Cruzando fronteiras entre universidade e Educação Básica: a sinfonia entre residência pedagógica e atuação docente na formação inicial de professores em Ciências Biológicas
Victor Henrique Santos França
Licenciado em Ciências Biológicas, mestrando em Biotecnologia (UFS)
Clívio Pimentel Júnior
Doutor em Educação (UFBA), docente orientador no Programa Residência Pedagógica - Subprojeto Biologia da UFS
O Programa de Residência Pedagógica (PRP) se destaca como uma iniciativa integrada à Política Nacional de Formação de Professores, buscando aprimorar a formação prática dos futuros docentes por meio da criação de um espaço de aperfeiçoamento profissional que visa “fortalecer os vínculos educacionais das redes de ensino com as universidades, ampliando a participação das instituições da educação básica na formação inicial docente” (Costa; Pimentel Júnior, 2022). Em consonância com a visão de Freitas (2020) e de Diniz-Pereira (2013), a imersão no espaço escolar é uma condição fundamental para o desenvolvimento dos saberes docentes, especialmente em um contexto em que a formação tradicional frequentemente fragmenta teoria e prática (Gatti, 2010). Nesse sentido, o PRP surge como uma resposta crítica a essas lacunas, propiciando aos licenciandos em Ciências Biológicas uma oportunidade única de articular conhecimentos acadêmicos às demandas reais da sala de aula, alinhando-se às diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que enfatizam a aprendizagem por competências e a contextualização do conhecimento científico (Brasil, 2018).
A Universidade Federal de Sergipe (UFS), ao integrar-se ao PRP, estabelece parcerias com redes federal, estadual e municipal de ensino em municípios como Aracaju e São Cristóvão, posicionando-se como agente transformador na formação docente. Essa colaboração viabiliza a inserção dos licenciandos nos cotidianos escolares, promovendo uma formação centrada na relação dialética entre teoria e prática. No subprojeto de Ciências Biológicas, o programa busca não apenas envolver os estudantes em atividades pedagógicas, mas também estruturar seu desenvolvimento profissional na criação de saberes experienciais, combinando metodologias inovadoras – como o uso de tecnologias digitais e abordagens ativas – às exigências contemporâneas do ensino de Ciências.
Diante desse contexto, este artigo parte do seguinte questionamento: “Como a imersão prática, proporcionada pelo PRP, contribui para a articulação entre os saberes teóricos da formação inicial e as demandas reais da atuação docente em Ciências Biológicas?”. Para respondê-lo, apresentamos um relato de experiência das atividades desenvolvidas no PRP da UFS (2022-2023) no Colégio de Aplicação (Codap), analisando estratégias metodológicas alinhadas à BNCC – como aulas práticas, jogos educacionais e visitas laboratoriais – e seus impactos na construção da profissionalidade docente. O objetivo central é demonstrar como a integração entre universidade e escola, mediada pelo PRP, supera modelos formativos tradicionais, oferecendo subsídios para uma formação docente que priorize a reflexão crítica, a inovação pedagógica e a aplicação contextualizada do conhecimento.
Metodologia
Neste estudo, o relato de experiência emerge a partir da vivência da prática escolar realizada de outubro de 2022 a junho de 2023, englobando as aulas de Ciências destinadas aos alunos do 8º ano dos Anos Finais do Ensino Fundamental. Essa experiência é impulsionada pelo Programa de Residência Pedagógica, uma colaboração entre o Departamento de Biologia e o Colégio de Aplicação, ambos da UFS. A atuação do residente visa o desenvolvimento prático e o aprimoramento de habilidades pedagógicas no contexto do subprojeto de Ciências Biológicas.
