Videoclipe como atividade de multiletramentos: relato de experiência de oficina no Ensino Fundamental
Graziela Frainer Knoll
Doutora em Letras (UFSM), licenciada em Língua Portuguesa (UFSM), professora adjunta na UFN, professora na Secretaria Municipal de Educação de Itaara/RS
Lucas Oliveira Silva
Mestrando em Letras (UFSM), licenciado em Letras - Língua Inglesa (UFSM), professor de Língua Inglesa da rede municipal de ensino de Santa Maria/RS
Aldiara Fernanda Pavão Garcia
Licenciada em Matemática (UFN), bacharela em Estatística (UFSM), especialista em Educação Ambiental (UFSM), mestranda em Tecnologias Educacionais em Rede (UFSM), professora de Matemática na rede estadual do Rio Grande do Sul
Sheila Silvana Silva Machado
Licenciada em Matemática (UFSM), especialista em Gestão Escolar (UCB), professora de Matemática da rede estadual do Rio Grande do Sul
Ensinar na era das mídias representa um desafio e, ao mesmo tempo, uma oportunidade para os educadores. Nesse cenário, as mídias desempenham um papel fundamental na vida dos alunos, influenciando a forma como eles consomem, compartilham e constroem conhecimento. Isso não apenas envolve o uso de tecnologias como ferramentas educacionais, mas também a promoção do pensamento crítico em relação às informações disponíveis.
Trabalhar com audiovisual em sala de aula é uma forma de inserir diferentes modalidades de linguagens com as quais os estudantes interagem diariamente, mas sob um propósito pedagógico. Nessa perspectiva, o videoclipe é um formato audiovisual que pode ser inserido em práticas pedagógicas na escola de forma interdisciplinar, pois a concepção de um material audiovisual demanda a fusão de elementos visuais e sonoros, cuja essência das produções reside na narrativa visual que instiga a compreensão no espectador (Rabaça; Barbosa, 2014). Quanto à mensagem a ser transmitida ao público, ela pode estar conectada à narrativa auditiva, como observamos em videoclipes nos quais o tema visual se vincula à trama musical ou podem ser simbólicas e subjetivas.
Para viabilizar essa construção, torna-se imprescindível a elaboração de um roteiro com as ações dos atores meticulosamente delineadas para cada momento da composição musical. É crucial compreender não apenas o que será registrado, mas como a linguagem dos participantes do vídeo desempenha papel fundamental na transmissão efetiva da mensagem.
Exposto isso, o objetivo deste artigo é realizar um relato de experiência acerca de um videoclipe como atividade de ensino, a partir de uma prática com estudantes do Ensino Fundamental. Esse formato audiovisual e midiático foi utilizado em um conjunto de oficinas para uma escola pública municipal, com produção realizada pelos estudantes de um videoclipe, produto final da oficina.
Ao levar o videoclipe para a sala de aula, trabalham-se as linguagens verbal (letra da música) e não verbal (sons, dança, ritmo e gestos) de forma criativa e inovadora. Dessa forma, o videoclipe pode ser abordado pela perspectiva do multiletramento, quando destacamos a diversidade de linguagens presentes na sociedade contemporânea, além da diversidade de culturas com as quais interagimos habitualmente (Rojo, 2012). Essa abordagem se fortaleceu desde o ano de 1996, à medida que o propósito essencial da educação passou a ser destacado pelo acesso à aprendizagem, a fim de que todos estejam aptos a exercer plenamente a cidadania em um mundo globalizado.
Precisamos compreender a ideia e o escopo da pedagogia dos letramentos, para dar conta do contexto de uma sociedade culturalmente e linguisticamente diversificada que se apresenta de forma cada vez mais globalizada, incluindo as múltiplas culturas que se relacionam e a pluralidade de textos que circulam. Em segundo lugar, a pedagogia dos letramentos deve considerar a variedade crescente de formas de textos, associadas às tecnologias de informação e comunicação (GNL, 1996 apudCope; Kalantzis, 2000).
Assim, o videoclipe abre uma gama de oportunidades para que professor e estudante explorem diferentes habilidades e formas de expressão, mediante a integração de elementos visuais, sonoros e narrativos. Além disso, trata-se de uma forma de trabalhar com o formato da cultura digital, pois os estudantes podem criar conteúdo audiovisual, manifestando um protagonismo que os motiva ao aprendizado. Para apresentar este relato, o artigo está organizado em: objetos de aprendizagem, videoclipe (como formato audiovisual na educação), metodologia, relato de experiência e conclusão.
