido.

Assim há maior facilidade em reconhecer que, quando há interesse por um conteúdo, a atenção do indivíduo é bem mais intensa, o que a torna um fator positivo que muito contribui ao aprendizado, pois a memória ativa (parte que lida com a informação imediatamente, ativando o raciocínio) e a memória de armazenamento (parte que recupera informações, compara e compõe estruturas compreensivas) trabalham em parceria, garantido essa potencialidade na dedicação ao que é estudado ou objeto de atenção.

Já para as motivações extrínsecas, a fim de serem exemplificadas significativamente, propõe-se a cada leitor exercitar a lembrança de quando alguém os ajudou a aprender, seja instigando-os sobre o assunto, traçando comparações sobre o que sabiam e lhes interessava com relação ao conteúdo em pauta, revelando o quanto se avançou na compreensão e cumprimento do desafio da aprendizagem, apontando novas possibilidades e lhes confiando capacidade.

Conforme Santos (2008), o professor exerce grande papel nesse sentido:

O papel docente de desafiar deve ser insistentemente aperfeiçoado. Precisamos construir nossa forma própria de “desequilibrar” as redes neurais dos alunos. Essa função nos coloca diante de um novo desafio com relação ao planejamento de nossas aulas: buscar diferentes formas de provocar instabilidade cognitiva. Logo, planejar uma aula significativa significa, em primeira análise, buscar formas criativas e estimuladoras de desafiar as estruturas conceituais dos alunos. Essa necessidade nos poupa da tradicional busca de maneiras diferentes de “apresentar a matéria”. Na escola, informações são passadas sem que os alunos tenham necessidade delas; logo, nossa função principal como professores é de gerar questionamentos, dúvidas; criar necessidade e não apresentar respostas.

Quando problematizamos, abrimos as possibilidades de aprendizagem, uma vez que os conteúdos não são tidos como fins em si mesmos, mas como meios essenciais na busca de respostas. Os problemas têm a função de gerar conflitos cognitivos nos alunos (desequilíbrios), que provoquem a necessidade de empreender uma busca pessoal [sic] (Santos, 2008, p. 4).

Vale ressaltar a primordialidade de que as motivações intrínsecas superem as extrínsecas, a evitar dependência a fatores alheios à vontade pessoal/subjetiva, além de assumir o compromisso com estudo, por tudo que ele significa à atuação salutar de um cidadão consciente e coletivista. Para isso, é preciso que o aprendiz e ou estudante tenha uma boa imagem de si mesmo, ou seja, sinta-se capaz de aprender. Em proveito, ainda, as palavras de Santos (2008, p. 7):

Alguém que não tem “permissão de ser” não se habilita a aprender, pois não tem referenciais internos para alimentar a interação necessária com o objeto da aprendizagem. Nossos alunos precisam sentir que podem ser o que são na sala de aula e que toda parte de si que não for muito conveniente será fruto de uma negociação respeitosa que levará a uma adaptação de comportamento que, por sua vez, será um ganho de habilidade relacional, um presente para ser melhor no mundo.

Nesse intento, percebe-se que professores ou mediadores de aprendizagem devem estimular “seus” aprendizes e ou estudantes a conhecer a si próprios — como apregoava, redundantemente ao estilo, a máxima de Delfos (cidade grega onde, na Antiguidade, construiu-se um templo dedicado ao deus mitológico Apolo, abrigando sábios oráculos): “Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo” — e, se ocorrer de o estudante, inicialmente, já apresentar uma imagem negativa de si, procurar engajá-lo naquilo que ele possa mais facilmente superar e surpreender-se; elogiar seus esforços em aprender, ainda que não tenha galgado aos níveis por ambos esperados; e provocar a reflexão sobre o processo por meio de meta-aprendizagem, a fim de que, com esses estímulos, o próprio aprendiz perceba que há nele a grande motivação a superar desafios, principalmente, lançados por ele.

É claro que, para isso, não seja desconsiderada a particular conceituação de eficácia que os professores devem possuir

para trabalhar em qualquer condição depende acentuadamente do nível de sua crença de autoeficácia, ou seja, da crença de que pode exercer ações destinadas a produzirem certos resultados; [...] a motivação para enfrentar situações difíceis no ensino deriva do pareamento que a pessoa faz entre suas próprias capacidades percebidas e as condições reais dos desafios. Assim, altas crenças de eficácia são a primeira condição para os professores lidarem com o difícil problema de motivar seus alunos. Tais crenças originam-se, por sua vez, de influências sociais positivas de colegas e da direção e, mais do que tudo, de experiências reais de êxito, que ocorrem em função de muitos conhecimentos e habilidades adquiridas [sic] (Bandura, 1993 apud Bzuneck, 2004, p. 2).