Atendendo às demandas do contexto da escola-campo, as práticas pedagógicas relatadas e escolhidas buscaram incorporar abordagens metodológicas alinhadas à BNCC. A partir de sua homologação, a BNCC passou a definir o conjunto de objetivos de aprendizagem ao longo da Educação Básica, em todas as áreas de conhecimento, incluindo aí as Ciências da Natureza e suas Tecnologias. Seguindo o fluxo nacional de implementação de políticas nas escolas, a proposta pedagógica do Colégio de Aplicação da UFS passou a traduzir e a incorporar as orientações normativas da BNCC, refletindo numa proposta comprometida com os princípios e as diretrizes estabelecidos pela BNCC e a pedagogia de competências. Nesse sentido, as metodologias educacionais adotadas na vivência do PRP foram selecionadas com o intuito de assegurar uma implementação eficaz dos objetivos e das competências propostas pela BNCC. Entendendo que o desenvolvimento de competências abarca aprendizagens conceituais, procedimentais e atitudinais de modo contextualizado e aplicado (Zabala; Arnau, 2010), o intuito global do planejamento pedagógico das atividades foi proporcionar aos estudantes vivências pedagógicas diversificadas, priorizando o atendimento à diversidade das formas de aprender para diminuir o teor transmissivista do ensino (Zabala; Arnau, 2010). Dessa forma, proporcionamos uma educação organizada e consistente, conforme as diretrizes nacionais estabelecidas para a formação dos estudantes.
As atividades desenvolvidas, incluindo aulas, testes, atividades práticas e saídas de campo, foram consideradas cruciais na formação inicial docente. A escolha do relato de experiência como técnica de apresentação proporciona uma análise detalhada das intervenções, fornecendo uma perspectiva enriquecedora e contextualizada da vivência das práticas escolares em contextos reais de ensino. Isso contribui para uma compreensão aprofundada do impacto dessas experiências na formação dos estudantes, alinhando-se ao objetivo de promover uma aprendizagem significativa e eficaz no campo da formação inicial de professores em Ciências Biológicas. Assim, apresentamos a organização do conjunto de atividades pedagógicas dessa vivência escolar, detalhando-as em suas especificidades.
Quadro 1: Mecanismos reprodutivos - objeto de conhecimento, habilidades da BNCC e abordagens realizadas
Objeto de conhecimento |
Habilidades |
Abordagem metodológica |
Mecanismos reprodutivos |
(EF08CI07) Comparar diferentes processos reprodutivos em plantas e animais em relação aos mecanismos adaptativos e evolutivos. |
- Aulas expositivas e participativas em sala de aula - Atividades escrita - Aula em laboratório - Materiais didáticos (célula procarionte, eucarionte, cogumelo e planária) - Jogo tradicional (Batata quente) - Avaliação final escrita |
Iniciamos pelo objeto de conhecimento Mecanismos Reprodutivos, presente no plano de ensino da escola e previsto para trabalhar com os Anos Finais do Ensino Fundamental. A exploração desse objeto de conhecimento foi estruturada por meio de uma metodologia diversificada, integrando diversas abordagens pedagógicas para otimizar o aprendizado dos alunos.
Inicialmente, foram realizadas aulas expositivas e participativas em sala de aula, proporcionando aos estudantes uma introdução teórica fundamentada. Essa etapa visou não apenas apresentar informações teóricas e conceituais relevantes, mas envolver ativamente os alunos na construção do conhecimento, fornecendo elementos e ferramentas para a interpretação dos fenômenos estudados (Anastasiou et al., 2004).
Em seguida, foi promovida atividade escrita, desafiando os estudantes a expressar, de maneira autônoma, o entendimento adquirido durante a aula expositiva. Essa prática teve como objetivo consolidar o aprendizado individual e estimular uma reflexão crítica acerca do tema. A etapa seguinte contemplou aulas práticas em laboratório, onde utilizamos materiais didáticos, como: células procariontes, eucariontes, cogumelos e planárias. Esses elementos serviram para explorar os mecanismos reprodutivos de forma tangível. A abordagem prática permitiu uma compreensão mais profunda e concreta dos conceitos, enriquecendo a experiência de aprendizado. Introduzindo uma dinâmica lúdica, implementamos o jogo tradicional Batata Quente, no qual os alunos transmitiam informações de mecanismos reprodutivos de forma descontraída. Essa atividade não apenas proporcionou um momento de descontração como consolidou os conceitos de maneira memorável.
Ao encerrar a sequência de atividades, propomos uma avaliação escrita que serviu não apenas como instrumento de avaliação do entendimento, mas também como uma oportunidade para os alunos consolidarem o aprendizado e esclarecerem eventuais dúvidas.