O videoclipe como formato audiovisual no contexto educacional
As inovações tecnológicas podem ser vistas como aliadas ao trabalho docente, quando servem à diversificação dos objetos de aprendizagem, das atividades e das metodologias de ensino, ou seja, quando agregam uma transformação positiva à sala de aula. Nesse intuito, muito se tem discutido a respeito da inserção de tecnologias, como a do smartphone, do notebook e da própria Internet nas práticas pedagógicas. As mídias audiovisuais e seus formatos (como o formato do videoclipe e do filme) permanecem importantes para a renovação das práticas e, consequentemente, para a motivação dos estudantes. Segundo Moran (2007, p. 162),
a televisão, o cinema e o vídeo, CD ou DVD – os meios de comunicação audiovisuais – desempenham, indiretamente, um papel educacional relevante. Passam-nos continuamente informações, interpretadas; mostram-nos modelos de comportamento, ensinam-nos linguagens coloquiais e multimídia e privilegiam alguns valores em detrimento de outros.
O fator principal em relação às mídias no ensino é que elas agregam diferentes linguagens às aulas, ampliando as possibilidades de leitura, interpretação e compreensão ao estudante. Ao mesmo tempo, elas renovam atividades que já se tornaram esperadas ou pouco criativas, do ponto de vista do aluno, como o ato de copiar textos e realizar exercícios no quadro. Não se trata de abandonar as aulas expositivas ou os exercícios tradicionais, mas transformar parte das aulas em experiências de aprendizagem mais diversificadas e engajadoras.
Entretanto, incluir tecnologias digitais no ensino não é o suficiente para transformar uma sala de aula. Moran (2018, p. 9) explica que as tecnologias digitais são acessíveis, instantâneas e podem ser empregadas de múltiplas formas, mas “o que faz a diferença não são os aplicativos em si, mas estarem nas mãos de educadores, gestores (e estudantes) com uma mente aberta e criativa, capaz de encantar, de fazer sonhar, de inspirar”. Assim, a maneira como as atividades são planejadas e propostas, de forma interessante, atraente e com sentido ao estudante é o que fará a diferença.
Quanto à diversidade de videoclipes disponíveis para serem agregados a uma atividade de ensino é importante considerar que “todo material, que no acesso ao conhecimento tem a função de ser mediador na comunicação entre o professor e o aluno, pode ser considerado material didático” (Brasil, 2002, p. 79). Dentro do planejamento do professor e da proposta da disciplina ou do currículo escolar, cabe ao professor elencar os materiais audiovisuais mais apropriados ao ano escolar e à sua prática pedagógica.
O videoclipe, além de ser uma forma de expressão artística, pode ser habilmente integrado como recurso pedagógico, oferecendo uma poderosa ferramenta para atividades de ensino que estimulem à criatividade, à análise crítica e à interpretação contextual, mediante narrativas que os estudantes venham produzir. As narrativas são formas de contar histórias e podem ser sonoras, visuais, escritas e ilustradas. Barthes (2011) entende que a narrativa não é uma simples sequência de acontecimentos, mas uma arte de quem transmite a história e os acontecimentos do seu ponto de vista.
Para Coelho (2003), cujo trabalho se refere a um estudo das narrativas audiovisuais em videoclipes, as narrativas presentes nessa mídia conectam o artista ao seu público, por meio de alguns artifícios. Um desses artifícios é a não linearidade da performance do artista à história que está sendo contada. Assim, não é necessário que a história tenha início, meio e fim definidos dentro do audiovisual. Nesse aspecto, Barthes (2011, p. 57) afirma que as narrativas consistem em uma linguagem sintética, “fundada principalmente sobre uma sintaxe de encaixamento e de desenvolvimento: cada ponto da narrativa irradia em muitas direções ao mesmo tempo”. Assim, diferentes elementos podem estar presentes no audiovisual a fim de agregar algo novo à história, dependendo da forma como foi planejado pelo seu produtor.
Com isso, o videoclipe oferece oportunidade para explorar as noções de narrador, tempo, espaço e personagem, de maneira dinâmica, tornando o estudante o produtor de uma narrativa multimídia, não só um leitor de um texto escrito, como frequentemente abordamos a narrativa na escola. Ao analisar cuidadosamente a técnica a ser utilizada, a montagem dos eventos e os elementos visuais empregados, os alunos podem realizar a construção da narrativa, compreender a manipulação do tempo e do espaço e sua importância na história, identificando as representações das personagens, desenvolvendo uma apreciação mais profunda da linguagem audiovisual e aprimorando suas habilidades críticas, expressivas e interpretativas.