Ainda em consideração aos fatores motivacionais, esbarra-se nas variáveis emocionais e sociais, pois o humor reflete no interesse e predisposição a aprender, ao passo que diversos atores/fatores sociais, dentro e fora do âmbito escolar, podem contribuir com a sensibilização e percepção do que se quer e precisa fazer para conseguir ou assimilar o objeto ou conceito pretendido.

Sobre estruturação cognitiva

Outro fator do processo de aprendizagem é que todo conhecimento carece de estruturas, uma vez que, ao ser elaborado ou confrontado choca-se, reconhecendo-se e ressignificando-se, com a maneira de pensar e organizar informações de quem o produz ou quem o assimila.

De tal circunstância, constata-se que diferentes áreas do conhecimento tendem a constituir conjunturas próprias de serem compreendidas e expressas. Isso fica evidente quando se menciona, por exemplo, linguagem matemática e pensamento algébrico. Também não foge à regra o nível individual, em que cada sujeito constitui uma idiossincrasia de compreender(-se), expressar-se.

O importante é que cada aprendiz perceba que ao estudar inexoravelmente deverá reconfigurar suas estruturas de pensamento, de modo a alinhavá-las com seu objeto e campo de estudo. E que cada mediador de aprendizagem favoreça a correspondência da estruturação do conhecimento com a tendência de aprender, perceptiva em cada aprendiz. Assim, será propício, ao menos em âmbito alicerçador, que estudantes organizem estratégias eficientes ao seu estudo. Relacionado a esse aspecto, Maturana e Varela (1995, p. 39) ressaltam que

os fenômenos associados à percepção só podiam ser entendidos se se concebesse o operar do sistema nervoso como uma rede circular fechada de correlações internas, e simultaneamente compreendeu que a organização do ser vivo se explicava a si mesma ao ser vista como um operar circular fechado de produção de componentes que produziam a própria rede de relações de componentes que os gerava (teoria que ele posteriormente chamou de autopoiese).

A partir disso, em proveito das palavras dos autores recém-mencionados na mesma obra (1995, p. 42), é compreensível que a “percepção, operar do sistema nervoso, organização do ser vivo e conhecimento autoconsciente conformam um todo conceituaI e operacional indissolúvel”.

Em continuidade, outrossim, as ligações neuronais constituem-se em crucial aspecto sobre como os conhecimentos são estruturados no cérebro, a permitir otimizar o pensamento relacional, compreensivo e criativo.

Em conformidade com os estudos de Tabacow (2006), dentro da composição cerebral, existem os neurônios, que, ao iniciar desenvolvimento embrionário, formam-se em bilhões, pois não é possível ao organismo humano regenerá-los como faz com outras células, e diariamente os está a perder em massivas quantidades, independentemente dos hábitos saudáveis que o indivíduo em questão adota. Esses neurônios são responsáveis por armazenar informações e indicar percepções sensoriais, no entanto são as ligações entre eles, chamadas sinapses, que garantem ativação rápida e eficaz do conhecimento armazenado.

Dessarte, de nada adiantam bilhões de neurônios se não é estabelecida comunicação adequada entre eles — como conhecimento guardado que se torna inútil. Portanto, investir nas redes neurais garantirá maior cognição, consequentemente facilitará a aprendizagem.

Nesse sentido, entendida a utilidade do investimento, a Taxonomia de Bloom et al.(1956) indica como isso pode ser propiciado. Com aplicação nos fazeres educacionais de todas as divisões da complexidade cognitiva elaborados na teoria, em ordem crescente de exigência das operações mentais podem ser assim organizados, com a denominação substantiva e ações correlatas: conhecimento (apontar, arrolar, enunciar, registrar...), compreensão (descrever, identificar, explicar, esclarecer...), aplicação (empregar, ilustrar, traçar, praticar...), análise (calcular, examinar, contrastar, criticar...), síntese (compor, coordenar, esquematizar, criar...) e avaliação (ajuizar, selecionar, taxar, validar...).

Desse modo, ao realizar um estudo do que Benjamin Bloom e outros teóricos revisionistas, como Johnson (2007) e Tompson (2008), consideram como gradações do processo cognitivo, percebe-se que, para galgar essas etapas, é necessário pleno desenvolvimento da anterior; e que o estudante que não vivencia todas as possibilidades gradativas da taxonomia perde o desenvolvimento do entrelaçamento sináptico que cada gama de operações mentais promove.