De modo geral, ao proporcionar uma combinação de atividades de leitura, atividade teórico-prática, jogos e atividade avaliativa escrita, o planejamento didático-pedagógico priorizou o trabalho com diferentes estímulos e diversificação, para que o ensino não acabe “sendo um instrumento sobrecarregado de conteúdos e de difícil cumprimento nos planejamentos e nas programações de aula, o que acaba por frustrar os estudantes e professores” (Zabala; Arnau, 2010, p. 83).
Quadro 2: Sexualidade - objeto de conhecimento, habilidades da BNCC e abordagens realizadas
Objeto de conhecimento |
Habilidades |
Abordagem metodológica |
|
Sexualidade |
(EF08CI08) Analisar e explicar as transformações que ocorrem na puberdade considerando a atuação dos hormônios sexuais e do sistema nervoso. (EF08CI09) Comparar o modo de ação e a eficácia dos diversos métodos contraceptivos e justificar a necessidade de compartilhar a responsabilidade na escolha e na utilização do método mais adequado à prevenção da gravidez precoce e indesejada e de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST). (EF08CI11) Selecionar argumentos que evidenciem as múltiplas dimensões da sexualidade humana (biológica, sociocultural, afetiva e ética). |
- Aula expositiva e participativa em sala de aula - Atividades escrita - Aula e visita ao laboratório de microbiologia - Materiais didáticos (aparelho reprodutor feminino e masculino, camisinha masculina, feminina e DIU) - Jogo online (Kahoot) acerca das IST, da sexualidade humana e da gravidez precoce na adolescência - Mapa mental a respeito dos sintomas, tratamento e profilaxia sobre IST - Avaliação escrita |
Seguindo a sequência de ações do plano de ensino, avançamos para o próximo objeto de conhecimento: Sexualidade. A estruturação da exploração para esse conhecimento também se deu por meio de aulas expositivas e participativas, enriquecidas pelo uso de materiais didáticos como modelos do aparelho reprodutor feminino e masculino, camisinhas e DIU. As aulas com esses materiais serviram de auxílio para abordar: sistema reprodutor masculino e feminino, dinamismo fisiológico das mudanças do corpo, referentes à puberdade e métodos contraceptivos. Além da importância da diversificação das atividades educativas, buscando atender às diversidades das formas de aprender (Zabala; Arnau, 2010), a introdução de modelos educativos tem sido entendida como uma estratégia importante na promoção da educação científica, enquanto permite aproximar os estudantes e alfabetizá-los na linguagem científica, contribuindo para a aprendizagem e para a mudança cultural acerca da percepção da natureza desse conhecimento (Cachapuz et al., 2005). A renovação do ensino de Ciências da Natureza, nesse sentido, passa pela promoção e pelo fomento da cultura científica de modo a familiarizar os estudantes com o universo simbólico da Ciência, seus procedimentos e métodos (Cachapuz et al., 2005).
Ademais, as atividades escritas fizeram parte no processo de construção do conhecimento, desafiando os alunos a expressarem autonomamente seus entendimentos. Além das atividades realizadas na sala de aula e no laboratório do colégio, houve também uma abordagem prática efetuada durante uma visitação ao Laboratório de Microbiologia, no Departamento de Morfologia da UFS, utilizando estereoscópio, cepas de bactérias e leveduras dispostas no laboratório para proporcionar uma compreensão mais aproximada e descontraída do conteúdo acerca dos agentes etiológicos das IST e suas relações com o organismo.
Em paralelo, um jogo online denominado Kahoot foi utilizado em sala de aula para abordar informações mais sensíveis sobre IST e questões sociais intrínsecas à sexualidade humana e à gravidez precoce na adolescência. Essa estratégia foi concebida para transcender as barreiras tradicionais, promovendo uma compreensão mais ampla e contextualizada dos temas sociais, a fim de enriquecer a discussão para além dos aspectos biológicos e adentrar às diversas dimensões socioculturais que permeiam a sexualidade. Ao trazer esses temas para o ambiente educacional, a escola desempenha um papel essencial na promoção da consciência e na mitigação de estigmas em torno de questões relacionadas à sexualidade e à gravidez precoce. Essas discussões em sala de aula não apenas informam, como ainda contribuem para a formação de cidadãos mais conscientes, capazes de tomar decisões informadas e respeitosas acerca de questões relacionadas à saúde sexual e reprodutiva. Ademais, o uso de estratégias lúdicas por meio das tecnologias digitais da informação e comunicação (TDIC) possibilita, também, trabalhar aspectos do objeto de conhecimento de forma afinada aos aspectos da cibercultura, contribuindo para uma inserção dos estudantes nessa linguagem que vem remodelando as sociabilidades no espaço e no tempo da contemporaneidade.