O trabalho de Prado (2017) relata uma proposta didática no ensino de História cujo objetivo é apresentar o videoclipe como documento histórico e instrumento de aprendizagem relevante que possibilita o contato com outras sociedades e temporalidades. A experiência proporcionou uma reflexão acerca do uso de diversas fontes históricas, como registros textuais, iconográficos ou materiais, dando ao aluno a oportunidade de ajudar a construir (ou reconstruir) a história a partir do seu próprio olhar interpretativo. Além disso, a autora destaca a proximidade que esse formato audiovisual estabelece com os adolescentes, por envolver som, imagem e a letra de uma música, tornando-se uma forma de expressão que favorece o reconhecimento das vivências dos alunos, representando valores do seu tempo.
Ademais, conforme Gumesson (2012) – que analisou o uso do videoclipe em atividades de ensino de Língua Inglesa no Ensino Médio - os ganhos obtidos com esse formato audiovisual são vários, como: o desenvolvimento das habilidades da língua, a promoção da interação social e o senso crítico. Isso se dá de forma ainda mais potente quando há temas transversais presentes no videoclipe. Para que isso ocorra, não é suficiente apresentar um videoclipe na aula de Inglês, mas é preciso planejar cuidadosamente a atividade, tendo em vista as habilidades que o professor pretende trabalhar, como leitura, escuta ou pronúncia. A autora ressalta que alguns dos principais benefícios do videoclipe na aula de Língua Inglesa são: a aproximação entre o estudante e o uso da língua por nativos, a interação social que proporcionam e a aprendizagem colaborativa que pode ser feita.
Dessa forma, o videoclipe pode ser utilizado em uma atividade de multiletramento, devido a sua perspectiva que coloca o estudante como um analista crítico, um sujeito capaz de construir e produzir significados, compreendendo como os textos estão articulados e, além disso, sendo um sujeito transformador da realidade. Com isso, a mente incorpora uma aprendizagem de forma situada e social, isto é, os contextos sociais estão implícitos nos conhecimentos adquiridos (Cope; Kalantzis, 2000). Como uma atividade de multiletramento, espera-se que: (1) a prática seja situada, (2) seja dada uma instrução explícita ao aluno; seja feito um enquadramento crítico do texto (ou, neste caso, do videoclipe), (3) seja realizada uma prática transformadora (a ação do aluno seja capaz de construir significados e transformar uma realidade).
Há, ainda, a possibilidade de trabalhar de forma interdisciplinar com a narrativa do videoclipe, agregando conhecimentos e linguagens de diferentes componentes curriculares, pois um videoclipe pode ser trabalhado na aula de Língua Inglesa paralelamente com a sua tradução para o Português, como um exercício de interpretação, e com a Arte, ao ser estabelecido um exercício de criação multimídia, como a produção de um novo videoclipe pelas crianças. A esse respeito, Moran (2018, p. 9) considera que as tecnologias digitais podem abrir portas para uma interdisciplinaridade mais efetiva, com “integração entre as diversas disciplinas através de um projeto mais amplo e outras atividades que façam sentido”. Em consequência disso, os alunos adquirem uma compreensão mais abrangente e integrada do conhecimento, fazendo a conexão entre diferentes disciplinas e sendo preparados para enfrentar desafios mais complexos dentro e fora da sala de aula.
Metodologia
Este trabalho se constitui como pesquisa qualitativa, concentrando-se na compreensão contextualizada de fenômenos sociais, culturais, psicológicos ou humanos. Como método, o relato de experiência é uma narrativa que descreve detalhadamente uma experiência vivida por uma pessoa ou um grupo de pessoas. Desse modo, trata-se de uma atividade de ensino vivenciada por um grupo de alunos e professores em uma comunidade escolar. Essa forma de registrar e comunicar os resultados da experiência pedagógica tem como objetivo principal compartilhar as vivências, as experiências e os aprendizados decorrentes de uma determinada situação ou evento. Este relato traz uma oficina realizada em uma escola pública municipal de Ensino Fundamental, em um município do interior do Rio Grande do Sul, durante uma colônia de férias, em janeiro de 2024.