Possibilidades de aprendizagem

Não basta que os indivíduos, ao se depararem com as diferentes etapas do estudo, estejam aptos a aprender. Conforme mencionado, há uma série de outros fatores que pesam no processo de aprendizagem; portanto, a inserção ou relação do indivíduo em cada um deles deve ainda se pautar pela agregação de significado que o conhecimento sob estudo deve lhe proporcionar, que em ocasiões oportunas é alavanca ou chave mestra à produção autoral.

Por isso, hodiernamente, ao se discutirem metodologias que facilitem experienciar e promover ações para o conhecimento, tem-se apostado tanto na pesquisa e na virtualidade (que é feito ou simulado por meio eletrônico e de tecnologias computacionais de informação) como elementos que favorecem o caminhar do aprendizado autoral e interativo.

Quanto ao ato de pesquisar, implica a possibilidade de questionamentos reconstrutivos e, conforme aponta Demo (1990, p. 17-18),

pesquisa toma aí contornos muito próprios e desafiadores, a começar pelo reconhecimento de que o melhor saber é aquele que sabe superar-se. O caminho emancipatório não pode vir de fora, imposto ou doado, mas será conquista de dentro, construção própria [...]. Vale, então, rever o conceito de aprendizagem, relacionado ao de ensinar, sempre restritos os dois a posições receptivo-domesticadoras. Educação aparece decaída na condição de instrução, informação, reprodução, quando deveria aparecer como ambiência de instrumentação criativa, em contexto emancipatório. O que conta aí é aprender a criar. Um dos instrumentos essenciais da criação é a pesquisa. Nisto está o seu valor também educativo, para além da descoberta científica [sic].

Com o mesmo propósito, considerem-se as vantagens que a interação em estudos e ou produções em grupo podem refletir nos esforços individuais. Os sujeitos podem falar de suas expectativas e dúvidas quanto aos processos em que estão inseridos, e com o diálogo reconhecer interesses comuns e estímulos, além de ter questionamentos sanados e muitos outros criados — pois problematizar e reproblematizar são atitudes vitais para que se tenham novos caminhos a trilhar.

Em relação à virtualidade, de imediato deve-se ressalvá-la menos como distanciamento da qualidade de interação, porém mais para o prisma do que se discorre, como caracterizada por diferentes meios de estabelecer/reforçar conteúdos e contatos.

O que, a partir do primeiro estabelecimento, Bevilaqua e Peleias (2013) apontam a Educação à Distância (EaD) — e nesse bojo estão inseridas as plataformas dos ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) — como promotora de práticas heutagógicas (relativo à heutagogia, concepção epistemológica comparada a Pedagogia e a Andragogia, no entanto especifica-se por se concentrar na autonomia dos processos de aprendizagem), a favorecer os aprendizados autônomos, em consonância com uma conceituação autopoiética (relativo à autopoiese, conceituação de Humberto Maturana e Francisco Varela, mencionada no presente artigo).

Ademais, com a interatividade virtual, há oportunidade de reforçar autorias coletivas — e, portanto, de conhecimento democratizado — junto à dinâmica de interesses que o contexto atual, deflagrado por individualismos, exige às presentes gerações, sobretudo se essas buscam se enveredar por entendimento sustentável.

Conclusão

Os estudos resultaram na sugestão de que tanto aprendizes quanto mediadores saibam aferir suas balanças processuais da aprendizagem por meio de metaestudo, a fim de se conscientizarem de métodos congruentes de aprendizado, tais quais as peculiaridades do que é estudado e de quem estuda.

A competência intelectual se fortalece muito mais por composição fenotípica (entendida como esforço do próprio indivíduo) do que por composição genotípica (herdada pelo indivíduo).

Relevante, além de ser ciente de uma gama de teorizações sobre como o aprendizado se consolida, é estar consciente de que o que se aprende torna parte do aprendiz, e o que é mediado possibilita o objeto de estudo ser ressignificado pelo aprendiz, a propiciar o processo autopoiético.

Por conseguinte, na interação do processo completo de aprender paralelamente ao agir enquanto o coelho que devora/assimila, mas que, ao exercitar a autoria, gradação máxima e exímia comprovação de aprendizado, o aprendiz deve entender suas constatações como pressupostos subjetivos, na analogia da planta que desequilibra a fome de outro roedor de conhecimentos.

Por fim, este texto em nenhum momento buscou encerrar as discussões a respeito de como a aprendizagem se consolida e ou é favorecida, mas, quanto a isso, buscou contribuir com pontos de partida para aprofundar discussões no âmbito das práticas educativas.

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Publicado em 09 de abril de 2025

Como citar este artigo (ABNT)

AZUAGA, Gustavo Aurélio Tomé; CAMPELO JUNIOR, Marcos Vinicius. Do repolho ao coelho. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 13, 9 de abril de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/13/do-repolho-ao-coelho

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