Na sequência, os alunos foram incentivados a criar mapas mentais em sala de aula a respeito de sintomas, tratamentos e profilaxias dessas infecções. Como etapa final do processo de aprendizagem, foi aplicada uma avaliação escrita. Essa metodologia diversificada foi cuidadosamente selecionada com o intuito de aprofundar o aprendizado dos alunos, contemplando as diversas dimensões biológicas, socioculturais, afetivas e éticas relacionadas à sexualidade humana. O uso combinado de abordagens teóricas e práticas visou proporcionar uma compreensão abrangente e contextualizada, aprimorando a experiência educacional dos estudantes.
Quadro 3: Sistema Sol, Terra e Lua e Clima - objeto de conhecimento, habilidades da BNCC e abordagens realizadas
Objeto de conhecimento |
Habilidades |
Abordagem metodológica |
Sistema Sol, Terra e Lua e Clima |
(EF08CI12) Justificar, por meio da construção de modelos e da observação da Lua no céu, a ocorrência das fases da Lua e dos eclipses, com base nas posições relativas entre Sol, Terra e Lua. (EF08CI13) Representar os movimentos de rotação e translação da Terra e analisar o papel da inclinação do eixo de rotação da Terra em relação à sua órbita na ocorrência das estações do ano, com a utilização de modelos tridimensionais. |
- Aula expositiva e participativa em sala de aula - Atividade escrita - Materiais didáticos (globo terrestre e lanterna) - Avaliação processual |
Continuando a sequência estabelecida pelo plano de ensino, avançamos para o objeto de conhecimento seguinte, Sistema Sol, Terra e Lua e Clima. Nessa etapa, o foco recai nos fenômenos celestes e climáticos, com ênfase nos movimentos de rotação e translação da Terra, as fases da Lua, os eclipses e a influência desses elementos nas estações do ano. A estruturação didático-pedagógica da exploração desse objeto de conhecimento também segue uma abordagem diversificada, integrando diferentes estratégias pedagógicas para otimizar o aprendizado dos alunos.
Iniciamos com a realização de aulas expositivas e participativas em sala de aula, oferecendo uma base teórica sólida do Sistema Solar, seus componentes e os fenômenos celestes em questão. Essa etapa visou não apenas transmitir informações, mas envolver ativamente os alunos na construção do conhecimento, promovendo uma compreensão mais profunda dos temas. Além disso, a etapa subsidiou as discussões e a realização de demais atividades didáticas previstas para o trabalho com o objeto de conhecimento.
Para consolidar o aprendizado, foram propostas atividades escritas para que os alunos tivessem a oportunidade de expressar o que assimilaram dos movimentos de rotação e translação, das fases da Lua e dos eclipses. Entendemos que as atividades escritas e de leitura são fundamentais na promoção da alfabetização científica e na educação científica de modo amplo, fomentando o conhecimento de informações e a construção de argumentos pelos estudantes, importante habilidade social que os aproxima da cultura da natureza da Ciência (Cachapuz et al., 2005). Nesse sentido, é um tipo de atividade sempre abordada na atuação, visando promover esse momento mais atento à construção e à consolidação de conhecimentos.
Em seguida, incorporamos a exploração lúdica, utilizando materiais didáticos como um globo terrestre e uma lanterna. Essa abordagem permitiu uma representação visual dos conceitos estudados, proporcionando uma compreensão aproximada dos fenômenos celestes. A prática complementou as aulas teóricas, promovendo uma aprendizagem mais completa, assim como discutido anteriormente.