Considerando a pedagogia de multiletramentos como estruturadora da atividade proposta (nela, o estudante precisa construir e produzir significados e não ser visto como um receptor de informações), foram feitos os seguintes procedimentos:
- Estruturação da oficina mediante um planejamento de ensino pelos docentes, com a definição dos objetivos, procedimentos, produto final e materiais necessários para a atividade;
- Levantamento de videoclipes apropriados para a faixa etária da turma de 12 a 16 anos de idade, estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental;
- Articulação de saberes nas atividades de escuta, compreensão e interpretação das músicas em Inglês;
- Criação audiovisual de um videoclipe que interpretasse uma das canções selecionadas, desde a roteirização até à finalização do produto para posterior socialização com a turma.
Estabelecidas essas etapas, a oficina descrita foi realizada em quatro encontros explicados no próximo tópico.
Relato de experiência: Oficina Linguagem no Vídeo – Criação de um Videoclipe
No mês de janeiro de 2024, foi oferecida aos alunos da rede municipal de ensino de um município no interior do Rio Grande do Sul, uma colônia de férias composta por oficinas pedagógicas interdisciplinares cujo objetivo fosse a criação de um produto educacional pelos estudantes. Essa atividade foi realizada nas escolas municipais onde os alunos matriculados poderiam se inscrever e participar das atividades desenvolvidas pelo corpo docente de cada escola. Dentro desse contexto, os professores se organizaram em grupos de trabalho interdisciplinares, estruturando as oficinas com diferentes temáticas e finalidades pedagógicas.
A oficina Linguagem no Vídeo - Criação de um Videoclipe contou com 22 alunos inscritos, divididos em dois grupos de onze alunos cada e quatro professores de diferentes componentes curriculares, responsáveis pela execução, sendo um professor de Língua Inglesa, uma professora de Língua Portuguesa e duas professoras de Matemática. A atividade foi proposta com os seguintes objetivos: conhecer e discutir de maneira crítica o gênero videoclipe, compreender as letras em língua inglesa, analisar as narrativas audiovisuais apresentadas, desenvolver um roteiro para a criação de um videoclipe, produzir a narrativa planejada, com gravação de cenas e edição.
No primeiro momento, foi realizada uma explicação expositiva acerca do conceito de videoclipe, assim como uma apresentação das etapas que eles teriam que desenvolver ao longo dos encontros da oficina. Essa etapa foi expositiva e contou com a apresentação oral e por meio de slides do conceito de videoclipe, além do seu propósito de produção e consumo. Nesse momento, os alunos tiveram que pensar a respeito das seguintes questões (Quadro 1):
Quadro 1: Perguntas introdutórias
1) |
O que é o videoclipe? |
2) |
Quem o produz? |
3) |
Como ele é produzido? |
4) |
Qual a finalidade dessa produção? |
5) |
Onde podemos encontrar o videoclipe? |
Em seguida, após a discussão do conceito de videoclipe, foram abordados os elementos estruturais desse formato, bem como os estilos possíveis conforme o gênero musical. Esse momento da oficina proporcionou aos alunos um entendimento crítico e reflexivo acerca de um gênero vastamente disseminado e consumido pela cultura pop atual presente nas plataformas digitais (Oliveira; Lucena, 2021). Dentre as respostas, constatou-se que a principal forma de consumo de videoclipes para os alunos é o Youtube,pois alguns deles alunos não conheciam os canais televisivos direcionados à exibição de vídeos musicais, como o Canal Multishow ou a MTV. Quando questionados acerca da finalidade do gênero videoclipe, responderam que a principal finalidade era “monetizar” e divulgar um trabalho musical, portanto focaram-se no caráter comercial do gênero.
Depois dessa discussão, foram lançados os seguintes questionamentos aos estudantes: “Você já assistiu a um videoclipe de uma música em Língua Inglesa ou em outra língua?”, “A letra da música tinha relação com a história que estava sendo apresentada no vídeo?” e “Você pensa que as letras, na maioria das vezes, fazem uma relação com a narrativa audiovisual?”. De modo geral, os alunos afirmaram que já assistiram a vídeos de canções em outras línguas e, na maioria das vezes, as letras não se relacionavam com as narrativas apresentadas. Alguns dos alunos disseram que procuram as traduções na internet das letras para fazerem tal relação e entenderem que está sendo cantado pelos artistas.