A avaliação processual, adotada ao longo do processo, buscou acompanhar o desenvolvimento dos alunos, identificando eventuais desafios e oferecendo suporte personalizado quando necessário a partir das atividades escritas de sala de aula, com a participação de todos. Essa avaliação processual faz parte do próximo objeto de conhecimento trabalhado. Nesse contexto, a avaliação processual assume um caráter formativo, focando não na atribuição de notas, mas no acompanhamento do ritmo de aprendizagem e na adaptação das características individuais dos estudantes. Essa abordagem visa avaliar o conhecimento adquirido, proporcionando ajustes contínuos e garantindo uma abordagem mais personalizada ao processo de ensino (Lordêlo; Rosa; Santana, 2010, p. 18).
Assim, buscamos uma aprendizagem significativa e contextualizada, estimulando o interesse dos alunos para que tivessem uma compreensão mais aprofundada dos fenômenos celestes e climáticos.
Quadro 4: Clima - objeto de conhecimento, habilidades da BNCC e abordagens realizadas
Objeto de conhecimento |
Habilidades |
Abordagem metodológica |
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Clima |
(EF08CI14) Relacionar climas regionais aos padrões de circulação atmosférica e oceânica e ao aquecimento desigual causado pela forma e pelos movimentos da Terra. (EF08CI15) Identificar as principais variáveis envolvidas na previsão do tempo e simular situações nas quais elas possam ser medidas. |
- Aula expositiva e participativa em sala de aula - Atividade escrita - Sequência didática: confecção de material didático e visualização em campo, além de preparar mapas conceituais - Avaliação processual |
Por fim, avançando para o próximo objeto de conhecimento, Clima, a abordagem pedagógica se pautou em estratégias diversificadas. A priori, realizamos aulas expositivas e participativas em sala de aula. Em seguida, incorporamos atividades escritas. Uma etapa importante nessa fase consistiu na aplicação de uma sequência didática que englobava a confecção de material didático das nuvens e de sua visualização em campo, ou seja, fora da sala de aula. Essa abordagem prática permite uma compreensão mais real das variáveis envolvidas na previsão do tempo e na relação entre climas regionais, padrões de circulação atmosférica e oceânica e o aquecimento desigual causado pelos movimentos da Terra.
Durante essa sequência, os alunos também foram envolvidos na elaboração de mapas conceituais, promovendo a organização e a assimilação dos conhecimentos de forma integrada. Além disso, é importante destacar que houve uma ênfase especial no desenvolvimento do conteúdo relacionado ao clima, especialmente naquele direcionado à região nativa dos estudantes em questão, Aracaju/Sergipe. O uso de mapa conceitual tem sido uma importante estratégia didática por meio da qual é possível observar a forma de construção de conhecimento singular dos estudantes, explorando as maneiras pelas quais vão construindo significados para os termos conceituais e suas interrelações com os fenômenos naturais investigados (Barbosa; Pereira; Pimentel Júnior, 2022). Trata-se de uma estratégia colaborativa e representativa em termos de construção de conhecimento, mostrando os caminhos pelos quais os estudantes vão produzindo seus significados e conhecimentos.
A avaliação processual, mantendo seu caráter formativo, continua a permitir o acompanhamento do progresso individual dos estudantes e a adaptação constante das estratégias de ensino. Essa abordagem multifacetada visa não apenas transmitir informações, mas também desenvolver habilidades práticas e promover uma compreensão abrangente do tema, indo além da transmissão de informação.
Resultados e discussão
Durante a imersão na escola-campo e a regência no 8º ano, vivenciamos momentos únicos e enriquecedores de formação docente. Nos capítulos especiais do Programa de Residência Pedagógica, não apenas observamos, como assumimos a regência de aulas, mergulhando nas intricadas dinâmicas da prática pedagógica. Esses instantes se revelaram etapas cruciais, quando as teorias abordadas em sala de aula se entrelaçaram com a experiência prática, delineando de forma única a trajetória de formação docente, preenchendo lacunas frequentemente negligenciadas nos currículos e destacando a necessidade de ir além da teoria abstrata para uma aplicação concreta. A colaboração constante entre residentes e preceptor foi como compor um enredo coeso e cada interação contribuía para o desenvolvimento da narrativa prática. Trabalhar em equipe proporcionou uma abordagem abrangente ao ensino, sublinhando a importância da construção coletiva do conhecimento.
De modo geral, a implementação do planejamento didático-pedagógico com a diversificação das atividades no tratamento dos objetos de conhecimento ensinados, permitiu compreender a sua importância e a ideia de que “nem tudo se aprende do mesmo jeito, com o mesmo tempo e com o mesmo trabalho. Discernir o que pode ser objeto de uma unidade didática, como conteúdo prioritário, talvez seja um exercício ao qual não estamos acostumados, mas nem por isso é menos necessário” (Zabala, 1998, p. 86). Ou seja, foi um desafio constante do planejamento oportunizar diferentes estímulos e práticas educativas aos conteúdos curriculares, buscando abarcar a diversidade.
A introdução da tecnologia no cenário educacional desempenhou um papel significativo na abordagem pedagógica. Utilizamos estrategicamente recursos tecnológicos, como o jogo online Kahoot, para abordar temas sensíveis relacionados à sexualidade humana e à gravidez precoce na adolescência. Essa ferramenta ofereceu uma maneira inovadora e envolvente de explorar esses assuntos, promovendo discussões construtivas em sala de aula. A adaptação de métodos tradicionais para incluir tecnologias contemporâneas reflete o compromisso em proporcionar uma educação dinâmica e contextualizada, alinhada às necessidades e aos interesses dos alunos.
A reflexão contínua sobre as práticas e a adaptação constante das estratégias de ensino durante essa imersão foram essenciais para moldar a trama educacional. A revisão sistemática das estratégias de ensino-conteúdo não apenas corrigiu equívocos, como impulsionou notável progresso aos alunos, independentemente de suas habilidades iniciais.
Os resultados expressivos conquistados durante a regência no 8º ano apresentaram muitos significados. A abordagem prática, centrada em experimentos e em atividades interativas, cativou os alunos e aprofundou significativamente a sua compreensão dos conceitos científicos. Isso sublinha a importância de uma pedagogia que coloca a experimentação como protagonista no aprendizado das Ciências, aproximando-nos das práticas que representam uma educação científica de qualidade, com foco na cultura científica e na natureza da Ciência (Cachapuz et al., 2005).
Em suma, a imersão na prática profissional se desdobrou como um desfecho impactante, costurando a teoria à prática de maneira harmoniosa. Essa abordagem reforçou a urgência de uma formação inicial de professores que promova a vivência prática, enriquecendo a aprendizagem e preparando os futuros educadores para os desafios do ambiente escolar.
Em síntese, os resultados dessa regência não foram apenas conclusivos, mas lições valiosas que transcendem o contexto específico. A experiência impactou positivamente as relações professor-aluno, aluno-conteúdo e professor-conteúdo, sublinhando a importância de uma abordagem diversificada e flexível no ensino de Ciências. O feedback positivo da turma validou não apenas as metodologias e as adaptações utilizadas durante a regência, mas destacou a troca mutuamente enriquecedora de conhecimento, consolidando o papel crucial dessa experiência no crescimento profissional e no aprimoramento das práticas de ensino. As abordagens adotadas ao longo do período de regência abrangeram temas, como: Mecanismos Reprodutivos, Sexualidade, Sistema Sol, Terra e Lua, e Clima. Eles foram experiências envolventes que trouxeram o uso de tecnologias educacionais, como o Kahoot, as metodologias ativas em jogos tradicionais, os jogos educacionais online em sala de aula, as visitas laboratoriais, as oficinas e a construção de experimentações com materiais lúdicos, criando assim um enredo educacional memorável.
Os conteúdos ministrados e as abordagens utilizadas revelaram que os mecanismos reprodutivos se transformaram em uma narrativa intrigante, por meio da qual os alunos, por experimentações práticas e discussões abertas, desvendaram os mistérios da vida. A abordagem delicada e respeitosa à Sexualidade (Quadro 2), permitiu uma jornada de autodescoberta, ancorada em diálogos inclusivos e reflexões construtivas. Tendo em vista que esse objeto de conhecimento se revela como desafiador ao ser levado para sala de aula, ele é de extrema importância, pois evidencia conhecimentos e percepções gerais acerca do corpo.