Num segundo momento, propusemos um desafio prático aos alunos, que tiveram que organizar as letras em Língua Inglesa das músicas dos videoclipes escolhidos pelos professores. Os alunos foram separados nas suas respectivas equipes, em pontos distintos do espaço da sala de aula. Cada equipe recebeu as estrofes da música separadamente e, mediante a escuta da canção, tiveram que ordenar a letra, reconhecendo sons e palavras. O objetivo dessa dinâmica foi incentivar os alunos a compreenderem e a organizarem a música na ordem correta, prestando atenção à letra da música apresentada em um aparelho de áudio duas vezes. Uma pontuação foi estabelecida para o grupo que organizasse a ordem correta das três músicas selecionadas: The nights, de Avicii, Radioactive, de Imagine Dragons e The reason, do Hoobastank. Assim, os alunos puderam exercitar a compreensão auditiva do Inglês, uma vez que precisaram criar uma estratégia a partir das palavras já conhecidas. Não disponibilizamos os nomes das canções previamente, a fim de deixar o desafio mais complexo para o estudante. Depois de encerrada essa parte do desafio, discutimos com os alunos as letras das canções.
Na terceira parte da oficina, realizamos uma atividade em que os alunos tiveram que assistir aos videoclipes dessas canções respondendo acerca da história apresentada no vídeo, para entenderem como se desenvolve uma narrativa audiovisual. Dessa forma, seguimos para a exibição dos videoclipes das músicas escolhidas, com o propósito de exemplificar que os vídeos das músicas podem representar uma narrativa de acordo com a letra ou terem uma narrativa própria, mais subjetiva, quando a narrativa audiovisual se distancia da letra da música. Nessa etapa, os grupos compartilharam suas impressões dos videoclipes, buscando estabelecer a relação entre a letra e a narrativa visual. Para isso, foi necessário que compreendessem as letras das músicas com a sua tradução para o Português, para que averiguassem se havia conexão com as histórias representadas no videoclipe.
Após assistirem e discutirem sobre os videoclipes, os alunos tiveram que escolher uma das três músicas anteriores para a criação de um videoclipe autoral. Assim, os alunos escolheram a música The nights,do artista Avicii. Segundo a percepção dos estudantes na análise desse vídeo, tanto a letra quanto a narrativa visual remetem às memórias de momentos bons que uma pessoa pode ter em sua vida. Além disso, eles perceberam que todas as vezes que a palavra nights, cuja tradução para o português seria “noites” era mencionada na canção, a imagem do vídeo tinha relação com alguma atividade noturna.
No quinto momento, os alunos escolheram um dos videoclipes para recriar a sua própria versão daquela narrativa audiovisual. Nesse momento, eles precisaram criar um roteiro para o videoclipe e, também, precisaram pensar em quais lugares e ações seriam interessantes para a temática da música. Após a geração de ideias, os alunos compartilharam suas ideias e os roteiros feitos para que, em conjunto com a turma e os professores, fosse feita uma avaliação do que seria possível fazer dentro das possibilidades de recursos e espaços da escola. Assim, adaptações e sugestões foram feitas para a reorganização dos roteiros pelos estudantes.
Posteriormente, foram feitas as gravações das imagens com o uso dos celulares de alguns alunos. Lugares como a sala de informática, o refeitório, a quadra esportiva e a biblioteca foram utilizados para as gravações, foram feitas danças típicas de redes sociais e algumas brincadeiras dos estudantes, geralmente realizadas na hora do intervalo. Esses elementos foram reverenciados no vídeo com a finalidade de descrever momentos divertidos e empolgantes da oficina.
No último momento da oficina, os alunos executaram a edição do vídeo utilizando o aplicativo gratuito Youcut. Alguns alunos relataram que já utilizavam aplicativos semelhantes para a edição de seus vídeos pessoais. Dessa forma, eles puderam compartilhar seus conhecimentos acerca de edição, como cortes e criação de efeitos, inserção de legendas, execução do áudio e aceleração do vídeo em momentos específicos. Após as edições, os vídeos foram apresentados aos demais colegas, aos professores e à equipe diretiva, com o propósito de socializar as linguagens e técnicas aprendidas na composição daquele produto final.
Como reflexão, consideramos que o acesso à internet e às mídias digitais de modo amplo permite que os estudantes consumam músicas e videoclipes do mundo inteiro, diariamente. Cada audiovisual representa a expressão musical, os gostos, o figurino, a cultura e as representações de mundo características de seu tempo. Explorar essa variedade cultural e de linguagens na oficina relatada não só amplia as habilidades comunicativas dos alunos como os capacita a interpretar, a analisar e a criar de maneira mais abrangente e consciente. Isso contribui significativamente para moldar cidadãos mais preparados para enfrentar os desafios de uma sociedade cada vez mais multimídia e interconectada. Assim, ao introduzir o audiovisual na sala de aula, não apenas ampliamos o horizonte do aprendizado, mas promovemos uma educação mais alinhada à realidade social.