Outro ponto significativo diz respeito à exploração do Sistema Sol, Terra e Lua. O ponto transformou a sala de aula em um observatório cósmico, onde os estudantes se tornaram astrônomos curiosos. As metodologias participativas, envolvendo jogos tradicionais e o dinamismo dos jogos educacionais online, transformaram a aprendizagem em uma aventura coletiva. O uso do Kahoot adicionou uma pitada de competição saudável, transformando a sala em um palco animado de conhecimento.
Nossas jornadas foram além das quatro paredes da sala de aula. As atividades, fora da sala de aula, foram como excursões científicas. Nelas, os estudantes puderam tocar, experimentar e vivenciar o que antes era apenas teoria. A construção de experimentações com materiais lúdicos engajou os estudantes e proporcionou uma abordagem tátil e prazerosa ao aprendizado. Esses elementos não foram apenas atividades, mas capítulos emocionantes em nosso livro educacional, transcendendo as páginas e tocando os corações dos alunos.
Portanto, a partir da implementação do planejamento, acreditamos que não só contemplamos aspectos educacionais já preconizados pela BNCC, como ultrapassamos as expectativas. Cada abordagem foi cuidadosamente pensada para desenvolver não apenas habilidades técnicas, mas competências socioemocionais. A vivência educacional foi um cumprimento de metas curriculares e uma jornada emocionante que nutriu a curiosidade, a empatia e a paixão pelo conhecimento.
Figura 1: Primeira verificação de aprendizagem por abordagem tradicional de ensino
Fonte: Acervo do autor (2023).
Figura 2: Integração de atividades com a preparação de material didático lúdico
Fonte: Acervo do autor (2023).
Figura 3: Visitação laboratorial como melhoramento da assimilação ao conteúdo
Fonte: Acervo do autor (2023).
Considerações finais
A residência pedagógica se revela como um catalisador essencial na formação de futuros professores em Ciências e Biologia, desempenhando um papel de destaque na integração de metodologias participativas, com diversificação de atividades pedagógicas. Ao estabelecer uma sólida conexão entre teoria acadêmica e prática pedagógica nas escolas de Ensino Básico, o programa amplia horizontes educacionais, redefinindo a abordagem do ensino de Ciências. Por meio desse relato de experiência e da execução do planejamento didático-pedagógico, aliada à concepção construtivista que atende à diversidade dos ambientes escolares, acreditamos ser possível contribuir para uma formação integral para além do modelo transmissivo.
Ao fomentar a participação dinâmica dos alunos e ao promover a imersão prática, a RP oferece uma experiência transformadora que vai além do tradicional modelo de formação de professores. A ênfase nas metodologias participativas aprimora o tratamento do conteúdo curricular, incentivando a autonomia e a participação ativa dos alunos na construção do conhecimento.
Nesse contexto, a RP preenche uma lacuna na formação docente, abraçando a inovação necessária para alinhar o ensino de Ciências às demandas contemporâneas. A inserção de tecnologias, simulações e abordagens participativas amplia o acesso ao conhecimento, preparando os futuros educadores para enfrentar os desafios de uma sociedade cada vez mais digital.
Desse modo, ao formar educadores aptos a utilizar boas abordagens, contribui-se para o aprimoramento da formação prática de profissionais capacitados a instigar a curiosidade, inspirar a aprendizagem e promover uma visão mais dinâmica e participativa do ensino de Ciências.
Em síntese, a RP não apenas forma professores, mas impulsiona agentes de mudança que aprendem e incorporam metodologias diversas como ferramentas essenciais para criar ambientes de aprendizagem envolventes e eficazes na formação integral. Ao abraçar essa abordagem, o programa enriquece a formação de professores em Ciências, contribuindo para a construção de uma educação inovadora, centrada no aluno e preparada para os desafios do século XXI.
Referências
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Publicado em 14 de maio de 2025
Como citar este artigo (ABNT)
FRANÇA, Victor Henrique Santos; PIMENTEL JÚNIOR, Clívio. Cruzando fronteiras entre universidade e Educação Básica: a sinfonia entre residência pedagógica e atuação docente na formação inicial de professores em Ciências Biológicas. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 17, 14 de maio de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/17/cruzando-fronteiras-entre-universidade-e-educacao-basica-a-sinfonia-entre-residencia-pedagogica-e-atuacao-docente-na-formacao-inicial-de-professores-em-ciencias-biologicas
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