A integração do audiovisual ao ambiente escolar, mediante a oficina de férias, assume papel crucial no enriquecimento do processo educacional. Ao incorporar recursos audiovisuais como o videoclipe, os educadores têm a oportunidade de cativar a atenção dos alunos de maneira mais envolvente, proporcionando uma experiência de aprendizado dinâmica e estimulante. O audiovisual torna os conceitos mais tangíveis e acessíveis para o estudante de Ensino Fundamental e promove o desenvolvimento de habilidades, como a interpretação crítica, a análise visual e a síntese de informações. Além disso, o uso do audiovisual na escola fomenta a inclusão de diferentes estilos de aprendizagem, atendendo às diversas necessidades dos alunos e preparando os estudantes para a compreensão e a participação em uma sociedade cada vez mais mediada por mídias e tecnologias.
Conclusões
A oficina Linguagem no Vídeo: Criação de um Videoclipe foi concluída da maneira planejada, pois os alunos não apenas desenvolveram habilidades técnicas de gravação e edição de vídeo como também aprimoraram sua capacidade de criar um produto audiovisual bastante consumido por eles mesmos na cultura pop. A finalização da parte prática e autoral da oficina na qual foi gerado o videoclipe foi dividida em três partes: a primeira foi a partilha do roteiro com os professores e os demais alunos, como uma atividade colaborativa; a segunda parte, a gravação das cenas descritas no roteiro, utilizando os celulares dos alunos e a terceira, a edição das cenas realizada pelos estudantes, associando o visual gravado com a música escolhida. Com a integração das etapas, a oficina promoveu a colaboração, o pensamento crítico e a expressão dos estudantes.
Entendemos que o emprego de vídeos na sala de aula proporciona benefícios importantes, como a aproximação entre os alunos e a Língua Inglesa, um idioma que parece distante da realidade social desses estudantes. A interação e a aprendizagem colaborativa também foram diferenciais percebidos na oficina, trabalhando no estudante noções de autonomia, participação e decisão, inclusive cenas e locais a serem representados na narrativa. Ao término do produto, os estudantes conceberam um videoclipe original e, também, adquiriram uma compreensão teórica e crítica a respeito da narrativa audiovisual, explorando as diversas possibilidades criativas proporcionadas pela tecnologia digital. Essa experiência evidenciou como os multiletramentos podem agregar à sala de aula, capacitando os alunos a se tornarem criadores de conteúdo, não só consumidores.
Por fim, destacamos que é uma incumbência e, ao mesmo tempo, um desafio aos educadores incorporar estratégias pedagógicas que efetivamente integrem as mídias digitais no processo de ensino, considerando que os estudantes irão atuar em uma sociedade cada vez mais influenciada pelas mídias. Esse enfoque estimula a criatividade, promovendo a comunicação e desenvolvendo habilidades de linguagens importantes para a promoção das competências necessárias para uma participação ativa no mundo digital.
Referências
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GUMESSON, Duanny W. B. A utilização de vídeos em aulas de Inglês para o Ensino Médio. Revista Polyphonía, Goiânia, v. 21, n° 2, 2012. DOI: 10.5216/rp.v21i2.18978. Disponível em: https://revistas.ufg.br/sv/article/view/18978. Acesso em: 10 fev. 2024.
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RABAÇA, Carlos A.; BARBOSA, Gustavo G. Dicionário essencial de comunicação. Rio de Janeiro: Lexikon, 2014.
ROJO, Roxane. Pedagogia dos multiletramentos: diversidade cultural e de linguagens na escola. In: ROJO, Roxane; MOURA, Eduardo (org.). Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola, 2012.
Publicado em 14 de maio de 2025
Como citar este artigo (ABNT)
KNOLL, Graziela Frainer; SILVA, Lucas Oliveira; GARCIA, Aldiara Fernanda Pavão; MACHADO, Sheila Silvana Silva. Videoclipe como atividade de multiletramentos: relato de experiência de oficina no Ensino Fundamental. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 17, 14 de maio de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/17/videoclipe-como-atividade-de-multiletramentos-relato-de-experiencia-de-oficina-no-ensino-fundamental
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